segunda-feira, maio 31, 2010

O BODE EXPIATÓRIO DO MUNDO - E ALGUMAS PERGUNTAS INCÔMODAS


Lá vou eu, bancar o advogado do diabo de novo... Mas não tem jeito: quem mandou não ser um cara legal, um sujeito certinho, politicamente correto, do tipo que joga para a platéia e só diz coisas boas? Quem mandou insistir em pensar por si mesmo em vez de seguir a manada em uma questão como a do Oriente Médio, onde, como se sabe e é insistementente repetido nos jornais e na TV, Israel é o lado mau e os humanistas do Hamas e do Hezbollah, para não falar do Irã, são o lado angelical, os mocinhos da história, os defensores da humanidade?

A notícia de hoje - e também a de ontem, e a de anteontem... - é mais uma aleivosia cometida pelos perversos e malvados israelenses, esses inimigos de tudo que é bom, puro e belo que existe, e que vivem de agredir os outros, sem qualquer razão. Refiro-me, claro, ao ataque da Marinha israelense a um comboio da "ONG" turca IHH, que levava "ajuda humanitária" à Faixa de Gaza. Segundo informam as agências de notícias, no ataque ao comboio de navios, auto-batizado de "flotilha da liberdade", morreram cerca de dez pessoas, e várias ficaram feridas. Preparem-se para ouvir condenações veementes do "mundo" contra essa ação de Israel. Preparem-se para ver e ouvir presidentes e primeiro-ministros rasgando as vestes e exigindo uma ação enérgica contra esse "ato covarde e desumano" do "regime sionista". Um ataque militar, e com mortos, a uma frota que só queria levar remédios e comida aos palestinos cercados em Gaza! Chocante, não?

A coisa é chocante, sim, mas não tanto pelos mortos e feridos - o que é sempre lamentável -, e sim pela forma oportunista e sem-vergonha como, mais uma vez, os inimigos de Israel, declarados ou não, vão se aproveitar do episódio para deslanchar a mais sórdida propaganda antissemita disfarçada de indignação humanista. Vamos aos fatos: a "ONG" que organizou o comboio alegadamente enviava "ajuda humanitária" à Faixa de Gaza. A Faixa de Gaza é controlada, desde 2006, pelo Hamas. O Hamas é um grupo terrorista financiado pelo Irã e que jurou, nada mais nada menos, destruir Israel e estabelecer, em seu lugar, um califado islâmico. O Hamas utiliza o território da Faixa de Gaza para lançar ataques terroristas a Israel (fato este, geralmente ignorado, que levou à guerra dois anos atrás.) É por isso que Israel - que de lá se retirou, unilateral e incondionalmente, em 2005 - estabeleceu um bloqueio à região. A tal "ONG" turca atacada por Israel tem laços estreitos com o Hamas - seu presidente, Bület Yildirin, é amigão do chefe do grupo, Ismail Hanieh (veja a foto acima - Yildirin é o da esquerda). Fui muito sutil ou preciso ser mais didático?

Nada disso, claro, faz qualquer diferença para a maioria dos governos, assim como para dez em cada dez órgãos de imprensa, que vêem em Israel apenas o lado agressor, jamais um Estado que luta para se defender. De imediato, antes mesmo que se soubesse como e quantos morreram, vários países expressaram sua condenação a Israel. O Brasil, claro, não foi exceção. Acabei de ler a nota que o Itamaraty preparou sobre o assunto. Ela condena a ação israelense, "em termos veementes" (do tipo que a política externa lulista jamais usaria para se referir a Cuba ou ao Irã, por exemplo). Ao mesmo tempo, a nota afirma que uma investigação internacional independente deve ser realizada para averiguar as circunstâncias do incidente. Pois é. Primeiro, condene um dos lados, em termos veementes; depois, peça uma investigação para saber o que aconteceu... A nota aproveita para defender ainda o fim imediato do bloqueio israelense à Faixa de Gaixa, "com vistas a garantir a liberdade de locomoção de seus habitantes e o livre acesso de alimentos, remédios e bens de consumo àquela região." (Nem preciso lembrar: não é dita uma palavra sobre o terrorismo do Hamas.)

A mais recente onda mundial de repúdio a Israel segue o mesmo padrão das anteriores. Ou seja: não importa o que Israel faça ou deixe de fazer, sempre será o culpado. O governo israelense, que também lamentou as mortes (ao contrário de governos como o iraniano, que não costuma lamentar a morte de cidadãos israelenses, como as 85 pessoas que uma bomba colocada por seu serviço secreto fez em pedaços em Buenos Aires em 1994), o governo israelense, eu dizia, afirma que os navios estavam em suas águas terrritoriais, e que seu soldados atiraram porque antes foram atacados. O outro lado diz que a abordagem ocorreu em águas internacionais, e que os ativistas que morreram estavam se defendendo. Quem tem a razão? Faço apenas duas observações: 1) caso seja verdadeira a versão de que o ataque ocorreu em águas internacionais, como os ativistas da tal "ONG" turca fariam para despejar sua "ajuda humanitária" na Faixa de Gaza sem violar o espaço marítimo ou aéreo israelense? e 2) supondo que os mortos estavam defendendo suas próprias vidas, então os israelenses já chegaram abrindo fogo, pelo simples prazer de matar pessoas inocentes e indefesas? Nesse caso, o número de mortos deveria ter sido bem superior a dez, não? Sim, pois os navios levavam, segundo consta, mais de 700 pessoas. Mas adivinhem em quem o "mundo" prefere acreditar numa hora dessas...

Basta ver quem está por trás das palavras mais duras contra Israel nesse episódio para se ter uma idéia do que estou falando. Um que elevou a voz e se declarou "chocado" pela atitude da Marinha israelense foi o governo do Irã. O que disseram os porta-vozes de Teerã? Que o mínimo que os países deveriam fazer seria romper relações com Israel (que eles chamam de "regime sionista"). O Irã é aquela teocracia islamita paparicada pelo governo Lula da Silva e presidida por Mahmoud Amadinejad, que nega o Holocausto, trata a oposição à base do chicote e já declarou para quem quiser ouvir que deseja varrer Israel do mapa (se depender de Lula e de seu colega da Turquia, com armas nucleares). Um regime e um presidente muito humanistas, como se vê.

O que queria a "flotilha da liberdade"? Queria armar uma provocação anti-israelense. E alcançou esse objetivo plenamente. Convenhamos, é um jogo em que não há como perder: qualquer que fosse o resultado, a tal "ONG" sairia ganhando. Se furasse o bloqueio, entregando a tal "ajuda humanitária" ao Hamas, ela mostraria ser capaz de desafiar Israel, que ficaria desmoralizado diante de seus inimigos. Se o comboio fosse, em vez disso, abalroado pelas autoridades israelenses, os ativistas estavam prontos para reagir e produzir "mártires", conseguindo colocar o mundo, mais uma vez, contra Israel. Foi o que aconteceu.

O que deveria fazer Israel? Se não agisse como deve agir um país quando um bloqueio militar é furado - ou seja: com força militar -, colocaria sua segurança em perigo. Se agisse energicamente, como o fez, seria condenado como truculento. Em qualquer situação, seria a Geni da "opinião pública" internacional, o bode expiatório do mundo. Novamente, foi isso também o que aconteceu.

Há somente uma situação em que os israelenses deixariam de ser tidos como vilões e passariam a ser vistos com simpatia pelos que hoje lhe atiram pedras: se deixassem de se defender, permitindo que o os humanistas do Hamas e do Hezbollah continuem a atirar bombas sobre suas cabeças. Quem sabe abdicando de usar a força militar para manter um bloqueio a uma área dominada pelo Hamas, e usada desde 2006 como base de ataques terroristas a seu território, o governo israelense fique, sei lá, bem na fita? Certamente, o mundo deixaria de falar mal de Israel, e o país ganharia os aplausos da opinião pública internacional. Só tem um probleminha: aí já não existiria Israel nem israelenses... Todos já teriam virado pó, como desejou fazer um dia Adolf Hitler em relação aos judeus. E como querem, hoje, Ahmadinejad e o Hamas.

Foi justamente por ter optado por se defender, sem dar bola para o que o "mundo" diria, que Israel conseguiu resistir e sobrevivar por sessenta anos contra todos os que, como Ahmadinejad (que financia o Hamas), juraram varrê-lo do mapa. Foi isso o que garantiu a sua sobrevivência, em primeiro lugar, como descobriram na pele os Estados árabes vizinhos e a Fatah, ex-OLP, em sucessivos conflitos (1948, 1956, 1967, 1973, 1982 etc.), e como bem sabem também os fanáticos do Hamas, Jihad Islâmica e Hezbollah, que contam com o apoio e a cobertura de "ONGs" como a IHH. Mas é claro que você não vai ver ninguém na imprensa lembrar esse fato. O "mundo" já decidiu: a única forma de Israel deixar de ser malhado e tratado como aquilo que seus inimigos são ("racista", "genocida" etc.) é cometendo suicídio. Deixar que uma "ONG" com ligações com o Hamas fure um bloqueio militar para dar apoio ao terrorismo sob o pretexto da "ajuda humanitária" é um bom caminho para atingir esse objetivo.

Agora, para finalizar, seguem algumas perguntas que você certamente NÃO vai ver ninguém fazendo na imprensa esses dias:

- Furar um bloqueio militar, ainda mais para dar "ajuda humanitária" a uma região controlada por um grupo terrorista e genocida, é uma "ação pacífica"?

- Se uma ONG de defesa dos direitos humanos resolvesse organizar um comboio de ajuda humanitária ao povo do Irã, ou de Cuba, ou da Coréia do Norte, o que aconteceria? Quando algum desses governos impedisse a ONG de fazê-lo, o clamor mundial seria o mesmo?

- Por que a "flotilha da liberdade" não tentou furar o bloqueio à Faixa de Gaza pelo lado egípcio?

São apenas perguntas. Tente respondê-las quem tiver mais de dois neurônios.

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P.S.: Segundo diz o noticiário, entre os ativistas da tal "ONG" anti-Israel, estava uma brasileira, Iara Lee, uma cineasta. É o Brasil mostrando, mais uma vez, que, na questão do Oriente Médio, não perde a chance de ficar do lado errado...
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terça-feira, maio 25, 2010

A COMÉDIA IRANIANA DE LULA. OU: UM TEXTO ME DÁ MAIS UM MOTIVO PARA NÃO SER "NENHUMLADISTA"

Como sempre faço quando um assunto me interessa, procuro ler tudo que posso sobre o tema. Isso inclui textos idiotas, panfletários ou de propaganda ideológica, ao lado de análises sérias, escritas com lógica e bom senso. Inclui também aquele tipo de texto em que o autor procura o tempo todo se omitir de dizer a que veio, em nome de uma “isenção” erroneamente identificada com equilíbrio e sabedoria, como se o “meio-termo” fosse sempre a justa medida da verdade para todas as coisas, e não, como geralmente acontece, uma capa para encobrir o medo elementar de fazer escolhas morais.

Um exemplo dessa mentalidade “isentista” ou “nenhumladista” é um texto de um velho conhecido deste blog, o Pablo Capistrano (http://www.diariodenatal.com.br/2010/05/25/opiniao.php). Pablo, aliás, há algumas semanas me expulsou de seu website por causa de uma comparação que eu fiz e que ele não achou legal, envolvendo galináceos. Na ocasião, até escrevi de volta, tentando mostrar que não há qualquer sentido agressivo ou atentatório à honra pessoal mostrar a diferença entre carne, frango e chester (ver meu texto "A arte da tergiversação", neste blog), mas não adiantou: meu texto foi vetado e me vi banido do site. Agora Pablo vem comprovar que aquela minha analogia estava certa, com um artigo que, a começar pelo título (“Nem tanto, nem tão pouco”), apenas reforça minha atitude de fugir da neutralidade quando se trata do governo Lula, especialmente em questões como o recente “acordo” com o Irã.

Pablo começa dizendo que teve o cuidado de deixar passar uma semana e ler e ouvir tudo que pôde sobre o tal “acordo” envolvendo Brasil,Turquia e Irã anunciado com fanfarra no começo da semana, o qual se revelou (mais) um monumental fiasco da diplomacia lulista. Ele diz que não gosta de formar uma opinião apressada e que é fácil exagerar, reduzir, distorcer etc., buscando evitar interpretações simplistas e rudimentares sobre certos fenômenos etc., etc. Atitude louvável, sem dúvida, que também procuro seguir à risca. Principalmente quando quem está na berlinda é algum governo de “direita”, contra o qual se forma um suspeitíssimo consenso, como o de George W. Bush no caso do Iraque, por exemplo. O que leva a pensar: será que um dia teremos uma análise que não seja exagerada, reducionista e distorcida por parte de algum luminar da esquerda a respeito da decisão de Bush de derrubar Saddam Hussein? E quando veremos esse mesmo benefício da dúvida negado a Bush deixar de ser aplicado por analistas “isentos” a regimes tão do gosto das esquerdas, como o dos irmãos Castro em Cuba, por exemplo? Mas estou divagando. Adiante.

Discorrendo sobre interpretações que atenderiam mais a interesses político-partidários do que à busca pela verdade, Pablo tenta pesar na mesma balança os argumentos centrais dos “governistas” e “oposicionistas” na questão do “acordo” com o Irã. Aparentemente, quero crer que por distração, ele parece se esquecer que reduzir questão tão complexa ao que disseram “governistas” e “oposicionistas” no plano doméstico e no contexto de uma (pré)campanha presidencial é uma forma de reducionismo. Trata-se de uma interpretação simplista e rudimentar – exatamente o que Pablo alega ser contra no começo do texto. A mais recente mancada gigantesca do megalonaniquismo lulista vai muito além desse esquema pré-fabricado (e totalmente artificial, diga-se de passagem, haja vista a disputa eleitoral deste ano se resumir a um campeonato entre duas vertentes esquerdistas). A questão não é entre “tucanos” e petistas, entre Serra e Dilma, mas entre o mundo e um louco nuclear que ameaça destruir outro país. Ponto.
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Afirma Pablo: “Nem tanto, nem tão pouco. Há que se reconhecer um mérito do governo Lula nesse caso: o de definitivamente trazer para a agenda da política eleitoral brasileira temas circunscritos apenas aos aficionados em política externa.”

Pois é, ainda há quem veja mérito na egotrip do Aiatolula... Independentemente do fato de que, como já escrevi antes, política externa (infelizmente) nunca deu ou tirou voto no Brasil, o “mérito” do governo Lula apontado por Pablo pode ser resumido assim: Lula e seus cumpinchas do Itamaraty estão expondo o Brasil ao ridículo mundial, mas isso pelo menos faz com que os brasileiros passem a discutir o assunto. Ou seja: a política externa da Era Lula é uma porcaria, mas pelo menos o povo está falando nela... Sobre isso, tenho apenas uma coisa a dizer: Que mérito, cara-pálida? Lula está arrastando o nome do Brasil na lama!

Além do mais, é improvável que o tema da política externa será trazido para a agenda eleitoral. Por um motivo muito simples: os brasileiros estão cantando e andando para o que acontece no mundo! Se se importassem, se dessem à atual política externa a devida atenção, pelo menos a metade da atenção que dão ao futebol ou às fofocas de celebridades, se encheriam de indignação e sairiam às ruas pedindo a cabeça de Lula numa bandeja. Por pura vergonha.

Prossegue Pablo:
“Além do mais, é preciso reconhecer que o governo Lula não inventou a retórica da independência e da crítica da diplomacia brasileira às grandes potências do norte. Desde o tempo de Rui Barbosa o Brasil aqui e acolá cutuca, com seu discurso emergente, os senhores da política mundial.”

E daí que não foi Lula o inventor da retórica antiamericana e terceiro-mundista? Isso só mostra que o antiamericanismo doentio é uma constante em certos setores da diplomacia brasileira. Agora, francamente, ver algum parentesco entre a política externa aloprada de Lula e Rui Barbosa é um pouco demais, não? Gostaria de saber o que a “Águia de Haia” e liberal ferrenho teria a dizer hoje em dia se confrontado com a aliança incondicional de Lula com tipos como Ahmadinejad. Arrisco um palpite: ele estaria se remexendo no túmulo, com certeza! Sem falar que o patrono da diplomacia brasileira, o Barão do Rio Branco, principal articulador da “aliança não-escrita” com Washington, seria descrito hoje pelos que comandam a diplomacia petista como um americanófilo. O que mostra que a política externa lulista é, além de tudo, contrária à tradição diplomática brasileira.

Mais Pablo: “O que o governo Lula fez, e isso é também preciso reconhecer, é tomar uma atitude geopolítica que condiz com o discurso de sublevação dos servos, bem cara à esquerda pós-iluminista. Se os governos anteriores permaneciam no campo da retórica servindo ao jogo de interesses políticos do momento, a dupla Lula-amorim saiu da conversa e fez um movimento geopolítico internacional realmente ousado e independente, projetando o país, para o bem ou para o mal, como um elemento autônomo no jogo das macropotencias mundiais. È preciso reconhecer isso.”
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“Discurso de sublevação dos servos”? Ahmadinejad, os Castro e Chávez certamente assinariam embaixo dessa expressão. O que Lula e companhia fizeram foi atrelar o Brasil ao que de pior existe na humanidade, e isso inclui um regime teocrático, o iraniano, que é em tudo anti-iluminista. Enxergar mérito nessa patacoada é apenas referendar um antiamericanismo rançoso e bolorento, caro às esquerdas e também a uma direita estúpida e reacionária (sim, há reacionários em ambos os lados). O “movimento ousado e independente” da dupla Lula-Amorim custará ao Brasil a respeitabilidade internacional, colocando o País no rol dos países amigos de tiranos e terroristas. E isso conduz não ao protagonismo, mas a seu exato oposto: o isolamento internacional, a diminuição do tamanho do País no concerto das nações. O que já é realidade, como o caso do Irã demonstra cabalmente.
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Diz Pablo: “A jogada da dupla Lula-amorim se deu em quatro movimentos. O Brasil já havia tentado marcar essa posição no caso de Honduras, mas a interferência dos EUA frustrou as intenções tupiniquins. Então Lula acenou para o Armadinejahd quando ocorreram as eleições no Irã ano passado. Em um segundo movimento Lula convidou o presidente do Irã para vir ao Brasil. Depois se meteu em Israel com o discurso da paz (agora ficou bem claro que a intenção de Lula em Israel não tinha nada a ver com causa da paz entre palestinos e israelenses). Por fim visitou o Irã e posou para a foto com o acordo nas mãos.”

1) não foi a “interferência dos EUA” que frustrou as intenções tupiniquins em Honduras: foi a ignorância do que diz a Constituição daquele país, além do alinhamento com o golpismo bolivariano;

2) Lula não somente “acenou para Ahmadinejad” nas eleições do ano passado: ele referendou a fraude, justificando a repressão à oposição iraniana, que comparou a uma torcida frustrada porque o time perdeu um jogo de futebol; o mesmo padrão se repetiu quando do convite à visita indesejada de Ahmadinejad ao Brasil.
Concordo apenas com a parte final do parágrafo.
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Para Pablo, o “lado escroto” do movimento lulista em direção ao Irã está em ter-se aproximado (eu usaria outro verbo) de um regime teocrático, que tende para o totalitarismo. Ele também tem a clareza de pensamento de não aceitar as comparações do Irã com Israel, que tem armas nucleares e não assinou o TNP, pois é inteligente o suficiente para compreender que não se pode colocar no mesmo saco um país que luta para se defender e um regime comandado por um lunático que jurou varrê-lo do mapa, além de negar o Holocausto e oprimir seu próprio povo. Mas ele derrapa ao não perceber que o “lado escroto” da política externa lulista para o Irã se manifesta no próprio “acordo” Brasil-Turquia-Irã, uma simples manobra para que o irá ganhasse tempo e continue a enganar o mundo e enriquecer urânio para seu programa nuclear secreto. Uma escrotice de marca maior, que só perde para a burrice dos lulistas. Qual o mérito do governo Lula em proteger um regime como o de Ahmadinejad?
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No final, Pablo escreve: “O governo brasileiro conseguiu o que queria. Mostrou ao mundo que pode atuar fora do quintal sulamericano e que não é um simples pau mandando dos EUA, pena que tinha que ser ao lado do Armadinejad, pena que tinha que ser ao lado da teocracia dos Aiatolás que fala em nome de Deus para justificar os erros e as misérias políticas dos homens.”

Nem vou entrar na discussão sobre se o governo brasileiro “conseguiu o que queria” (a chinelada que recebeu no dia seguinte ao tal “acordo” do Conselho de Segurança da ONU e a humilhação que se seguiu estão aí para falar por si mesmos.) Vou me concentrar apenas no seguinte: Pablo dá a impressão que o erro de Lula está apenas em ficar ao lado de Ahmadinejad, como se o antiamericanismo recalcado e irracional que pauta atualmente a política externa brasileira fosse uma coisa boa. Não é. É justamente esse antiamericanismo, juntamente com um complexo de inferioridade travestido de complexo de “comigo-ninguém-pode”, que está por trás de todas as inumeráveis derrotas da política externa brasileira nos últimos oito anos, e que levou à enrascada em que o governo Lula se meteu no Oriente Médio.
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Há quem se negue a ter uma posição definida sobre tudo, e prefira se refugiar numa confortável eqüidistância. Há quem ache que a verdade está sempre no meio. Eu não. Entre Lula e a honestidade, ou entre Ahmadinejad e o mundo, eu não escondo de que lado estou.

sexta-feira, maio 21, 2010

QUANDO A VAIDADE SE JUNTA À IGNORÂNCIA


Embalado por uma corte de bajuladores, incensado por uma imprensa embasbacada e por empresários incapazes de enxergar além do próprio bolso, estimulado por altos índices de popularidade em função do que outros fizeram e pelo silêncio cúmplice de uma oposição auto-castrada, Luiz Inácio Lula da Silva achou que estaria marcando um gol de placa ao assinar, juntamente com a Turquia, o acordo nuclear com o Irã de Mahmoud Ahmadinejad, na terça-feira passada. Menos de 24 horas depois, porém, a fanfarra deu lugar à depressão mais profunda: percebendo que o acordo não passava de uma forma de Ahmadinejad ganhar tempo para evitar sanções e prosseguir desafiando o mundo com seu programa nuclear secreto, as cinco potências do Conselho de Segurança da ONU, mais a Alemanha, aprovaram unanimemente novas sanções internacionais ao Irã, tornando o acordo, anunciado com estardalhaço na véspera, letra morta. O "gol de placa" virou uma bola murcha. Pior: um vexaminoso gol contra.

"Tem gente que não sabe fazer política sem inimigos", esbravejou o reformador do mundo, querendo referir-se aos países do Conselho de Segurança, aparentemente se esquecendo de que Mahmoud Ahmadinejad não sabe fazer política sem o inimigo objetivo - Israel, que ele jurou varrer do mapa. "O acordo era o mesmo que tinham proposto antes", lembrou, ignorante do fato de que, justamente por isso, um novo acordo nas mesmas bases com Ahmadinejad, que já descumpriu acordos semelhantes no passado, não acrescenta nada. "Dizem que o Brasil não tinha nada que se meter na questão do Irã; e os EUA, o que tem a ver com a questão?", urrou o especialista em geopolítica e auto-proclamada pomba da paz, investindo contra os alvos de sempre, a "elite" e os EUA, que não o deixariam fazer uma política externa "sem inimigos". Como se os EUA, principal aliado e suporte de Israel, e maior alvo do terrorismo islamita, não tivessem nenhum interesse em neutralizar uma ameaça terrorista representada por um Estado teocrático com armas nucleares...

Lula acreditou, convencido por assessores que só dizem o que ele quer ouvir e pela lista dos mais influentes da Time, que bastaria uns tapinhas nas costas e duas ou três piadas que ele resolveria de uma vez por todas a questão mais complexa do mundo atual. Acreditou nos próprios poderes demiúrgicos para, "olho no olho", convencer Ahmadinejad a deixar de ser Ahmadinejad e cimentar, assim, o caminho para, quem sabe, ganhar o Nobel da Paz ou tornar-se o primeiro secretário-geral monoglota da história da ONU. Infelizmente para ele, a realidade não se ajustou a seus planos. Quebrou a cara, de forma miserável.

O mais novo vexame da política externa lulista demonstra claramente o quão desastrosa pode ser uma diplomacia quando a esta se juntam a pretensão e a ignorância. Lula é considerado por muitos um gênio da política doméstica, onde se beneficia da ausência de oposição real e de décadas de endeusamento, mas não passa de um total ignorante em questões externas. Seu conhecimento dos problemas do Oriente Médio não vai além de uma conversa de botequim com os companheiros do partido. Para ele, resolver conflitos internacionais de décadas ou séculos é como conseguir um acordo entre sindicalistas e empresários da FIESP, ou como costurar uma aliança com o PTB ou o PMDB, na qual ele pode exercer seu charme de ex-metalúrgico e sua habilidade instintiva de conciliador. Em política internacional, ao contrário, isso não basta. Lula jamais se deu ao trabalho de ler um livro e estudar a questão que se propõe resolver, confundindo árabes com persas. O resultado é uma sucessão de trapalhadas, que apenas deixam exposto seu despreparo e o colocam na posição de bobo da corte ou de idiota útil da arena internacional, como escreveu recentemente o New York Times. O que o impele não é a preocupação genuína com a segurança e a paz mundial, mas a ambição pessoal, a pura, simples e infantil vaidade.

Há outros fatores, claro, que só reforçam a trapalhada. A Turquia, como país islâmico, pode ter lá seus motivos para assinar o acordo com o Irã. Entre outros fatores, ambos os países são vizinhos, e partilham uma grande população curda, além de possuírem laços históricos e comerciais que se perdem nas brumas do tempo. Mas e o Brasil? A busca por um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, uma velha obsessão do Itamaraty, ficou, na prática, mais longe depois do acordo de Teerã - os países árabes, cujo apoio Lula corteja para o pleito, desconfiam tradicionalmente do Irã, coisa que Lula também parece ignorar completamente. Sobra a ambição nuclear própria, a megalomania que membros do governo já deixaram clara em algumas declarações contrárias ao Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP), inclusive com a tese, realmente fantástica, da "bomba nuclear para fins pacíficos" (!)... É somente isso que explica, além da soberba e da ignorância, o apoio quase explícito dos lulistas ao programa nuclear iraniano.

"Mas o Brasil assinou o TNP, e a Constituição proíbe o País de ter armas nucleares", poderia lembrar alguém. É verdade. Mas isso não elimina outra grande verdade: esse é o governo presidido por um sujeito que, diante de um obstáculo constitucional à expulsão de um jornalista estrangeiro que havia escrito sobre seus hábitos etílicos, resolveu a questão com um murro na mesa e a seguinte frase: "Foda-se a Constituição!"

A união da pretensão com a ignorância jamais pode dar bons resultados. A política externa petista do Itamaraty é uma prova disso.
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quinta-feira, maio 20, 2010

PIADA PRONTA



Notícia de hoje:

"Governo lança programa de combate ao crack".

Qual o melhor comentário sobre a notícia acima?

a) O índio de araque acima também tem seu próprio programa sobre o assunto. O colar que está usando - e Lula também - está aí para provar.

b) Vocês entenderam errado: é "programa contra o craque" (vide Dunga).

c) "Ô Franklin, esse colar que o Evo Morales deu pra mim usá (sic) tem um cheiro meio esquisito... é boldo?"

d) "Combate ao crack", né? Carlos Minc e as FARC que o digam... .
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P.S.: Não deu para resistir. Eu sabia que um dia eu teria meu momento Kibe Loco...
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quarta-feira, maio 19, 2010

A MAIOR HUMILHAÇÃO DA HISTÓRIA DA DIPLOMACIA BRASILEIRA*


Manchetes de alguns dos principais jornais do mundo nesta quarta-feira, 19 de maio de 2010:

"Grandes potências de acordo em aplicar sanções ao Irã". (New York Times)

"Parceiros dos EUA concordam em sancionar o Irã". (The Washington Post)

"Apesar do pacto com o Brasil, EUA busca sancionar o Irã". (El Clarín - Argentina)

"A despeito da gestão de Lula, avançam as sanções ao Irã". (La Nación - Argentina)

"EUA freia o plano de Erdogan e Lula". (El País - Espanha)

"Washington reúne a China e a Rússia contra o Irã". (Le Figaro - França)

"Clinton ataca acordo Turquia-Brasil com o Irã". (Financial Times - Reino Unido)

"Irã enfrenta novas sanções enquanto Rússia e China apóiam resolução da ONU". (Financial Times)

"EUA ignoram acordo e propõem sanções ao Irã". (O Estado de S. Paulo)

"Hillary atropela acordo de Lula". (O Globo)

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Parabéns Lula!
Parabéns Celso Amorim!
Parabéns Samuel Pinheiro Guimarães!
Parabéns Marco Aurélio Garcia!

O Brasil agora, realmente, é um país a ser levado a sério no mundo!

Finalmente, somos um protagonista das relações internacionais!
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Lula para secretário-geral da ONU!
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Lula para o Nobel da Paz!
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Lula para presidente das Galáxias!
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Para relaxar um pouco, leiam a frase de Marco Aurélio Top Top Garcia, antes de ser divulgada a notícia das sanções internacionais contra o Irã de Mahmoud Ahmadinejad (perguntado sobre o que aconteceria se os EUA aprovassem as sanções ao Irã):

"Eles vão se se dar mal. Vão sofrer uma sanção moral e política".

Desculpem, mas, depois desta, só com risada enlatada mesmo:

KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK..... ;-)


* - Resolvi aproveitar o título de outro texto meu, sobre a patacoada lulista-bolivariana em Honduras. Sabem como é: com esse pessoal, títulos como este jamais são definitivos. Eles, os lulo-petistas, não cansam de se superar.


terça-feira, maio 18, 2010

A PANTOMIMA DO ACORDO NO IRÃ


Esqueçam a chanchada bolivariana em Honduras. Ou a criminalização de dissidentes políticos em Cuba. Ou o apoio explícito ao tiranete Hugo Chávez na Venezuela. Ou ao índio de araque Evo Morales da Bolívia. A maior bola fora da política externa aloprada do governo Luiz Inácio foi dada nessa segunda-feira em Teerã, capital do Irã.

"Lula assina acordo com o Irã", foi a manchete de todos os jornais. E logo a petralhada, toda assanhada, foi cacarejando: "Viram só? Nosso Líder conseguiu um acordo; ele estava certo; os EUA e a ONU, que querem sanções, estão errados!". Só faltaram pintar o Apedeuta como o novo Gandhi. Com o mesmo açodamento com que saíram espalhando que Lula fora eleito pela Time "o mais influente" do mundo - quando foi listado, na verdade, entre muitos outros, e com perfil assinado pelo mentiroso profissional Michael Moore (!) -, tentaram novamente enganar os otários e inocentes úteis.

Pois é. No Brasil, muitos se deixarão enganar, mas no exterior a coisa é um pouco diferente. Lá fora, muita gente já se deu conta da patacoada. O tal acordo assinado por Lula, Ahmadinejad e pelo primeiro-ministro da Turquia, que está sendo vendido como um "importante passo para a paz" e como uma "vitória da diplomacia brasileira", não é nada disso que estão falando os tocadores de tuba do Apedeuta. Tampouco Lula é o cara que trouxe o ramo de oliveira para a região mais conturbada do planeta. Como sempre é o caso em se tratando dos petistas, trata-se exatamente do contrário do que eles dizem..

Um acordo entre Lula e Ahmadinejad é mais ou menos como um acordo entre o PT e o MST, ou entre Vagner Love e os traficantes da Rocinha. Ou seja: não vale a tinta em que foi escrito. Acordo entre semelhantes não é acordo, muito menos "de paz". Haveria acordo, e de paz, se de um lado estivessem os aiatolás iranianos e, de outro, os israelenses. Mas, para isso, é preciso que um dos lados reconheça o outro. Ou que, pelo menos, abdique de transformá-lo em pó. No caso em tela, isso significaria Ahmadinejad renunciar a seu propósito declarado de destruir Israel. Alguém vê essa possibilidade num futuro próximo?

Nem mesmo o Chamberlain tupiniquim, adepto da paz a qualquer preço (mesmo que o preço a pagar seja a própria paz), levaria a sério essa fantasia.

O que diz o acordo celebrado em Teerã? O seguinte: o Irã concorda em exportar 1.200 quilos de urânio para a Turquia, um país amigo. Em um ano, esse urânio voltará ao Irã, enriquecido a 20%, supostamente para fins médicos e científicos. E isso em troca de quê? Da promessa de Ahmadinejad de cumprir o acordo, o mesmo que ele já descumpriu antes com a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA)... Qual a garantia de que ele não repita o mesmo que já fez no passado, e mande a AIEA se danar? A palavra dele, ora!

Em outras palavras: ele, Ahmadinejad, irá manter seu programa nuclear, em troca da promessa - sim, da promessa - de que irá respeitar, de agora em diante, o que não teve qualquer pejo em desrespeitar no passado. É esse o grande "avanço" conquistado em Teerã. É esse o grande "passo para a paz"...

Quem ganhou? É fácil responder. Ganhou Ahmadinejad, que terá mais tempo para enriquecer urânio e continuar a descumprir acordos internacionais, que ele considera tanto quanto considera os direitos humanos ou as regras das eleições em seu próprio país. De agora em diante, ficou mais difícil aprovar as sanções internacionais ao regime iraniano. Ganhou Lula, que conseguiu um palanque para suas ambições megalonanicas de tornar-se um "protagonista mundial". Quem perdeu? O mundo. A paz.

Perde a ONU, os EUA, a União Européia, a Rússia, que agora passarão por "intransigentes" por defenderem sanções contra um regime liderado por um sujeito que desenvolve um programa nuclear secreto e ameaça fazer retornar outro país à Idade da Pedra. Graças à Lula e ao primeiro-ministro da Turquia, o Irã está mais perto da bomba. A paz ficou mais distante.

E Lula nisso tudo? Muita gente se pergunta o que ganha o Apedeuta ao se meter no quiprocó do Oriente Médio. Arrisco um palpite. Lula está se lixando para a região, assim como está se lixando para a democracia em Cuba ou para a ética no Brasil. Para ele, o importante é aparecer. Ele, que é incapaz de diferenciar um iraniano de um árabe, um cavalo de um camelo, considera a questão nuclear iraniana importante apenas porque lhe oferece uma oportunidade de falar mal dos "donos do mundo" e posar de "líder dos pobres". E de encher a própria bola, que não para de ser inflada por um exército de puxa-sacos. Estes o convenceram de que, procedendo assim, estará aberto o caminho para que o Apedeuta receba o Prêmio Nobel da Paz ou a secretaria-geral da ONU. Quem sabe? Houve até quem apostasse que Lula, o filho do Brasil, iria bombar no Oscar (gargalhadas).

O fato de o Irã, um regime teocrático patrocinador do terrorismo, que tem na destruição de outro país uma questão de honra, possuir um dia a bomba atômica é, para Lula, de somenos importância: aliás, é até desejável. Basta lembrar do que disse recentemente seu vice, José Alencar, o inventor da noção de "bomba nuclear para fins pacíficos" (!). Ele, Lula, soma à megalomania um desejo de também possuir a bomba ("Se os EUA têm, por que o Irã não pode ter?", é o raciocínio bucéfalo por trás da tese de "desamarmento global" defendida pelos petistas do Itamaraty). Ele já deu uma dica: "O que quero para o Irã é o mesmo que quero para o Brasil", disse. Para Lula, o mundo estaria mais seguro com um Irã nuclearizado. Isso seria apenas cômico, se não fosse perigoso.

Caso não tenha ficado claro ainda quem ganha e quem perde no tal acordo iraniano, proponho aqui as seguintes perguntas. Tentem respondê-las:

- Ahmadinejad irá renunciar a seu programa atômico? Irá permitir que os inspetores da AIEA o fiscalizem?

- Ahmadinejad renunciou a seu objetivo declarado de "varrer Israel do mapa"?

- Ahmadinejad irá deixar de financiar o terrorismo de grupos como o Hamas e o Hezbollah?

As respostas para as perguntas acima, obviamente, estão ao alcance de qualquer pessoa capaz de somar dois mais dois. O problema é que, nas hostes lulistas, essas pessoas são minoria.

"Mas então, não se deve negociar com o Irã?", pergunta a velhinha de Taubaté. Respondo lembrando alguns fatos esquecidos. A primeira condição para que haja negociação é que os dois lados reconheçam o direito de o outro existir. Somente assim é possível que haja concessões de lado a lado, e que o processo avance. Se um dos lados não aceita a existência do outro, se jurou varrê-lo do mapa, como faz Ahmadinejad em relação a Israel, então não há negociação possível, nem desejável. Qualquer tentativa de negociar, nesse contexto, não passa de uma forma de apaziguar, ou seja, de se render ante quem não deseja a paz. Estes vêem nas negociações apenas uma forma de ganhar tempo e se fortalecer para o próximo golpe. O resultado não é a paz, é a guerra, é o suicídio. Os israelenses sabem disso, e por isso se recusam a negociar com Ahmadinejad, assim como se recusaram a negociar com a OLP de Yasser Arafat enquanto esta não abandonasse o terrorismo e reconhecesse o direito de Israel à existência (foi isso, aliás, o que tornou possivel os acordos de paz de Oslo, de 1993). Foi assim também, diga-se, com TODOS os ex-inimigos de Israel, com os quais este assinou acordos de paz, como o Egito e a Jordânia. Os israelenses sabem que, diante de ditadores inimigos da paz e da humanidade, o apaziguamento é o caminho para a morte. Foi exatamente isso que aconteceu em Munique, em 1938. E é o que Lula - com a cumplicidade da Turquia - está estimulando no Oriente Médio.

Em Teerã, Luiz Inácio conseguiu descer mais um degrau na lista sem fim de iniquidades da política externa mais estapafúrdia da História do Brasil. Agora só falta o Aiatolula conseguir, olho no olho, que o maluco de Teerã pare de executar opositores e encarcerar homossexuais. Ah, mas eu esqueci: não há presos políticos no Irã, apenas torcedores tristes porque seu time perdeu o jogo. Também não há homossexuais, como já disse Ahmadinejad...

No mundo civilizado, Lula já começa a ser visto como o que realmente é: um idiota útil, um amigo de tiranos e terroristas, um bobo da corte do cenário internacional, totalmente ignorante e infantilmente ávido por aplausos. Por estas bandas, porém, onde décadas de endeusamento e camadas de propaganda oficialista impedem uma visão livre de clichês e platitudes, ele continua a ser festejado como o que nunca foi e o que jamais será: um estadista. Pode demorar, mas um dia olharemos para este período com a mais profunda vergonha.

sábado, maio 15, 2010

A COMPARAÇÃO QUE ESTUPROU A VERDADE É UM INSULTO A MANDELA

Por Augusto Nunes
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O presidente Lula precisou de duas frases e uma comparação infamante para afrontar a Justiça Eleitoral, escancarar a própria indigência intelectual e assassinar a verdade: “Uma parte da história da Dilma me lembra muito a do Mandela”, disse no programa ilegal do PT. “Uma vez o Mandela me disse que só foi para o confronto quando não deram outra saída para ele”. O estupro da História foi chancelado pela candidata que mente como quem respira: “Eu lutei, sim. Pela liberdade, pela democracia”.
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A comparação é mais que uma impostura atrevida, é mais que outro estelionato eleitoreiro. É um insulto ao homem que redesenhou o destino da África do Sul. Nelson Mandela lutou pelo fim do apartheid, pela restauração da liberdade e pelo nascimento do regime democrático. Dilma Rousseff serviu a grupos radicais que queriam trocar a ditadura militar pela ditadura comunista. Ele aceitou o confronto depois de propor todas as soluções pacíficas possíveis. Ela aderiu à luta armada em 1967, um ano antes da decretação do AI-5.
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Mandela protagonizou combates reais. Dilma não passou de figurante em assaltos a bancos e cofres particulares. Ele ficou preso 27 anos por liderar a imensa maioria negra. Ela ficou três anos na cadeia por obedecer a extremistas ignorados pelo povo. Mandela venceu. Dilma perdeu. A ditadura militar foi derrotada pela resistência democrática de que jamais participou.
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Mandela chegou ao poder pela vontade popular. Dilma, que nunca disputou nem eleição de síndico, é fruto da vontade de Lula. Ele negociou com os carcereiros brancos a extinção do apartheid. Ela despreza os democratas que negociaram a anistia de que foi beneficiária e declara guerra a todos os oposicionistas. Mandela é um grande orador, um líder vocacional e um político sedutor. Dilma não diz coisa com coisa, faz tudo o que manda o mestre e tem a simpatia de um poste.
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Nelson Mandela é um estadista. Dilma Rousseff é uma farsa.

quarta-feira, maio 12, 2010

ANOS DE CHUMBO: DESMASCARANDO UMA IMPOSTURA HISTÓRICA




O texto a seguir é bem longo. Mas não poderia ser diferente. Conto com a paciência do leitor.

A propósito: desafio qualquer intelectual de esquerda, inclusive o autor do texto que analiso, a provar que o que digo em seguida não é verdade. Está lançado o desafio.


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Tenho o costume – alguns diriam o mau hábito – de ler o que os esquerdistas escrevem. A tarefa é árdua, sei bem, mas pode ser bem instrutiva. Um dos textos que li e que me chamou a atenção nesses dias foi do Professor Vladimir Safatle, do Departamento de Filosofia da USP. O título do artigo é “Do uso da violência contra o Estado ilegal”, e está numa coletânea organizada por Edson Teles e pelo próprio Vladimir Safatle, O que resta da ditadura (São Paulo: Boitempo, 2010, páginas 237-252). Resolvi analisar o texto, pois percebi que muitos dos, digamos, argumentos utilizados pela esquerda brasileira para justificar uma certa visão – infelizmente, bastante difundida – sobre a História brasileira recente encontram-se lá.
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O autor inicia o texto com uma epígrafe retirada do romance 1984, de George Orwell – “Ele expulsou a cena da memória. Era uma lembrança falsa” –, que não poderia ser mais inadequada. A citação de Orwell faz referência à prática costumeira nos regimes totalitários de apagar fatos considerados inconvenientes ao poder. E é exatamente isso que o texto faz, ao criticar o “apagamento da História” pelos militares brasileiros, apenas para apagar, ele mesmo, a parte da História que não convém lembrar à esquerda.
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Já no começo, Safatle usa um exemplo que remete à Lei de Godwin – aquela que diz que, quando se acusa alguém de nazista, é porque já não é mais possível qualquer debate. Ele menciona Auschwitz e os nazistas para condenar aquilo que chama de “desejo de desaparecimento” que estaria presente na Lei de Anistia de 1979, que perdoou ambos os lados dos “anos de chumbo” no Brasil. Ele considera que esse processo de manipulação dos fatos está no cerne “de todo totalitarismo” etc.


À parte o uso equivocado, para dizer o mínimo, do conceito de totalitarismo aplicado à realidade política do regime militar brasileiro – regime que pode ser considerado autoritário, mas não totalitário, como pode constatar facilmente qualquer estudante de Ciência Política ainda não contaminado pelo vírus do marxismo vulgar –, Safatle ignora, em todo o texto, as ações praticadas pela esquerda terrorista no período. Ele nega mesmo essa definição, “terrorismo”, atribuindo-a a uma designação dos militares, e não aos fatos. Os termos “subversivo” e “terrorista”, longe de se referirem a atos concretos, seriam apenas o produto da manipulação semântica daqueles que detêm a soberania (ou seja, o poder). Assim, citando autores como Carl Schmitt, ele considera um uso extensivo e pouco rigoroso do termo em um contexto inacreditável chamar-se, por exemplo, de terroristas os integrantes do MST, ignorando as ações e o culto à violência revolucionária desse movimento pretensamente social, que recebe dinheiro do Estado para invadir e depredar propriedades e intimidar pessoas. .

A idéia central do texto de Safatle é que o Estado surgido após 1964 no Brasil, e que perdurou até 1985, era ilegal e, portanto, a luta contra ele era necessariamente legal e uma forma de resistência democrática. É nesse sentido que ele aborda a questão dos desaparecidos políticos, cujo não-reconhecimento pelo Estado, ou a não punição dos torturadores e assassinos, equivaleria a uma segunda morte: “o Estado deixa de ter qualquer legitimidade quando mata pela segunda vez aqueles que foram mortos fisicamente”, diz ele, esquecendo-se, aparentemente, de que tal processo de assassinato/desaparecimento/esquecimento foi levado às últimas conseqüências nos países socialistas como a ex-URSS e também pelos militantes da luta armada no Brasil.

Após criticar o que seria o pouco rigor conceitual no trato de termos como “terrorista” aplicado aos revolucionários do MST, Safatle não revela qualquer pejo em associar a ditadura militar brasileira ao nazismo, afirmando que “algo de fundamental do projeto nazista e de todo e qualquer totalitarismo alcançou sua realização plena na América do Sul”. Tal associação, se pode ter algum sentido no caso da Argentina, perde completamente a razão de ser no caso brasileiro. Não somente pelo fato – ignorado por Safatle – de que o conceito de totalitarismo (e, por extensão, de nazismo, uma de suas variantes) é inseparável da idéia do Partido-Estado (o regime de 64, ao contrário, extinguiu os partidos políticos), mas sobretudo porque os militares agiram para impedir a transformação do Brasil num Estado totalitário de corte socialista ou soviético. Algo que nem mesmo historiadores marxistas, como Jacob Gorender, ousam negar.

Depois de identificar o regime de 64 com o totalitarismo nazista, Safatle lança suas baterias contra a Lei de Anistia, comparando a situação brasileira ao que aconteceu na Argentina e no Chile, onde os generais foram julgados e condenados. Ele parece se esquecer de que, nesses países, terroristas de esquerda que lutaram contra o regime também tiveram o mesmo destino que os militares. É aqui aonde ele quer chegar: o que ele quer é que somente os crimes de um lado, “da direita”, sejam condenados.

Para ele, “o único país que realizou de maneira bem-sucedida as palavras dos carrascos nazistas foi o Brasil”. E isso porque, no Brasil, houve anistia, que beneficiou igualmente quem torturou e quem pegou em armas contra o regime. Em outras palavras: para Safatle, a anistia, uma conquista da sociedade brasileira, resultado de longa negociação política para viabilizar a redemocratização do País, é uma causa... nazista!

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Rejeitando categoricamente a idéia de que “toda violência se equivale”, Safatle rejeita a tese de que o esquecimento dos “excessos” do passado é o preço a ser pago para garantir a estabilidade democrática. O problema é que os “excessos” que ele não quer que sejam esquecidos são os praticados pelos agentes do regime militar, e somente esses, como se a violência política tivesse vindo de uma única fonte. É como se a luta armada contra o regime militar simplesmente não tivesse existido. O que revela um forte traço de esquecimento de sua própria parte – no caso, dos “excessos” e violências da esquerda armada. Ao se referir unicamente à “amnésia sistemática em relação a crimes de um Estado ilegal”, ele acaba incorrendo na amnésia sistemática em relação aos crimes cometidos pela esquerda armada. Ele é, enfim, um membro do “Partido da Amnésia” que ele critica, apenas com o sinal ideológico invertido.

Ao analisar dois argumentos contraditórios utilizados por alguns defensores do regime militar – “não houve tortura” e “houve tortura e assassinato, mas era uma guerra” – Safatle acaba caindo, ele mesmo, numa série de contradições, resultantes, em parte, de desconhecimento dos fatos históricos. Primeiro, ele agride a verdade quando diz que a idéia de que os militares tomaram o poder de forma preventiva contra um Estado comunista que estava sendo posto em marcha com a complacência de João Goulart é “um claro revisionismo histórico delirante”. (Os próprios comunistas, como o já citado Jacob Gorender, deveriam, portanto, ser acusados de revisionistas históricos delirantes[1].) Em seguida, envereda num debate jurídico com o Supremo Tribunal Federal, que recentemente decidiu pela não revisão (ou não “modificação de interpretação”, como diz Safatle) da Lei de Anistia. Ele se refere à Lei n. 6.683, em que se lê: “Excetuam-se dos benefícios da anistia os que foram condenados pela prática de crimes de terrorismo, assalto, seqüestro e atentado pessoal”, concluindo que, como esses crimes nunca foram objeto de anistia, os militares que os cometeram não podem ser anistiados, sequer na lei que eles mesmos se “autoconcederam” (o que é errado: a Anistia foi negociada com a sociedade). A conclusão é a seguinte: somente os delitos praticados pelos militares e agentes da repressão configuram “terrorismo, assalto, seqüestro e atentado pessoal”. Quanto aos que a esquerda cometeu, nenhuma palavra.

Em sua crítica ao STF, Safatle ataca um dos expoentes da “ala conservadora” do tribunal, que, a fim de justificar que, caso militares fossem julgados, antigos membros da luta armada deveriam ter o mesmo destino (como se não fosse, precisamente, o caso), “chegou ao limite”, afirma ele, de invocar o artigo 5, inciso 44, da Constituição Federal, que diz o seguinte: “Constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis e militares, contra a ordem constitucional e o Estado democrático”. Seu argumento é que o regime de 64 era um Estado ilegal, logo a luta armada contra ele não pode ser colocada no mesmo patamar do terrorismo contra um Estado democrático. Aparentemente, ele tem razão, mas se esquece de um detalhe: a luta armada dos anos 60 e 70 não era uma luta pelo restabelecimento da ordem constitucional e democrática (veremos isso mais adiante). Também esquece que já existia guerrilha no Brasil antes de 1964 (retomarei esse ponto).

Safatle afirma que o Brasil é o único país onde a Anistia serve para acobertar “crimes contra a humanidade, como o terrorismo de Estado [e o terrorismo de esquerda não é terrorismo?], a tortura [militantes de esquerda também torturaram prisioneiros] e a ocultação de cadáveres [idem], o único país onde as Forças Armadas não fizeram um mea-culpa sobre o regime militar [e por que deveriam? os militares deixaram o poder muito bem avaliados pela população em geral; além disso, somente uma parcela ínfima dos militares esteve diretamente envolvida na repressão política], onde os corpos de desaparecidos ainda não foram identificados porque o Exército teima em não dar informações [o Exército está subordinado ao Presidente da República; logo, se informações não são divulgadas sobre onde estão os restos mortais dos desaparecidos – os “arquivos da ditadura” –, isso se deve à incapacidade, ou à má vontade, do governo]”. Isso explica por que ele acha absurdo o STF decidir que, caso a anistia a um lado seja suspensa, o outro lado – os militantes da luta armada – deveriam também ser condenados. É que, para Safatle, terrorismo de esquerda não é terrorismo, e tortura de esquerda não é tortura.

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Não contente em tentar “reinterpretar” a Lei a seu talante, por um critério ideológico, Safatle avança sobre a História. Ao tentar rebater o que até as paredes do STF já sabem – que “os dois lados têm crimes contra a humanidade” –, ele pergunta: “qual o caso de tortura feito por ‘terroristas’?” Eu poderia citar os seqüestros de diplomatas estrangeiros, ou as ameaças a inocentes civis em filas de banco durante “expropriações revolucionárias”, ou o adolescente retalhado pelos guerrilheiros do PCdoB no Araguaia, mas acho que isso não iria fazer diferença para Safatle. Para ele, chamar os seqüestros de crimes contra a humanidade é um “argumento de circunstância”, pois crimes contra a humanidade são aqueles “praticados pelo Estado contra seus cidadãos”. (Segundo esse raciocínio, os assassinatos de judeus poloneses ou bielorrussos por alemães durante a Segunda Guerra não foram crimes contra a humanidade, pois afinal não se tratava de cidadãos alemães assassinados pelo Estado alemão...) Sem falar que sua afirmação de que o seqüestro do embaixador norte-americano no Brasil, Charles B. Elbrick, em 1969, não caracterizou tortura porque, ao ser solto, Elbrick “não procurou um hospital por algum tipo de seqüela”, tendo-se resumido a dizer: “Ser embaixador nem sempre é um mar de rosas”, prova tanto seu ponto de vista quanto afirmar que não houve tortura contra guerrilheiros porque eles, ao serem soltos, também não procuraram um hospital – alguns deles, mesmo, passaram-se para o lado da repressão após terem sido capturados. Isso prova que não houve tortura? (A propósito: não consta que ser guerrilheiro também fosse algum mar de rosas.) .

Safatle não economiza sofismas e meias-verdades para tentar convencer de seu argumento de que somente um lado cometeu crimes e que, portanto, a reciprocidade não vale no caso brasileiro. Após agredir a História do Brasil, ele investe sobre a de outros países. No caso, a França do regime colaboracionista de Vichy (1940-1944). Ele pergunta: “por que o Tribunal de Nuremberg não condenou os resistentes franceses contra o governo de Vichy?” Eu poderia responder: pelo mesmo motivo por que os pilotos de bombardeiros aliados que destruíram as cidades alemãs ou japonesas não foram condenados após a guerra. Mas prefiro essa outra explicação: porque os maquis franceses, ao contrário dos “guerrilheiros” brasileiros, argentinos ou chilenos (assim como as FARC colombianas hoje) não lutaram para implantar uma ditadura comunista na França (embora houvesse comunistas em suas fileiras), mas para libertar o país da ocupação nazista e restaurar, numa frente com outras forças políticas, o regime democrático. (Aliás, vale lembrar: os comunistas franceses só se engajaram na resistência após 1941, quando Hitler invadiu a URSS - até então, eram aliados dos nazistas.) Mas isso para Safatle não tem importância: o que vale para ele é que o princípio jurídico adotado no caso de Vichy consistiu em dizer que “a violência sistemática do Estado contra o cidadão em hipótese alguma equivale à violência do cidadão [sic] contra um Estado ilegal e seus aliados”. Como se 1) a violência do regime de 64 no Brasil tivesse sido “contra o cidadão”, e não contra grupos organizados que se opunham ao regime com armas na mão; e 2) como se a violência terrorista, que visava a derrubar o regime vigente para substituí-lo por uma forma de ditadura socialista, fosse a “do cidadão” contra um “Estado ilegal”. Não foi.

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Como se não bastassem a má utilização dos conceitos e os erros e omissões históricas, Safatle insiste num argumento que só pode ser interpretado como má-fé ideológica: a fim de justificar o terrorismo de esquerda dos anos 60 e 70, ele menciona o “direito de resistência” presente na tradição política liberal, desde John Locke. Trata-se da mais pura impostura intelectual. Ele afirma que “essa [a luta armada dos anos 60/70 no Brasil] é uma batalha que não separa esquerda e liberais, mas que se fundamenta no reconhecimento de uma espécie de campo comum entre as duas posições”. E arremata: “toda ação contra um governo ilegal é uma ação legal”. (grifo dele)

O argumento é falacioso, por duas razões. Primeiro, pela instrumentalização da tradição liberal para justificar uma luta que visava, em última instância, à implantação de um regime totalitário, de perfil socialista ou comunista – o exato oposto do liberalismo. Segundo, porque os terroristas brasileiros não buscaram, em momento algum, formar uma frente única com setores liberais de oposição legal ao regime militar. Pelo contrário: como demonstra Elio Gaspari, a luta armada desprezava o apoio dos setores moderados da oposição, como o MDB de Tancredo Neves e Ulysses Guimarães(2). Isso mostra, por si só, como os objetivos da luta armada e da oposição legal ao regime militar eram diferentes (eu diria mesmo incompatíveis).

Safatle afirma ainda que, “do ponto de vista estritamente jurídico-normativo, o regime militar brasileiro era mais ilegal que o Estado nazista alemão”. Ele tem certa razão nesse ponto: afinal, Hitler foi eleito democraticamente, ao contrário dos militares. Mas isso não muda a essência da questão. Afinal, Fidel Castro também não foi eleito por ninguém, e nesse sentido o regime cubano também é mais ilegal do que o de Hitler. Hugo Chávez, por sua vez, foi eleito democraticamente, e no entanto comanda um regime que caminha gradativamente para tornar-se uma ditadura. Além do mais, desde quando a luta armada no Brasil se orientou por considerações jurídico-normativas?

Safatle afirma uma grande verdade quando diz que “um governo só é legítimo quando se funda sobre a vontade soberana de um povo livre para fazer valer a multiplicidade de interpretações a respeito da própria noção de ‘liberdade’. Um governo marcado por eliminação de partidos, atemorização sistemática de setores organizados da sociedade civil, censura, eleições de fachada marcadas por casuísmos infinitos, além de assassinato e exílio de adversários como política de Estado certamente não cabe neste caso”. Poucas vezes li definição mais precisa do que é e como funciona um regime totalitário, como o nazismo e o comunismo (que a esquerda armada pretendia emular no Brasil – o que demonstra a inexistência de qualquer compromisso democrático por parte dos “guerrilheiros”). Praticamente, Safatle corrobora o que certa vez disse Roberto Campos, refletindo sobre o que ocorreria caso a luta armada fosse vitoriosa no Brasil: “Em vez de anos de chumbo, teríamos rios de sangue”. Provavelmente por isso, ele tem a precaução de ressalvar o seguinte: “diga-se de passagem, isto vale tanto para ditaduras de direita quanto para revoluções populares em estado de degenerescência, regimes totalitários burocráticos ou despotismo oriental travestido de esquerda”. Se você trocar o que está acima por “ditaduras comunistas”, acertará na mosca. Mas Safatle não pode dizer isso: em vez de chamar as coisas pelo nome, ele prefere fórmulas evasivas como "revolucões populares em estado de degenerescência", "regimes totalitários burocráticos" ou "despotismo oriental travestido [sic] de esquerda". Ele faz parte da legião de marxistas acadêmicos que ainda insistem, contra a própria História, que o “ideal socialista” é puro e imaculado; apenas os homens não estão à altura dele...

Insistindo na identificação do direito de resistência do cidadão com a luta armada para implantar o comunismo no Brasil, o que o leva até mesmo a invocar a Declaração de Independência dos EUA (!) para justificar a violência terrorista de esquerda, Safatle escreve: “o direito fundamental de todo cidadão é o direito à rebelião [para acabar com as liberdades e implantar o comunismo?]. Quando o Estado se transforma em Estado ilegal, a resistência por todos os meios é um direito [por todos os meios? assassinato de inocentes, inclusive?]. Neste sentido, eliminar o direito à violência contra uma situação ilegal gerida pelo Estado significa retirar o fundamento substantivo da democracia” [e por acaso os terroristas queriam democracia? qual documento de organização armada de esquerda fala em restaurar as liberdades democráticas? Lamarca e Mariguella, democratas?].

Em uma nota de rodapé, Safatle admite que o caso brasileiro não pode ser colocado no mesmo nível do terrorismo de grupos como Brigadas Vermelhas, Baader-Meinhof, PAC etc., que ensangüentou a Alemanha e a Itália nos anos 70 (e que tiveram no Minimanual do guerrilheiro urbano escrito por Carlos Mariguella sua obra de referência). Seu argumento é que as ações no Brasil foram contra um Estado ilegal, enquanto a Alemanha e a Itália eram países democráticos. Ele está certo nesse último ponto, no qual se distancia da posição oficial do governo brasileiro, via Tarso Genro (caso Cesare Battisti). Mas, como sempre, comete uma meia-verdade, quando nega que os terroristas brasileiros, embora lutassem contra um “Estado ilegal”, desejavam implantar outro Estado ilegal. Sem perder o cacoete esquerdista, ele atribui à tentativa de confundir as duas lutas, a dos terroristas brasileiros e a dos terroristas europeus, a “setores conservadores”. Ele chega a cometer erros factuais crassos, que só podem ser creditados à ignorância em relação à História. É somente isso que explica sua afirmação de que “nenhum grupo armado brasileiro sequestrou aviões, implementou política de atemorização sistemática da população civil ou absurdos do gênero”.

A afirmação é totalmente falsa. Eis os fatos:

- De 1968 a 1972, houve oito seqüestros de aviões comerciais no Brasil por terroristas de esquerda – dois deles, em julho de 1970 e em maio de 1972, terminaram com a morte e/ou prisão dos seqüestradores em operações de resgate das Forças Armadas.

- Quanto à implementação de uma política de atemorização sistemática da população civil, basta folhear o Minimanual de Mariguella para constatar que esse era um objetivo da luta armada de esquerda: mediante ações ousadas, como explosão de bombas, seqüestros e assassinatos, os terroristas visavam a provocar uma reação autoritária do regime, que se abateria sobre toda a população, a qual, então, se colocaria do lado dos “guerrilheiros”. E isso através do clima de caos e de insegurança generalizada que as ações terroristas provocariam.

- Essa política de intimidação pelo terror foi implementada não somente contra a população civil – como no Araguaia, onde os guerrilheiros do PCdoB estabeleceram uma “zona liberada” maoísta, com suas próprias leis (inclusive pena de morte) –, mas contra os próprios militantes da luta armada suspeitos de traição ou que, por qualquer motivo, discordavam dos demais companheiros ou pretendiam abandonar a luta – os chamados “justiçamentos”, que Safatle prudentemente se omite de comentar.

Em um trecho, Safatle quase deixa transparecer o verdadeiro objetivo da luta armada que defende: “não devemos compreender a idéia fundamental deste direito à resistência simplesmente como o núcleo de defesa contra a dissolução dos conjuntos liberais de valores (direito à propriedade, afirmação do individualismo etc.)”. Ou seja: o “direito à resistência” invocado por Safatle, embora beba na fonte da tradição liberal, deve orientar-se para sua superação, isto é: para o socialismo ou o comunismo. Usa-se, assim, o liberalismo para negá-lo. Uma prática recorrente da esquerda, diga-se de passagem.

O mito da luta armada “pela democracia” está presente em trechos como este: “os jovens que entraram na luta armada aplicaram o direito mais elementar: o direito de levantar armas contra um Estado ilegal, fundado por meio da usurpação pura e simples do poder graças a um golpe de Estado e ao uso sistemático da violência estatal. Desconhecer este direito é, este sim, o ato totalitário por excelência”. Como se a finalidade da luta armada não fosse o estabelecimento de outro Estado ilegal, mil vezes mais autocrático do que a ditadura militar... E como se esse Estado sonhado pelos terroristas de esquerda não fosse a quintessência do totalitarismo(3).

Mas o essencial do texto de Safatle, de sua tese da legalidade intrínseca do terror contra um “Estado ilegal”, encontra-se no seguinte parágrafo:

“Neste sentido, não devemos tolerar o argumento de que nos países socialistas também havia terrorismo de Estado e era isto que a luta armada procurava implantar no Brasil. Os nazistas tentaram desqualificar seus oponentes como serviçais da ordem bolchevique. Galtieri, Videla, Contreras também tentaram. No entanto todos eles foram ou estão presos. O que mostra como o Brasil deve ser o único país no mundo [sic] onde este argumento vale. Pois o resto do mundo sabe que aqueles que lutam contra um Estado ilegal são vistos inicialmente como exercendo um direito maior que é o fundamento de toda democracia real: o direito de dizer ‘não’, nem que seja por meio das armas. Não é por outra razão que países como a França tratam comunistas que participaram da resistência, como Jean Cavaillès e Guy Moquet, como heróis nacionais”.

Primeiro: a existência de terrorismo de Estado nos países socialistas, assim como a intenção da luta armada de implantar isso no Brasil, não é um “argumento”: é um fato. Está abundamentemente comprovado por milhares de depoimentos, assim como por dezenas de documentos das organizações clandestinas de esquerda do período, bem como por suas ações.

Segundo: assim como os nazistas, os comunistas tentaram desqualificar seus oponentes – na verdade, ainda o fazem –, chamando-os de "fascistas", e isso não faz qualquer diferença para a questão em pauta.

Terceiro: assim como Galtieri, Videla e outros generais latino-americanos foram presos, terroristas de esquerda na Argentina e no Chile, como os Montoneros e os membros do MIR, também foram encarcerados, o que mostra a validade do princípio da reciprocidade.

Quarto: a que “resto do mundo” o autor se refere? Certamente, não a parte da humanidade que condena o terrorismo, seja que roupagem tiver – sobretudo se vier disfarçado de “resistência democrática” contra um Estado ilegal para instaurar, em lugar deste, o comunismo.

Quinto: É por esse motivo que a resistência francesa é louvada, mas os terroristas de esquerda latino-americanos, não (pelo menos pelos que têm a democracia em alta conta). Os comunistas franceses só são tratados como heróis porque participaram da resistência em frente com outras forças políticas, como os liberais e inclusive conservadores. Se não fosse o anticomunista general De Gaulle, que tomou a frente do movimento de resistência e impediu o Partido Comunista Francês de tomar o poder, a História seria diferente.

Em seguida, Safatle incorre em mais uma desinformação histórica:

“Devemos lembrar aqui de um dado claro e fundamental. Não havia luta armada de esquerda antes do golpe militar de 1964. Não há nenhum caso registrado de grupo guerrilheiro atuante antes do golpe”. (grifo dele)

E mais: “nenhum historiador até hoje indicou o registro de alguma forma qualquer de ação armada antes do golpe militar”.

Não sei por qual livro de História Safatle estudou o período pré-64 no Brasil. Certamente, ele jamais ouviu falar de Jacob Gorender, Daniel Aarão Reis Filho e Denise Rollemberg, além de Elio Gaspari, todos autores que esmiúçam o projeto guerrilheiro da esquerda anterior à tomada do poder pelos militares, como é comprovado pela existência de focos guerrilheiros das Ligas Camponesas de Francisco Julião, anos antes do golpe de 64. Ele provavelmente desconhece os Grupos dos Onze de Leonel Brizola, que tinham em A Guerra de Guerrilhas, pequeno manual subversivo de Che Guevara, sua obra de referência. Desconhece também o fato, amplamente conhecido, de que, já em 1961 – no governo de Jânio Quadros! –, militantes das Ligas Camponesas (organização antecessora do MST) tinham ido treinar guerrilha em Cuba, sob os auspícios de Fidel Castro. Assim como ignora, ou finge ignorar, que a luta armada jamais esteve ausente dos planos e da ação do Partido Comunista, mesmo em seu período semi-legal, como demonstra a eclosão de guerrilhas camponesas na região de Porecatu, no Paraná, na década de 50. Sem falar, obviamente, na quartelada de 1935, a chamada intentona comunista(4). Enfim, ele, Safatle, não sabe nada de História. Ou sabe, e por isso tenta reescrevê-la, como fazia Stálin.
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É o desconhecimento dos fatos relacionados acima, assim como uma boa dose de desonestidade intelectual, o que explica o mito da luta armada como “resistência democrática”, que perpassa todo o texto de Safatle, e é retomado nesse trecho: “a luta armada esteve vinculada primeiramente à recusa legítima ao regime militar, ao caráter insuportável que ele adquiriu para vários setores da população nacional” (grifo dele). Mentira. A luta armada, como vimos, já surge em embrião antes de 1964, nas Ligas Camponesas e nos Grupos de Onze. O projeto guerrilheiro é anterior à ruptura constitucional de 64. As primeiras ações terroristas ocorrem em 1966 (atentado à bomba no aeroporto dos Guararapes, Recife), mais de dois anos antes do fechamento autoritário do AI-5, quando o regime militar ainda mantinha intactas várias liberdades políticas. Mesmo quando a repressão atingiu o auge, em 1969-1974, o conjunto da população nacional esteve muito longe de simpatizar com os guerrilheiros, que sempre estiveram isolados da sociedade (ao contrário, a popularidade do governo era altíssima). O que levou, primeiramente, à luta armada não foi a recusa legítima a um regime discricionário, nem a reação à falta de liberdades, mas a idéia da revolução socialista, presente na esquerda brasileira desde 1922, e que tomou impulso, no começo dos anos 60, após a Revolução Cubana.

Prossegue Safatle: “De toda forma, a multiplicidade política de trajetórias de ex-membros da luta armada (encontramos vários deles em partidos cujo espectro vai do Psol ao PSDB) mostra retrospectivamente como eles eram unidos principalmente pela recusa, e não pela partilha, de um projeto positivo claramente delimitado. Vale a pena insistir nesse ponto: o que unia todos os que entraram na luta armada não era um projeto comum, mas uma recusa comum”. O que o fato de alguns ex-militantes da luta armada terem aderido ao PSDB prova? Nada! Mostra apenas que alguns trocaram a revolução socialista pela social-democracia, enquanto outros (PSOL), nem isso (Aliás, Safatle fala como se o PSDB fosse um partido "de direita"...) Ora, na Alemanha, alguns terroristas do Baader-Meinhof ingressaram, depois, no Partido Verde. Outros, por sua vez, cerraram fileiras com os social-democratas. Isso torna menos terroristas suas ações do passado? A “recusa comum” de que fala Safatle era a recusa da democracia, o projeto socialista. Nada mais que isso.

Safatle cita os casos de pessoas “que absolutamente nada tinham a ver com grupos comunistas”, como Rubens Paiva e Vladimir Herzog, para tentar mostrar que o argumento central dos militares (“era uma guerra”) não tem validade, logo não há por que eles terem sido anistiados. Nesse caso, ele seria obrigado a reconhecer que os crimes da esquerda também não podem ficar impunes, pois afinal esta também assassinou inocentes, muitos deles simples transeuntes, sem qualquer vinculação político-partidária (o que não era o caso de Paiva e Herzog – este último, aliás, militava no Partido Comunista). O fato de haver vítimas inocentes de um lado não elimina a existência de vítimas inocentes de outro. Mais uma vez: ou se punem todos, ou não se pune ninguém.

(Aliás, é bom lembrar: as famílias das vítimas da repressão política no Brasil - e alguns nem tão vítimas assim - já foram regiamente indenizadas pelo Estado. E os que tombaram sob as balas e bombas da esquerda armada, quando receberão o mesmo tratamento de seus algozes?)

Ao final, Safatle faz uma análise meio lírica do governo João Goulart, que ele nega, contra todas as evidências históricas, ter sido um governo que caminhava para alguma forma de golpismo esquerdista, pois ele “demonstraria a viabilidade de uma esquerda, ao mesmo tempo, profundamente transformadora e capaz de assumir processos próprios às democracias parlamentares, modificando seu sentido ‘por dentro’” etc. Como se o estímulo oficial à quebra da disciplina e da hierarquia nas Forças Armadas, sem falar no apoio a um movimento revolucionário no campo, com o avanço de setores descompromissados com as liberdades em diversas áreas, fossem sinais de uma “verdadeira democracia”... Algo, aliás, em que muita gente no governo Lula acredita.
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Textos como o de Vladimir Safatle demonstram que a luta pela memória dos “anos de chumbo” do regime militar ainda não acabou. Pelo contrário, a visão de esquerda, parcial e mistificadora, teima em se impor aos fatos, insistindo na revogação – ou na “reinterpretação”, como queiram – da Lei de Anistia, inclusive apelando para argumentos pseudo-humanitários e pseudo-humanistas.

Não cabe dúvida de que o regime político instalado no Brasil após 1964 era um Estado autoritário baseado na coação e na força. Era, portanto, um Estado ilegal. Também não se discute que a repressão político-militar foi selvagem e empregou sistematicamente a tortura e o assassinato, e que isso é condenável sob qualquer ponto de vista. Mas nada disso elimina o fato de que a luta armada de esquerda contra esse Estado era, ela também, ilegal e contrária aos princípios universais da democracia e da civilização. Seu objetivo, claro está pelos documentos e proclamações das organizações de esquerda atuantes no período, não era o retorno da ordem liberal-democrática anterior ao golpe, nem tampouco a instalação de uma forma de estado de direito constitucional, mas a substituição do regime provisório e excepcional dos generais por outro regime, permanente, de força, provavelmente socialista e certamente autoritário, quando não totalitário, como bem demonstrou Elio Gaspari. Não há qualquer razão para considerar as ações da guerrilha urbana e rural – assassinatos, seqüestros, assaltos a bancos etc. – como formas de luta democrática ou como expressões do direito legítimo à resistência nos moldes liberais, assim como não há qualquer razão em não considerar tais ações como terrorismo, a não ser a ânsia em falsificar a História para preservar antigos mitos políticos.

Nem toda ação contra um Estado ilegal é necessariamente legal. Do contrário, toda ação – explodir prédios cheios de gente e assassinar inocentes, por exemplo – estaria justificada, em nome da luta pela “liberdade”. No caso brasileiro, a luta armada nasceu não da resistência à repressão, ou do endurecimento do regime autoritário, mas de uma opção política feita por setores radicais de esquerda pela revolução violenta e pelo socialismo, opção esta que é anterior à tomada do poder pelos militares. Não reconhecer essa realidade é falsear a História, em nome de uma visão mistificadora com objetivos partidários.

A Lei de Anistia de 1979 perdoou a todos, torturadores e guerrilheiros, tendo surgido de um pacto entre o governo militar, já sem os instrumentos autoritários do AI-5, e a sociedade civil, que começava a reorganizar-se depois de anos de arbítrio. Tratou-se de uma solução negociada, certamente não a ideal, mas a que foi possível alcançar naquelas circunstâncias. O fato de torturadores e assassinos terem sido anistiados não significa que a anistia foi “autoconcedida” pelos militares, visto que os que praticaram crimes de sangue do lado da esquerda também foram agraciados com o benefício do perdão e do esquecimento. Foi isso, bem ou mal, o que permitiu a reconciliação nacional e a redemocratização do País, em última instância.

Isso significa que a redemocratização, no Brasil, foi “extorquida” pelos militares? Não. Novamente: houve um pacto político, um acordo em que ambas as partes concordaram em deixar de lado as feridas do passado e em anular os crimes de cada um. A anistia seria extorquida se tivesse sido unilateral, ou seja, se não tivesse sido concedida também aos opositores do regime. Criada essa situação, porém, qualquer tentativa de rever ou “reinterpretar” a Lei de Anistia para que puna apenas um dos lados só pode ser entendida como revanchismo e levaria, inevitavelmente, a uma situação de anomia jurídica, que teria, certamente, sérias implicações para a ordem democrática. Não há outra solução: ou se mantém a Anistia tal como está, ou ela é revogada e, nesse caso, todos – torturadores e guerrilheiros – devem parar na cadeia.

Todas essas considerações, obviamente, não farão calar o coro dos que, sob a alegação de que tortura é crime contra a humanidade, logo imprescritível, desejam ver a Lei de Anistia revogada ou modificada para punir apenas um dos lados dos “anos de chumbo” – em geral, generais octogenários e nonagenários, já sem nenhuma influência política. Para essas pessoas, o único acerto de contas possível com o passado é o que resulte de uma ruptura revolucionária da ordem política e social - situação em que costuma vigorar não a anistia, mas o paredón. Ruptura esta que foi perseguida pelos que pegaram em armas contra o regime de 64, sob inspiração de regimes políticos em que os opositores jamais tiveram o benefício de qualquer anistia, como o de Cuba. Ao contrário dos militares brasileiros que os combateram, os revolucionários marxistas não conhecem o perdão.

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(1) "Nos primeiros meses de 1964, esboçou-se uma situação pré-revolucionária e o golpe direitista se definiu, por isso mesmo, pelo caráter contra-revolucionário preventivo. A classe dominante e o imperialismo tinham sobradas razões para agir antes que o caldo entornasse." GORENDER, Jacob, Combate nas trevas (5a edição São Paulo: Ática, 1998, p. 73).

(2) "Ao contrário do que sucedeu nas resistências francesa e italiana ao nazismo e mesmo na Revolução Cubana, onde conservadores e anticomunistas se integraram na luta contra a tirania, as organizações armadas brasileiras não tiveram, nem buscaram, adesões fora da esquerda. A sociedade podia não estar interessada em sustentar a ditadura militar, mas interessava-se muito menos pela chegada à ditadura do proletariado ou de qualquer grupo político ou social que se auto-intitulasse sua vanguarda. A natureza intrinsecamente revolucionária das organizações armadas retirou-lhes o apoio, ainda que tênue, do grosso das forças que se opunham ao regime. Eles viam na estrutura da Igreja católica e na militância oposicionista de civis como Tancredo Neves e Ulysses Guimarães um estorvo no caminho da revolução. Eles, por seu lado, viam na luta armada um estorvo para a redemocratização." GASPARI, Elio, A ditadura escancarada (São Paulo: Companhia das Letras, 2002, p. 194).

(3) "A luta armada fracassou porque o objetivo final das organizações que a promoveram era transformar o Brasil numa ditadura, talvez socialista, certamente revolucionária. Seu projeto não passava pelo restabelecimento das liberdades democráticas. Como informou o PCBR: 'Ao lutarmos contra a ditadura devemos colocar como objetivo a conquista de um Governo Popular Revolucionário e não a chamada ´redemocratização´'. Documentos de dez organizações armadas, coletados por Daniel Aarão Reis Filho e Jair Ferreira de Sá, mostram que quatro propunham a substituição da ditadura militar por um 'governo popular revolucionário' (PCdoB, Colina, PCBR e ALN). Outras quatro (Ala Vermelha, PCR, VAR e Polop) usavam sinônimos ou demarcavam etapas para chegar àquilo que, em última instância, seria uma ditadura da vanguarda revolucionária. Variavam nas propostas intermediárias, mas, no final, de seu projeto resultaria um 'Cubão'." Ibid., pp. 193-4.

(4) "Os grupos armados não pretendiam opor, só e fundamentalmente, uma resistência à ditadura. O projeto de guerra de guerrilhas no Brasil era anterior ao golpe de 64; vinha, desde o princípio daquela década, estimulado pelo exemplo da revolução em Cuba. Para não falar nas propostas de revolução armada que vinham de muito antes, na tradição bolchevique, como o levante comunista de 1935, como a linha política do PCB no início dos anos 50 ou, ainda, como os projetos revolucionários comunistas de tendência trotskista." RIDENTI, Marcelo, O fantasma da revolução brasileira (São Paulo: Unesp, 1993, pp. 63-4).

sexta-feira, maio 07, 2010

PT, PARTIDO GOLPISTA E PSICÓTICO


Está no blog de Reinaldo Azevedo, mas se quem lê estas linhas não gosta dele, também está em diversos sites, a começar pelo da Folha de S. Paulo. O PT, partido de Lula e de sua criatura, o boneco de ventríloco Dilma Rousseff, lançou um jornal em que, entre outras coisas, admite seu DNA golpista. O título do texto a seguir diz tudo. Volto em seguida.

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sexta-feira, 7 de maio de 2010 5:33

Escrevo abaixo sobre aquele papo de auto-regulamentação da mídia, um debate que, segundo entendo, tem DNA moral da pior qualidade. Nasce da gritaria petralha. Aliás, “petralha” passaria num conselho, ou a palavra seria considerada manifestação de “preconceito”? E o termo “neoliberal” empregado como xingamento? Liberdade de expressão ou manifestação inequívoca de discriminação? Trato do assunto em outro post. Vamos adiante. A direção nacional do PT editou um jornal chamado “Movimentos”. Quem assina o editorial é o presidente do partido, José Eduardo Dutra.

Lê-se lá, segundo informa na Folha Ranier Bragon:“Os movimentos sociais organizados precisam se manter atentos, pois o ‘ovo da serpente’ está intacto e as mesmas elaborações teóricas, sentimentos de superioridade e defesa de privilégios que animaram os golpistas de 1º de abril de 1964 ainda estão presentes nos corações e mentes da elite”.

E onde estariam os golpistas? A turma de Dutra explica, ainda segundo a Folha:

O texto principal do jornal, de 12 páginas, fala que “os articuladores e reais mentores da ditadura” estão “encastelados em entidades patronais, nos meio de comunicação que a ditadura lhes legou, nos espaços conquistados, graças ao seu servilismo, no Poder Judiciário, no Legislativo e na burocracia dos Executivos”.

“Movimentos” procura ainda associar o pré-candidato tucano José Serra, acreditem, ao ambiente que resultou no golpe de 64. É verdade! Serra era presidente da UNE, foi perseguido e teve de se exilar. Em 1973, teve de fugir do Chile por causa do golpe de Pinochet.

Na página 7, manda ver: “É Dilma ou barbárie”, ecoando, de modo bucéfalo, o “socialismo ou barbárie”, da revolucionária Rosa Luxemburgo. A expressão deu nome a um grupo da esquerda francesa. Como se nota, a palavra “Dilma” está no lugar da palavra “socialismo”. Pode-se entender que ela é o socialismo possível hoje — e a boa notícia, no caso, é que isso dá conta do estado em que se encontra o socialismo…
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Um partido que associa uma das vítimas do golpe de 64 a um ambiente supostamente golpista que haveria no país evidencia que não estamos diante das opções “Dilma ou barbárie”. Nesse caso, sou obrigado a concluir que “Dilma É a barbárie”.

Vamos adiante nos desdobramentos lógicos do jornal petista, assinado pelo presidente do partido. Se o ambiente que temos aí — com liberdade partidária, liberdade de organização, liberdade de expressão, Poderes no pleno gozo de suas prerrogativas e imprensa livre — é golpista, é manifestação prévia da barbárie, então Dilma Rousseff é a opção para acabar com essa bagunça. Os petistas contam com a vitória de sua candidata para pôr um fim a essa zorra. Logo, conclui-se que Dilma está se candidatando a dar um golpe nas instituições, em nome do PT, tão logo isso seja possível.

E vejam lá que o Judiciário também está na mira.

As palavras têm sentido. O PT confessa, com o seu jornal, que a democracia que está aí não lhe serve. Isso faz do PT um partido golpista.

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Voltei
Tachar os adversários - ou os simples críticos - de golpistas enquanto planeja, ela própria, um golpe contra a democracia tem sido uma tática frequente da esquerda psicótica, aqui e alhures. E o PT é useiro e vezeiro nisso. Basta lembrar da conversa mole sobre o tal PIG ("partido da imprensa golpista"), uma invenção do PUM (Partido Unificado dos Mentirosos) para encobrir mensalões e aloprados e, de quebra, tutelar os meios de comunicação. Ou da inversão total da realidade, ao ponto do surrealismo, na questão de Honduras, quando a política externa petista apoiou abertamente um golpista afastado por tentar rasgar a Constituição como se aquele tivesse sido vítima de um... golpe (!).

Nem precisa muito esforço para constatar o tamanho da mentira. Ao mesmo tempo em que chama os outros de golpistas, o PT tenta a todo custo criminalizar a propriedade privada e impor a censura, entre outras preciosidades bolivarianas, no tal Programa Nacional-Socialista dos Direitos Humanos, o PNDH-3. E muitos petistas não escondem seu desapontamento com o fato de Lula não ter conseguido emplacar um terceiro mandato, ao arrepio da Constituição. Lula, aliás, já se queixou publicamente várias vezes do Judiciário - alvo constante dos arreganhos totalitários da petralhada - e não poupa elogios a tiranos como os irmãos Castro em Cuba, já tendo afirmado que na Venezuela "há democracia até demais". Praticamente não passa um dia sem que o governo dos companheiros não invente uma maneira de censurar a imprensa ("controle social da mídia", eles dizem) ou não tente impor uma nova medida atentatória à igualdade de todos perante a Lei ou limitadora da liberdade individual. Entre a militância, já nem há mais pudor em defender abertamente que Lula se torne uma espécie de Fidel Castro, algo que certamente seria de seu agrado. E é essa gente que chama os outros de golpistas! É essa gente que se diz democrata!

Ao forçarem a barra e apresentarem, anacronicamente, a realidade partidária atual como uma espécie de reedição de 64, os petistas cometem um duplo atentado contra a verdade histórica e a lógica: primeiro, mostram tucanos e seus aliados como herdeiros das mesmas forças que tomaram o poder em 64, o que é ridiculamente falso; segundo, tentam se apresentar como os únicos e legítimos defensores da democracia contra quem supostamente quer destrui-la - como se eles, petistas, fossem democratas da gema e o governo de João Goulart, deposto em 1964 por um golpe civil-militar, fosse um primor de democracia. Simplificam e torcem até não mais poder a História, de modo a apresentar seus rivais na própria esquerda - José Serra e o PSDB - como representantes da "elite" e da "direita golpista". E há quem assine embaixo disso!

Trata-se, claro, de um exemplo óbvio de inversão psicótica, uma tentativa evidente de manipulação da realidade. Nesse sentido, proponho um exercício: tente ouvir um petista falar por cinco minutos e conte quantas vezes ele chamou seus adversários políticos de "golpista". Depois inverta, ou melhor, recoloque no devido lugar, o epíteto, devolvendo-o a quem o proferiu. O mesmo vale para todos os outros xingamentos que os esquerdistas adoram atirar em quem não compartilha de suas ideias totalitárias, como "fascista" e "reacionário". O resultado será um retrato perfeito do que são e do que querem os lulistas. Eu garanto: é tiro e queda!
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Os petralhas não perdem a chance de revelar sua natureza antidemocrática e golpista. E o fazem principalmente quando acusam os outros dos mesmos delitos que cometem. Seria somente ridículo, se não houvesse tanta gente que cai, voluntariamente ou não, nessa conversa fiada de stalinistas farofeiros.