sábado, junho 11, 2011

RETRÁTU DU INTELEQUITUAU BRAZILÊRU

Se tem uma coisa que realmente me tira do sério, quase tanto quanto xingar minha mãe, é quando alguém me chama de intelectual.

Nessas horas, fico indignado. Eu, intelectual? De jeito nenhum. Não no Brasil de hoje.

Para ser considerado intelectual no Brasil da era da mediocridade lulopetista, o sujeito precisa preencher alguns requisitos básicos. Não me enquadro em nenhum deles. Muito pelo contrário. Sou o exato oposto do que se convencionou chamar de intelectual na terra dos papagaios.

Alguns requisitos essenciais para fazer parte da nem-tão-seleta categoria dos "intelectuais brasileiros" já foram analisados por Olavo de Carvalho - certamente o exemplo perfeito de anti-intelectual tupiniquim - no artigo Ética do Intelectual Brasileiro. Ou: Como Tornar-se uma Pessoa Maravilhosa, publicado em seu livro de 1996, O Imbecil Coletivo: Atualidades Inculturais Brasileiras. Vou apenas tentar atualizá-los aqui. São os seguintes:

- Não ter idéias próprias. O legítimo representante da intelligentsia brasileira está sempre acompanhando o rebanho; jamais se atreve a dele se desviar um milímetro sequer e a trilhar um caminho próprio. Seu principal compromisso, acima de tudo, é com a própria grei, o partido ou o sindicato, também agrupados sob a denominação comum de pessoas maravilhosas. Ele coloca as afinidades político-ideológicas e pessoais de amizade ou geração acima da verdade. Para tanto, converte-se em simples repetidor de slogans, incapaz de elaborar um pensamento original, por menor que seja, sobre qualquer assunto. Sua meta primordial, sua razão de viver, é jamais destoar do que pensa o "coletivo".

Geralmente aboletado em algum departamento de universidade pública brasileira (convertido, portanto, em intelectual estatal), onde sente-se à vontade em meio a seus semelhantes, e onde geralmente possui um séquito próprio (além de verbas oficiais), nosso herói está sempre disposto a puxar o saco de seus parceiros (o que inclui autoridades), comprazendo-se no beletrismo e no elogio complacente. Assim espera, claro, receber o mesmo tratamento de seus pares, numa masturbação coletiva sem fim. Escreve (quando escreve) artigos sempre elogiosos e que visam a não desagradar ninguém, ou textos de teor lírico e supostamente "profundos" sobre coisas do cotidiano, esforçando-se para mostrar que é um cara sensível e para ser tão incisivo quanto uma canção dos Teletubbies. Para demonstrar sua solidariedade de classe, sempre que um da turma estiver encrencado por causa de uma besteira que fez ou disse, ele está a postos para colocar sua assinatura em um "manifesto de intelectuais" a favor do encrencado - sendo esta, muitas vezes, sua única produção intelectual.

Mais do que tudo, o verdadeiro intelectual brasileiro busca a aprovação de seus cumpinchas, vendo nisso o critério superior e definitivo, o selo de qualidade a atestar sua ciência e sabedoria. Por esse motivo, e para não cometer o terrível pecado de destoar da manada, ele idolatra Chico Buarque, "um dos maiores intelectuais brasileiros".

- Ser contra o capitalismo e os EUA (não importa quem estiver no poder). O típico intelectual brasileiro é devoto da religião antiamericana, embora alguns não aceitem ser chamados de antiamericanos (são capazes até de ficar indignados se alguém os chamar assim). Deseja ardentemente ver os EUA na sarjeta, e adoraria ver o lugar da pátria de Thomas Jefferson como maior potência mundial tomado pela China, assim como até há pouco desejava que esse posto fosse ocupado pela finada União Soviética. No máximo, alegra-se pela eleição do Obama porque ele é negão e sua vitória foi uma "vitória contra o racismo" etc., tomando o cuidado de rotular de racista e nazista qualquer um que tiver a ousadia de fazer perguntas inconvenientes sobre o atual presidente norte-americano (ou "estadunidense", como prefere dizer). Se obrigado a falar sobre coisas como direitos humanos, enche-se de indignação contra as ações dos EUA na guerra contra os terroristas islamitas da Al-Qaeda, como o waterboarding de prisioneiros, ao mesmo tempo em que acha um exagero típico da Guerra Fria pedir democracia em Cuba e chamar Fidel Castro de ditador, por exemplo.

O intelectual brasileiro que se preza está sempre pronto a escrever (isso, claro, quando escreve) rios de tinta criticando "os males do capitalismo" e a "desumanização da sociedade de consumo" (da qual, aliás, se beneficia com prazer), mas não tem uma palavra a dizer sobre a falta de liberdade e as torturas de presos políticos nos regimes totalitários comunistas do passado e do presente, assim como em outras ditaduras apoiadas pelos companheiros no poder, como a do Irã. Vez ou outra, ele diz uma palavra a favor de Marx, repetindo o chavão, por exemplo, de que a última crise econômica global "comprovou a atualidade do pensamento marxista" - embora, na maioria dos casos, jamais tenha lido uma linha de O Capital em toda a vida. Mas ler, para ele, não é importante (como veremos adiante).

- Acima de tudo, o intelectual brasileiro por excelência é de esquerda. Sendo assim, ele acredita piamente que tudo que não for de esquerda só pode ser a encarnação do tinhoso. Mesmo sem ter a menor idéia de quem foram Edmund Burke, Friedrich Hayek, Ludwig Von Mises, Ortega y Gasset e Milton Friedman, ele está sempre disposto a satanizar autores liberais e de direita. Geralmente filiado ou simpatizante do PT ou do PSOL, ele gosta de se queixar da "mídia" (geralmente acrescida dos adjetivos "burguesa" ou "conservadora"), a ponto de acreditar que os tucanos e a VEJA são de direita... Se perguntado o que ele é, ele dirá socialista ou anarquista, ou então "pós-moderno" e até mesmo "niilista". Mas jamais (jamais mesmo!) liberal ou conservador, termos que, para ele, têm quase o mesmo significado de "fascista" - aliás, ele usa e abusa dessa expressão, "fascista", empregando-a sempre para desqualificar quem dele discorda.

Alguns membros dessa confraria de iluminados que são os intelectuais brasileiros tentam se diferenciar (mas só um pouquinho...) do restante da manada, posando de "neutros" ideologicamente, afetando superioridade moral e colocando-se acima ou além das ideologias. Em geral, gostam de repetir mantras como "esquerda e direita são conceitos ultrapassados", enfatizando, assim, seu caráter pós-ideológico. Mas não lhes peça para condenar a corrupção petista ou regimes políticos como o cubano. Nesse caso, é grande o risco de você ser tachado por ele de reacionário ou "proto-fascista"... Nesses momentos, a alegada neutralidade vai para o beleléu e aflora o militante.

- Sendo de esquerda, o autêntico exemplar da classe intelectual no Brasil é, claro, um "progressista". Ele é, portanto, a favor da legalização do aborto e do casamento gay, assim como da legalização das drogas - mas é visceralmente contra o cigarro e o álcool, porque afinal são "indústrias". Sempre em sintonia com a opinião da maioria de sua espécie, ele não vê problema algum em se dizer pró-democracia e defender, ao mesmo tempo, o fim da liberdade de expressão (sobretudo religiosa), mediante uma lei que, se aprovada, irá instituir o delito de opinião, encarando-a como um "avanço na luta pelos direitos civis" dos homossexuais, que serão colocados, assim, num pedestal acima dos demais cidadãos, sujeitos a irem parar na cadeia por citarem a Bíblia ou por uma piada de bar considerada "homofóbica". Além disso, é um inimigo ferrenho do racismo, tanto que defende a sua institucionalização mediante um sistema de cotas e um tribunal de pureza racial inspirado na África do Sul da época do apartheid (detalhe: em um país de mestiços). Também é um pacifista e um humanista, pois é um defensor ardoroso da idéia de desarmar a população mediante a proibição do acesso a armas de fogo adquiridas e registradas legalmente - embora não mostre o mesmo ardor em relação à idéia de reprimir o crime organizado e colocar os bandidos atrás das grades (afinal, a polícia é uma instituição reacionária e fascista...).

- Mente ilustrada, nosso intelectual não perde a chance de atacar violentamente a Igreja Católica, cobrindo-a com os piores epítetos (intolerante, homofóbica, antro de pedofilia etc.). Ao mesmo tempo, cala-se diante da perseguição a minorias nos países islâmicos, considerando isso preconceito contra o Islã. Quanto a religião, declara-se ateu, agnóstico ou adepto de algum culto da moda, de preferência oriental (budista, hare krishna, santo daime ou satanista light), mas nunca, NUNCA, católico (ou membro de alguma denominação tradicional protestante, como os luteranos ou metodistas). Enfim, vale qualquer coisa, menos a religião dos "brancos ocidentais imperialistas" etc.

- Finalmente, para ser intelectual no Brasil não é preciso sequer conhecer a língua portuguesa. Intelectual brasileiro que honra o nome manda às favas a última flor do Lácio. Para ele, o respeito às regras gramaticais é coisa da elite burguesa, e corrigir alguém por falar (ou escrever) "nóis pega os peixe" ou "os livro está emprestado" é "preconceito lingüìstico". Faz abertamente a apologia do erro e o culto da ignorância, enaltecendo a "língua de pobre" contra a norma culta, que seria um "instrumento de dominação da burguesia" (rotulando os pobres que estudam, portanto, de burgueses). Tendo como ideologias o vitimismo e o pobrismo, advoga a idéia imbecil de que ter nascido pobre é uma licença para todo tipo de desatino (corrupção inclusive), e apresenta-se como defensor da cultura "popular" ou "da periferia" contra a cultura "burguesa" ou "do centro", numa reprodução tosca e idiota da velha "teoria da dependência". Chega mesmo a aplaudir um ex-presidente semi-analfabeto que tortura o idioma, chamando de "preconceito elitista" lembrar que ele só não estudou porque não quis. Do mesmo modo, acha que criticar uma presidente por não dizer coisa com coisa (sem falar nas mentiras) é "machismo". É alguém que considera perfeitamente normal um ministro da educação ou um professor universitário falar (ou escrever) "cabeçário", "fusilar" (com S) e "Getulho" (com LH).

Resumindo: por favor, não me chamem de intelectual. Pelos seguintes motivos:

O típico intelectual brasileiro sofre de carência afetiva e de necessidade de aprovação. Eu não padeço desse mal, e não me importo de ser impopular. Acho, aliás, que a impopularidade é quase um dever de quem busca a verdade.

O típico intelectual brasileiro está comprometido, acima de tudo, com os de sua grei. Meu único compromisso é com minha consciência.

O típico intelectual brasileiro ama o povo. Eu não. E acho que o povo tem mais é que ser educado para sair do estado semi-bárbaro em que se encontra.

Não é só o povo que precisa de um banho de civilização. Os intelequituais também. De civilização e de vergonha na cara.

2 comentários:

Riva disse...

Excelente descrição das nossas valorosas cabeças pensantes, a maioria delas que lê ou leu “O Capital”, por preguiça de encarar o calhamaço, recorreu ao “O Capital uma leitura popular” do Carlo Cafiero, geralmente a leitura se resume ao volume três, o mais popular nas faculdades e sindicatos.

Anônimo disse...

Parabéns, nobre Intelectual!