terça-feira, outubro 23, 2012

O DIA EM QUE FIDEL CASTRO QUASE DESTRUIU O MUNDO

Há exatos cinquenta anos, o mundo quase acabou.
 
Quem conhece um pouco de História sabe que não exagero. Em outubro de 1962, as duas superpotências da época, os EUA e a finada URSS, encararam-se na Crise dos Mísseis em Cuba, que por pouco – muito pouco mesmo –, não levou a uma guerra nuclear, o que significaria a destruição de toda a vida no planeta. Foi simplesmente a maior confrontação da história da humanidade.
 
Tudo começou quando o então premiê da extinta URSS, Nikita Krushev, decidiu enviar algumas dezenas de mísseis balísticos nucleares (e, soube-se depois, alguns milhares de tropas) para a ilha de Cuba, situada a apenas 120 quilômetros da Flórida. Seu objetivo era, a pretexto de proteger o regime castrista – que havia rompido com os EUA e sido alvo de uma tentativa fracassada de invasão na Baía dos Porcos, em 1961 –, alterar o equlíbrio nuclear na Guerra Fria, a favor da URSS. A operação, altamente secreta, foi descoberta pelos aviões espiões norte-americanos (os U2), que sobrevoavam a ilha.
 
Seguiram-se treze dias em que a própria sobrevivência da espécie humana esteve por um fio. O então presidente dos EUA, John Kennedy, pressionado para declarar guerra, decidiu instalar uma quarentena militar em volta da ilha. Nos EUA, milhares de pessoas, já esperando o pior, corriam para estocar alimentos em abrigos subterrâneos. Os líderes soviéticos pareciam inflexíveis. Nunca o mundo esteve tão perigosamente próximo do Apocalipse (leiam Um Minuto para a Meia-Noite, de Michael Dobbs, para saberem em detalhes sobre o que estou falando).
 
Felizmente, as mentes racionais, que sempre são minoria, acabaram predominando, e prevaleceu o bom-senso: em um acordo secreto, Krushev concordou em retirar os mísseis de Cuba, em troca da promessa de Kennedy, fielmente cumprida, de que não invadiria a ilha caribenha (de bônus, recebeu a retirada de mísseis obsoletos norte-americanos da Turquia). O mundo respirou aliviado. Provavelmente foi graças à essa decisão que você está agora lendo estas linhas.
 
Momento culminante da Guerra Fria, a Crise dos Mísseis (ou Crise de Outubro) marcou para sempre a História do século XX, inaugurando a política de "détente" (ou contenção) entre Washington e Moscou, que perdurou ate o fim da URSS, em 1991. Paralisadas pelo terror suscitado pela perspectiva de aniquilamento mútuo em uma guerra nuclear, as duas superpotências nunca ousariam enfrentar-se em um confronto direto. Jamais o mundo seria o mesmo desde então.
 
Muito se fala sobre o papel de Kennedy e de Krushev na crise, mas geralmente se deixa em segundo plano um ator fundamental: Fidel Castro.
 
O líder cubano, então um jovem revolucionário de 36 anos, tomara o poder em 1959 à frente de uma revolução popular que empolgara o mundo, prometendo democracia para a ilha. Em poucos meses, mandou as promessas democráticas às favas, transformando-se num ditador. Nesse caminho, aproximou-se dos comunistas, que antes desprezava (e que o desprezavam), tornando-se, numa manobra que desnorteou a muitos, aliado da URSS, instaurando o único regime marxista do Ocidente. Foi a seu convite que Krushev, interessado, em suas próprias palavras, em "colocar uma marmota nas calças de Tio Sam", tomou a decisão mais perigosa de sua vida (e que certamente contribuiu para sua queda, em 1964).
 
Fidel Castro pensava bem diferente de Kennedy e de Krushev. Tanto que, dizem, ao saber da decisão deste último de retirar os mísseis de Cuba, sem o seu consentimento, ficou furioso e quebrou um espelho a pontapés. "Nikita, mariquita, lo que se da no se quita", passou a ser um slogan gritado, nos anos seguntes, por claques amestradas em manifestações de apoio ao regime castrista.
 
Qual foi o papel de Castro na Crise? Até hoje os cubanos, submetidos à mais estrita censura, não sabem, e muitos fora de Cuba, que ainda têm uma imagem romântica do ditador cubano – geralmente os mesmos que consideram Cuba um exemplo de democracia... –, tampouco sabem ou querem saber. Mas o fato é que o líder cubano era abertamente a favor do confronto com os EUA, mesmo que isso resultasse na destruição total de Cuba – e do planeta – em um holocausto nuclear. Fidel Castro, o humanista, não queria a paz. Queria a guerra. Queria o fim do mundo.
 
É o próprio Krushev quem diz. Em sua autobiografia, o dirigente soviético afirma que (os grifos são meus)
 
“Castro sugeriu que a fim de impedir a destruição dos nossos mísseis, nós os usássemos contra os Estados Unidos num golpe preventivo. Achava que um ataque americano era inevitável e que cumpria que nos antecipássemos a ele. Em outras palavras: tínhamos de lançar imediatamente um ataque com mísseis nucleares contra os Estados Unidos. [...] Ficou claro para nós que Fidel Castro não havia entendido os nossos propósitos. (KHRUSHCHEV, Nikita, As fitas da glasnost: memórias de Khrushchev, São Paulo, Siciliano, 1991, p. 224)

Pois é. Muito antes de George W. Bush, Fidel Castro já defendia um "ataque preventivo". E contra os EUA. E com armas nucleares...

Posteriormente, como é de seu feitio, Castro tentou negar que tivesse feito semelhante proposta, cujo resultado inevitável seria a deflagração de uma guerra nuclear de proporções inimagináveis. Em sua primeira visita à URSS, em 1963, Castro encontrou-se com Krushev. Na ocasião, os dois tiveram o seguinte diálogo, narrado por Krushev em suas memórias:
 
[Krushev, dirigindo-se a Fidel] Eu disse a ele: “Você queria iniciar uma guerra com os Estados Unidos. Por quê? Afinal, se uma guerra começasse, nós teríamos sobrevivido, mas Cuba provavelmente não mais existiria. Seria pulverizada. Mas você estava propondo que fizéssemos um ataque preventivo!”
Ele disse: “Não, eu nunca propus isso.”
Eu disse: “Como você pode dizer que nunca o propôs?”
O intérprete falou: “Fidel, Fidel, você me falou pessoalmente sobre isso.”
Fidel novamente insistiu: “Não!”
Então começamos a procurar os documentos. É uma coisa boa que Fidel não tenha feito essa declaração apenas oralmente, mas nos enviou um documento escrito.
O intérprete mostrou-o a ele: “Como você interpreta esta palavra aqui? Não significa guerra? Um ataque nuclear?”. (KHRUSHCHEV, Sergei (ed.), Memoirs of Nikita Khrushchev, v. 3: statesman, 1953-1964, Providence, RI: Watson Institute; The Pennsilvannia State University Press, 2007, p. 348)
 
A memória de Castro realmente era falha. Em mensagem a Krushev, datada de 27 de outubro de 1962, assim ele expressou, de forma dramática, seu descontentamento com a decisão soviética de retirar os mísseis da ilha:
 
“Muitos olhos de homens, cubanos e soviéticos... dispostos a morrer com suprema dignidade, verteram lágrimas ao conhecer a decisão surpreendente, inesperada e praticamente incondicional, de retirar as armas... Nós sabíamos – não presuma que ignorávamos – que haveríamos de ser exterminados, no caso de estalar a guerra termonuclear. Contudo, nem por isso lhe pedimos que cedesse [...] Entendo que não se deve conceder aos agressores o privilégio de decidir, ainda mais quando há de se usar a arma nuclear... E não sugeri ao senhor, camarada Krushov, que a URSS fosse agressora, porque isso seria algo mais que incorreto... imoral e indigno de minha parte, mas que, desde o instante em que o imperialismo atacasse... as forças armadas destinadas à nossa defesa... respondessem com um golpe aniquilador...”. (citado em FURIATI, Claudia, Fidel Castro, uma biografia consentida, tomo II – do subversivo ao estadista, São Paulo: Record, 2002, p. 133)
 
O recentemente falecido historiador marxista inglês Eric Hobsbawn certa vez declarou em entrevista que não se importaria se morressem 15 ou 20 milhões de pessoas se fosse para construir um "amanhã radiante" socialista. O ditador cubano também não via problema algum em exterminar milhões de pessoas, ainda que o resultado disso fosse amanhã nenhum. Cada vez entendo mais por que Hobsbawn era fã de Fidel Castro.

Hoje um ancião decrépito, dedicado a desmentir boatos sobre sua morte, Fidel Castro pouco lembra o ardoroso revolucionário disposto a sacrificar a vida de milhões de seres humanos em uma hecatombe nuclear. Muitos – e isso é o mais surpreendente – ainda o vêem como um símbolo humanista de resistência e líder de um regime vítima de agressão. Mal sabem que, se dependesse daquele velhinho de barbas brancas, sequer estaríamos aqui para contar a história. Se o mundo não é hoje um monte de cinzas, certamente não é por vontade de Fidel.

segunda-feira, outubro 22, 2012

JOAQUIM BARBOSA E O RACISMO PETISTA

Quando Lula nomeou Joaquim Barbosa para ser ministro do STF, o PT acreditava que ele, por ser negro, estaria afirmando as políticas raciais do governo e que seria, ao mesmo tempo, um instrumento dócil a serviço do projeto de poder lulopetista.

Agora que o julgamento do Mensalão mostrou que Joaquim Barbosa, ao contrário do que esperava o PT, é um juiz de verdade, e não um militante, os petistas estão furiosos com ele. Isso porque acreditam que, por o terem "colocado lá", ele lhes deve favores. E o estão cobrindo de insultos e ofensas racistas na internet.

Trocando em miúdos: quando Joaquim Barbosa foi nomeado, era o "primeiro ministro negro do STF". Agora, é o "negro traidor", pois se recusou a fazer o papel de jagunço do lulopetismo.

Conclusão1: Assim como fizeram no Congresso com o Mensalão, os petistas tentaram acabrestar o STF. Desta vez, com a arma racial. Mas quebraram a cara.

Conclusão2: Negro bom, para os petistas, é negro que dá a pata.

Ou seja: além de CORRUPTOS, são RACISTAS.

Sem mais, meritíssimo.
***
Em tempo, que fique claro: Joaquim Barbosa merece meu respeito e meu aplauso. Mas não o vejo como um "herói". Não é herói quem simplesmente cumpre seu dever. E ao mandar os mensaleiros para a cadeia os juízes do STF estáo cumprindo suas funções. Nada mais do que isso.

Essa mania dos brasileiros de aclamar heróis de tempos em tempos, seja na política, seja no esporte, é reveladora de um traço cultural nosso, um certo messianismo, um caudilhismo - e, nesse caso, da fragilidade institucional do país. A frase é verdadeira: triste do país que precisa de heróis.

Além disso, Joaquim Barbosa é merecedor de respeito por seu passado, não porque é negro e "veio de baixo", mas porque soube superar as dificuldades e estudou para ser o que é - ao contrário de um certo Apedeuta, que, ao contrário da lenda, não o fez porque não quis. Mesmo assim, muita gente, branca, negra ou cor-de-rosa, veio da pobreza e delas eu não compraria um carro usado. Origem pobre e cor da pele não são atestados de honestidade. Aliás, não são atestados de nada.

Não gosto de heróis. O Brasil não precisa deles, sejam falsos ou verdadeiros. Só precisa que se cumpra a lei. E de vergonha na cara. Já seria de bom tamanho.

sábado, outubro 13, 2012

HOBSBAWN E A ERA DOS IDIOTAS

Está circulando na internet um troço curioso. Trata-se de um texto-manifesto, assinado por uma certa ANPUH (Associação Nacional de Professores de História), da qual eu, apesar de graduado em História, nunca tinha ouvido falar - e da qual, pelo que segue, orgulho-me de não ser sócio.

É uma resposta (ou deveria ser) ao obituário publicado na revista VEJA do historiador inglês Eric Hobsbawn, falecido no dia 1 de outubro aos 95 anos de idade. Os senhores da tal ANPUH se mostram indignados pelo que consideram um tratamento desrespeitoso dado pela revista ao historiador marxista inglês, uma das vacas sagradas da intelligentisia esquerdista mundial e, por tabela, brasileira - o que significa: um autor obrigatório nas universidades brasileiras, sobretudo para quem não conhece outro autor e acredita que a historiografia marxista é a única existente.

O texto é um típico produto coletivo de mentes que só sabem pensar coletivamente (ou seja: que não sabem pensar). Tanto que seus autores, na ânsia de darem uma "resposta" a quem teve a ousadia de criticar um de seus ídolos (um crime, enfim, de lesa-santidade), parecem esquecer-se de fatos básicos, fundamentais. O que apenas reforça minha convicção de que os esquerdistas são guiados por um misto de cegueira voluntária e amnésia. E por nenhum senso do ridículo.

Fiz questão de transcrever o texto na íntegra. Vai em vermelho. Meus comentários vão em preto.  

ANPUH- RESPOSTA À REVISTA VEJA

09/10/2012

Eric Hobsbawm: um dos maiores intelectuais do século XX

Na última segunda-feira, dia 1 de outubro, faleceu o historiador inglês Eric Hobsbawm. Intelectual marxista, foi responsável por vasta obra a respeito da formação do capitalismo, do nascimento da classe operária, das culturas do mundo contemporâneo, bem como das perspectivas para o pensamento de esquerda no século XXI. Hobsbawm, com uma obra dotada de rigor, criatividade e profundo conhecimento empírico dos temas que tratava, formou gerações de intelectuais.

Não se discute que Hobsbawn foi um historiador de talento, dotado de inteligência. Falo sobre isso depois. Tampouco está em questão sua influência sobre gerações de intelectuais. O debate é outro, como se verá adiante.

Ao lado de E. P. Thompson e Christopher Hill liderou a geração de historiadores marxistas ingleses que superaram o doutrinarismo e a ortodoxia dominantes quando do apogeu do stalinismo.

Nem tanto. Hobsbawn, se procurou distanciar-se do stalinismo, depois da denúncia dos crimes de Stálin feita por Kruschev em 1956, não teve a coragem e a ousadia de abandonar o barco do comunismo nos anos seguintes. Pelo contrário: até intensificou sua militância comunista, recusando-se a criticar abertamente a URSS e justificando os milhões de assassinatos de Stálin, como veremos em seguida. Ele sempre se manteve no campo marxista, dando "apoio crítico" ao Kremlin e considerando os EUA "a maior ameaça à humanidade". Nos últimos tempos, não cansava de elogiar Lula como um exemplo de governante marxista.

Deu voz aos homens e mulheres que sequer sabiam escrever. Que sequer imaginavam que, em suas greves, motins ou mesmo festas que organizavam, estavam a fazer História. Entendeu assim, o cotidiano e as estratégias de vida daqueles milhares que viveram as agruras do desenvolvimento capitalista.

Para começar, a função do historiador, como a de qualquer intelectual, não é "dar voz aos excluídos", ou, como está acima, "aos homens e mulheres que sequer sabiam escrever". Ele pode até fazer isso, mas como militante político, não como um investigador, que deve ter como único compromisso a realidade dos fatos. E a realidade da História é que as "agruras do desenvolvimento do capitalismo", ao contrário do que diz o texto, levaram à melhoria das condições gerais de vida dos trabalhadores em todos os países capitalistas europeus, conforme demonstraram, com dados e números inquestionáveis, estudiosos sérios como Ludwig von Mises (ver o seu As Seis Lições, se quiserem tirar a prova).

Mas Hobsbawm não foi apenas um "acadêmico", no sentido de reduzir sua ação aos limites da sala de aula ou da pesquisa documental. Fiel à tradição do "intelectual" como divulgador de opiniões, desde Émile Zola, Hobsbawm defendeu teses, assinou manifestos e escolheu um lado. Empenhou-se desta forma por um mundo que considerava mais justo, mais democrático e mais humano.

Aqui há uma falsidade disfarçada de verdade biográfica: Hobsbawn foi sim, além de historiador, um militante - ou um "divulgador de opiniões". Mas de maneira nenhuma essas se enquadram numa perspectiva fiel à tradição intelectual de autores como Émile Zola - Hobsbawn era comunista, Zola era um liberal e um democrata, um defensor da tolerância, famoso pela defesa do capitão Dreyfus no final do século XIX. Aliás, Hobsbawn, judeu como Dreyfus, assinou manifestos e participou de passeatas a favor do nacionalismo palestino (na época em que este sequer reconhecia o direito de Israel à existência). Aproximou-se, assim, portanto, muito mais dos detratores antissemitas de Dreyfus do que de Zola e outros paladinos da liberdade de imprensa. Algo, aliás, inexistente na defunta URSS, que Hobsbawn sempre tratou com simpatia em seus livros, como um paradigma daquilo que ele considerava um mundo "justo, democrático e mais humano"... Nada mais longe da verdade.

Claro está que, autor de obra tão diversa, nem sempre se concordará com suas afirmações, suas teses ou perspectivas de futuro. Esse é o desiderato de todo homem formulador de ideias. Como disse Hegel, a importância de um homem deve ser medida pela importância por ele adquirida no tempo em que viveu. E não há duvidas que, eivado de contradições, Hobsbawm é um dos homens mais importantes do século XX.

Deixando de lado o português arrevesado - isso de escrever "desiderato"... -, a frase de Hegel, no contexto em que está colocada, não significa rigorosamente nada: Napoleão, Hitler, Lênin e Stálin foram importantes no tempo em que viveram, e isso não acrescenta ou retira absolutamente nada do significado de suas ações. O que está em questão não é a importância de Hobsbawn - ele foi, sim, um historiador importante -, mas o valor de suas idéias. Ou, melhor dizendo: a moralidade delas.

Eis que, no entanto, a Revista Veja reduz o historiador à condição de "idiota moral" (cf. o texto "A imperdoável cegueira ideológica da Hobsbawm", publicado em www.veja.abril.com.br). Trata-se de um julgamento barato e despropositado a respeito de um dos maiores intelectuais do século XX.

Aqui, finalmente, entramos na questão principal. Vejamos quão "barato" e "despropositado" é o julgamento da revista sobre Hobsbawn.

Veja desconsidera a contradição que é inerente aos homens. E se esquece do compromisso de Hobsbawm com a democracia, inclusive quando da queda dos regimes soviéticos, de sua preocupação com a paz e com o pluralismo.

Pelo menos o texto reconhece que Hobsbawn tinha contradições... Mas somente para, logo em seguida, incorrer na maior das contradições, ao afirmar que o marxista Hobsbawn tinha uma compromisso com a democracia (!). Ora, de que democracia os autores do manifesto estão falando? Se é das "democracias populares" do Leste Europeu ou da ex-URSS, então acertaram em cheio. Mas não da democracia liberal, da democracia tal qual a conhecemos, com alternância de poder, eleições livres e liberdade de associação e de expressão, a qual Hobsbawn, como todo bom marxista, dedicava um desprezo solene, tachando-a de "burguesa". E isso mesmo após a queda dos regimes soviéticos, ao contrário do que está dito acima. Preocupação com a paz e com o pluralismo? Qual pluralismo existia na finada URSS? Existe tal coisa na moribunda ditadura cubana (que Hobsbawn admirava)? Uma coisa é a contradição que é inerente a todos os homens. Outra, é a idiotice moral de justificar a morte de milhões de seres humanos em nome do que quer que seja. 

A Associação Nacional de História (ANPUH-Brasil) repudia veementemente o tratamento desrespeitoso, irresponsável e, sim, ideológico, deste cada vez mais desacreditado veículo de informação.

A tal ANPUH considera desrespeitoso e irresponsável (!?) chamar Hobsbawn, por sua posição esquerdista pró-URSS, de idiota moral. E investe contra o mensageiro e não a mensagem. Deixando de lado o ódio da esquerda brasileira ao "cada vez mais desacreditado veículo de informação" - ódio que se estende aliás a todo e qualquer órgão de imprensa que não esteja sob seu controle -, devo dizer que, a meu ver, a denominação de idiota moral para referir-se a Hobsbawn não lhe faz justiça. Isso porque, ao contrário do que afirma a revista, ele não era um idiota. Idiota é quem não sabe o que faz. E Hobsbawn sabia. Ao se negar a criticar a URSS e ao justificar o morticínio de milhões de pessoas em nome de "um mundo melhor", ele mostrou mais que idiotice: mostrou cumplicidade moral com o terror e com a barbárie. Se ele fosse um idiota, desses de babar na gravata, seria melhor para ele: seria um álibi. Portanto, a VEJA foi até boazinha com ele...

O tratamento desrespeitoso é dado logo no início do texto "historiador esquerdista", dito de forma pejorativa e completamente destituído de conteúdo. E é assim em toda a "análise" acerca do falecido historiador.

Em primeiro lugar, o tratamento de "historiador esquerdista" (na verdade, "comunista"), não é dado pela revista, mas por outro historiador eminente, o igualmente britânico e também recentemente falecido Tony Judt. Este, citado no texto da VEJA, advertira Hobsbawn em 2008 que, com sua insistência ideológica em tratar de forma benigna a ex-URSS, ele seria lembrado pela posteridade não como "o" historiador, mas como "o historiador marxista" (ou "comunista"). E, de fato, foi isso que Hobsbaw sempre foi, e jamais escondeu que fosse.

Nós, historiadores, sabemos que os homens são lembrados com suas contradições, seus erros e seus acertos. Seguramente Hobsbawm será, inclusive, criticado por muitos de nós. E defendido por outros tantos. E ainda existirão aqueles que o verão como exemplo de um tempo dotado de ambiguidades, de certezas e dúvidas que se entrelaçam. Como historiador e como cidadão do mundo. Talvez Veja, tão empobrecida em sua análise, imagine o mundo separado em coerências absolutas: o bem e o mal. E se assim for, poderá ser ela, Veja, lembrada como de fato é: medíocre, pequena e mal intencionada.

São Paulo, 05 de outubro de 2012

Diretoria da Associação Nacional de História

ANPUH-Brasil

Gestão 2011-2013

Sempre desconfiei de textos escritos na primeira pessoa do plural, ainda mais referentes a toda uma categoria profissional ("Nós, historiadores"). Como se todos os historiadores estivessem representados etc. Mas deixa pra lá. É curioso como, ao mesmo tempo em que afirmam, corretamente aliás, que "os homens são lembrados com suas contradições, seus erros e seus acertos", os autores do manifesto buscam isentar Hobsbawn de qualquer julgamento crítico. Como se ele, Hobsbawn, estivesse acima de qualquer análise que não fosse hagiográfica - em outras palavras: acima do bem e do mal. E isso ao mesmo tempo em que caem num relativismo fácil, negando a própria validade de conceitos como bem e mal, vistos como categorias absolutas, mais em termos teológicos do que históricos ou ideológicos. (Menos, claro, se for para atacar o "imperialismo ianque" ou a besta-fera do capitalismo, mas já desisti de tentar explicar para esse pessoal que o capitalismo não é um jogo de soma zero.) 

Basta fazer um pequeno exercício para desmontar essa falácia. Imaginem se um historiador se propusesse a escrever "a" História do século XX e que, ao fazê-lo, denunciasse acerbamente os crimes do comunismo mas evitasse, de propósito, qualquer menção ao nazi-fascismo. Seria chamado, no mínimo, de intelectualmente desonesto. Agora imaginem que esse mesmo historiador fizesse declarações nas quais buscasse justificar os crimes de Hitler e de Mussolini. Algum dos signatários do manifesto da ANPUH se oporia a que se criticasse tal historiador, no mínimo como cúmplice moral dos crimes do totalitarismo nazi-fascista? Quem, em vez disso, acusaria o crítico de não levar em conta as contradições e ambiguidades do historiador, considerando a condenação moral deste como uma visão "medíocre, pequena e mal-intencionada"?

Mas deixemos que o próprio Hobsbawn responda essa questão. No artigo da VEJA, do qual o manifesto dos "historiadores" é, supostamente, uma réplica, há o relato de um episódio que os autores da "resposta" estranhamente não citam. E que apenas aumenta minha certeza de que os devotos brasileiros de Hobsbawn realmente mal e mal conhecem o pensamento e a obra do autor. Eis o episódio, uma entrevista dada em 1994 por Hobsbawn ao jornalista da BBC Michael Ignatieff (conforme relatado pelo historiador britânico Robert Conquest, autor do clássico O Grande Terror):

Segundo o historiador, o Grande Terror de Stalin [mais de 20 milhões de mortos apenas na principal de três ondas, fora outros milhões de mortes fora dos Expurgos] teria valido a pena caso tivesse resultado na revolução mundial. Ignatieff replicou essa afirmação com a seguinte pergunta: “Então a morte de 15, 20 milhões de pessoas estaria justificada caso fizesse nascer o amanhã radiante?” Hobsbawm respondeu com uma só palavra: “Sim”.

Este era Hobsbawn. O verdadeiro Hobsbawn. Aquele que em nenhum momento aparece no manifesto da ANPUH.

Não pensem vocês que não reconheço, na obra de Hobsbawn, qualidades, inclusive literárias. Entre suas obras, estão livros interessantes como A Era das Revoluções, A Era do Capital e a A Era dos Impérios (A Era dos Extremos, que trata do "breve século XX" [1914-1991], é o mais fraco da série, por razões ideológicas - Hobsbawn passa ao largo dos crimes do comunismo, como se tivessem sido uma nota de rodapé). Mesmo obras como Bandidos, se foram pioneiras em suas áreas de pesquisa, por enfocar temas até então relegados a um plano secundário pela historiografia tradicional, trazem consigo um forte ranço ideológico (no caso, a tese marxista do "banditismo social", que trata criminosos como "rebeldes primitivos" em luta contra uma ordem social injusta etc.).  Ele certamente foi um grande historiador e um intelectual importante, que não se rebaixava à condição de panfletário produtor de agitprop. Não era um agitador vulgar, como Noam Chomsky, ou um filósofo de quinta, como Slavoj Zízek. Mas, sinto dizer, ele foi, assim como estes, um idiota moral. A exemplo de intelectuais e figuras proeminentes da esquerda, como Jean-Paul Sartre, José Saramago e Gabriel García Márquez, que não quiseram ou não foram capazes de deixar suas preferências ideológicas e seus preconcentos anticapitalistas e antiamericanos fora de suas análises, Hobsbawn justificou o terror stalinista.  Flertou, para dizer o mínimo, com uma das faces do Mal. Talvez a pior de todas.

Hobsbawn foi um historiador inteligente, mas colocou a sua inteligência a serviço de um projeto totalitário que deixou mais de 100 milhões de mortos no século XX. E se recusou a fazer uma autocrítica consistente. Seu talento e capacidade acadêmica apenas aumentam sua culpa. E ainda há quem escreva manifestos defendendo (ou omitindo) essa sua atitude. Enfim, isso sim, uma visão pequena, medíocre e mal-intencionada. Coisa de idiotas.

terça-feira, outubro 09, 2012

CINISMO OU LOUCURA?


Tive a sorte (ou o azar) de nascer numa cidade e num estado onde o PT jamais chegou ao poder. Digo sorte e azar ao mesmo tempo porque, se por um lado isso me livrou de sentir na pele as "maravilhas" do "jeito petista de governar" (como o aparelhamento do Estado pelo partido e a roubalheira desenfreada "em nome dos trabalhadores"), por outro lado permitiu a eles - os petistas de lá - terem a caradura de ainda posar de “éticos” e “contra tudo isso que está aí”, repetindo o mesmíssimo discurso petista de antes do mensalão. Ofendendo a inteligência e abusando, assim, da paciência alheia.

Isso mesmo. Ainda há petistas que enchem a boca para falar de ética... e sem ruborizar.

De tanto ver esse pessoal se lamuriando após perder nas urnas, já identifiquei um padrão. E posso dizer com certeza: petista não sabe perder. Nem o que é democracia.

Basta atentar para o seguinte (onde o partido não venceu, ou onde ainda é minoria):

- Culpam sempre a "ignorância do eleitor" (como se o único "voto consciente" fosse o dado a eles, petistas); é a velha teoria (elitista, pra variar) de que "o povo não sabe votar";

- Chamam todos – todos! – os outros candidatos de corruptos (logo quem...); é a velha ladainha do "ninguém presta, só eu" (lembram?);

- Quando não contestam a legitimidade do resultado – a única eleição válida, para eles, é a que ganham –, lamentam não terem conseguido derrotar o "poder econômico" (justo o PT, que se aliou com Maluf nessas eleicões...).

Tudo isso para não terem de reconhecer o óbvio: o povo não os quis (isso eles não podem aceitar, pois afinal eles são a "vontade do povo"...).

Enfim, um comportamento claramente antidemocrático (a democracia existiria apenas para que eles, petistas, cheguem ao poder).

O mesmo se aplica aos demais partidos autoproclamados de esquerda (PSOL, PSTU etc.).

Este ano os petistas tomaram uma surra nas capitais que já governaram, como Porto Alegre (RS) e Belo Horizonte (MG) - locais visitados durante a campanha, coincidência ou não, pela presidenta-gerenta. Sem falar em Recife (PE), onde o vexame foi ainda maior. É que nesses lugares os eleitores já conhecem o PT, e portanto ficou mais dificil manter a pose de contestadores e inimigos do "sistema". Já nas cidades em que sempre foram um poder marginal (e não "marginais do poder", como disse o ministro Celso de Mello, do STF), a máscara de bons-moços ainda não caiu, e ainda há gente ingênua ou desmiolada o suficiente para levá-los a sério. 
 
Realmente, ganhando ou perdendo, a cara de pau - ou a loucura - da petralhada não tem limites. Enquanto houver tolos, haverá petistas.

domingo, outubro 07, 2012

PERGUNTAR NÃO OFENDE...

Luiz Inácio Lula da Silva chefiou o maior esquema de corrupção da História do Brasil - a condenação dos mensaleiros no STF tornou esse fato inegável e impossível de esconder. Marcos Valério e o advogado de Roberto Jefferson deixaram claro que ele, Lula, não somente sabia de tudo como foi o chefe da quadrilha - José Dirceu, José Genoíno e Delúbio Soares foram apenas os executores, paus-mandados a seu serviço.

Luiz Inácio Lula da Silva, enquanto esteve na Presidência da República, afrontou acintosamente, e de forma quase diária, a Justiça, ao descumprir inúmeras vezes a legislação eleitoral, usando e abusando da máquina do Estado para fazer campanha para seus apaniguados. 

Luiz Inácio Lula da Silva recebeu do representante das FARC no Brasil, segundo denúncia da revista VEJA (jamais refutada), oferta de 5 milhões de dólares para sua campanha à Presidência em 2002. Três anos depois, a mesma revista denunciou a doação ilegal de dinheiro da ditadura comunista de Cuba para sua campanha. Novamente, não foi refutada. 

Luiz Inácio Lula da Silva foi o presidente mais pró-ditaduras que o Brasil já teve, tendo escarnecido dos direitos humanos em países como o Irã, chegando ao ponto de devolver refugiados cubanos para a ilha-prisão, enquanto acolheu terroristas como Cesare Battisti. Juntamente com Hugo Chávez, Lula interveio abertamente nos negócios internos de Honduras e do Paraguai, patrocinando, nesses dois países, tentativas de golpe (enquanto chamava de golpistas os que tinham aplicado a lei). Violou, assim, a Constituição Federal, que determina expressamente que as relações internacionais do Brasil devem guiar-se pelo respeito aos direitos humanos, à paz e à soberania dos povos.

Luiz Inácio Lula da Silva estuprou a Constituição diversas vezes, ao tentar impor a censura aos meios de comunicação de forma sub-reptícia (o "controle social da mídia"), e inclusive tendo expulsado - contra a Lei - um jornalista estrangeiro por não ter gostado do teor de matéria por ele escrita (na ocasião, declarou em alto e bom som: "Foda-se a Constituição!").

Luiz Inácio Lula da Silva fez tudo para abafar o caso do assassinato em 2002 do prefeito de Santo André, Celso Daniel, que seria o coordenador de sua campanha à Presidência naquele ano. Seu chefe da Casa Civil, Gilberto Carvalho, está diretamente envolvido no caso.

Luiz Inácio Lula da Silva usou e abusou de suas prerrogativas presidenciais para favorecer amigos e correligionários, inclusive parentes, como seu filho Lulinha, que desde que o pai chegou ao poder passou de monitor de zoológico com salário de 600 reais por mês a dono de empresa milionária associada à antiga Telemar (coincidentemente ou não, depois que esta foi vendida em transação patrocinada pelo pai-presidente). 

Luiz Inácio Lula da Silva tentou chantagear um ministro do STF, tentando obter com isso o adiamento do julgamento do mensalão.

Luiz Inácio Lula da Silva, segundo documentos divulgados pelo Wikileaks, tentou extorquir dinheiro dos fabricantes do avião Rafale, na concorrência aberta pela FAB para adquirir novos jatos militares. A comissão que receberia pelo serviço seria sua "aposentadoria".   

Diante dos fatos acima - apenas uma amostra, pois há mais -, fica a pergunta:

POR QUE LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA NÃO ESTÁ NA CADEIA? (Ou, pelo menos, respondendo a processo penal?)

Com a palavra, os senhores procuradores do Ministério Público.