quarta-feira, fevereiro 27, 2008

É PRECISO ENTERRAR O MITO CASTRISTA

Estou sendo particularmente prolixo em relação à "renúncia" do tirano Fidel Castro. Peço que me perdoem por essa minha fixação em um único assunto. Sei que parece obsessão de minha parte, e que isso cansa. Mas a cada dia aparece um motivo a mais para falar - mal - desse mitômano, assim como da distopia que ele impôs à sua ilha da fantasia, e que hipnotizou gerações inteiras de perfeitos idiotas latino-americanos. E não estou me referindo somente a mentes esclerosadas como Frei Betto e Oscar Niemeyer. Muita "gente boa" também se deixou e continua a se deixar enganar pelo farsante do Caribe. Além disso, acho que tenho direito a algumas obsessões.

Acabo de ler, por exemplo, um texto de um conhecido meu, dos tempos da faculdade, o Pablo Capistrano, publicado no Jornal de Hoje, de minha cidade, Natal-RN, de 23/02. O texto, bem escrito como tudo o mais que ele produz, não pode ser considerado exatamente uma apologia da ditadura castrista, nem uma crítica. A meu ver, ele exemplifica uma visão que se tornou corrente em muitas análises e reportagens, que parecem estar pisando em ovos quando tratam da ditadura cubana e de seus crimes. O autor - espero que ele não se chateie comigo por citar seu nome neste blog, mas isso é internet - busca a todo momento uma atitude "equilibrada" diante do fenômeno Fidel, longe do que chama de "trivialidades ideológicas que embotam uma visão mais transparente do papel da revolução cubana no cenário da política latino americana". Já escrevi neste blog que não acredito na possibilidade de ter uma atitude "equilibrada" e "isenta" diante de tiranos homicidas como Fidel Castro. Assim como não sei a que trivialidades ideológicas o autor se refere. Sei apenas que, se está se referindo aos 17 mil fuzilamentos e 78 mil afogados tentando fugir da ilha desde 1959, é forçoso admitir que isso constitui bem mais do que uma mera trivialidade.

O autor critica, com muita propriedade aliás, o embargo econômico dos EUA à ilha como "o maior aliado da Cuba socialista", responsável pela criação do "espectro do inimigo gigantesco, do império poderoso e continental, um Golias feito de dólares, tecnologia e petróleo, que pairava sobre a atrevida ilha de Fidel, que fortalecia o discurso do regime e ajudava a manter acesa a chama da revolução." Quanto a isso, estou de total acordo com Pablo Capistrano. O mito do Davi cubano enfrentando o Golias imperialista norte-americano, ao mesmo tempo em que atrelava a economia do país ao Golias de pés de barro soviético, é devido, em boa medida, a alguns erros da Casa Branca em relação a Cuba, e à forma extremamente malandra como Fidel Castro se aproveitou desses erros para mandar milhares para o paredón e consolidar sua ditadura. O problema é o que é afirmado em seguida: "De certo modo, era conveniente para o regime norte americano que Fidel permanecesse no poder (talvez na época da guerra fria, não, mas depois que a URSS caiu, qual o motivo para manter Cuba sob cerco? )". Concordando-se ou não com a manutenção do embargo à ilha (já cheguei a achar que era um erro, mas agora tenho minhas dúvidas a respeito), deve-se dizer que há, sim, motivo de sobra para manter Cuba sob cerco depois do fim da URSS. Pelo menos 2 milhões de motivos - o número aproximado de cubanos que fugiram da ilha-prisão desde que Fidel e seus barbudos tomaram o poder, em 1959. São esses, os chamados gusanos ("vermes", em espanhol), que pressionam o governo norte-americano para manter o embargo comercial à ilha. É gente que perdeu tudo com o regime de Fidel, muitos tiveram parentes e amigos presos e fuzilados, e sonham com o dia em que vão poder retornar à ilha em que nasceram e desfrutar de seu país em liberdade. Gente como, por exemplo, os três músicos que fugiram no final do ano passado quando em turnê em Olinda, ou os dois pugilistas que aproveitaram a vinda para os Jogos Pan-Americanos para tentar escapar para a liberdade, mas foram capturados como escravos fujões e devolvidos a seu feitor Fidel Castro pelo governo do capitão-do-mato Lula da Silva. Se eu fosse um desses cubanos desesperados, não sei se seria a favor do fim do embargo econômico a essa ditadura, ainda mais porque a dita-cuja mantém relações comerciais normais com a maioria dos países do mundo, e inclusive, de forma indireta, com os EUA, mediante os milhões enviados todo ano à ilha pelos exilados de Miami, e isso não fez a ilha avançar um milímetro em direção à democracia. Muito pelo contrário.
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"Se é espantoso que Cuba tenha permanecido sem contato oficial com a maior economia do mundo, e ainda assim tenha conseguido grandes avanços sociais, mesmo durante o colapso que arrasou a infra-estrutura da Ilha entre 1989 e 1993, mais espantoso ainda é entender como muitos jornalistas e comentaristas políticos não conseguiram entender ainda a ligação estreita que unia o regime norte americano e a revolução castrista."

A relação estreita entre os EUA e a revolução castrista, seja lá o que isso seja, é algo claro e inegável. Como claro e inegável é o fato de que a tese, amplamente difundida, de que Cuba se voltou para o lado da ex-URSS e do comunismo porque foi a isso empurrada pela política hostil e desastrada dos EUA é uma das maiores mentiras que já surgiram em todos os tempos (não sei se é isso que o autor quer dizer; espero que não). Como mentirosa é a idéia, também repetida ad nauseam, de que Cuba se tornou uma espécie de éden da saúde e da educação após a subida de Fidel ao poder (novamente, espero que não seja a isso que o autor se refere, quando fala em "grandes avanços sociais" supostamente alcançados pela ditadura cubana). Pelo contrário: Cuba era, e isso já escrevi antes, um dos países mais prósperos e desenvolvidos das Américas até os anos 50, inclusive na área social. Tinha, então, a 3a renda per capita da América Latina. Hoje, está em 29. lugar, na frente apenas do Haiti.

"Ao sustentar um embargo contra Cuba com o velho e manjado argumento dos Direitos Humanos (usado quando é politicamente conveniente) os governos norte americanos davam a Fidel força para continuar mobilizando as massas na sua ilha."

É impressionante como a propaganda castrista é eficiente. Mesmo quando acreditamos que não estamos fazendo o jogo de Fidel, acabamos reproduzindo, sem saber, suas mentiras e manipulações. Vejam a questão dos direitos humanos. A tirania castrista tem sempre pronta a resposta quando é cobrada pelos fuzilamentos e prisões de dissidentes: "Olhem os EUA" etc., etc. Desse modo, alegam - e muitos entre nós assinam embaixo - que o argumento dos direitos humanos, quando usado pelos EUA, não passa de uma conveniênia política. Não nos damos conta de que o mesmo poderia ser dito pelos defensores de ditaduras de direita em relação a seus acusadores, isto é, que estariam agindo de acordo com as conveniências da URSS etc., etc. É estranho, para dizer o mínimo, que não se veja ninguém dizendo que os defensores da anistia e das Diretas Já no Brasil nos anos 70 e 80 eram um bando de agentes de Moscou (e olha que muitos eram mesmo). Mas quando se trata dos exilados e dissidentes cubanos pedindo democracia e eleições livres na ilha-cárcere, ah!, são todos lacaios do imperialiamo ianque e mercenários a soldo da CIA... E ainda há quem queira criticar os "double standards" dos EUA nessa questão.

"Erra quem pensa que o líder cubano é uma figura simples, perpassada de uma rudimentar unidade ontológica que o liga apenas a imagem do ditador sanguinolento que os analistas do cordão da CNN costumam a passar. O ditador Fidel é uma de suas imagens. Há a do líder carismático, messiânico; a do revolucionário romântico, a do político pragmático e frio, do nacionalista arraigado a uma idéia de "cubanidade" que se uniu de forma intrínseca a idéia de revolução, com a sua figura pessoal. Há Fidel para todos os gostos e antes que o tempo construa seu julgado sobre o legado do velho líder, muitas imagens ainda vão aparecer, para banhar os sonhos, ódios e utopias dos homens."

Que Fidel Castro é uma figura-chave da História latino-americana no século XX, e que não se pode analisar a trajetória do continente sem levá-lo em conta, é um fato, não há o que se discutir. Ele é, sem dúvida, uma personagem histórica da mais alta importância, goste-se ou não dele. Exatamente como foram grandes figuras históricas Hitler, Stálin, Mao Tsé-Tung e o Aiatolá Khomeini. No entanto, não vejo ninguém - pelo menos ninguém em seu juízo perfeito - tentando de algum modo relativizar os crimes monstruosos que esses senhores cometeram, enaltecendo o "bom legado" que eles deixaram para a posteridade. Não vejo ninguém, por exemplo, dizer que há Hitlers e Stálins, assim como Francos e Pinochets, "para todos os gostos". Fidel Castro é um tirano e assassino. Isso não é uma questão de "imagem". É um fato. Eu me recuso a cultivar essa posição ambígua em relação ao ditador cubano e a seu regime criminoso.

Não é preciso ser nenhum americanófilo fanático ou pertencer ao cordão da Fox News e da CNN para perceber que Fidel Castro é um dos tiranos mais sanguinários que já pisaram sobre a terra, cujo nome merece figurar na lista dos maiores farsantes e enganadores da História. Basta um pouco de bom senso e honestidade intelectual. Se não acreditam em mim, é suficiente dar uma olhada nos números da repressão em Cuba desde 1959, fartamente documentados, e tentem refutá-los, se puderem. Se o mal provocado por Fidel Castro se restringisse ao que ele fez com a ilha de Cuba nesses últimos 49 anos, já seria algo terrível o suficiente. Mas a dimensão da tragédia castrista vai muito além do espaço territorial da ilha do Caribe e de seus 11 milhões de habitantes. Durante quase meio século, o tirano cubano e seus apoiadores trataram de construir uma lenda revolucionária que embotou os cérebros de milhares, senão milhões de pessoas em todo o mundo, especialmente na América Latina. Esse mito foi responsável pelas maiores calamidades políticas na história do continente nas últimas cinco décadas. Inclusive no Brasil, onde o golpe de 1964 foi desfechado sob a justificativa de impedir a "cubanização" do País - justificativa que, com as informações de que dispomos hoje em dia, está bem longe de ter sido um mero pretexto ou pura paranóia dos milicos.

A lenda castrista, infelizmente, não chegará ao fim com a morte de Fidel Castro. Morto este, é preciso matar o mito criado em torno de sua figura. A exemplo de outras ideologias totalitárias, como o nazismo e o stalinismo, o castrismo sobreviverá, ainda por algum tempo, ao desaparecimento de seu criador. Assim como aconteceu com outro mito que está diretamente ligado a Fidel, o de Che Guevara, a lenda criada em torno de sua personalidade persistirá por muito tempo ainda após sua morte física, pelo menos enquanto houver gente disposta a se deixar enganar. Quando soube da "renúncia" fictícia do "Coma Andante", seu amigo Lula da Silva declarou aos jornalistas que Fidel era o "único mito vivo" da atualidade. Pela primeira vez vou concordar com algo que o Apedeuta disse. De fato, Fidel é um mito vivo, mas não pelas razões que acha Lula. Fidel Castro não foi somente um tirano assassino, responsável pela destruição física e moral de seu país: é um farsante, um grande trapaceiro e mentiroso. Enfim, um mito político, que precisa ser extirpado, assim como o foram os mitos Stálin e Mao Tsé-Tung e um dia será Lula.

Não tenho o costume de citar a mim mesmo, mas não me vem à mente agora maneira melhor de terminar esse texto senão repetindo o que escrevi aqui em outro artigo. Creio que a frase seguinte resume o que penso sobre o discurso do "legado ambíguo" da ditadura cubana e de Fidel Castro:

"Tem gente que acha possível ficar neutro diante do crime e da mentira. Tem gente que prefere esconder-se detrás de um véu de ambigüidade. Tem gente que acha impossível distinguir entre o certo e o errado, a verdade e a mentira, o bem e o mal. Eu, não."

2 comentários:

pablocapistrano disse...

Pô Gustavo fico lisongeado em perceber que você escreveu tanto sobre um texto tão despretensioso e que eu particularmente ~escrevi meio que burocraticamente para preencher meu compromisso com o jornal e emitir uma opinião sobre o assunto.

não precisa se desculpar por discordar de mim nem por me citar, é até bom.

mas vamos aos pontos:

1. Confesso a você que eu não consigo ser parcial, nem radical sobre nada. Não amo, nem odéio meus objstos de análise. anos de leitura da maldita filosofia alemã fizeram seu estrago sobre mim pór isso não consigo perder a frieza quando eu vejo as discussões das dua storcidas organizadas (os pro e os contra fidel).

2. trivialidade ideologica é, para mim, satanizar fidel ou diviniza-lo. isso sim é perpetrar o mito que você quer derrubar, lembra do paraiso perdido de John Milton? Lúcifer é um anti-heroi tão fascinante quando Jesus.

3. satanizar fidel é burrice, assim com idealiza-lo. faces de uma mesma moeda e de um radicalismo que em essencia é igual.

4. a revolução americana está ligada a cubana, na jistória latino americana porque são faces de um mesmo iluminismo que gerou o liberalismo de adam smith anglo-americano e os socialismo franco-germanicos. elas aparecem com alternativas excludentes, por isso estão linkadas uma a outra de modo simbiotico.

pablocapistrano disse...

Continuando..

4. quanto a questão do embargo só há uma resposta para a manutenção desse embargo depois da queda da URSS, o interesse mútuo dos EUA e de Cuba, o embargo era vital para o regime de Cuba e atendia aos intereses da administração Bush pai e filho e Clinton, que tomaram medidas endureçendo o embargo.

5. quanto a questão dos DHs, veja Guantanamo e o que a adminstração Bush está fazendo ao rasgar a convcenção de genebra e criar uma zona solta de qualquer tipo de direito (nem o direito norte americano, nem o direito dos prisioneiros do oriente médio, nem o direito internacional está sendo aplicado aquelas pessoas) como é possivel sustentar que essa administração defende os direitos humanos?
o patrioct act aprovado pelo congresso norte americano e suportada pela SCF jogou a revolução norte americana e tudo aquilo de mais importante que aquele pais já produziu em termos de materializar a utopia iluminista no lodo.
isso é trágito, Tomas Paine, Jefesrson e John Rawls, devem estar sofrendo muito no caixão.

bem, não sei se tem mais, mas é isso, acho que vou comentar seu comentário no JH da próxima sexta e escrever outro artigo deicando as coisas mais claras.

valeu cara, e não se esquente pode sentar o pau nos meus artigos, quem tá na chuva é para se molhar.

keep on the beat!