Eu sei que o assunto é chato. Eu sei que ninguém quer falar a respeito. Mas é preciso. Nem tudo na vida é sombra, água fresca e roquenrol. Infelizmente.
A patacoada promovida pelo governo Lula e por Hugo Chávez em Honduras, com a transformação da embaixada brasileira em QG do golpismo bolivariano, entrará para a História como um momento triste para a verdade. Poucas vezes se mentiu tanto, e tão descaradamente, para justificar uma tentativa de estupro constitucional como se fosse a defesa da democracia. Poucas vezes se viu na História maior desfaçatez, maior inversão da realidade. E poucas vezes se viu tanta gente engolir impensadamente tantas falsidades como se fossem fatos, e desprezar fatos como se não passassem de propaganda.
Primeiro, os bolivarianos de aqui e de alhures venderam a idéia de que a deposição de Manuel Zelaya em 28/06 foi um "golpe". Os jornais passaram, então, a se referir, insistentemente e de forma sistemática, aos que expulsaram Zelaya do poder como "golpistas", "governo golpista", ou "governo de facto" - com "c" de cascata -, enquanto Zelaya era o "presidente deposto", "presidente democraticamente eleito" ou mesmo - o cúmulo da cara-de-pau - "presidente constitucional"... No começo, a estratégia deu certo - muita gente comprou a tese de que houve mesmo um "golpe" em Honduras, e que Zelaya, tadinho, foi expulso do poder por ser um democrata, um amante das leis e da liberdade... Mas bastou alguém fazer o que ninguém tinha feito até então - ler a Constituição de Honduras - para que ficasse claro quem é o golpista, e quem agiu para cumprir a Lei. Aí a fraude veio à tona.
Fossem os esquerdistas pessoas normais, com um pingo de consciência moral e um mínimo de sentido de decência, e, diante de desmascaramento tão evidente, teriam pelo menos se calado e colocado a viola no saco. Mas não. A cada mentira sua desmascarada, inventam imediatamente outra, que substitui a anterior, e assim indefinidamente, até a eternidade. Sua tática se resume no seguinte: mentir, mentir, mentir. Sempre. O tempo todo. Até que a mentira, de tão repetida, se torne verdade, como dizia Goebbels.
Diante da simples leitura do que está escrito na Constituição da República de Honduras, o argumento do "golpe" convence cada vez menos os incautos (apesar disso, eles sempre existirão, tenham certeza). Daí porque os cabos eleitorais do bigodudo Zelaya e de seu mestre Hugo Chávez resolveram partir para outra. Não batem mais na tecla do "golpe" - pelo menos não tanto quanto antes -, nem tentam mais negar que a "materialização" de Zelaya na embaixada brasileira em Tegicugalpa - convertida em palanque zelayista - foi planejada pelos governos de Lula e de Chávez e constituiu uma aberta violação da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas e da soberania hondurenha. Em vez disso, insistem em comparações fajutas, a fim de sustentar a farsa.
Não sendo mais capazes de esconder o fato óbvio de que Manuel Zelaya, ao convocar um plebiscito ilegal para decidir sobre sua reeleição, tentou rasgar a Constituição hondurenha, fazem, agora, a seguinte comparação: FHC mudou a Lei para reeleger-se em 1998, e o presidente colombiano Álvaro Uribe também deseja alterar a Constituição da Colômbia para garantir um terceiro mandato. Não são ambos, portanto, golpistas? Não são, também, a seu modo, bolivarianos?
Não! Nem FHC, nem Álvaro Uribe, pertencem à mesma laia de Manuel Zelaya, Hugo Chávez, Evo Morales e Rafael Correia. E não é preciso ser do PSDB ou concordar com a reeleição de FHC ou com o terceiro mandato de Uribe para perceber isso. Na verdade, esse é mais um motivo para ser contra a reeleição, pois apenas dá ensejo a que os inimigos da liberdade defendam suas teses antidemocráticas e tentem confundir ainda mais a opinião pública.
A questão é desonesta, como tudo que vem dos bolivarianos, por várias razões. Em primeiro lugar, o fato de um governante ter mudado a Lei para reeleger-se, por mais que se discorde dessa iniciativa (e discordo totalmente, pois acredito que não se deve mudar as regras no meio do jogo), não faz dele, necessariamente, um caudilho bananeiro e liberticida. Não se pode colocar no mesmo saco personagens e situações completamente diferentes: a reeleição de FHC, assim como o terceiro mandato para Uribe, discutíveis como são, não podem ser equiparados ao projeto chavista-bolivariano. Este é um projeto revolucionário, que visa não somente à perpetuação do tiranete no poder - notem bem: perpetuação, e não somente um segundo ou terceiro mandato presidencial -, mas à total e completa subordinação dos demais poderes constitucionais e de toda a sociedade ao poder central. Comparar o golpe civil tentado por Zelaya em Honduras ou o realizado por Chávez na Venezuela à reeleição de FHC ou ao projeto continuísta de Uribe na Colômbia é o mesmo que comparar uma bomba de nêutrons a um traque. Quando FHC ou Uribe tentarem destruir as instituições democráticas do país, dando uma ordem ilegal ao comandante do Exército, em clara afronta a uma determinação do Supremo Tribunal, bem como exportar a "revolução bolivariana", poderemos conversar a respeito. Até lá, o que há é apenas falsidade e manipulação, nada mais.
FHC e Uribe podem ser acusados de muita coisa, menos de serem inimigos da democracia. O mesmo não pode ser dito do projeto lulista do terceiro mandato, de que se falou durante algum tempo, mas que, infelizmente para os lulistas, não vingou, pois as instituições brasileiras, felizmente para nós, ainda não deixam. A idéia do terceiro mandato de Lula era um atentado à democracia porque tinha mais a ver com Chávez do que com FHC. O lulismo, aliás, tem tudo a ver com o chavismo, sendo na verdade sua face mais light e "respeitável". Mesmo essa face "moderada" do lulismo, porém, caiu por terra com a trapalhada do Itamaraty em Honduras.
Como já disse aqui, pouco a pouco a verdade vai se impondo na questão de Honduras, e cada vez mais pessoas se dão conta das mentiras e falsificações da gangue zelayista-chavista-lulista. Até o Senado Federal, em geral uma casa de horrores, parece ter acordado para o que está acontecendo na América Latina, tendo seu Comitê de Defesa e Relações Exteriores recusado a entrada da Venezuela no MERCOSUL, com base na cláusula que garante o compromisso dos países do bloco com a forma democrática de governo. Os bolivarianos brasileiros, é claro, também mentem nesse assunto: alegam que a questão não é o governo de Chávez, mas um país, a Venezuela, cuja entrada no MERCOSUL renderia frutos econômicos à organização etc. etc. Balela. Só quem não tem a mínima idéia do que é o regime chavista, ou quem está mancomunado com ele até o pescoço, pode dizer esse tipo de coisa. Não há separação entre o "país" e o "regime": aceitar a Venezuela no bloco seria avalizar o regime chavista, assim como aceitar a Alemanha de Hitler seria o mesmo que aceitar o nazismo. Chávez já deixou claro, para quem quiser saber, que pretende eternizar-se no governo, e que não pensa em deixá-lo antes do ano de 2021 (!). Será que o MERCOSUL ainda existirá nessa data?
Vejam que os bolivarianos nem escondem mais que Zelaya tentou um golpe em Honduras, e que foi deposto por causa disso. Também nem discutem mais se a Venezuela de hoje é ou não uma ditadura. Agora se agarram ao argumento de que "outros fizeram o mesmo" para justificar a volta de Zelaya ao poder. Com isso, revelam uma notável conformidade entre as políticas externa e interna: se você lembrou, ao ler o que está aí em cima, de um certo presidente que tentou justificar os escândalos de corrupção em seu governo com base na afirmação de que "todos fazem igual", não pensou errado.
É somente a persistência da mitologia esquerdista, ou a ignorância mais absoluta, que explicam o porquê de tanta gente ainda insistir na tese de que houve golpe em Honduras. Se os militares de outras épocas tivessem agido diante de governos populistas e esquerdistas com o mesmo profissionalismo e o mesmo respeito à Constituição com que agiram os militares hondurenhos, a América Latina teria sido poupada de muitos horrores e misérias. Mesmo aqueles, porém, aceitaram sair de cena. O mesmo não pode ser dito dos bolivarianos. Para eles, é o poder total, ou poder nenhum.
É isso que mais preocupa os bolivarianos, o que mais lhes tira o sono: pela primeira vez, um país disse não a suas investidas totalitárias, colocando-se firmemente em defesa da democracia contra um caudilho que tentou violá-la. É esse certamente o "perigoso precedente" de que falou Barack Hussein Obama há algum tempo: o que temem é que se repita em seus países o que ocorreu em Honduras, isto é, que o Congresso e o Judiciário, com o apoio da maioria do povo, saiam em defesa da Lei e os botem para correr. Chávez, Morales, Correia, Ortega etc.: podem colocar as barbas de molho. É isso o que o povo de Honduras está dizendo ao mundo.
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