sexta-feira, novembro 27, 2009

DE VEXAME EM VEXAME


Olha, pode parecer que não, mas a verdade é que não torço contra a diplomacia brasileira. Nem mesmo contra a diplomacia do governo Lula, dos chanceleres Celso Amorim e Marco Aurélio Garcia. Muito pelo contrário. Apesar de o nome deste blog poder sugerir o contrário, não sou da turma do quanto pior, melhor. Adoraria ver o Brasil ocupando o espaço que merece no concerto das nações, sendo respeitado e admirado pelo resto do mundo, ao menos pela parte do mundo que presta, o mundo civilizado. Torço mesmo para que tudo aquilo que a propaganda lulista pinta sobre o aumento da influência internacional do Brasil deixe de ser o que é, apenas marketing e confete, e se torne, um dia, realidade.

É exatamente por isso - porque, acreditem ou não, sou um patriota e quero ver o nome do Brasil elevado lá fora - que eu só posso me encher de vergonha diante da sucessão interminável de vexames que vêm sendo colecionados pelo Itamaraty nos últimos anos. Se depender dos que mandam atualmente em Brasília, a política externa brasileira será lembrada, durante anos, como motivo não de orgulho, mas de chacota.

Praticamente não passa uma semana sem que o Brasil não dê apoio a um ditador, ou procure justificar sua opção pelo lado mal da humanidade, apelando para um antiamericanismo primitivo e para um terceiro-mundismo da época da brilhantina. É constrangedor.

Seria extenuante e extremamente tedioso elencar todos os fracassos da política externa lulista neste espaço. Vou apenas citar dois fiascos monumentais que ocorreram na semana que passou.

O primeiro vexame aconteceu na segunda-feira, com a visita completamente desnecessária e indesejável, sob qualquer ponto de vista, do genocida e patrocinador do terrorismo Mahmoud Ahmadinejad do Irã. Esta, além de não trazer nenhum benefício concreto ao Brasil - se é para aumentar o comércio bilateral, isso pode perfeitamente ser alcançado sem a vinda do negador do Holocausto -, serviu apenas para deixar claro que o governo Lula não dá a mínima para a democracia e os direitos humanos. Além disso, a visita expôs o megalonanismo da atual política exterior brasileira, particularmente embaraçoso diante das ofertas brasileiras de servir de "mediador" no conflito do Oriente Médio - o que, como se já não fosse absurdo o bastante pelo fato de o Irã se recusar sequer a reconhecer Israel (logo, se opõe a qualquer processo de paz na região), levou a uma das maiores saias-justas dos últimos tempos: durante a visita de Ahmadinejad, Lula, para agradar ao visitante, defendeu publicamente o programa nuclear iraniano "para fins pacíficos" - na sexta-feira, o governo brasileiro desmentiu a si próprio, abstendo-se de condenar a recusa do Irã em cooperar com a Agência Internacional de Energia Atômica, em Viena (até a China e a Rússia votaram pela condenação ao regime de Teerã). Com isso, a diplomacia tupiniquim foi exposta ao ridículo - um vexame político e moral de proporções incomensuráveis.

O segundo vexame se arrasta há cinco meses, e irá atingir o ápice no próximo domingo, dia 29/11, em Honduras. O governo Lula, pela boca do chanceler oficial Celso Amorim, declarou que não vai reconhecer o resultado das eleições presidenciais marcadas para este fim-de-semana naquele pequenino país da América Central. Motivo: considera Manuel Zelaya, o presidente deposto em 28/06 por tentar violar uma cláusula pétrea da Constituição do país, e que se encontra "hospedado" na embaixada do Brasil em Tegucigalpa, subitamente convertida em seu palanque e escritório político, o legítimo governante de Honduras, e insiste na tese de que ele foi derrubado por um "golpe de estado". Tese essa que, se conseguiu impor-se durante algum tempo após a deposição de Zelaya, por força única e simplesmente do espírito de rebanho e de um consenso forjado no seio da "comunidade internacional", só se sustenta pela ignorância mais completa sobre o que diz a Constituição hondurenha - passada a onda unanimista inicial, atiçada pela OEA do socialista José Miguel Insulza e pela ONU do sandinista Miguel D'Escoto, a razão e a simples leitura da Carta Magna hondurenha deixam claro que nada que se disse sobre Honduras é verdadeiro. Mesmo o governo Obama, que no começo engrossou o coro dos que condenaram o "golpe" e exigiram o "retorno imediato" do golpista Zelaya ao poder, percebeu que ele, Zelaya, é um encrenqueiro apoiado por Hugo Chávez e um fator de desestabilização, e que o melhor caminho para superar a crise em Honduras é garantir a realização das eleições presidenciais. Inclusive organizações importantes, como a Human Rights Foundation, reconheceram que o "golpe" que afastou Zelaya foi desfechado, na verdade, para garantir o cumprimento da Lei e preservar o estado de direito democrático. Mas o Brasil persiste no erro e, tal qual criança embirrada, encasquetou que, se Zelaya não retomar o trono, não haverá democracia. Zelaya, sim; eleições, não: esta é a fórmula da diplomacia lulo-petista para "normalizar" a situação no país.

Já escrevi bastante neste blog sobre a crise em Honduras. Provei - repito: provei - que a tese de que houve golpe em 28/06 contra Zelaya é uma fraude, uma mentira. Também provei - e desafio qualquer um a mostrar que estou errado - que o abrigo a Zelaya na embaixada brasileira contraria todas as normas e convenções internacionais, e que, ao fazê-lo, o governo Lula interveio na situação política de um país soberano, o que é uma violação da própria Constituição brasileira de 1988. Agora o governo Lula vem somar a tudo isso a infâmia, ao não aceitar a legitimidade de uma eleição democrática - cuja realização foi garantida pelo governo "golpista" que manteve o calendário eleitoral - porque quem tentou rasgar a lei maior do país não voltará ao poder. É algo de um ridículo atroz: entre a realização de eleições e a volta de um golpista à presidência, o Brasil prefere esta última. Desse modo, caminha juntamente com Zelaya para a irrelevância - exatamente o oposto do tão falado "protagonismo" brasileiro na questão hondurenha.

O mais risível nisso tudo é que a política do Itamaraty lulista para Honduras, assim como para o Irã, terá a partir de agora mais uma "justificativa", o antiamericanismo velho de guerra, tão manjado quanto idiota, uma vez que agora Obama está no lado oposto nessas duas questões. É que Obama, embora continue a ser o queridinho de Muamar Kadafi, pode até ser esquerdista, mas não é burro: ele já percebeu que apoiar Zelaya é o mesmo que dar apoio a Hugo Chávez e a suas pretensões megalomaníacas na região, além de respaldar um sujeito que diz ouvir vozes e ser vítima de raios emitidos por mercenários israelenses... Embora esquerdista e apaziguador como é, ele não quer jogar o prestígio de seu país na lama por tão pouco. Não é o caso do Brasil. Em Honduras, assim como na visita de Ahmadinejad, o governo Lula, por motivos ideológicos, psicológicos ou o que seja, não se acanha em jogar na lata de lixo a credibilidade de sua política externa. Honduras é o túmulo da diplomacia brasileira.

Como afirmei no início deste texto, não torço contra os objetivos proclamados pela política exterior de Lula e companhia, mesmo conhecendo seu caráter nitidamente ideológico. Lamento apenas que, com seus atuais protagonistas, ela traga tanta vergonha a quem ainda a tem.

Nenhum comentário: