Constantine Menges estava certo. Quem?, você deve estar se perguntando. Vou repetir o nome para ninguém esquecer: Constantine Menges. Mas quem é essa figura? É, não. Era - morreu alguns anos atrás. E o que ele disse ou escreveu para estar certo, e sobre o quê? Vou contar uma historinha.
O ano era 2002. Corria a campanha presidencial no Brasil. Os dois candidatos favoritos eram Luiz Inácio Lula da Silva e José Serra. O favorito, Lula, todos sabemos, ganhou a eleição. Respirava-se, então, um certo ar de desconfiança, não se sabia exatamente a que vinha o candidato do PT (agora se sabe muito bem: veio para transformar o Estado num cabide de empregos para os companheiros, refestelados na farra dos cartões de crédito corporativos, entre outras práticas republicanas). Os mercados ainda tremiam ante a perspectiva de um governo petista. Lula não havia lançado ainda sua "Carta aos Brasileiros", na qual provava que os homens do dinheiro poderiam ficar tranqüilos, pois um governo da companheirada poderia muito bem conviver com seus lucros (e até multiplicá-los, como se viu depois, abrindo-se formidáveis oportunidades de negócios, como, por exemplo, no setor de telefonia, como bem sabe o Lulinha). Foi nesse ambiente de insegurança e receio, sintetizado pela fala patética de Regina Duarte na TV ("tenho medo"), que um desconhecido professor norte-americano, Constantine Menges, publicou nos jornais dos EUA, às vésperas das eleições brasileiras, um texto assustador, intitulado "Blocking the New Axis of Evil" ("Bloqueando o Novo Eixo do Mal").
Aquilo estourou como uma bomba. Poucas vezes um artigo causou tanto espanto e indignação. Resumidamente, o gringo dizia o seguinte:
- A ascensão de Lula da Silva no Brasil constituía uma séria ameaça à segurança do continente ("Uma nova ameaça terrorista de armas/mísseis bélicos nucleares pode surgir, incluindo Fidel Castro de Cuba, o regime Chavéz na Venezuela e o próximo presidente eleito radical do Brasil, todos com ligações com Iraque, Irã e China"."Se o candidato pró-Castro for eleito presidente do Brasil, os resultados podem incluir um regime radical no Brasil, o restabelecimento de seus programas de armas nucleares e de mísseis bélicos, com ligações estreitas com Estados patrocinadores do terrorismo, como Cuba, Iraque e Irã, com efeitos na desestabilização das frágeis democracias vizinhas.")
- O então candidato favorito à presidência do Brasil, Luiz Inácio da Silva, do Partido dos Trabalhadores, era "um radical pró-Castro com extensos laços com o terrorismo internacional".
- As inclinações radicais de Lula se evidenciavam pela sua aliança de longa data com o ditador Fidel Castro e pela fundação, juntamente com este, do Foro de São Paulo ("O senhor da Silva não guarda segredos de suas simpatias. Ele tem sido aliado do senhor Castro por mais de 25 anos. Com a ajuda do senhor Castro, o senhor da Silva fundou o Fórum de São Paulo em 1990, como um encontro anual de comunistas e outros terroristas radicais e organizações políticas da América Latina, Europa e Oriente Médio, o qual tem sido usado para coordenar e planejar atividades políticas e terroristas ao redor do mundo e contra os Estados Unidos").
- Inimigo do capitalismo e do mercado, um governo Lula seria um retrocesso no caminho para a criação da ALCA, a Área de Livre Comércio das Américas, e para a liberalização econômica no continente ("Como o senhor Castro, o senhor da Silva culpa os Estados Unidos e o 'neo-liberalismo' pelos problemas reais das áreas sociais e econômicas que o Brasil e a América Latina ainda enfrentam. O senhor da Silva chamou a Área de Livre Comércio das Américas de um plano dos Estados Unidos para 'anexar' o Brasil, e ainda disse que os financiadores internacionais que buscam o pagamento de seus empréstimos de 250 bilhões de dólares são 'terroristas econômicos.' Ele também disse que aqueles que estão retirando investimentos do Brasil com medo de seu regime são 'terroristas econômicos'. Isto nos dá uma idéia sobre o tipo de 'guerra contra o terrorismo' que seu regime irá conduzir.")
- Um governo Lula no Brasil seria um estímulo importante para as ações de governos antidemocráticos e antiamericanos na região, como o de Hugo Chávez na Venezuela, assim como para movimentos terroristas como as FARC ("O Brasil divide fronteiras com outros 10 países da América do Sul. Isto ajudaria da Silva a estimular - e ele frisou que o faria - a política externa do regime Chavez, pró-Castro e pró-Iraque, na Venezuela, que tem provido suporte aos comunistas narcoterroristas da FARC na Colômbia, assim como outros grupos anti-democráticos em países da América do Sul.")
- A ascensão de Lula significaria, enfim, a criação de um verdadeiro "Eixo do Mal" na América Latina, unindo o Brasil à ditadura de Cuba e ao regime chavista na Venezuela ("Um eixo Castro-Chavéz-da Silva significaria ligar os 43 anos da política de guerra de Fidel Castro contra os Estados Unidos, com a riqueza em petróleo da Venezuela e o potencial econômico e nuclear bélico do Brasil").
Confesso que, ao ler pela primeira vez essas linhas, eu mesmo tomei um choque. Aquilo parecia puro delírio paranóico. O fato de o autor do texto ser ligado a uma instituição ultraconservadora, de direita, o Hudson Institute, e ter inclusive trabalhado no Conselho de Segurança Nacional e na CIA, certamente influiu para que quase ninguém o levasse a sério. Resultado: as advertências do autor foram quase imediatamente postas de lado, como coisa de lunáticos. Lembro que, uma noite, em uma dessas cerimônias do Itamaraty, eu e um grupo de colegas do Instituto Rio Branco cercamos a então embaixadora dos EUA no Brasil, Donna Hrinak, e lhe indagamos sobre o texto. Ela, muita solícita, muito simpática, tratou logo de descartar avaliação tão alarmante, dizendo que o governo norte-americano não endossava absolutamente aquelas idéias. Até a representante do "Império" achou o texto absurdo... Eu mesmo, que ainda não sabia da existência e das maquinações do Foro de São Paulo, achei que aquilo tudo era um exagero, para dizer o mínimo. Para mim, Lula podia ter, e certamente tem, todos os defeitos, entre os quais farsante e enganador, além de espertalhão e preguiçoso. Mas radical e incendiário, achava eu, ele não era.
Ledo engano. Hoje, passados quase seis anos, sou forçado a reconhecer que as palavras de Constantine Menges eram proféticas. Ele acertou em cheio. Todas as suas previsões se mostraram precisas, certeiras.
Leia novamente os pontos enumerados acima. De todos os vaticínios adiantados por Menges, apenas um, o de que o Brasil poderia restabelecer seu programa de armas nucleares iniciado no regime militar, ainda não se mostrou realidade. Mas isso não significa que os companheiros petralhas tenham desistido da idéia. Muito pelo contrário. Vez ou outra se ouve um rumor êntre as fileiras petistas e seus aliados, em favor da retomada do projeto nuclear brasileiro, em nome do ideal megalomaníaco de "Brasil Potência". O que mostra que Constantine Menges não estava tão longe da verdade assim também nesse quesito.
Onde o analista norte-americano mais acertou, claro, foi na análise (na verdade, na denúncia) das relações para lá de íntimas e cordiais entre o então candidato Lula e Fidel Castro, assim como com o protoditador Hugo Chávez e as FARC. Alguém pode negar, à luz dos últimos fatos ocorridos na América Latina, que esse "eixo do mal" realmente existe? Quem pode dizer, ante a pilha de evidências fartamente documentadas e disponíveis na internet, que Lula, Fidel Castro, Chávez, Morales, Correia, e os terroristas das FARC e do MIR chileno não são parceiros na mesma organização revolucionária continental, o Foro de São Paulo? Essa aliança, que Menges escancara, é uma realidade, um fato inegável, como comprovam as atas do Foro. Mas esse alerta caiu, então, em ouvidos moucos. É que, na época, Lula tentava ganhar o apoio das elites e da classe média e, apelando para uma jogada de marketing jamais igualada na história do Brasil, apresentava-se como um esquerdista "domesticado", light - "Lulinha paz e amor". Muitos caíram nessa. E hoje pagam o preço de sua cegueira ou ingenuidade.
Não sendo possível refutar fatos tão concretos, tão evidentes que só faltam subir nos telhados e gritar nas esquinas, não resta outra coisa a fazer às esquerdas senão tentar desqualificar o autor de denúncias tão graves, tão escabrosas. É a velha tática de atacar o mensageiro, e não a mensagem. Sim, Constantine Menges era um falcão, um conservador de direita, um membro do staff presidencial de Bush e ardente anticomunista, além de ter trabalhado para a CIA. E daí? Desde quando para desmascarar uma impostura é preciso ter atestado de pureza ideológica? A simples exigência desse pré-requisito demonstra até que ponto chegou a hegemonia ideológica das esquerdas: só se aceita a crítica vinda das próprias hostes esquerdistas, nunca de fora delas. Ou seja: se o sujeito é um completo idiota, um débil mental de babar na gravata (como dizia Nelson Rodrigues), sem nenhuma idéia própria, mas se apresenta e se comporta segundo os cânones da esquerda, sempre haverá quem o ouça com atenção. Se, ao contrário, ele apresenta provas concretas e irrefutáveis do que diz, se a realidade comprova item por item tudo que ele escreveu, mas é "um reaça", ninguém lhe dará a mínima. O fato de o acusador ser de direita ou conservador vale tanto quanto querer saber qual seu prato preferido ou para que time de futebol ele torce. E, no caso de Constantine Menges, um refugiado nascido na Turquia e naturalizado norte-americano depois de fugir do nazismo na Europa e ter ajudado a resistência à dominação soviética no Leste Europeu durante a Guerra Fria, o anticomunismo é uma virtude.
Se os esquerdistas tivessem um pingo de honestidade intelectual, para não dizer vergonha na cara, deveriam todos ficar de joelhos, contritos, e pedir perdão a Constantine Menges. E se não fôssemos tão ingênuos, tão parvos e idiotas, estaríamos hoje todos arrependidos e envergonhados por não lhe termos dado a devida atenção.
2 comentários:
Olá, acabei de publicar seu interessante artigo em meu blog:
http://conspiratio3.blogspot.com.br/2014/03/bloqueando-o-novo-eixo-do-mal.html
Se acaso tiver alguma restrição, deixe um comentário e o retiro.
Obrigada,
Celia
Olá, acabei de publicar seu interessante artigo em meu blog:
http://conspiratio3.blogspot.com.br/2014/03/bloqueando-o-novo-eixo-do-mal.html
Se acaso tiver alguma restrição, deixe um comentário e o retiro.
Obrigada,
Celia
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