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domingo, dezembro 29, 2013

ESQUERDA E DIREITA: UM DEBATE NECESSÁRIO

 
O GloboNews Painel,  programa televisivo comandado por William Waack, promoveu um debate no dia 28 sobre os conceitos de "direita" e "esquerda" no Brasil contemporâneo. Não vi ainda o vídeo do programa, mas, a se julgar pela importância do tema e pelos convidados  - o jornalista Reinaldo Azevedo e os professores Luiz Felipe Pondé e Bolívar Lamounier - acredito ter sido um debate interessante e produtivo, no mais alto nível.
 
Trata-se de um tema por demais pertinente, sobretudo no Brasil, onde vigora a total confusão mental sobre quase tudo, devido a um certo culto da ambiguidade em todos os terrenos - ideológico, político, moral etc. Particularmente, não compartilho da visão confortável de que "esquerda e direita são conceitos ultrapassados", que teriam sido enterrados junto com os escombros  do Muro de Berlim. A meu ver, eles continuam válidos, até porque, ao que parece, o Muro ainda não caiu nas terras de Cabral. (Se alguém tem alguma dúvida, que veja os nomes ou, se tiver tempo, leia os programas de partidos como PT, PSDB, PDT, PCdoB e tutti quanti, ou leia a Constituição de 1988, e conte quantas vezes lá aparecem as palavras "igualdade" e "justiça social", em contraste com termos como "liberdade" e "propriedade privada"...) Nesse aspecto, estamos uns trinta anos atrasados. Daí que um debate desse tipo pode ser uma excelente oportunidade de tentar rever esse atraso e botar os pingos nos "is".  Reinaldo Azevedo, aliás, fez as perguntas certas em seu blog, as quais vou aproveitar para responder, dando assim meus pitacos sobre o assunto.  Creio que muito que foi dito no programa coincide com o que vou dizer aqui.
 
Pergunta: Existem direita e esquerda por aqui?
Minha resposta: Esquerda, certamente existe, e de todos os tipos: centro-esquerda (majoritária), extrema-esquerda, esquerda aguada, esquerda caviar etc. Temos esquerdas e esquerdistas de todos os tipos e para todos os gostos, desde a esquerda mais escancaradamente pragmática (o PT à frente) até os mais porraloucas seguidores de Lênin e Trotsky. O que não há é direita, ou pelo menos uma direita politicamente viável. Há, aqui e ali, um ou outro deputado, um ou outro jornalista (como o próprio Reinaldo Azevedo), um ou outro blogueiro ou professor, que não rezam segundo a cartilha das patrulhas esquerdistas, mas estes são a minoria da minoria, e não estão articulados politicamente (alguns, como o deputado Jair Bolsonaro, são figuras folclóricas, que fazem mais bem do que mal à esquerda, certamente sem saber). O que é, diga-se com todas as letras, uma anomalia, uma verdadeira jabuticaba: o Brasil é o único - repito: o ÚNICO - país democrático sem um partido de direita forte e competitivo. Daí, aliás, não haver praticamente oposição ao lulopetismo.

Pior que isso: não há, no Brasil, uma cultura de direita. E o mais grave: num país em que a população é majoritariamente, esmagadoramente, instintivamente conservadora e de direita, como já escrevi aqui. O que torna ainda mais dramática e necessária a missão de romper a camisa-de-força ideológica imposta ao país por décadas de propaganda sistemática e persistente, que separou o mundo político do mundo real. Não por acaso, a população saiu às ruas em junho passado gritando "eles não nos representam": de fato, nenhum partido representa o pensamento médio do brasileiro. Tanto que, sem lideranças, os protestos não tiveram um Norte definido, perdendo-se no generalismo de slogans "contra-tudo-isso-que-está-aí" e no "por-um-mundo-melhor", facilmente apropriados pela esquerda radical...
 
Pergunta: Por que todos os políticos e partidos se dizem de centro-esquerda?
Minha resposta: Porque vigora no Brasil há décadas a hegemonia cultural e política das ideias de esquerda, via gramscismo. Daí a política, no Brasil, ter-se transformado num sambinha de uma nota só, como o é também o discurso cultural e nas universidades, em que todos repetem, por um automatismo inconsciente, os chavões e slogans marxistas. No Brasil, existem partidos de esquerda e fisiológicos, e só. Não é de surpreender, portanto, que as eleições sejam, há décadas, um concurso de esquerdismo - onde ganha, obviamente, o mais esquerdista. 
 
A hegemonia de esquerda é tão forte que partidos como o PT e seus aliados e derivados de extrema-esquerda se dão ao luxo de criar a própria direita. Na ausência de uma sigla que possa ser considerada como tal, o papel recaiu sobre o PSDB, um partido social-democrata, logo de centro-esquerda por excelência. Houve até um idiota que disse, um dia desses no Roda Viva da TV Cultura que os black blocs, os comuno-anarquistas aliados de legendas como PSOL e PSTU,  são... "de direita"! (a explicação que ele deu: "eles usam máscaras"...). Vigora, enfim, a mais completa demonização, a satanização, da "direita", aliás inexistente no Brasil, algo perigoso para a democracia. Nessas circunstâncias, não é de se estranhar que todos no Brasil sejam de centro-esquerda, algo que não ocorre em nenhum outro lugar no mundo.   
 
(Um parêntese: existe sim, direita no Brasil, mas uma direita burra, politicamente desarticulada - ainda bem. Inclusive, há políticos de direita ou conservadores - no mau sentido da palavra, não no burkeano - entre os partidos aliados do governo, e no próprio PT. Mas não é dessa direita que estou falando: refiro-me a um certo sentimento difuso, que se alimenta, paradoxalmente, do vazio ideológico deixado pela hegemonia esquerdista. Esse sentimento é facilmente constatado nas redes sociais, onde reina a indignação imediatista e exortações demagógicas a favor da pena de morte, por exemplo, são comuns. É uma "direita" formada geralmente de nacionalistas nostálgicos do regime militar ou de devotos religiosos, para os quais a aniquilação de seus inimigos ou o reino dos céus é mais importante do que a defesa da liberdade. Apesar de professarem um anticomunismo retórico, "direitistas" assim se sentiriam à vontade em países como Cuba e Coreia do Norte. Uma direita laica, responsável e democrática - conservadora, enfim - seria o melhor antídoto contra essa "direita" de fancaria. Esta apenas dá munição aos esquerdistas.)  
 
Pergunta: Por que alguns grupos ideológicos reivindicam o monopólio da virtude?
Minha resposta: Porque se consideram, como no caso dos partidos comunistas, entes de razão, donos absolutos da Verdade Revelada e da chave da História. Essa é a essência, aliás, da ideologia marxista, totalmente vitoriosa entre nós (e pior: por W.O...). Em nome desse ideal de uma sociedade perfeita no futuro, tudo, absolutamente tudo - o extermínio de 100 milhões de pessoas, por exemplo - é permitido, e coisas como o Mensalão tornam-se facilmente compreensíveis. Nesse sentido, o PT é um partido fundamentalmente leninista: todos os meios são válidos, aos olhos dos companheiros petistas, para chegar ao poder e nele se manter - o assassinato, de reputações ou de fato (vide o caso Celso Daniel), é apenas um exemplo. Trata-se do herdeiro legítimo de uma tradição revolucionária que remonta à Revolução Francesa, passando pela Revolução bolchevique na Rússia e, mais recentemente, pelo castro-guevarismo e pelo gramscismo, sem jamais reconhecer o valor inerente da democracia.  
 
Além disso, o PT tem uma arma poderosa à sua disposição, que falta às demais agremiações e que o aproxima ainda mais de partidos totalitários: os chamados "movimentos sociais". É sobretudo nessa área que se revela seu caráter gramscista, de partido que faz de tudo para alcançar seus objetivos. Não importa se as causas que professa e suas políticas práticas sejam absolutamente contraditórias: não se espantem se a defesa dos direitos humanos feita por uma Maria do Rosário ou um Luiz Eduardo Greenhalg caminha lado a lado com a devoção fanática a ditaduras totalitárias como a dos Castro em Cuba, ou se a tentativa de criminalizar a "homofobia" anda de mãos dadas com a defesa do regime teocrático do Irã, onde se enforcam homossexuais, ou ainda se a implantação de cotas raciais no serviço público seja uma forma de institucionalizar o racismo, ou se militantes feministas calam-se covardemente ante a incitação ao estupro feita por um professor esquerdista contra uma jornalista - todas essas bandeiras de minorias não passam de instrumentos, de um meio para se chegar ao fim almejado. Não esqueçam: o compromisso do PT e assemelhados é com o poder, e nada mais. Para tanto, não hesitam em manipular as causas mais disparatadas, a fim de minar o "sistema" e semear o caos, valendo-se de idiotas úteis. Antes, eram os camisas negras e a Guarda Vermelha; hoje, são os "movimentos" negro, indígena, feminista, LGBTT etc.
 
Pergunta: O conservadorismo é necessariamente reacionário?
Minha resposta: Absolutamente não. A associação entre conservadorismo e reacionarismo é uma invenção da esquerda, sobretudo da esquerda marxista, que penetrou profundamente nos corações e mentes da população brasileira. O conservadorismo nasce da moderação, da busca por mitigar os horrores trazidos pelos jacobinos na Revolução Francesa, e conservar - daí o nome - princípios universais consagrados anteriormente, dos quais a liberdade é o principal. Não por acaso, sua matriz é anglo-saxônica, tendo como um dos maiores filósofos o britânico Edmund Burke (1729-1797), e fortemente alicerçada nas conquistas institucionais das "revoluções" inglesa (1688) e norte-americana (1776) - revoluções só no nome, pois visaram antes a conservar, e não a transformar, a propriedade privada e a liberdade individual diante da ameaça do Estado absolutista. Na França revolucionária e sobretudo na Rússia, ao contrário, a revolução foi feita para eliminar a propriedade e, com ela, a liberdade do indivíduo, resultando nas piores formas de opressão estatal conhecidas na História da humanidade. Se o critério é a democracia e a liberdade, portanto, reacionários são os socialistas e comunistas, não os conservadores. 
 
(Mais um parêntese: não que não exista uma direita reacionária, como escrevi acima. Mas é a parte da direita que abandonou o conservadorismo, preterindo-o em favor de soluções estatistas e socialistas. Isso mesmo: socialistas. Parece confuso? Então lembrem do criador do fascismo, o ditador italiano Benito Mussolini, que veio das fileiras do Partido Socialista italiano. Não que ele tenha abandonado o socialismo para mergulhar no delírio totalitário - ele apenas lhe deu um outro nome. Mussolini e Hitler consideravam o liberalismo seu maior inimigo, adotando políticas muitas vezes copiadas dos comunistas, a começar pelo controle total da sociedade pelo Partido-Estado. Quando virem um esquerdista chamar alguém de "fascista" - um de seus xingamentos preferidos -, pensem nisso.)
 
Pergunta: Direita liberal e extrema direita se confundem?
Minha resposta: De maneira nenhuma direita liberal e extrema-direita se confundem, pois não se pode confundir liberalismo político e econômico com a sua antítese, o dirigismo estatal, encarnado tanto pela extrema-direita quanto pela extrema-esquerda. Daí os conservadores serem inimigos irreconciliáveis do totalitarismo, seja de direita ou de esquerda, mantendo uma distância não somente política, mas sobretudo filosófica, dos fascistas. O mesmo não pode ser dito da esquerda "moderada", ou centro-esquerda, em relação à extrema esquerda: une-as um laço fundamental, que é a devoção ao Estado, laço este comum também aos extremistas de direita. Por isso é mais provável uma aliança entre a esquerda e a extrema-esquerda (como de fato ocorre, atualmente, no Brasil), ou entre os dois extremos ideológicos, do que entre liberais (ou liberais-conservadores) e a extrema-direita. Aliás, a aliança entre os extremos de cada lado já se realizou historicamente (o pacto "de não-agressão" entre Hitler e Stálin, que foi o catalisador imediato da Segunda Guerra Mundial, em 1939). Uma aliança assim jamais seria possível entre liberais e fascistas.
 
Portanto, só se pode entender a atual hegemonia ideológico-cultural esquerdista no Brasil, e a consequente vilanização da "direita", como o resultado de uma grosseira falsificação da História e das ideias. Falsificação que precisa ser denunciada com todas as forças por qualquer pessoa com um mínimo de honestidade intelectual. Do contrário, o Brasil continuará a ser um país em que a política se resume a petistas e tucanos, dilmas e aécios. Uma quase república soviética, governada por comissários de araque - e sem oposição digna desse nome.

quarta-feira, julho 10, 2013

A DIREITA PERMITIDA


por Olavo de Carvalho                                
          
        
O controle sobre o uso do vocabulário público é um dos instrumentos mais eficientes e mais perversos do arsenal criado pela estratégia de Antonio Gramsci para o estabelecimento da hegemonia – o domínio hipnótico das consciências – e a subseqüente tomada do poder pela esquerda revolucionária.

Quando você ouvir dizer que "Direita e esquerda são noções ultrapassadas", repare bem e notará que em geral a frase vem da boca de algum senhor satisfeito e de unhas polidas, que corresponde esquematicamente àquilo que no imaginário comunista constitui um "burguês". Ela é, com efeito, um lugar-comum da "direita". Pelo menos um esquerdista contumaz diria que o é -- e eu não hesitaria em lhe dar razão, com a ressalva de que aí não se trata da direita em geral, da direita essencial que se encarnou historicamente em Edmund Burke, em Disraeli, em Aléxis de Tocqueville, em T. S. Eliot ou em João Camilo de Oliveira Torres, mas de uma direita muito específica, localizada e até peculiar: a direita brasileira de hoje, constituída inteiramente de senhores satisfeitos e de unhas polidas, cuja única preocupação na vida, além de absorver rios de dinheiro para engordar e dispender rios de dinheiro para emagrecer, é precisamente não se preocupar com nada.
 
Além de poder ser facilmente identificado pela mencionada palavra-de-passe, o membro dessa facção ideológica assinala-se também por autodenominar-se "centro", um termo cuja exatidão se pode aferir matematicamente pela equidistância do seu umbigo a qualquer ponto da majestosa circunferência abdominal que delimita, por assim dizer, a sua substância espiritual.
 
Se, munido desses dois indícios, o leitor ainda tiver alguma dificuldade para distinguir o tipo, há um terceiro critério, que não falha: o componente desse partido notabiliza-se pela absoluta inexistência, no seu ser consciente, de qualquer conflito entre a tranquilidade soberana com que ele nos assegura que o comunismo morreu e a solicitude temerosa com que busca aplacar as exigências do falecido mediante polpudos cheques para projetos educacionais de doutrinação esquerdista, para a campanha do PT, para prêmios culturais dados aos ídolos da esquerda.
 
Visto da esquerda, esse é o direitista ideal, o direitista que os comunistas pediram – ou pediriam, se fossem crentes -- a Deus. Além de alimentar com sua conta bancária os empreendimentos da revolução em marcha e protegê-los sob o manto de invisibilidade das almas do outro mundo, ele ainda consente em oferecer sua própria pessoa como máximo exemplo comprobatório do argumento comunista, desempenhando de bom grado o papel do gorducho fominha, a imagem didática do burguês enfatuado, egoísta e interesseiro, que o doutrinador marxista pode, com a certeza do fácil sucesso oratório, exibir a boquiabertos militantes como protótipo do inimigo odioso e desprezível a ser varrido da face da terra pela revolução salvadora.
 
Outra vantagem indiscutível que a rotunda presença desse personagem na ala direita do palco oferece aos ocupantes da ala contrária é que, uma vez identificado o seu perfil com o da direita enquanto tal, qualquer direitista um pouco diferente dele que se apresente, por exemplo, um direitista honrado, cheio de idéias, que prefira antes defender valores morais do que representar alegremente o papel do palhaço da história, acabará parecendo um tipo estranho, não terá como ser catalogado e facilmente será expelido para o domínio do anormal, do inaceitável, do absurdo. Não havendo nome específico para isso no vocabulário corrente, o jeito será apelar à ampliação quantitativa e carimbá-lo: "Extrema-direita". Hoje em dia, com efeito, basta você dizer qualquer coisa que saia dos lugares-comuns da direita gorda sonsa, basta você fazer qualquer crítica mais séria ao discurso dominante – basta você dizer, por exemplo, que ser "gay" não é tão valioso quanto ser santo --, e pronto: todos respondem que você é o Le Pen em pessoa, se não Benito Mussolini ou Adolf Hitler. Não estou caricaturando: estou descrevendo coisas que se passam todos os dias nos jornais e nas universidades.
 
Eis então a direita reduzida à opção entre fazer o papel de bode expiatório ou ser chamada de fascista, de nazista, de virtual assassina de negros, índios e judeus (embora ela esteja repleta de judeus, negros e descendentes de índios). Como ninguém quer fazer esse papel vexaminoso, todos se apressam em vestir seu uniforme de gorduchos fominhas e a sair repetindo pelas ruas: "Sou de centro! Sou de centro!"
 
Aí a esquerda deixa você existir: o gorducho, afinal, está aí apenas para ser roubado, cuspido e ainda acusado de corrupção. Qualquer direita que não caiba nesse modelo é nazismo.
 
O próprio termo "direita" foi tão criminalizado, que hoje um brasileiro, viajando pela Europa, se surpreende ante a tranqüilidade com que um Paul Johnson, um Roger Scruton se apresentam como direitistas e na platéia ninguém tem chilique, nem os confunde com Le Pen. Sim, na Europa a direita se mostra e não é considerada pornográfica. No Brasil, quando ela aparece, as mães cobrem os olhos de seus filhos.
 
O controle sobre o uso do vocabulário público é um dos instrumentos mais eficientes e mais perversos do arsenal criado pela estratégia de Antonio Gramsci para o estabelecimento da hegemonia – o domínio hipnótico das consciências – e a subseqüente tomada do poder pela esquerda revolucionária.
 
Uma direita inerme e caricatural que não ousa dizer seu nome, uma direita incapaz de escolher seu próprio destino, uma direita condenada a desempenhar os papéis ora ridículos ora odiosos que seus inimigos lhe designaram, é o produto mais típico da hegemonia esquerdista triunfante.
 
Publicado no jornal Zero Hora, de Porto Alegre, em de julho de 2000.

sábado, agosto 11, 2012

A FALSA MEMÓRIA DA DIREITA - UM TEXTO DE OLAVO DE CARVALHO

Como adendo a meu post anterior, reproduzo a seguir texto de Olavo de Carvalho. Trata-se da melhor análise disponível - na realidade, a única, até agora - sobre um fenômeno tipicamente brasileiro: a ausência, no Brasil, de uma direita que valha o nome. Tanto que os "direitistas" brasileiros (se é que existe algum) se resumem a alguns saudosistas do regime militar - a única "direita" que a maioria dos brasileiros conhece ou conheceu um dia.
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O texto confirma aquilo que venho dizendo neste blog há tempos: que o regime militar, apesar de alguns êxitos alcançados (particularmente na área econômica e no combate às guerrilhas), prestou um serviço inestimável à esquerda, ao decapitar toda uma geração de políticos de direita que fizeram o movimento de 64, substituindo o pensamento conservador pela tecnocracia e abrindo o caminho, assim, para a hegemonia cultural e ideológica da esquerda.  Os militares acabaram com partidos como a UDN de Carlos Lacerda, queimando as pontes que os uniam à sociedade civil, em nome de uma visão antipolítica e autoritária herdada do positivismo. O resultado foi um imenso vazio, logo preenchido pela esquerda. Estamos hoje colhendo os frutos desse erro histórico gigantesco.  
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É por essa razão que propostas como a da refundação da ARENA, o partido de sustentação política do regime militar, é um tiro na água. Pior: é um tiro no próprio pé. Se o objetivo é romper com o monopólio ideológico esquerdista e construir uma verdadeira alternativa conservadora de direita, o primeiro passo é se livrar do legado histórico do regime dos generais - e não reivindicá-lo, como querem alguns generais aposentados. É algo que deveria ser óbvio, mas em um país sem memória - ou melhor, com falsa memória, como diz o prof. Olavo -, afirmar o óbvio é a maior das heresias. (GB)  

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A FALSA MEMÓRIA DA DIREITA
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por Olavo de Carvalho

O positivismo nada tem de conservador: é, com o marxismo, uma das duas alas principais do movimento revolucionário.

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Dizem que o Brasil é um país sem memória, mas isso não é verdade: o Brasil é um país com falsa memória. Esquecer o passado é uma coisa, reinventá-lo conforme as ilusões do dia é bem outra. É desta doença que a memória do Brasil padece, e ela é bem mais grave que a amnésia pura e simples.
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Não, não estou falando da manipulação esquerdista do passado. Ela existe, mas é apenas um aspecto parcial da patologia geral a que me refiro. Esta infecta pessoas de todas as orientações ideológicas possíveis e algumas sem orientação ideológica nenhuma. Ela é um simples resultado da ojeriza nacional à busca do conhecimento, portanto à reflexão madura sobre o que quer que seja.
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Querem um exemplo de falsa visão do passado que não foi produzida por nenhum esquerdista? O País está cheio de almas conservadoras e cristãs que ainda idealizam o regime militar, como se ele fosse uma utopia retroativa, a encarnação extinta das suas esperanças.
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É verdade que os militares não roubavam, que eles fizeram o Brasil crescer à base de quinze por cento ao ano, que eles construíram praticamente todas as obras de infra-estrutura em que a economia nacional se apoia até hoje, que eles acabaram com as guerrilhas, que no tempo deles a criminalidade era ínfima e que os índices de aprovação do governo permaneceram bem altos pelo menos até a metade da gestão Figueiredo. Que tudo isso são méritos, ninguém com alguma idoneidade pode negar.
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Mas também é verdade que, tendo subido ao poder com a ajuda de uma rede enorme de instituições, partidos e grupos conservadores e religiosos, a primeira coisa que eles fizeram foi desmanchar essa rede, cortar as cabeças dos principais líderes políticos conservadores e privar-se de qualquer suporte ideológico na sociedade civil.
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Fizeram isso porque não eram conservadores de maneira alguma; eram indivíduos formados na tradição positivista – forte nos meios militares até hoje – que abomina o livre movimento das ideias na sociedade e acredita que o melhor governo possível é uma ditadura tecnocrática.
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Pois foi uma ditadura de militares e tecnocratas iluminados o que impuseram ao País por vinte anos, rebaixando a política à rotina servil de carimbar sem discussão os decretos governamentais. Suas mais altas realizações foram triunfos típicos de uma tecnocracia, seus crimes e fracassos o efeito incontornável do desejo de tudo controlar, de tudo reduzir a um problema tecnoburocrático, em que o debate político é reduzido a miudezas administrativas e a iniciativa espontânea da sociedade não conta para nada.
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O positivismo nada tem de conservador: é, com o marxismo, uma das duas alas principais do movimento revolucionário. Compartilha com a sua irmã inimiga a crença de que cabe à elite governante remoldar a sociedade de alto a baixo, falando em nome do povo para que o povo não possa falar em seu próprio nome.
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Tal foi a inspiração que acabou por predominar nos governos militares. Que dessem ao movimento de 1964 o nome de "Revolução" não foi mera coincidência, nem usurpação publicitária de um símbolo esquerdista, mas um sinal de que, por baixo da meta de derrubar um governo corrupto e devolver rapidamente o País à normalidade, tinham planos de longo prazo, ignorados da massa que os aplaudia e até de alguns dos líderes civis de cuja popularidade se serviram para depois jogá-los fora com a maior sem-cerimônia.
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Todas as organizações civis conservadoras e de direita que criaram a "Marcha da Família com Deus pela Liberdade", a maior manifestação popular da história brasileira até então, foram depois extintas, marginalizadas ou reduzidas a um papel decorativo.
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Como bons tecnocratas, os militares acreditavam piamente que podiam governar sem sustentação cultural e ideológica na sociedade civil, substituindo-a com vantagem pela pura propaganda oficial. Esta, por sua vez, era esvaziada de toda substância ideológica, reduzida ao triunfalismo econômico e à luta contra o "crime".
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Gramsci, no túmulo, se revirava, mas de satisfação: que mimo mais delicioso se poderia oferecer aos próceres da "revolução cultural" do que um governo de direita que abdicava de concorrer com eles no campo cujo domínio eles mais ambicionavam? Naqueles anos, e não por coincidência, o monopólio do debate ideológico foi transferido à esquerda, que ao mesmo tempo ia dominando a mídia, as universidades, o movimento editorial e todas as instituições de cultura, sob os olhos complacentes de um governo que se gabava de ser "pragmático" e "superior a ideologias".
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A esquerda, quando caiu do cavalo, em 1964, teve ao menos o mérito de se entregar a um longo processo de autocrítica e até de mea culpa, de onde emergiu a dupla e concorrente estratégia das guerrilhas e do gramscismo, calculada para usar os guerrilheiros como bois-de-piranha e abrir caminho para a "esquerda pacífica", na qual o governo militar não viu periculosidade alguma – até que ela, por sua vez, o derrubou do cavalo com o escândalo do Riocentro e a enxurrada de protestos que se lhe seguiu.
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Aqueles que, na "direita", ou no que resta dela, se apegam ao regime militar como um símbolo aglutinador, em vez de examinar criticamente os erros que o levaram ao fracasso, estão produzindo um falso passado. Não o fazem por esperteza, como a esquerda, mas por ingenuidade legítima, com base na qual a única coisa que se pode construir é um futuro ilusório.


quarta-feira, julho 18, 2012

ELES SÃO O FUTURO? ENTÃO VIVA O PASSADO!


Outro dia vi um vídeo no youtube que me deixou intrigado. Nele, um jovem economista, defensor entusiasmado da escola liberal (ou "neoliberal", como gostam de dizer os esquerdistas, por ignorância ou má-fé), investia pesado contra um adversário ideológico. Em tom indignado, às vezes embolando as sílabas, o discípulo de Von Mises e de Hayek atacava com veemência um "filósofo-astrólogo", representante de uma direita "medieval" e "reacionária". Ele, o rapaz do vídeo, era o legítimo representante da direita, não o filósofo enganador, “teórico da conspiração” etc.

Pesquisei na internet, e vi vários vídeos e textos de teor semelhante, tanto por parte do economista liberal quanto do filósofo em questão. E reforcei minha quase certeza de que o que falta no Brasil é mesmo uma direita filosoficamente sólida e consequente.

A quizília parece ser antiga, e teria começado por causa de algumas mensagens no Orkut. Francamente, esse tipo de disputa não me interessa. Parece mais uma briga de egos, em que adjetivos injuriosos – não raro, com referências à vida pessoal de cada um – toma o lugar de argumentos. Já li que brigaram até mesmo por um pronome oblíquo.

Tão vazio e sem sentido quanto o arranco-rabo em si é a dicotomia que se quer estabelecer entre uma direita "medieval" e "reacionária" versus uma direita "moderna", "liberal" etc. Sobretudo se os pomos da discórdia forem, como são, questões como aborto, casamento gay e descriminalização das drogas. Onde está escrito que para ser “de direita” ou “liberal” é preciso defender esse tipo de coisa? Pode-se ser contra tudo isso com argumentos políticos e filosóficos, inclusive religiosos, perfeitamente legítimos. E, ainda que o crítico seja um membro da Opus Dei ou um saudoso das Cruzadas, como se poderia almejar, em sã consciência, um "retorno" ao passado? Como disse certa vez o filósofo acusado pelo economista de reacionarismo e medievalismo, isso não é ideologia: é espiritismo.

Não acredito que deva existir uma só direita, aliás não acho que exista somente uma (é curioso como se costuma falar "as esquerdas", no plural, mas quase nunca "as direitas"). Acredito, porém, que se deve ser coerente. Muitos que se dizem de direita hoje em dia são burguesinhos mais interessados na redução de impostos e em balancetes de lucros do que em democracia. São liberais, até ultra-liberais, mas não são conservadores. Pior: vêem mesmo contradição entre uma coisa e outra. Têm verdadeiro horror ao epíteto: para eles, "conservador" é pior do que ser de esquerda. Defendem com ardor o livre mercado e a propriedade privada, leram todo Adam Smith e John Stuart Mill, mas não dizem nada sobre Edmund Burke e G.K. Chesterton. Desde que a economia esteja nos trilhos, e os negócios estejam indo bem, não se importam que o governo seja formado por um bando de tarados e psicopatas. Esquecem que o conservadorismo é o verdadeiro esteio da democracia e que o contrário desta é revolução - seja violenta, seja mediante a guerra cultural gramsciana, que a esquerda está ganhando de goleada.

Esse tipo de "direita", francamente, me diz muito pouco. Do mesmo modo que desconfio de quem proclama as virtudes do liberalismo econômico mas vê na China comunista um modelo, aprendi a desconfiar de quem se diz "progressista" mas não tem uma palavra a dizer sobre o enforcamento de homossexuais e o apedrejamento de mulheres no Irã. A esquerda bem-pensante e politicamente correta está cheia desse tipo de vigarista, que adora acusar a Igreja Católica de reacionarismo, mas não vê nada errado nos países islâmicos. Quem é reacionário? Quem é medievalista?

Se há algo que distingue direita e esquerda, hoje em dia, não é a economia, mas princípios. E princípios, diga-se, morais e religiosos. No caso em questão, são os valores da civilização ocidental e, sim, cristã (em tempo: sou ateu, mas nem por isso deixo de reconhecer a importância desses valores para a democracia). É a defesa desses princípios universais que distingue a direita – pelo menos a direita com que me identifico – do que se convencionou chamar de esquerda. Por exemplo: roubar é errado. Matar, sobretudo se tiverem sido 100 milhões de pessoas, também. A vida humana e a liberdade individual, para mim, são sagradas. Assim como honestidade na política. Isso é "medievalismo"?

Em um país hegemonizado há décadas por um esquerdismo de botequim, onde o comunismo é levado a sério e “conservador” e “direitista” são palavrões, a existência de intelectuais que se reivindicam de direita – "medieval" ou não - é uma boa notícia. Seria uma pena que a vaidade e briguinhas pessoais tomassem o lugar de argumentos.

Certa vez, o escritor Nelson Rodrigues – um famoso "reacionário" –, indagado por um jornalista sobre suas idéias conservadoras, respondeu da seguinte forma, referindo-se aos comunistas: "se eles são o futuro, então eu sou o passado, sou a Idade Média!". As mesmas palavras podem ser repetidas hoje em dia. O futuro da humanidade é o "progressismo" preconizado por gayzistas, abortistas, maconhistas e outros do mesmo naipe? Muito prazer, eu sou o passado.

sexta-feira, março 09, 2012

UM POEMA PARA OS TEMPOS ATUAIS

Primeiro eles vieram atrás dos liberais.
Atacaram-nos de todas as formas, buscaram desacreditá-los,
Até que “liberal” virou uma palavra feia.
E eu não protestei, porque não era liberal;
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Depois, eles vieram pelos conservadores.
Trataram de satanizá-los, de estigmatizá-los, 
Até que que não sobrou nenhum deles.
E eu não disse nada, porque não era conservador;
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Mais tarde, eles vieram atrás dos católicos e dos evangélicos.
Cobriram-lhes de calúnias, ridicularizam-nos,
Tacharam-nos de reacionários, atrasados, homofóbicos…
E eu me calei, porque não era católico, nem evangélico;
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Então foi a vez de todos os que insistiam em pensar de forma diferente.
E eu permaneci em silêncio, porque não me interesso por política;
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Finalmente, vieram me buscar.
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E já não havia ninguém para protestar.

domingo, janeiro 27, 2008

ANTONIO GRAMSCI, OU COMO FAZER AMIGOS E INFLUENCIAR PESSOAS


"Quem controla a mente humana, controla a realidade" (George Orwell, 1984)


O ex-primeiro-ministro da antiga Alemanha Ocidental, Konrad Adenauer, certa vez disse uma frase que, em sua aparente simplicidade, resume tudo. Era mais ou menos assim: "É uma pena que a inteligência humana seja limitada, enquanto a estupidez não conhece limites".

Fico pensando nessa frase, que li há muito tempo, toda vez que tento debater sobre o cenário político atual latino-americano, em especial sobre a esquerda, no Brasil e no mundo, e alguém me vem com argumentos do tipo: o conjunto da esquerda brasileira já abandonou por completo a idéia de revolução socialista; com exceção de alguns grupelhos radicalóides, a esquerda nacional já se acomodou perfeitamente à democracia e ao capitalismo; todo esse papo sobre revolução continental e Foro de São Paulo não passa de simples paranóia e delírio de um punhado de reacionários e saudosistas dos tempos da Guerra Fria etc etc.

Esse tipo de wishful thinking, que se tornou um verdadeiro mantra após a queda do Muro de Berlim e o fim da URSS, não resiste ao menor sopro de crítica. Ignoro se meus interlocutores já ouviram falar em Gramsci - desconfio que não -, mas o fato é que os argumentos mostrados acima apenas parecem reproduzir, sem tirar nem pôr, as idéias principais gramscianas.
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O italiano Antonio Gramsci (1891-1937), um dos maiores teóricos marxistas do século XX - alguns o consideram o maior ideólogo comunista depois de Lênin -, foi o fundador do Partido Comunista Italiano, até poucos anos atrás o maior do Ocidente. Autêntico amarelão ideológico, no dizer de Reinaldo Azevedo, Gramsci é uma espécie de Dale Carnegie das esquerdas. Em seus escritos, ele tratou de adaptar o pensamento marxista à época da comunicação de massa, defendendo que a tomada do poder pelos comunistas poderia ocorrer não necessariamente por meio da insurreição armada, tal como ocorrera na Rússia em 1917, nem mesmo pela simples via legal e eleitoral, mas por um processo de conquista gradativa das instituições, particularmente da superestrutura intelectual e espiritual da sociedade. Em outras palavras, os revolucionários comunistas, segundo Gramsci, deveriam concentrar seus esforços não exclusivamente na luta política direta pelo poder do Estado, mas, principalmente, na conquista de espaços e na busca pelo controle, a partir de dentro, da mídia, das artes, das ciências - enfim, da vida intelectual e cultural em geral. A dissimulação é parte importante nesse processo: em vez de palavras de ordem por um governo socialista, por exemplo, deveriam ser usadas expressões como "governo democrático e popular", ou "em defesa da paz", ou, ainda, "inclusão social", ainda que os objetivos dos marxistas sejam exatamente o inverso. Palavras como "comunismo" e "revolução" estariam, assim, proibidas - o importante era construí-las na prática cotidiana, através da propaganda. Nada, portanto, de sair por aí defendendo, em alto e bom som, a derrubada imediata da burguesia e a tomada do poder pela classe operária. A propaganda é sempre mais eficaz quando não parece propaganda.
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Desse modo, além de disfarçar os reais propósitos dos revolucionários, o método gramsciano visa a criar as bases para a revolução sem falar em revolução, para o estabelecimento do comunismo sem precisar falar abertamente em comunismo, e todo aquele que ouse denunciar esse esquema solerte de solapamento da democracia é imediatamente tachado de reacionário ou paranóico. A esse processo, levado adiante pelos "intelectuais orgânicos" do proletariado - o partido -, Gramsci chamou de conquista da hegemonia. Um esquema quase perfeito, brilhante em sua sonsice sem limites.
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Como fica claro pelas idéias de Gramsci, o verdadeiro campo de batalha em que as esquerdas tratam de construir seu poder hoje em dia não são as instituições do Estado, como o Parlamento e as eleições. É a mente humana. Não se toma o poder apenas pela força, mas pela persuasão, pelo convencimento. É pelo controle mental, pela repetição incessante de slogans e chavões, que se pode alcançar o tão sonhado controle da realidade. Isso demanda um trabalho longo e prolongado de infiltração e doutrinação ideológicas, que ocorre de forma lenta, solerte, anestésica, quase imperceptível, nos principais setores da superestrutura. Esse trabalho pode durar anos, ou mesmo décadas. O objetivo é que, no decorrer desse processo, os objetivos do partido revolucionário - o príncipe moderno, na definição de Gramsci, que a retirou de Maquiavel - venham a constituir-se, nas palavras do próprio Gramsci, "em um imperativo moral, um substituto do imperativo divino".

Recentemente, reli 1984, de George Orwell, um de meus livros preferidos. A certa altura do romance, O'Brien começa a explicar a Winston qual a finalidade da tortura que lhe estava sendo aplicada em nome do Ingsoc, o Partido. Não se tratava de simplesmente forçar o prisioneiro, pela dor e pelo medo, a confessar-se herege ou autor de crimes imaginários, como na Inquisição medieval ou na ditadura stalinista soviética. O objetivo, explica O'Brien, era fazer o prisioneiro acreditar que era efetivamente culpado de um crime monstruoso (a "crimidéia", ou crime do pensamento), a fim de aceitar o poder do Ingsoc. Era, enfim, fazê-lo amar o Grande Irmão. Isso porque - conclui O'Brien - o controle sobre a mente humana, a ponto de fazê-la acreditar que dois mais dois são cinco, é o fundamento mesmo do poder do Partido.

Não sei se Orwell conhecia os escritos de Gramsci. Mas, ao narrar de forma tão contundente os mecanismos de dominação totalitária, descreveu à perfeição a maneira como a ideologia esquerdista, marxista e totalitária, vem penetrando há pelo menos oito décadas as mentes das pessoas no Ocidente, conforme o esquema preconizado por Gramsci. Tal esquema de condicionamento mental quase pavloviano já avançou tão profundamente sobre as consciências dos indivíduos que a maioria esmagadora da população é mantida na mais completa ignorância de sua existência, embora ele possa ser facilmente percebido em todos os lugares: nas escolas, no cinema, no teatro, na literatura, nas igrejas, nos sindicatos etc. Eis um exemplo que julgo bastante didático: você, que lê essas linhas, conhece algum professor universitário ou artista de renome, ou qualquer outro "formador de opinião" no Brasil, que se diga abertamente de direita e a favor do capitalismo? Por outro lado, quantos você conhece que enchem a boca e estufam o peito para proclamar, aos quatro ventos, suas convicções esquerdistas, ou, pelo menos, simpáticas às teses de esquerda?

Quando à estupidez humana se soma a capacidade ilimitada dos herdeiros de Marx e Lênin de mudarem de cara e de roupa para enganarem os incautos, convencendo-os de que seus propósitos não são antidemocráticos, o resultado é meio caminho andado para o estabelecimento de um Estado totalitário. No Brasil, esse processo encontra-se em estágio bastante avançado, como demonstra a hegemonia (no sentido gramsciano do termo) do discurso "politicamente correto" em questões tão díspares como racismo, homofobia e meio ambiente, a ponto de ser necessário, para revertê-la, proceder a uma verdadeira reprogramação neurolingüística. O silêncio obsequioso da quase totalidade da imprensa brasileira a respeito da cumplicidade do governo Lula da Silva em relação aos narcoterroristas das FARC e ao Foro de São Paulo, assim como a elevação de figuras como Oscar Niemeyer e Luiz Fernando Veríssimo à condição de faróis intelectuais da nacionalidade, são apenas a ponta de um gigantesco iceberg. Há pelo menos trinta anos, já estamos todos dominados, inconscientemente, pela retórica esquerdista. Assim como o personagem principal de 1984, aprendemos todo dia que dois mais dois são cinco.