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terça-feira, abril 02, 2013

COMO CRIAR UM "MOVIMENTO". OU: PEQUENO MANUAL DO LIBERTICIDA MODERNO

- Politize a vida privada - Esqueça o discurso manjado de "revolução socialista", pelo menos em público. Isso está totalmente out. O verdadeiro militante do século XXI está antenado com as novas causas da moda. Nada de "proletariado", "burguesia", "comunismo" etc, essas palavras abstratas e cafonas, que não convencem mais ninguém e que somente afastam as pessoas. Em vez disso, use e abuse de conceitos como "raça", "gênero" e "opção sexual", dividindo a sociedade não mais em classes sociais, mas em tribos. Troque “revolução” por cotas para "afro-descendentes" nas universidades e "socialismo" por “casamento gay“ (ou "união homoafetiva", para não assustar). Se alguém lhe lembrar que cotas por raça são uma forma de racismo, algo estranhíssimo num país de mestiços, e que preferências privadas não podem ser fontes de direitos, finja que não ouviu.
 
- Apresente-se como uma "minoria perseguida" - Espalhe aos quatro ventos que você faz parte de um grupo historicamente marginalizado e oprimido, cujos direitos são sistematicamente negados por uma sociedade má e injusta. Vá mais além, e, com base na teoria da suposta superioridade moral do oprimido, apresente sua grei como formada por pessoas maravilhosas, supermodernas (ou edenicamente pré-industriais, como os índios), mais evoluídas, mais sensíveis e até mais inteligentes do que os demais seres humanos. Para reforçar essa impressão, se você for um militante gayzista, associe a defesa do casamento gay à luta contra o racismo ou pelos direitos das mulheres. Não dê bola se alguém lembrar que alguns dos personagens mais pervertidos e sinistros da História, como vários imperadores romanos e os membros das SA nazistas, eram homossexuais. Tampouco se importe com o fato de que mulheres eram impedidas de votar e trabalhar, e que a luta dos negros nos EUA e na África do Sul era motivada por leis de segregação racial, algo que jamais existiu no Brasil, onde gays gozam dos mesmos direitos dos héteros. Mantenha a pose e mude de assunto.
 
- Falsifique estatísticas – Para dar um ar "científico" à sua causa, é imprescindível amparar-se em dados e estatísticas, ainda que estas digam exatamente o contrário do que você está afirmando. Por exemplo, para justificar as cotas raciais nas universidades, cite aquela pesquisa que ninguém leu segundo a qual 52% da população brasileira é "negra". Aprenda com os desarmamentistas do Viva Rio, fazendo o mesmo com os números da violência, que apontaram o assassinato de um número X de homossexuais no Brasil no ano passado (não esqueça de usar palavras como "genocídio" e "holocausto" para se referir a essas mortes). Ninguém vai se dar ao trabalho de investigar os critérios adotados, segundo os quais todos os que não se declararam "brancos" (pardos, índios, mulatos, cafuzos, japoneses etc.) foram considerados automaticamente "negros". Tampouco vai procurar saber que uns 70% dos 200 ou 250 "mortos por homofobia" (num país com 50 mil assassinatos todos os anos…) foram assassinados por motivos passionais (brigas de casais, o programa que não deu certo etc.), ou seja, homossexuais matando homossexuais. Lembre-se: você é sempre vítima e o Brasil é um país extremamente racista e homofóbico, ainda que os fatos não o demonstrem.
 
- Distorça o sentido da palavra "igualdade" – Santificado com a auréola de eterna vítima oprimida, mostre-se como um paladino da luta por "direitos iguais", ainda que os direitos fundamentais (o direito à vida, à propriedade, à liberdade de expressão, de reunião, de voto etc.) já lhe sejam plenamente assegurados pela Lei, que é cega para diferenças individuais (como "raça" e "opção sexual"). Afirme que as leis existentes não bastam para inibir os crimes contra homossexuais (não esqueça de brandir as estatísticas acima) e que é preciso instituir uma lei especial criminalizando a "homofobia". Ignore que "homofobia" é um conceito extremamente vago, assim como o fato de que tal lei seria uma forma de criar direitos especiais, sacralizando a divisão da sociedade em categorias de cidadãos com mais e menos direitos (ou seja: o inverso da igualdade). Vá adiante e diga que um direito básico seu, por exemplo o de casar com uma pessoa do mesmo sexo, está sendo violado. Se alguém lembrar o óbvio e disser que o casamento está longe de ser um direito ilimitado (algo que, aliás, não existe); que um direito não pode se fundar em preferências sexuais, que podem mudar (ao contrário do sexo, que ninguém escolhe ao nascer); e que até o momento a natureza não descobriu nenhuma maneira de garantir a reprodução da espécie humana que não seja a partir da união sexual entre um homem e uma mulher, tache quem diz isso de "homofóbico" e outros adjetivos. Passe ao próximo estágio.


- Estigmatize quem pensa diferente – Quando deparar com alguém com idéias minimamente discordantes das suas, não perca tempo debatendo: chame-o logo de "racista", "homofóbico", "reacionário", "hater" e outros adjetivos ultrajantes. No limite, apele para a Lei de Godwin e tasque-lhe um "fascista" ou mesmo "nazista". Use e abuse desse recurso retórico, sem dar importância a se tais adjetivos correspondem ou não à verdade. O importante é criar um clima de paranóia, no qual todos ficarão inibidos em falar o que pensam e passarão cada vez mais a se autocensurarem para não serem malhados pelas patrulhas do "politicamente correto". Imponha um novo vocabulário, com o apoio de grande parte da imprensa e dos artistas da Televisão. Faça de conta que não sabe que, se a atração pelo mesmo sexo é um direito, também o é a repulsa por essa opção, e que portanto ninguém deve ser obrigado a ter as mesmas opiniões sobre este ou qualquer outro assunto. Não hesite em mirar abaixo da linha da cintura quando necessário, por exemplo chamando de "negro traidor" um juiz do STF que se negou a repetir os slogans do "movimento" e lançando dúvidas sobre a sexualidade daquele pastor acusado de "homofobia" (somente os militantes negros e gays podem ser racistas e homofóbicos). Diante das objeções de cunho religioso ao casamento gay ou ao aborto, por exemplo, arvore-se em teólogo, impondo uma reinterpretação dos textos sagrados, ditando o que padres e pastores devem dizer a respeito. Não dê a mínima se lhe lembrarem que a liberdade religiosa é um direito sagrado (sem trocadilho) do cidadão, sem a qual não há democracia. Tampouco se importe com o fato de que impedir alguém de expressar sua fé é instituir o delito de opinião, e que isso só existe em ditaduras. Aliás, é justamente por isso que você está lutando.
 
Pronto. Agora você só precisa encontrar gente desonesta ou tola o suficiente para montar um "movimento" a fim de impor sua agenda política. Pode começar tentando expulsar da presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados um parlamentar que não é da turma, baseado em alguma besteira que ele disse no Twitter alguns anos atrás. Se preciso na marra. Acima de tudo, jamais se esqueça que você pertence a um grupo ou raça superior, que os fins justificam os meios e que todos os que discordam de você são vermes que merecem ser esmagados. Se alguém disser que isso lembra certo regime politico do passado, não perca a pose de libertário, seguindo à risca o conselho do principal propagandista desse regime: “uma mentira dita cem vezes torna-se verdade”. A tática funciona.

sexta-feira, junho 15, 2012

A MARCHA DOS INTOLERANTES (OU: COMO DESTRUIR A LIBERDADE EM NOME DA... LIBERDADE)

Chegaremos a isto?

Faz tempo que não falo sobre este assunto. Mas os inimigos da razão e da liberdade não descansam. Vamos lá.

No último domingo, realizou-se em São Paulo a tal "parada do orgulho gay". Desta vez, o evento, que é considerado o maior do gênero no mundo, sofreu uma enxugada: em vez dos alardeados 4 milhões de participantes, cerca de 270 mil (dados oficiais) compareceram à Avenida Paulista. É que neste ano os militantes GLBTT (ainda é assim que se chama?) não contaram, para seu desfile de plumas e lantejoulas, com o mesmo financiamento público (!) de edições anteriores, em que pulularam por lá muitos artistas e políticos. Um deles, Fernando Haddad, candidato do PT/Lula à prefeitura de São Paulo - aquele do kit gay nas escolas, lembram? -, preferiu não dar as caras, para não dar bandeira.

Mas não é bem sobre isso que quero falar. Já tratei da impostura gritante que é a tese vigarista de que o Brasil é um pais "homofóbico" com a autodeclarada maior parada gay do mundo. Já desmascarei, inclusive com números, a lorota  estatística que apresenta o país como um campo de extermínio de gays, lésbicas e travestis. O que me leva a escrever este texto é uma frase que ouvi no noticiário.

Foi no Fantástico, da Rede Globo. "Manifestantes defendem aprovação de lei que irá criminalizar a violência contra homossexuais", dizia o locutor do soporífero programa domingueiro. Dito assim, parece que não tem nada de mais. Afinal, quem poderia ser contra uma lei que tem por objetivo punir agressões físicas a um grupo de pessoas? Ninguém em seu perfeito juízo, claro. Mas aí é que está o "x" da questão...  

Quem ouviu a notícia sem prestar a devida atenção - ou seja: a maioria dos espectadores do Fantástico - certamente não percebeu a pegadinha. Nada contra uma lei que criminalize a violência contra homossexuais. Se não fosse por um pequeno detalhe: tal lei, meus senhores, já existe. 
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Basta folhear o Código Penal. Quem agredir alguém, seja por que motivo for, será preso e estará sujeito a processo criminal. O delegado ou o juiz do caso não irá perguntar ao criminoso ou à vítima se o ataque ocorreu por causa da opção sexual ou do gosto de quem quer que seja. Não importa se o agredido (ou o agressor) for gay, hétero, bissexual ou torcedor do Cabofriense. Importa é que agredir uma pessoa é crime. Aliás, não é por outro motivo que a Justiça é representada com uma venda nos olhos: ela é cega para essas coisas. A lei vale para todos, sem distinção. Ponto. 

Mas, se uma lei assim já existe, de que estava falando, então, a Rede Globo? Do Projeto de Lei Complementar (PLC) 122, que tramita no Congresso brasileiro desde 2006. O que pretende o PLC 122? Criminalizar não a violência, que já é criminalizada e punida judicialmente, mas - atenção! - qualquer ato que possa ser considerado uma manifestação de ou uma incitação à "homofobia". O que seria isso? Ninguém sabe ao certo. Duvido que quem ler o texto do PLC em questão consiga me dar uma resposta objetiva. Pode ser o sermão de um padre ou de um pastor evangélico, ou uma citação da Bíblia. Pode ser mesmo uma piada de bar. Em outras palavras, caso tal PLC vire lei um dia, teremos instaurado o delito de opinião - algo que só existe em ditaduras. Não é por acaso que tal projeto de lei já foi batizado de "Lei da Mordaça Gay" (o que realmente é).

Um outro fato, ocorrido há algumas semanas, também é bastante ilustrativo do rumo que as coisas estão tomando no Brasil. Um clipe musical, em que um pagodeiro aparece cantando ao lado de mulheres seminuas e de alguns figurantes fantasiados de macaco, foi considerado, por causa das fantasias e das mulheres, "racista" e "sexista" pelos patrulheiros de plantão, guardiães do politicamente correto. 
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Isso mesmo. Um clipe. Racista. Porque nele há gente fantasiada de macaco. E sexista. Porque nele há mulheres. Racista e sexista. Preconceituoso. Discriminatório. Do mal. Pois é...
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Ah, tem um detalhe: o cantor é... negro. (Ou afro-descendente, como queiram.)
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Para muitos esse último detalhe foi o mais espantoso, o mais ridículo e surrealista. A mim não surpreendeu muito, pelo seguinte motivo: a última coisa que querem as ONGs gayzistas e racialistas, que estão por trás dessa onda de censura, é defender os direitos das minorias que dizem representar. Na realidade, atrevo-me a dizer que elas são as maiores vítimas desse tipo de militância. Se não, respondam-me:

Que patrão irá contratar um negro, ou um gay, sabendo que, se lhe der uma bronca por um trabalho mal feito, poderá ser processado por racismo ou homofobia? Se for inteligente e quiser evitar confusões, provavelmente não o fará, contratando somente loiros de olhos azuis, comprovadamente heterossexuais.

Do mesmo modo, que professor de universidade se atreverá a dar uma nota baixa a um aluno que passou no vestibular pelo sistema de cotas raciais, sabendo que poderá ser acusado de racismo por causa disso? E como ficará esse aluno diante de outros não-cotistas, que se sentirão obviamente prejudicados? Como esse aluno será enxergado por seus colegas que estudaram tanto ou mais que ele mas que, por causa das cotas, não tiveram acesso ao mesmo curso e à mesma faculdade? Não se sentirão, aliás com toda razão, vítimas de discriminação e de preconceito?

Não se trata de conjecturas, não se trata de um mero exercício de imaginação. Isso já está acontecendo. Graças ao sistema de cotas raciais nas universidades, considerado constitucional pelo STF, o Brasil é hoje, oficialmente, um país racista. Se depender de aberrações como o PLC 122, será também em breve um país "homofóbico", no qual até anedotas do Costinha serão proibidas.

Esse tipo de coisa passa facilmente despercebido devido a um hábil trabalho de propaganda, que conseguiu deixar quase todos cegos para o fato de que, por trás de slogans aparentemente libertários e igualitários, o que vem, de contrabando, é exatamente o oposto dessas palavras de ordem. Assim, ativistas gayzistas falam em igualdade, quando querem, na verdade, privilégios. Do mesmo modo, militantes negros apresentam-se como os campeões da luta contra a discriminação racial, quando o que estão fazendo, na realidade, é implementar a discriminação racial com a chancela estatal. No cerne de tudo não está a liberdade ou a igualdade, mas o seu contrário, ou seja, o cerceamento da liberdade e o fim da igualdade. E quem se opuser a isso é imediatamente tachado de reacionário, homofóbico, racista, porco direitista e outros epítetos. A tática funciona. 
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É claro que os militantes das ONGs GLBTT ou do "movimento negro" não pensam no que está aí em cima. Estão se lixando para "direitos iguais" e coisas do tipo. O importante, para esse pessoal, é impor sua agenda política, nada mais do que isso. Tampouco pensaram um segundo no que vai acima os juízes do STF que, no último mês, decidiram enterrar por unanimidade o artigo 5 da Constituição Federal, abolindo a igualdade de todos perante a lei, sacrificada no altar do ativismo judicial.
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Dane-se a Constituição, decretaram os magistrados da Corte Suprema. E que se danem os gays ou os negros, pensam os militantes do politicamente correto, para os quais estes não são mais do que massa de manobra, idiotas úteis para suas intenções liberticidas. Vale tudo em nome da "causa". Até dividir a sociedade em tribos. Graças aos que se dizem defensores da tolerância, o Brasil está virando um pais cada vez mais intolerante. E cada vez mais burro.

quinta-feira, maio 17, 2012

UM PAÍS FORA DA LEI


Major do exército alemão Edward Ernest Otto Westernhagen, assassinado a tiros no Rio de Janeiro em 1/07/1968 por membros do grupo terrorista COLINA - Comandos de Libertação Nacional (do qual Dilma Rousseff fez parte).  Se depender de alguns membros da "comissão da verdade", esse crime não deve ser investigado...

É, meus amigos, o Brasil está vivendo uma época realmente muito estranha.
Em menos de duas semanas, dois graves atentados contra a Constituição e a democracia, e parece que ninguém está dando a mínima.

Primeiro, o atentado consumado: os ministros do STF, por unanimidade, decidem abolir, simples assim, o Artigo 5 da Constituição de 1988, declarando nula a igualdade de todos perante a lei.  Para o deleite das ONGs racialistas, consideraram constitucional o sistema de cotas raciais nas universidades.

Depois, o atentado que se está delineando no horizonte: pelo menos três dos sete membros da "comissão da verdade" criada pelo governo para apurar violações dos direitos humanos cometidos no Brasil de 1946 a 1988 dão declarações em que insistem na tese oca de que a comissão vai apurar somente os crimes praticados por um lado apenas, os serviços de repressão política da ditadura militar (insinuando, inclusive, uma provável revisão da Lei de Anistia). Com isso, dão a entender que, ou não leram o texto da lei que criou a comissão, ou a desprezam e querem, na verdade, revanche.

Na cerimônia que deu posse aos membros da tal comissão, Dilma Rousseff chorou. Será que foi por alguma das 120 vítimas fatais dos grupos da esquerda armada no Brasil durante os anos 60 e 70? Desconfio que não. Afinal, Dilma foi uma que militou nesses grupos. Mas os mortos pelos terroristas de esquerda não merecem uma lágrima? Ou esse privilégio só é válido para os que exibirem o devido pedigree ideológico?

Ah, na cerimônia também não faltaram as declarações de praxe enaltecendo os "guerrilheiros" mortos, esses mártires da democracia. Só faltou dizer qual seria o documento-base dessa democracia pela qual lutaram: seria o programa da VAR-Palmares ou da Ação Libertadora Nacional?

Ou seja: em um caso, a igualdade foi jogada no lixo em nome da "raça"; no outro, é a propria verdade histórica, sem falar na lei, que está sendo vilipendiada. E o pior de tudo: tais absurdos estão sendo cometidos em nome da "igualdade" e do "direito à memória e à verdade"... Deve ser piada!

Depois dessa dose pra elefante, só mesmo lembrando as palavras de um jurista brasileiro do começo do século passado, leitura certamente não muito popular nos corredores do poder nesses dias:

Quando as leis cessam de proteger os nossos adversários, virtualmente cessam de proteger-nos. Porque a característica da lei está no amparar a fraqueza contra a força, a minoria contra a maioria, o direito contra o interesse, o princípio contra a ocasião. A lei desapareceu, logo que dela dispõe a ocasião, o interesse, a maioria, ou a força. Mas, se há, sobre todos, um regímen, onde a lei não pode ser vicissitudinária, onde nenhuma conveniência pode abrir-lhe exceção à estabilidade, à impersonalidade, à imparcialidade, é o republicano. A república é a lei em ação. Fora da lei, pois, a república está morta.

Quando as facções pretendem suspender a lei por amor das instituições republicanas, o seu sentimento é trocar as instituições republicanas em puro domínio das facções.*

Assinado: Rui Barbosa

(*“A lei”, in O Divórcio, As bases da Fé e Outros Textos, São Paulo, Martin Claret, 2008, pp. 133-4.)

segunda-feira, maio 14, 2012

UM TEXTO MARGINAL - POR DEMETRIO MAGNOLI

É isso. O STF, ao decidir pela legalidade do sistema de cotas raciais, aboliu, na prática, a Constituição. Simples assim.

Estou exagerando? Então leiam o texto a seguir, de Demétrio Magnoli. Sublinhei as partes mais interessantes para que não reste dúvida.

Como eu disse em outro texto: lembra daquele princípio de que todos são iguais perante a lei? Pois é. Pode esquecer.

É o Brasil, rumo à ditadura racialista… (GB)
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10 de maio de 2012


Demétrio Magnoli

"Basta ver o caráter marginal daqueles que se opõem ferozmente a essas políticas...". A frase, escandida pelo ministro Joaquim Barbosa num aparte casual, contém a chave para a compreensão da decisão unânime do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre as políticas raciais. Os juízes da Corte Maior não se preocuparam com a Constituição, mas unicamente com o lugar ocupado pelos defensores e pelos opositores das cotas raciais na cena política nacional. Eles disseram "sim" ao poder, definindo seu próprio lugar no grande esquema das coisas.

Cortes Supremas servem para interpretar o texto constitucional, nos inúmeros casos em que a letra da Lei não oferece resposta explícita. No artigo 5.º, a Constituição afirma que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza". No artigo 19, que "é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si". No artigo 208, que "o dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um". A letra da Lei é explícita, cristalina: dispensa interpretação. O STF, simulando interpretá-la, reuniu-se em assembleia constituinte e revogou o princípio da igualdade perante a lei. Os juízes encarregados de zelar pela Constituição qualificaram-na como um texto marginal.

O princípio da igualdade perante a lei está formulado nas Constituições americana e indiana em termos similares aos da nossa. Nos EUA, desde 1978 a Corte Suprema proferiu decisões cada vez mais contrárias às políticas de preferências raciais. Na Índia, logo após a independência, a Corte Suprema vetou tais políticas - e então o Congresso emendou o texto constitucional, descaracterizando o princípio da igualdade dos cidadãos. Por que, em contraste flagrante, os juízes do STF preferiram reescrever a Constituição de forma a inscrever a raça na lei?

No Brasil, a igualdade legal dos cidadãos é um "princípio fraco", introduzido nas Constituições por imitação. O "princípio forte" sempre foi o das relações pessoais, fundamento real dos intercâmbios das elites econômica, política e intelectual. Na lógica do Direito, o princípio da igualdade funciona como fonte dos direitos e garantias individuais. Tal conexão explica a importância atribuída ao "princípio fraco" na Constituição de 1988: o gesto político e jurídico de ruptura com o ciclo da ditadura militar era a promessa de um novo início, isento das máculas do passado. O STF está dizendo que aquele gesto representou um desvio de percurso - e já se esgotou. De certo modo, os juízes têm razão: bem antes da sessão de julgamento das cotas raciais, as principais correntes políticas do País imolaram o princípio da igualdade no altar de seus compromissos com as ONGs racialistas, que são minorias organizadas e influentes.

O conceito de preferências raciais adquiriu estatuto oficial no governo Fernando Henrique Cardoso, por meio do Programa Nacional de Direitos Humanos de 1996. No governo Lula a noção genérica de "discriminação positiva" desdobrou-se na política de cotas raciais. Dilma Rousseff prometeu, no início de sua campanha presidencial, expandir os programas de cotas para a pós-graduação. José Serra, candidato da oposição, manteve silêncio absoluto sobre as políticas de raça, avalizando tacitamente a orientação do governo Lula. A cooperação objetiva entre os grandes partidos rivais e a continuidade histórica das iniciativas racialistas na transição de um governo para o outro formam o pano de fundo da decisão unânime do STF. Eis a razão por que Joaquim Barbosa, como seus colegas, enxerga na Constituição um texto "marginal".

O estandarte da igualdade legal dos cidadãos condensa a narrativa de uma sociedade contratual formada por indivíduos livres das amarras do sangue e da tradição. A narrativa é a praça histórica comum aos liberais e aos socialistas. Os primeiros ergueram o princípio da igualdade no combate aos privilégios de sangue do Antigo Regime. Os segundos enxergaram nele a ferramenta das lutas pelo voto universal e pela liberdade de associação e de greve. No Brasil, contudo, essa história quase nada significa para os partidos que representam as duas correntes. O STF que aboliu o princípio da igualdade é a Corte Maior de um país onde José Sarney foi declarado um personagem acima da lei, Fernando Collor pontifica numa CPI sobre a corrupção e Sérgio Cabral protagoniza cenas dignas do Antigo Regime no palco apropriado da Cidade Luz.

Na sessão de julgamento do STF, o relator, Ricardo Lewandowski, alvejou sem rodeios o artigo 5.º da Constituição, atribuindo ao princípio da igualdade um sentido meramente "formal". O mesmo relator comandou, em 2009, a rejeição do pedido de instauração de processo contra o ex-ministro Antônio Palocci por violação do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa. Meses depois, a Caixa Econômica Federal informou em juízo que a violação decorreu de ordem emitida por Palocci. O escárnio do "princípio fraco", da igualdade legal, serve sempre ao desígnio de instaurar o império do "princípio forte", das relações pessoais.

O juiz Marco Aurélio Mello exprimiu a aspiração de generalização das políticas de cotas, como querem as ONGs racialistas. Num país em que, ao contrário dos EUA ou da África do Sul, jamais existiu segregação racial oficial, não há fronteira objetiva separando "brancos" de "negros". A difusão das preferências raciais nos concursos públicos e no mercado de trabalho em geral demanda uma série imensa de atos legais e administrativos de rotulação racial das pessoas. Em nome do combate ao racismo, o Estado deve fabricar raças em escala nacional, disse o STF. No afã de descartar a Constituição, aquele texto marginal, nenhum deles registrou a contradição explosiva entre meios e supostos fins.

* SOCIÓLOGO E DOUTOR EM GEOGRAFIA HUMANA PELA USP. E-MAIL:DEMETRIO.MAGNOLI@UOL.COM.BR

terça-feira, maio 08, 2012

Morgan Freeman sobre o "Mês da consciência negra"



Em 55 segundos, o grande ator norte-americano Morgan Freeman faz em pedaços uma estupidez racista chamada "Mês da Consciência Negra" (ou da "História Negra").

É uma pena que os ministros do STF não tenham visto o vídeo...

sexta-feira, abril 27, 2012

VIVAM AS COTAS! VIVA O RACISMO! VIVA A DESIGUALDADE!


Sabem aquele princípio de que todos são iguais perante a Lei? Podem esquecer.  Graças ao STF, que no dia 25 considerou constitucional o sistema de cotas raciais nas universidades, esse princípio sagrado do Direito e da Democracia virou letra morta. A partir de agora, está instituído oficialmente que há, no Brasil, cidadãos e cidadãos – ou cidadãos e "afro-descendentes". 
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Lembram ainda daquela conclusão científica, a que se chegou depois de décadas, e que foi considerada um importante avanço humanista quando divulgada há alguns anos, segundo a qual o conceito de "raça" foi descartado como uma ficção racista que não tem nada a ver com a biologia e quem tem raça, portanto, é cachorro? Pois é. Podem esquecer isso também.  De acordo com as incelenças togadas do STF, o racismo é algo que deve ser não execrado, mas aplaudido. Abaixo Nelson Mandela! Abaixo Martin Luther King! Viva Hitler! Viva Goebbels! Viva Gobineau!
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Quem acompanhou a votação da matéria no STF sabe do que estou falando. O principal tribunal do país, que já decidira mandar às favas a Constituição em nome da "união homoafeativa" – revogando, assim, o Artigo que trata da organização familiar e instituindo uma terceira categoria sexual –, resolveu por bem avalizar a separação racial no Brasil. E com argumentos, digamos, "progressistas", "do bem".  Vejamos os votos de cada magistrado.
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O presidente do STF, ministro Carlos Ayres Britto, justificou seu voto dizendo que “os erros de uma geração podem ser revistos pela geração seguinte e que é isto que está sendo feito”. Espero sinceramente que Ayres Britto esteja correto. Tanto que não perdi ainda a esperança de que a próxima geração corrija o que o STF fez na última quinta-feira. Aguardo o dia em que os pósteros restituirão a igualdade de todos perante a Lei.
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Ainda assim, fiquei intrigado com essa reedição da teoria do pecado original: a que "erros de gerações passadas" o ministro estaria se referindo? Se está falando da escravidão, acho justo que se corrija esse erro histórico. Poderíamos começar exigindo indenizações dos descendentes dos faraós por séculos de escravismo no Egito. Ou, se não quisermos retroceder tanto no tempo, dos mercadores de escravos africanos, muitos dos quais – vejam que coisa! – eram... negros!  Quem vai corrigir os erros de gerações passadas de donos de escravos, como era – descobriu-se há pouco – Zumbi dos Palmares?  Os descendentes de imigrantes japoneses?
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Outro jurisconsulto, Ricardo Lewandowski, afirmou que o sistema de cotas em universidades “cria um tratamento desigual com o objetivo de promover, no futuro, a igualdade”. Entendi. É a famosa tese de que é necessário promover a desigualdade agora em nome de uma igualdade num futuro indeterminado... É, já tentaram isso antes, e deu no que deu. Por que não garantir a igualdade hoje, e ponto final?
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Luiz Fux disse que “não se trata de discriminação reservar algumas vagas para determinado grupo de pessoas”, e afirmou: "É uma classificação racial benigna, que não se compara com a discriminação, pois visa fins sociais louváveis". Ah, bom! Anotem aí: separar as pessoas pela cor da pele, criando um tribunal de pureza racial, não é discriminação, mas uma "classificação racial benigna"… E isso porque, como diz o ministro Fux, "visa fins sociais louváveis". Que fins sociais seriam estes? Favorecer, com 20% das vagas garantidas, quem se declarar, e for considerado, "negro" ou "pardo"... Muito louvável, não?
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Seguindo o voto do relator, Rosa Weber disse que o sistema de cotas “visa dar aos negros o acesso à universidade brasileira e, assim, equilibrar as oportunidades sociais”. Pensei que o sistema que visa a dar aos estudantes – negros ou não – acesso às universidades já tinha sido criado: chama-se vestibular. Também acreditava que ser negro no Brasil era uma questão mais de opinião do que de cor de pele propriamente dita. Mas deixa pra lá. E quanto ao mérito pessoal? Deixa pra lá também.
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Outro membro do egrégio tribunal, Cármen Lúcia, justificou seu voto favorável às cotas citando duas histórias pessoais sobre marcas deixadas pela desigualdade na infância. Reminiscências pessoais, sobretudo se forem da infância, são uma arma infalível. Espero que Carmen Lúcia tenha sido pelo menos original, e não tenha apelado para estórias como a da amiguinha negra que foi barrada numa festinha de aniversário... Até porque não é com cotas raciais que se vai resolver esse tipo de coisa.
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Em seu voto, Joaquim Barbosa citou um julgamento da Suprema Corte americana que validou o sistema de cotas para negros nos Estados Unidos. Joaquim Barbosa é o único ministro do STF que poderia ser considerado negro.  Deve ser por isso que ele resolveu citar a Suprema Corte dos EUA, país onde as relações raciais são um tantinho diferentes.  Lá, eles tiveram segregação nas escolas, as leis Jim Crow e a Ku Klux Klan. Aqui, tivemos samba, feijoada e carnaval. Se Barbosa tivesse se lembrado que estava votando para institucionalizar o racismo no Brasil, um país de mestiços, e não nos EUA, talvez tivesse mudado seu voto.
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Já Cezar Peluso não acha que a reserva de vagas segundo o critério racialista fira o princípio da meritocracia. Segundo ele, o que impede as pessoas de entrarem nas universidades não é uma educação de baixa qualidade, mas a cor da pele, ou a auto-declarada cor da pele. É o fato, enfim, de ser "afro-descendente", e não a pobreza ou outras dificuldades econômicas. Argumento perfeito. Quer dizer o seguinte: se Peluso tivesse nascido com a tez um pouco mais escura, ou com o cabelo pixaim, não teria chegado a ministro do STF. Do mesmo modo, se Pelé tivesse nascido branco, não teria sido Pelé. Muito lógico, não?
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O único ministro que esboçou alguma crítica ao modelo de cotas, tal como já adotado há alguns anos pela UnB, foi Gilmar Mendes. Ele tentou argumentar que tal sistema pode gerar distorções e perversões. Pode, não, ministro: já está gerando. Irmãos gêmeos já foram separados na UnB pelo critério racialista – um havia se declarado “afro-descendente”; outro, não. Mendes também votou pela constitucionalidade das cotas.
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Celso de Mello, por sua vez, disse que “ações afirmativas estão em conformidade com Constituição e com Declarações Internacionais subscritas pelo Brasil”. Foi seguido por Marco Aurélio Mello. Surge daí uma dúvida: se as cotas estão conformes à Constituição, certamente não estão com o Artigo 5, que diz que todos são iguais perante a Lei. Quanto a declarações internacionais subscritas pelo Brasil, gostaria de saber em qual delas está escrito que se deve privilegiar indivíduos pela cor da pele. Porque foi isso, senhores, que os ministros acabaram de aprovar! 
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Li que, durante a votação no STF, um índio presente na platéia teve de ser retirado pelos seguranças porque estava perturbando a sessão, gritando que deveriam ser reservadas cotas semelhantes também para índios. Eu, que tenho cá uma gota de sangue índio, já estou pensando em protocolar um pedido para ser beneficiado por esse sistema maravilhoso. Só estou na dúvida se, pelo critério das cotas, eu teria direito a 50%, ou a 25%, ou a 15% das mesmas, já que minha ascendência indígena se perde nas brumas do tempo... Como ocorre com a maioria dos brasileiros, que, como dizia Gilberto Freyre, trazem todos, mesmo o loiro de olhos azuis, a marca do negro, sou um ser racialmente tão definido quanto a sexualidade de muitos artistas.
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Tenho uma sugestão aos senhores ministros do STF: por que não criar, estimulados pelo índio que queria apito, cotas para pessoas que se declararem incolores, ou sem raça definida? Ou para torcedores do Ferroviário? Por que não?  Estes, pelo menos, eu sei que existem. Ao contrário da auto-declarada "raça" batizada de "afro-descendente", algo real somente na cabeça de militantes políticos e dos juízes do STF rendidos ao politicamente correto.

sexta-feira, maio 20, 2011

CHEGA DE BOIOLICE

O Brasil está virando cada vez mais um país de boiolas.

Antes que você, caro leitor, tomado de um surto de indignação politicamente correta, resolva me submeter a um linchamento público e me tasque um processo por - em breve isso poderá ser possível - "homofobia", elegendo-me o Bolsonaro da vez, conceda-me pelo menos o direito de explicar o que quero dizer com a frase acima.

Em primeiro lugar, por boiolice não me refiro a nenhuma opção ou preferência sexual, seja por quem (ou pelo quê) quer que seja. Ser boiola, aqui, não tem absolutamente nada a ver com ser homossexual - aliás, não tem qualquer relação com a sexualidade, seja qual for. Esse tipo de coisa é para revistas de fofocas e programas de TV. Refiro-me tão-somente a uma atitude (ou melhor dizendo, falta de atitude) em relação à democracia e à liberdade individual. Atitude que, infelizmente, tem sido corrente no país de uns tempos para cá, ameaçando tornar-se obrigatória.

Trocando em miúdos: há gays que não são boiolas e há héteros que se deixam levar pela maior frescura, comportando-se como maricas. O sujeito pode ser o maior mulherengo e ser um boiola, e pode estar apaixonado por um porco-espinho e ser um exemplo de virilidade. Boiolice tem a ver não com o que se faz na cama, mas com hombridade.

Feito este esclarecimento inicial (espero que tenha ficado claro), vamos ao tema central deste texto.

A cada dia multiplicam-se, no Brasil, os casos de covardia moral, de renúncia voluntária à resistência contra o engodo e a impostura. Ou seja: de boiolice. Vejamos alguns exemplos.

Na Congresso Nacional, um projeto de lei - o PLC 122 - ameaça criminalizar qualquer opinião - eu disse: opinião - que possa ser considerada, de algum modo, "homofóbica", ou seja, preconceituosa, contra gays, lésbicas, travestis etc. O projeto é entusiasticamente apoiado pelos grandes meios de comunicação de massa, como a Rede Globo, tendo em sua comissão de frente uma senadora-sexóloga e um ex-BBB eleito deputado federal. Se for aprovado, o tal projeto de lei colocará na ilegalidade qualquer pessoa que tiver a ousadia de citar a Bíblia (ou o Corão) para se referir à homossexualidade, jogando no lixo, portanto, a liberdade de expressão e a maior manifestação desta, a liberdade religiosa.

Seria de esperar, portanto, que houvesse um forte movimento de repúdio a essa clara tentativa antidemocrática, que afronta a opinião da maioria absoluta da população brasileira. Mas que nada! Quase ninguém no mainstream ousa levantar a voz contra essa patacoada, com medo de ser tachado de "homofóbico" ou coisa parecida. Do mesmo modo, quase ninguém tem coragem de criticar a distribuição de um "kit gay" nas escolas, que ensina crianças de 7 e 8 anos de idade as virtudes e a beleza do Ken brincar de médico com o Ken e de a Barbie brincar de casinha com a Barbie.

Na mesma linha "cute-cute", o STF aprovou recentemente a "união homoafetiva". Independentemente do mérito da questão, os senhores ministros mudaram, de uma tacada, um artigo da Constituição Federal, o que legalmente só pode ser feito pelo Congresso mediante Emenda Constitucional. Simplesmente decidiram, cedendo à vontade de um lobby fortíssimo, que um Artigo da Carta Magna não vale mais e ponto final.

Ao decidirem mudar um Artigo da Constituição, os ministros do STF arvoraram-se em legisladores, mandando às favas, assim, a separação de Poderes, base da democracia. Pela lógica, portanto, deveriam esperar que alguém na OAB exigisse imediatamente, no mínimo, a dissolução do STF e a prisão de seus ministros por tentarem um golpe (in)constitucional. Mais uma vez, porém, praticamente nenhuma voz se ergueu para denunciar a trapaça.

O mais curioso é que, para justificar essa decisão, os ministros da Suprema Corte o fizeram pisando em ovos, procurando desviar-se da questão em pauta - a união civil entre pessoas do mesmo sexo -, substituindo o termo homossexual pelo anódino e antisséptico, quase angelical, "homoafetivo". Feito um grupo de freiras pudicas, não ousaram falar abertamente o que todos sabem: que gays também fazem sexo. Foram, nesse sentido, mais boiolas do que os militantes gayzistas que promovem "beijaços" em frente a igrejas católicas - estes, pelo menos, assumem claramente seu preconceito contra uma religião.

Essa constante e sistemática rendição ao politicamente correto constitui uma espécie de anti-Viagra, resultando na impotência voluntária de quem deveria estar nas ruas protestando contra todas essas violações à democracia, disfarçadas de bom-mocismo. E com argumentos, digamos assim, de maricas. Vejam o caso do desarmamentismo, uma religião que usa de todos os pretextos para se impor (o último dos quais foi um massacre cometido por um débil mental numa escola no Rio de Janeiro, com armas adquiridas ilegalmente).

Todo o discurso desarmamentista se baseia no argumento de que o cidadão de bem não é competente o suficiente para ter uma arma de fogo legalizada e que é ele, e não o bandido, o maior responsável pela violência e pela criminalidade no País. Em outras palavras: você, cidadão, em nome da própria segurança e da "paz", deve renunciar a seu direito à autodefesa. Conhecem boiolice maior do que essa? (talvez aquele símbolo feito com as duas mãos imitando um coraçãozinho...)

No caso da falácia desarmamentista, pelo menos, há alguma resistência organizada, como demonstrou o repúdio de 64% da população brasileira à idéia cretina de proibir a venda legal de armas no plebiscito de 2005 (os devotos da seita, porém, não desistiram, e já planejam reeditar a bobajada). Talvez pelo fato de afetar mais diretamente a vida das pessoas, sobretudo dos mais pobres, que, ao contrário do senador José Sarney, não têm dinheiro para contratar um batalhão de seguranças particulares, a idéia desarmamentista foi rejeitada. Mas isso não impede que a ideologia politicamente correta seja cada vez mais hegemônica no Brasil.

Tal fato é facilmente constatado em outros fronts da batalha cultural, nos quais o discurso do pobrismo e sua variante principal, o vitimismo, reinam incontestáveis e absolutos. As cotas raciais, por exemplo, já são uma realidade nas universidades e no serviço público, a despeito da própria formação mestiça da sociedade brasileira e afrontando abertamente o princípio constitucional da igualdade de todos perante a lei. O discurso das minorias, paradoxalmente, já se tornou majoritário no Brasil. A ponto de, hoje, declarar-se negro (ou "afro-descendente") ou gay (ou lésbica, ou transssexual, ou sei lá mais o quê) constituir uma verdadeira marca distintiva, facilitadora e garantidora de direitos especiais - privilégios. E o mais espantoso: tudo isso visto como se fosse algo perfeitamente natural, sem que se levante quase nenhuma voz de protesto (logo abafada e estigmatizada como "racista" ou "homofóbica"). Uma tremenda veadagem.

E por aí vai. Ai de quem se insurja contra a ocupação de espaços pela militância gayzista-desarmamentista-racialista: correrá o risco de virar um pária e até mesmo sofrer um processo legal e - caso seja aprovado o PLC 122 - acabar atrás das grades. Do mesmo modo, infeliz daquele que denuncie o culto da ignorância, outra marca registrada do vitimismo pobrista: é um "preconceituoso" e um "elitista". Diante da perspectiva de se tornar impopular e de vir a ser tachado com rótulos tão infamantes, o indivíduo prefere calar-se a peitar os que seqüestram a democracia. Coisa de boiola.

Curvar-se à ditadura do politicamente correto, muitas vezes escondendo as verdadeiras opiniões para não afrontar ou ferir suscetibilidades de quem se acha dono da verdade e da virtude, tornou-se a única e obrigatória regra moral seguida à risca no Brasil. Fora desse círculo infernal, se ousar destoar dos bem-pensantes e pensar com a própria cabeça, você será automaticamente rotulado como um intolerante, um racista, um homofóbico e um direitista raivoso (de preferência da TFP e da Opus Dei).

Isso sem falar na política propriamente dita, onde a boiolice reina poderosa e absoluta. Para começar, decidiu-se que chamar de apedeuta e analfabeto um sujeito que fazia a apologia do apedeutismo e do analfabetismo é "preconceito da elite". Além disso, tentem contar em quantos escândalos de corrupção e outros a companheirada no poder se meteu desde 2003. Em todos esses casos, a começar pelo mensalão, a dita "oposição", que tem o dever de se opor ao governo, comportou-se, em vez disso, como um clube de mulherzinhas.

O último escândalo da petralhada foi o milagre da multiplicação da conta bancária protagonizado por Antonio Palocci, o do estupro da conta do caseiro. Mais uma vez, o que fez o PSDB? Deu um show de falta de coragem e de testosterona. Acabei de ler algumas declarações de Aécio Neves, praticamente pedindo desculpas por tocar no assunto da conta de Palocci no Senado. Uma coisa assim, bem fofa. Com uma oposição dessas, por que o governo precisa de base aliada? São ou não são um bando de boiolas?

Uma das coisas que me lembro de ouvir quando criança era que um homem tinha que ter coragem. Que tinha que ser bravo, até fisicamente, para defender sua honra e enfrentar aquilo que considerasse errado ou injusto. Coragem e caráter, enfim, eram duas coisas inseparáveis. Era isso, mais até do que gostar ou não de mulher, o que definia e caracterizava a verdadeira macheza. Pelo menos foi assim que eu aprendi, e é nisso que acredito desde então.

Hoje, porém, para ser considerado alguém respeitável no Brasil, você tem que compactuar com a mentira e esconder as próprias opiniões. Ao ver a bundamolice geral que tomou conta do País na era da mediocridade lulopetista, não posso deixar de indagar: afinal, os brasileiros são eunucos?

sábado, março 19, 2011

CONTRA O RACISMO, LIBERDADE DE EXPRESSÃO E MERCADO NELES (OU: COMO O POLITICAMENTE CORRETO DESTRÓI A DEMOCRACIA)


Cena do filme "The Black Gestapo" (1974)


Há alguns dias li na VEJA uma entrevista que me deu vontade de agradecer aos céus e de aplaudir de pé, tendo chegado mesmo a pensar em fazer milhares de cópias e distribuir pelas ruas. O professor norte-americano de economia Walter Williams deu uma chinelada nos devotos do politicamente correto (o novo nome da velha "linha justa"dos partidos comunistas), que acreditam que as tais cotas raciais são uma solução válida para "integrar" os "excluídos" etc.

De forma clara - didática, lógica, incisiva -, o professor deixou evidente por que todo o palavrório sociologizante a favor de cotas raciais num país como o Brasil é na verdade um despropósito, um despautério que apenas cria um problema onde este é mínimo ou não existe. Também afirmou que, a longo prazo, o governo de Barack Obama, por se afigurar um fracasso (como provavelmente será lembrado), será ruim para os negros americanos. Citou números e estatísticas e arrematou, afirmando o óbvio: só uma educação de qualidade, o livre mercado, o capitalismo e os valores de liberdade individual promovem a inclusão dos negros. Enfim, tudo aquilo que causa espasmos de horror a nossos intelectuais estatizados, que odeiam com a mesma intensidade o liberalismo e seu corolário, a democracia. (Ah, e só por curiosidade: Walter Williams é negro.)

Sempre me chamou a atenção o fato de os militantes negros (ou "afro-americanos", ou "afro-descendentes", ou sei lá como são chamados pela novilíngua politicamente correta) serem quase todos, também, ardentes anticapitalistas. Melhor dizendo: sempre me intrigou que eles, que se dizem paladinos da "igualdade racial" e das oportunidades iguais para todos, não tenham a coragem de defender o capitalismo, o único sistema econômico-social compatível com esses objetivos.

Afinal, o que querem os defensores das cotas racialistas? (O termo adequado é racialista, e não "racial" - racialismo é uma ideologia; "racial" é apenas um adjetivo sem nenhum sentido, até porque quem tem raça é cachorro, gato, cavalo, galinha...) Tudo, menos promover a inclusão dos menos favorecidos. Qualquer outra coisa, menos combater o racismo.

Se os militantes racialistas o quisessem realmente, defenderiam o livre mercado, a única forma de promover a inclusão e a integração social. Como não o fazem, o que buscam, então? Exatamente o contrário: a não-integração, a exclusão, mediante a segregação, a separação das raças. Qual seu objetivo final? A destruição do livre mercado, o dirigismo estatal - enfim, o socialismo.

Na realidade, a chamada "causa negra", assim como a de outras minorias (gays, índios, feministas, ecologistas etc.) não passa de um pretexto para "combater o sistema" (ou seja: o capitalismo). E nada mais do que isso. Os ideólogos e militantes desses movimentos pouco se importam com os problemas, reais ou não, que alegam combater: o importante é culpar o maldito capitalismo por tudo de ruim que existe, e defender sua aniquilação. Nisso, apenas repetem o objetivo dos comunistas de outrora: como aqueles não conseguiram alcançá-lo pela revolução proletária, seus sucessores da Nova Esquerda passaram a defender a "inclusão" no sistema, mediante - aí está o pulo do gato (ou do gatuno) - a separação da sociedade em raças e em outros grupos sociais, a abolição da meritocracia em favor de critérios ideológicos. Mudaram de tática, mas o objetivo último - o fim do capitalismo - continua o mesmo. De certa forma, é a continuação da velha luta de classes, disfarçada sob o rótulo aparentemente anódino de "defesa das minorias". Não mais burgueses versus proletários, capitalistas versus operários ou camponeses, mas "brancos" contra "afro-descendentes", e assim por diante.

Isso fica claro no caso das cotas racialistas (e, na prática, racistas). Sabe-se que o próprio livre mercado - a própria sociedade - se encarrega de minimizar o racismo onde ele existe, promovendo a integração de populações marginalizadas por motivos raciais ou étnicos. O lucro, como sabe qualquer dono de bodega, não distingue cor, raça ou religião. Também não foi necessário nenhum sistema de cotas para que os negros nos EUA ocupassem o lugar dos brancos como os melhores jogadores de basquete, por exemplo. A sociedade (quer dizer: o mercado) se auto-corrige e se auto-regula.

Mas reconhecer isso seria admitir que o capitalismo não é o bicho-papão que todos dizem ser. A solução encontrada, então, foi defender as cotas, que são uma forma de o Estado - o deus pagão dos socialistas - impor sua autoridade, eliminando a meritocracia e substituindo-a por tribunais de pureza racial. A "promoção dos negros" (ou índios, ou pardos, ou amarelos, ou torcedores do Íbis) seria, assim, resultado não da própria dinâmica do mercado, mas da benemerência e boa vontade dos agentes estatais. Seria necessária a presença da "mão visível do Estado", exatamente para impedir que a mão invisível do mercado aja e dê frutos.

O mesmo raciocínio tortuoso, e o mesmo objetivo totalitário, se aplicam às demais "causas" caras aos militantes do "politicamente correto". Aqui, o que importa não é o combate ao racismo ou a qualquer outra forma de discriminação, mas aumentar o alcance da intervenção do Estado, que passa a ser um juiz supremo e definidor da raça e da sexualidade das pessoas, separando-as pela cor da pele ou pela opção sexual. A mesma lógica - ou falta de lógica - encontra-se nos programas assistencialistas do governo lulo-petista, como o Bolsa-Cabresto (oficialmente conhecido como Bolsa-Família): o aumento da dependência estatal, a criação de uma multidão de estadodependentes. Não é por acaso que a maioria dos militantes politicamente corretos esteja no PT e nos demais partidos de esquerda.

E isso a despeito da própria realidade nacional, por mais diferente que ela seja do que querem os militantes racialistas ou gayzistas. Na verdade, quanto mais diferente ela for do que apregoam seus slogans, mais eles intensificam sua militância, mais forte se faz a ação estatal. É difícil dizer, devido à intensa miscigenação, quem é e quem não é negro no Brasil? Não tem problema: o governo, por meio das cotas, diz quem é, instituindo a auto-declaração como critério científico e irretorquível ("Sou negro porque 'acho' ou me 'sinto' negro" etc.). E vai além: concede direitos especiais - privilégios, em bom Português - àqueles que assim se declararem. Estes gozarão, portanto, de tratamento diferenciado em vestibulares e em concursos públicos, largando na frente da maioria que não teve a sorte de ser considerada afro-descendente pelo Estado, e que terá, portanto, que estudar.

Do mesmo modo: o País é um dos mais tolerantes do mundo quanto à opção sexual dos indivíduos, possuindo a maior "parada do orgulho gay" do planeta? Também não há problema algum: pinça-se aqui e ali um caso isolado de preconceito, supervaloriza-se um xingamento, e pronto! - está cientificamente provado que o Brasil é um paraíso da homofobia. O passo seguinte é inventar uma lei para criminalizar expressões como "viado" e "boiola" e piadas de bichinha. Isso, evidentemente, depois de alguma ONG gayzista, com o apoio das novelas e do noticiário da Rede Globo, tentar manipular dados e estatísticas para "provar" que o País é um campo de extermínio de homossexuais, em que todos os dias um número "x" de gays, lésbicas e travestis é abatido como moscas em cada quarteirão e em cada rua das grandes, pequenas e médias cidades.

(Claro que, se desse número, a maioria dos agredidos o tiver sido por parceiros homossexuais - como ocorre em CEM POR CENTO dos estupros nas cadeias, por exemplo -, esse fato não será computado. Assim como não o serão os casos de serial killers que matam gays após transarem com eles - o que os torna, automaticamente, gays também. Nada disso será levado em conta, cabendo todas as agressões e assassinatos cometidos desse modo e nessas circunstâncias na mesma rubrica de crimes de "homofobia"...)

Desnecessário dizer, mas uma lei que pune com pena de prisão ou multa qualquer um que tiver a ousadia de contar uma piada do Costinha ou imitar os trejeitos do colega desmunhecado não estará completa se não atingir diretamente a maior fonte de homofobia que existe: a religião. Em particular, a Bíblia, que terá de ser proibida ou totalmente reescrita para adaptar-se a esses novos e brilhantes tempos de liberdade. (O Islã, que pune tais comportamentos com a morte ou o açoitamento, ficará de fora dessa interdição, pois se trata de religião exótica, não fazendo parte da civilização branca-européia-ocidental e gozando, portanto, de status diferenciado perante os multiculturalistas.)

Também não é preciso lembrar que o padre católico ou o pastor protestante que tiver o atrevimento de expulsar da igreja ou do templo o casalzinho gay que estiver dando uns amassos em frente ao altar durante a missa/culto será condenado a vários anos de cadeia pelo crime nefando de não permitir que eles transformem o local em motel. Afinal, quem liga para coisas sem importância como liberdade de culto e de expressão religiosa, não é mesmo?

O importante é que os gays, essas criaturas maravilhosas e ultra-sensíveis, possam ter a liberdade de expressar livremente e sem preconceitos sua sexualidade, beijando-se e acariciando-se em qualquer lugar, em qualquer momento, diante de qualquer platéia. Se podem fazê-lo durante um culto religioso, por que não numa creche, por exemplo, em frente a criancinhas de 2 anos de idade? E por que não com as próprias? Seria uma forma excelente de ensinar-lhes, na prática, o significado de "tolerância" e "respeito à diversidade". Uma lição de cidadania, sem dúvida...

E como fica, no final disso tudo, a liberdade de expressão e a igualdade de todos perante a Lei, cláusula primeira e fundamental da democracia? A essa altura, quando alguém se lembrar de fazer essa pergunta, todos já terão se esquecido desse detalhe há muito tempo.

E assim os militantes do politicamente correto - racialistas, gayzistas, feministas etc. - vão, a cada dia mais, minando as bases da democracia e do Estado de Direito. Em lugar deste, surgirá um mundo em que a discriminação por raça, sexo ou ideologia será institucionalizada, tornando-se de fato a única lei. Pelo menos enquanto não surgir uma forte corrente de opinião contrária a essa monstruosa impostura.

Um velho provérbio diz que o caminho do inferno é pavimentado por boas intenções. Tenho minhas dúvidas quanto às boas intenções. Mas, no tocante ao resultado final, não tenho dúvida alguma.

terça-feira, janeiro 18, 2011

SOBRE A ESCRAVIDÃO - UMA PEQUENA LIÇÃO DE HISTÓRIA


Nem todo comentário crítico ao que escrevo vem de mentes perturbadas e infantilizadas. De vez em quando - infelizmente, bem menos do que eu gostaria -, alguém consegue discordar do blog sem mandar o idioma e as normas da civilização às favas nem descer ao nível dos quadrúpedes ou dos protozoários. Um leitor, o Rafael Dias, está nessa categoria. Rafael não é um energúmeno - e isso, dada a situação geral da inteligência no Brasil de hoje, já é alguma coisa. Ele está apenas equivocado. Por essa razão, e por acreditar que ele quer aprender, respondo seu post. Ele escreveu, a respeito de meu texto ZUMBI, O ESCRAVOCRATA (os grifos são meus):

Concordo quando se diz que a unianimidade é burra. É importante ouvir os vários atores envolvidos no processo social. Realmente foi uma grande supresa para mim saber (se, de fato é verdade) que Zumbi era dono de escravos. Contudo, a visão que você expôs no seu texto é muito parcial, pois parte de casos isolados (mesmo que um exemplo seja o próprio Zumbi dos Palmares) e tenta criar a idéia de que era normal um negro escravizar o outro. Acho possível que isso tenha acontecido. Porém, você esqueceu citar em seu texto o critério fundamental para se decidir que seria escravo: a cor da pele, que tinha que, necessariamente ser negra. Não conheço registros na História do Brasil de brancos sendo escravizados. Não entenda o meu comentário como uma contra reação ideológica. Quando abordamos uma questão e temos a sincera intenção de tratá-la com transparência, não podemos esquecer de tocar em determinados pontos cruciais para que as nossas críticas não pareçam a defesa de um ponto de vista só nosso que queremos disseminar e que nem sempre dá conta de representar a realidade. Você escreve muito bem. Um texto limpo e claro. Mas peca no trato com o conteúdo, pois deixa de criticar o sitema segregador que existia formalmente, para tentar justificá-lo, alegando que os ditos segregados também eram praticantes das mesmas injustiças que sofriam. Foi um período tão nefasto da nossa história, que, até hoje irradia efeitos em nossa sociedade.
O que se pode inferir do seu texto é que a escravidão era válida, tendo em vista que alguns negros também a praticavam. É isso?

Caro Rafael,

Antes de tudo, obrigado por não ofender minha mãe nem usar adjetivos como "reacionário" ou "fascista" para se referir à minha pessoa. Nisso você já se diferencia da maioria dos que vêm aqui dizendo discordar do que escrevo. Vamos a seu comentário.

Você diz que a visão de meu texto é "muito parcial, pois parte de casos isolados" etc. Sobre ser ou não parcial, já tratei disso em outros textos, e não quero me repetir aqui. Digo apenas que, se você está se referindo ao exemplo de Zumbi dos Palmares como um "caso isolado", então só posso concluir que vivemos em mundos diferentes. Assim como Zumbi, houve muitos outros casos de ex-escravos que, uma vez alforriados, tornaram-se, eles mesmos, negociantes de escravos (alguns deles prosperaram bastante nesse negócio). Além do mais, como se pode chamar de "caso isolado" o fato de um líder escravo, não um líder qualquer, mas simplesmente o símbolo maior da luta anti-escravista no Brasil, ter sido, ele também, proprietário de escravos? É o mesmo que descobrir que Gandhi, por exemplo, era um belicista ou que Madre Teresa de Calcutá era uma devassa que mantinha secretamente um prostíbulo. Você diria que esses seriam "casos isolados" também?
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Depois disso, o mínimo que se espera é que toda instituição que leva o nome de Zumbi troque de nome imediatamente, ou que o dia 20 de novembro - dia da "consciência negra", em homenagem também a esse personagem - deixe de existir.

Rafael, não sei de onde você tirou a conclusão de que eu tento "criar a idéia de que era normal um negro escravizar outro". Primeiro, porque não se trata de uma idéia, muito menos criada por mim: é um fato histórico. Já escrevi e repito: a escravidão existia na África séculos antes de os portugueses lá chegarem no século XV, e continuou muito tempo depois, praticada pelos próprios africanos. Isso acontece, inclusive, ainda hoje, em países como o Sudão e a Arábia Saudita. Um príncipe saudita, aliás, foi preso em Londres no fim do ano passado acusado de ter espancado até a morte seu escravo de estimação... Isso é fato, não fui eu que inventei. (Aliás, gostaria de saber quando é que os descendentes dos faraós e sobas africanos irão pagar sua dívida histórica pela escravização de milhões de seres humanos...)

O que está aí em cima, Rafael, é suficiente para desmontar, como absurda, sua afirmação de que eu teria esquecido o "critério fundamental para se definir quem seria escravo: a cor da pele, que tinha que ser, necessariamente, negra". Isso porque a cor da pele, negra ou não, JAMAIS foi critério para se definir quem era e quem não era escravo, pelo menos no caso da África. Durante séculos, negros escravizaram negros, e inclusive brancos - desde a época dos faraós -, e quando os portugueses começaram a traficar escravos no Atlântico, os compravam em grande parte de tribos locais, que também praticavam a escravidão (e que eram, também, negros). Foram os europeus, não africanos ou asiáticos, que aprenderam com estes a escravizar outros povos, e não o inverso. Além disso, os portugueses, um povo muito pouco "puro" racialmente, jamais usaram o conceito de "raça" (muito menos a "cor da pele"), para escravizar quem quer que seja, até porque, como diz Gilberto Freyre, a consciência de raça era-lhes algo inteiramente estranho - o que havia era uma consciência de cultura, o que é uma coisa muito diferente. Se havia algo que definia quem seria escravo ou não, pelo menos no caso dos portugueses, não era a "raça" ou a "cor de pele": era a religião (se não fosse cristão, por exemplo; e, nas terras muçulmanas, se não fosse muçulmano etc.).

Aliás, se não me engano foi também Gilberto Freyre - leia Casa-Grande & Senzala, eu recomendo - que chamou a atenção para o fato de que o racismo moderno é uma invenção tipicamente anglo-saxônica, surgida com a Reforma Protestante a partir dos séculos XVI-XVII. Essa visão se consolida no século XIX, com as teorias científicas e pseudo-científicas então em voga, que foram instrumentalizadas para justificar o colonialismo (darwinismo, evolucionismo etc - inclusive, é bom que se diga, o marxismo). Nada que tivesse a ver, por mínimo que fosse, com o escravismo colonial português, de base essencialmente - na verdade, exclusivamente - católica e renascentista. É por esse motivo que a segregação racial foi imposta em países como os EUA ou a África do Sul, mas nunca, jamais, no Brasil, onde imperou, desde o início da colonização, a mistura racial, a miscigenação. (Quer dizer, pelo menos até agora nunca houve segregação racial no Brasil, porque, se depender dos "militantes negros", esta vai virar uma realidade por estas bandas - aliás, graças a absurdos como o sistema de cotas raciais, já está virando.)

Já escrevi o que está acima, com outras palavras, em outros textos. Se quiser, dê uma olhada nos posts O CLUBE DOS RESSENTIDOS e O FIM DE UM MITO. Você perceberá que já respondi suas questões.

Não é difícil, portanto, perceber que sua conclusão de que eu estaria "justificando" a escravidão, dizendo que ela teria sido "válida" etc. não tem nenhum sentido. Não justifico nem considero válida a escravidão, apenas chamo a atenção para o fato esquecido de que ela não foi praticada apenas por europeus de cabelos loiros e de olhos azuis. E que qualquer tentativa de se confundir escravidão com "raça" - ou, simplesmente, usar esse conceito biologicamente falso para propor "reparações" ou o que seja - não passa de grossa falsificação histórica e desonestidade intelectual.

Espero ter-lhe ajudado. Se precisar de mais algum esclarecimento, é só escrever. Ou, então, procure uma biblioteca.

sábado, janeiro 01, 2011

MATANDO O DOENTE PARA ACABAR COM A DOENÇA

Começo o ano de 2011 respondendo a dois leitores. O primeiro, Alberto, parece ter entendido bem meu texto "O CLUBE DOS RESSENTIDOS", e faz algumas observações pertinentes. Tenho com ele apenas uma pequena divergência pontual (na verdade, semântica), que aproveito para esclarecer aqui. O segundo, que se assina apenas como "Anônimo", é o típico leitor em que penso quando escrevo textos como o acima referido - alguém cheio de ilusões sobre um problema que não entende, ou que não quer entender. Como acredito tratar-se de alguém bem-intencionado e sinceramente interessado no debate, respondo a ele também.

Vamos aos comentários. Respondo-os em seguida, separadamente. Primeiro o Alberto:

Concordo com o texto. Já a algum tempo percebo uma certa inversão de valores na nossa sociedade, além de um excesso de puritanismo. Hoje tudo é politicamente incorreto. Palavras ganham novos significados, tornando-se proibidas.
Um dia desses assisti um episódio dos Trapalhões com o Mussum. Nesse episódio, como quase sempre, ele fazia piada com sua fixação por álcool/cachaça/"mé". Na época todos assistíamos em família, e ríamos bastante. Fiquei imaginando como seria se algum humorista ousasse criar algo parecido hoje em dia. Porque hoje tudo é proibido, de forma que ser politicamente correto tem se tornado missão impossível, exceto se você escolhe não expressar mais nenhuma opinião.

Quanto à política de cotas, vejo como um paliativo, que mascara o cerne do problema: O acesso a um ensino básico de qualidade, que permita a todos, independente de raça, crescer por mérito próprio.
E quando essas pessoas - que não tiveram acesso a um bom ensino básico - concluírem a graduação de forma sofrível e forem preteridas no mercado de trabalho em favor de outras mais preparadas, o governo vai criar cotas de vagas nas empresas também?
No fim, na ânsia de se estabelecer a igualdade, mascara-se a desigualdade.

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RESPOSTA AO ALBERTO
Estamos de total acordo quanto à ditadura do politicamente correto, que nada mais é do que a castração do pensamento crítico em nome de conveniências ideológicas. Seu exemplo do Mussum é perfeito. Não tenho nada a acrescentar.

Faço apenas uma observação: cota racial não é paliativo. Um paliativo é uma tentativa, ainda que inútil, de resolver um problema. Tentar estancar uma hemorragia com um band-aid, por exemplo. As cotas, ao contrário, não minimizam o problema que dizem combater - o racismo. Pelo contrário, o oficializam, instituindo um sistema de tribunais de pureza racial. Em outras palavras, não são parte da solução, mas do problema. São, aliás, o próprio problema.

Para que as cotas pudessem ser consideradas um paliativo - ou seja: para que fossem consideradas algo "válido, embora insuficiente" -, uma forma equivocada de tentar diminuir a desigualdade e garantir a "inclusão social" ou o que seja, o Brasil deveria ser um país em que os pobres fossem TODOS, ou em sua maioria, "negros". E em que essa condição - a raça - fosse o fator a impedir o acesso de camadas da sociedade à educação.

Nenhum desses fatores existe no Brasil. Primeiro, porque "pobre" e "negro", pelo menos aqui, são coisas distintas - é comum dizer-se que, no Brasil, as pessoas mudam de cor de acordo com a posição social: se ficam ricas, "embranquecem"; se, ao contrário, ficam pobres, "acobream-se". Segundo, ainda espero alguém me mostrar uma prova cabal e definitiva do que seria ser "negro" no Brasil, um país majoritariamente mestiço (eu mesmo, descendente de portugueses e de índios do sertão nordestino, passaria por indiano na Suécia...). Terceiro, porque raça é um conceito ideológico, não biológico - a única raça reconhecida pela Ciência é a do Homo Sapiens Sapiens. Como disse o João Ubaldo Ribeiro: "quem tem raça é cachorro".

Enfim, nem de paliativo é possível chamar as cotas raciais. Trata-se de uma medida estranha ao Brasil, contrária à nossa formação histórica e cultural. É algo problemático até nos EUA, onde a segregação há muito acabou e onde as diferenças (econômicas, sociais, culturais) entre "negros" e "não-negros" vem diminuindo nas últimas décadas, de forma acelerada (basta olhar o Obama). Seria a importação de um problema, um dos poucos que NÃO temos.

Agora, o "Anônimo":

Gustavo, você jamais poderá afirmar que " no Brasil não há racismo" e sabe por que ?, Por que você não é negro.
E não escrevo isso com ressentimento ou qualquer tipo de rancor, apenas aponto os fatos.
As pessoas que me olham diferente, vendedores de loja que me ignoram, seguranças de banco que me barram ( sem eu ter algo metálico no corpo), atendentes que me destratam por acaso estão ligando para o fato de o Brasil ser um país de miscigenados ? claro que não.

A mídia que em geral usa 2% de negros nos castings de novelas e seriados também não, então em termos práticos isso não vale de nada.

Eu acredito que enquanto não tivermos um sistema educacional que permita a todos competirem em pé de igualdade o sistema de cotas é sim válido. Eu reconheço que é um paliativo ,mas enquanto não evoluirmos em educação é a arma que nos resta para uma sociedade mais justa.


RESPOSTA AO ANÔNIMO
Discordo completamente. Não é preciso ser "negro" para constatar que o racismo é um fenômeno pouco comum - eu jamais diria "inexistente", mas é próximo disso - no Brasil, do mesmo modo que não é preciso ser judeu para saber que existe antissemitismo. Também não é preciso ser nascido nos EUA para constatar que o antiamericanismo é uma realidade. Esse tipo de raciocínio "de gueto" não vale um tostão furado.

Outra coisa: acho que não conheço nenhum "negro" de verdade no Brasil. Acredito que devam existir uns dois ou três brasileiros que possam ser considerados "negros puros". Mais do que isso, só se for imigrante africano (geralmente casado com uma loira ou uma mulata). Isso por causa - mais uma vez - da miscigenação. Quanto por cento de "sangue negro", ou de melanina alguém deve ter para ser considerado "negro" no Brasil? Ainda mais se formos levar em conta o critério "científico" adotado nos programas de cotas raciais - a auto-declaração (a pessoa "se declara negro", e pronto!). Então ser "negro" no Brasil é uma questão de opinião pessoal (própria)? Partindo desse pressuposto, e do fato de que opiniões podem mudar, qualquer um poderia se dizer negro hoje e mudar de idéia amanhã, ou vice-versa.

Não sei se o fato de alguém ser olhado diferente, ou ignorado por vendedores de loja, ou barrado em bancos, ou destratado por um atendente, caracteriza "racismo". Teríamos aí uma outra definição de racismo: "Sou negro e vítima de preconceito porque me olharam de maneira estranha na rua" etc. Já me olharam de forma diferente uma vez, e nem por
isso achei que fui vítima de preconceito ou de discriminação (talvez pelo fato de eu ser gordinho... hehe). A pessoa que lhe olhou "diferente" proferiu algum insulto referente à cor de sua pele ou a seu cabelo? Havia alguma placa na loja ou no banco indicando que só atenderiam caucasianos? Se não havia nada disso, qualquer acusação de racismo fica dependendo da subjetividade de quem a faz. Convenhamos, isso é muito pouco para embasar uma acusação, ainda mais uma tão séria (e eu acho seriíssima). Se a única prova de racismo é ter sido olhado de esguela ou destratado numa loja, ou barrado num banco, isso prova apenas que o Brasil não é a África do Sul do apartheid, concorda comigo?

Mais uma coisa: qual o critério usado para dizer que 2% (ou 1%, ou 10%, ou 60%...) do "casting" de telenovelas e seriados da "mídia" é de "negros" (ainda mais num país de miscigenados)? Seria o mesmo critério "científico" das cotas raciais, ou seja, a auto-declaração? Ainda que exista tal coisa, como é que se faria para determinar quem é e quem não é "negro"? E se o comercial ou o seriado exigir, ao contrário, atores e figurantes "negros" (um seriado sobre a escravidão no século XIX, por exemplo)? Poder-se-ia falar, nesse caso, de racismo contra "brancos", "pardos" ou "amarelos"?

Quanto ao resto do comentário, sobre as cotas serem ou não um paliativo, creio que já respondi ao Alberto sobre o mesmo assunto. Acrescento apenas que qualquer solução que não leve em conta o princípio da igualdade juridica dos cidadãos não pode ser considerada válida. Além de serem inconstitucionais, as cotas oficializam a desigualdade, não a igualdade (e pelo pior critério que existe: o da "raça"). Não têm nada a ver com justiça, mas com privilégios. É o mesmo que matar o doente para acabar com a doença.

Por isso que está aí em cima, aproveito para reafirmar o que disse: não somos racistas. Os militantes racialistas, que querem instalar a divisão da sociedade em raças, sim.

quinta-feira, dezembro 30, 2010

O CLUBE DOS RESSENTIDOS


Quando eu era criança, no final dos anos 70, não perdia um episódio do Sítio do Pica-Pau Amarelo. O seriado da Rede Globo foi meu primeiro contato com a obra de Monteiro Lobato, o genial escritor paulista que encantou e alimentou a imaginação de gerações de brasileiros, com um universo abertamente anárquico (burros falantes e leitões como marqueses, entre outras transgressões ao gosto tradicional) e uma síntese ousada de folclore caipira e mitologia grega. Um oásis de vida inteligente em meio ao deserto de mediocridade imperante na televisão, o Sítio abriu as portas, para muita gente, da literatura clássica e para as delícias do conhecimento. Graças a ele e a seu autor, Teseu e o Minotauro, Dom Quixote e Cervantes, tornaram-se para mim personagens tão familiares quanto Dona Benta e o Visconde de Sabugosa, Emília e o Saci-Pererê. Graças a isso, minha infância não foi totalmente desperdiçada em peladas de várzea e em brincadeiras idiotas, tendo sido, em vez disso, povoada por uma chispa de inteligência. Na era pré-videogame e pré-internet, o Sítio era minha Disneyworld, e Lobato era meu Nintendo, era meu Playstation.

Pois não é que apareceu um burocrata (ou melhor: um burrocrata) no governo federal dizendo que Monteiro Lobato, o autor de Reinações de Narizinho, é um escritor perigoso, impróprio para crianças? Pior: era um "racista"? Isso por causa de algumas frases consideradas ofensivas (como é sensível esse pessoal!) pela patrulha politicamente correta incrustrada na máquina governamental desde há oito anos, sobre a empregada negra da Dona Benta, a simpática Tia Nastácia. Monteiro Lobato, o racista odioso, não deve ser lido nas escolas, decretaram os vigilantes da cultura e da correção politica. Monteiro Lobato, o membro da Ku Klux Klan, deve ser expulso da cultura brasileira, decidiram os sábios.

A censura à obra de Monteiro Lobato é uma dessas coisas só possíveis de acontecer em épocas de rebaixamento intelectual e embrutecimento mental como a que estamos atravessando. É o retrato de uma Era. Classificar Monteiro Lobato por supostas ofensas aos negros em seus livros - e querer bani-lo do ensino por isso - é algo tão estúpido e tão idiota quanto querer censurar a obra de Aristóteles, Shakespeare ou Mark Twain pelo mesmo motivo. É, enfim, tentar castrar a inteligência.

Assim como o criador de O Sítio do Pica-Pau Amarelo, também sou perigoso. Também sou impróprio para cérebros infantis. Não aceito, por exemplo, os argumentos usados para justificar a introdução de cotas raciais em concursos públicos. Não vejo justificativa para dar tratamento diferenciado a candidatos a uma vaga na Universidade ou no Itamaraty, por exemplo, com base na auto-proclamada "raça" ("negro" ou "afro-descendente"). Não consigo ver isso senão como a oficialização do contrário do que se alega combater: o racismo. Toda vez que alguém entra na UnB ou no Itamaraty por causa de algum programa de cotas raciais, o Brasil fica menos parecido com o Brasil, e mais parecido com o Mississípi dos anos 50 ou com a África do Sul dos tempos do apartheid. Além do mais, quem tem raça é cachorro, como bem definiu o mulato João Ubaldo Ribeiro.
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Não vejo provas de que nós, brasileiros, somos racistas. Muito pelo contrário. Se há um país em que o conceito de raça – um conceito ideológico, não biológico, diga-se de passagem – tem pouca ou nenhuma importância, se tem um lugar em que a idéia de discriminação por raça ou pela cor da pele é algo completamente estranho à cultura nacional, é o Brasil. Se duvidam disso, leiam Casa-Grande & Senzala, de Gilberto Freyre (livro que muitos, principalmente os que não o leram, odeiam).
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Há quem veja, na tentativa absurda – e burra – de atrelar Monteiro Lobato aos dogmas da militância racialista – esta, sim, racista, pois enxerga o Brasil dividido em raças, como se aqui não tivesse havido mistura racial -, um simples "excesso" de pessoas no fundo bem-intencionadas, uma distorção de uma causa justa. Nada mais falso. O Brasil é um país cheio de defeitos, mas, se tem um que, felizmente, ninguém, muito menos os brasileiros, pode dizer que temos é que seríamos racistas. Aqui, nunca houve (pelo menos até agora nunca houve) o que foi regra nos países anglo-saxões – a segregação racial, a separação total – física, jurídica, cultural – entre as raças. Pelo contrário, o colonizador português, ele mesmo muito pouco "puro" racialmente falando (era o produto de séculos de mistura entre europeus, judeus e africanos, via dominação muçulmana), entregou-se gostosamente e sem preconceitos ao esporte priápico do cruzamento com índias, negras, caboclas, mulatas e cafuzas, até não sobrar nem resquício do que seria "raça". Se houve algum "excesso", por essas bandas, não foi de racismo, mas do seu contrário, ou seja: a miscigenação.

"Ah, mas e a escravidão? Os 'brancos' não têm aqui uma dívida histórica a pagar?" etc. Essa tem sido uma frase-clichê repetida ad nauseam pelos militantes racialistas, e por muitos ingênuos que caíram na deles (sem falar nos espertalhões em busca de uma grana dos trouxas que pagam impostos). Respondo com outra pergunta: Que dívida, cara-pálida? Olhem a História: a escravidão já existia na África séculos antes de o primeiro navegador português botar os pés no continente, e continua a ser praticada em terras muçulmanas, com as bênçãos de Alá e do multiculturalismo (no Sudão ela segue sendo uma realidade, e na Arábia Saudita a prática de ter escravos só foi oficialmente abolida em 1964). Milhares de europeus loiros e de olhos azuis foram escravizados por sultões turcos morenos e de olhos azeitonados (a primeira guerra que os EUA fizeram fora de seu território, no começo do século XIX, foi contra os piratas e mercadores árabes de escravos que agiam no Norte da África). Sem falar que, no Brasil, até mesmo ex-escravos, como Zumbi – o maior símbolo da "resistência negra contra a escravidão" –, eram eles mesmos donos de escravos e exploravam o tráfico escravista. Este não teve nada a ver com "raça", no sentido em que o tomam os ativistas de ONGs e movimentos racialistas – ou seja: não eram brancos escravizando negros, até porque de "brancos" os escravizadores tinham muito pouco. Sem falar que o escravismo esteve longe de caracterizar toda a sociedade colonial. Qual a "dívida" a ser paga por um descendente da oligarquia do sertão cearense, onde a presença escrava foi ínfima, para nao dizer inexistente? E qual peso deve recair na consciência de um filho ou neto de imigrantes alemães ou italianos do Rio Grande do Sul ou de Santa Catarina pela escravidão africana (a maioria dos quais chegou ao Brasil depois da Lei Áurea)? Dívida histórica? Quem vai pagar a dívida dos faraós?

A verdade é que episódios bizarros como o da censura a Monteiro Lobato refletem um fenômeno maior. Vivemos, atualmente, uma verdadeira revolução na linguagem. Miscigenação, por exemplo, virou uma palavra proibida. "Afro-descendente", ao contrário, tornou-se uma espécie de senha, uma palavra mágica capaz de mudar a realidade. Mas o que raios vem a ser "afro-descendente"? A Ciência já comprovou que os primeiros humanos surgiram na África. Logo, toda a humanidade, até mesmo o mais alvo norueguês, é afro-descendente. Dizer que essa categoria se refere unicamente aos negros ou aos descendentes de escravos africanos trazidos, a partir do século XVI, para as Américas (muitos deles vendidos por chefes de tribos inimigas aos mercadores europeus) é, portanto, um contra-senso, um absurdo lógico, e uma mentira histórica. Dizer "afro-descendente" é o mesmo que dizer "descendente de Eva". Ou seja, todos nós.

A revolução lingüística a que estamos assistindo não se restringe ao campo racial. Do mesmo modo que os militantes racialistas em relação a termos como "afro-descendente" ou "afro-brasileiro" (outra expressão que não quer dizer rigorosamente nada), será que os militantes gayzistas, que querem impor uma lei que criminaliza piadas de bichinha (a PLC 122/06), sabem do que estão falando quando acusam alguém – geralmente, alguém que não concorda com eles – de "homofóbico"? Será que têm consciência que "homofobia" simplesmente não existe? Ora, fobia é sinônimo de medo. Conheço medo de avião, medo da morte, medo de barata, medo do escuro. Medo de quem é homossexual, não, nunca ouvi falar. Há quem não goste de gays e, inclusive, bata neles? Certamente que sim, principalmente garotões inseguros sobre sua própria sexualidade que tentam, com isso, provar que são "machos". Ou seja: morrem de medo de dar bandeira. Não são homossexuais também?

A mesma manipulação semântica ocorre com a palavra "homoafetivo". O que é isso? Qualquer relação afetiva entre pessoas do mesmo sexo. Amizade, por exemplo, ou o amor de um irmão pelo irmão, ou de um filho pelo pai. Quem falou que "homoafetivo" se refere somente a amantes do mesmo sexo? Aqui o sequestro do vocabulário também é evidente.

Tudo isso aponta para o seguinte: a discriminação, no Brasil da Era da Mediocridade lulo-petista, não é contra negros, ou gays, ou índios, ou mulheres – é contra quem pensa diferente do resto da manada. Isso significa que o verdadeiro negro no Brasil, o judeu do Brasil de hoje, a verdadeira vítima de preconceito e perseguição, atende ao seguinte perfil: é homem, branco, de classe média (ou alta), cristão e heterossexual. E que acredita que todos são iguais perante a Lei, e não que a cor da pele ou o que se faz na cama dão a alguem direitos especiais – privilégios, em bom português.

Se os militantes de ONGs racialistas e gayzistas usassem um milésimo da sensibilidade que demonstram buscando racismo e homofobia onde isso não existe para denunciar a corrupção e as pilantragens da quadrilha lulo-petista no poder há oito anos, o governo do Capo di Tutti Capi ja teria virado poeira há muito tempo. Sem querer, os membros desse clube de ressentidos repetem outro personagem de Monteiro Lobato: o Jeca Tatu. Se estivesse vivo, o criador de Dona Benta certamente perceberia pouca diferença entre o Brasil de hoje e a Botocúndia.