quinta-feira, março 13, 2008

Resposta ao leitor - sobre terrorismo, dolo e culpa

Escreve o Rodolfo Mello, a propósito de meu texto "Resposta a um leitor 'viajante' - III":
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Essa discussão já passou dos limites, Gustavo. Concordo com a tua opinião de ser contra a ditadura de Fidel Castro, mas não posso concordar com o teu posicionamento de ser a favor dos crimes cometidos pelos Estados Unidos e Israel. Não acho que toda morte deve ser punida igualmente, mas considero que deve haver sempre punição. Assim como o homicídio culposo e doloso exigem penas diferentes, os crimes de morte acidentais e morte intencionais deveriam ambos serem punidos. Obviamente os intencionais deveriam ter uma punição maior, mas isto não exclui a punição dos crimes de morte acidental. Por que deveríamos permitir que alguns países sejam mais fortes que os outros? Não sou a favor do terrorismo, mas não acho que se deva permitir e concordar com os abusos de força exercidos pelos Estados Unidos e Israel.
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Epa! Peraí, Rodolfo! Onde foi que eu escrevi que sou "a favor dos crimes cometidos pelos Estados Unidos e Israel"? Onde foi que eu disse que não deve haver punição? Tudo que afirmei - e aproveito para reafirmar aqui - foi que não se pode colocar no mesmo balaio a violência de grupos terroristas como o Hamas e a Al Qaeda e a violência dos que os combatem, como os EUA e Israel. Isso não significa isentar estes últimos de qualquer responsabilidade ou culpa, mas sim saber pesar bem as coisas. Em outras palavras: não se pode dizer que há "equivalência moral" entre os assassinatos indiscriminados promovidos por Bin Laden ou pelo Hizbollah e as ações contraterroristas que podem resultar em mortes de civis inocentes. Os EUA e Israel cometem abusos nessa luta contra o terror? Cometem, sim, e basta ver Abu Ghraib e Guantánamo. Mas nem por isso se deve dizer que "é tudo a mesma coisa", em comparação com os atentados dos fundamentalistas islamitas.

Os abusos praticados pelos que se defendem de ataques terroristas, como os EUA e Israel, são geralmente utilizados por seus inimigos como álibi e justificativa para todo tipo de barbaridade contra a humanidade. É a justificação da barbárie. Por exemplo: Fidel Castro se aproveita do fato de que os EUA mantêm um campo de prisioneiros em Guantánamo, contra as leis internacionais, para desviar a atenção das violações aos direitos humanos na ilha-prisão (há umas duzentas Guantánamos em Cuba, mas ninguém parece estar muito preocupado com isso). É mais uma razão para discordar do papo-furado de que as duas violências - a terrorista e a contraterrorista - no final se equivalem e são tudo a mesma coisa. Não são, não! Pelo mesmo motivo por que não se pode dizer que são a mesma coisa o serial killer que trucida a esmo suas vítimas e o policial que, acidentalmente, mata um refém na tentativa de resgate. Em ambos os casos deve haver punição, mas não pelo mesmo crime - homicídio intencional (doloso) no primeiro caso; não-intencional (culposo) no segundo.
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Aliás, essa é uma diferença importante entre os que praticam o terrorismo e os que, na tentativa de detê-los, se excedem: quando um agente norte-americano ou israelense extrapola de suas funções e comete um crime de tortura ou assassinato contra um inimigo, ele será imediatamente execrado pela opinião pública dos países livres e terá de enfrentar as devidas conseqüências legais. O governo do qual ele faz parte, nesse caso, se encherá de vergonha e pedirá desculpas por esses delitos. Já o terrorista palestino ou muçulmano que detonar uma bomba num mercado cheio de civis ou invadir um seminário religioso abrindo fogo - como aconteceu na semana passada em Israel - será louvado e enaltecido como "mártir" e "herói". O que dizer disso?
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Muito se fala do duplo padrão (double standard) dos EUA e seus aliados na luta contra o terrorismo. É curioso como quase ninguém fala desse duplo padrão moral quando se trata dos seus inimigos.

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