A preservação da política econômica e da plataforma construída pelos antecessores não significa o reconhecimento de que essas políticas estavam certas quando foram implementadas e que o PT, então na oposição, estava errado. Pelo contrário. Significa uma chance de, tendo agarrado o poder nas mãos para não mais soltar, exercitar a falácia do "nunca antes neste país" e aparecer como "pai dos pobres". Para isso não é preciso coragem, nem mesmo inteligência: basta ser esperto e ter muita cara-de-pau.
O trecho mais problemático do texto de Maílson da Nóbrega é o seguinte:
Muito se deve à intuição política do presidente e ao trabalho de seu primeiro ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Lula percebeu que a preservação de sua popularidade dependia do controle da inflação e por isso reforçou a autonomia do Banco Central. Ele cresceu aos olhos do mundo em razão de sua simpatia, de seu carisma e por ser um líder de esquerda moderado, defensor da democracia e da economia de mercado.
Até um observador lúcido do Brasil como Maílson da Nóbrega, ex-ministro de Estado, caiu na esparrela do Lula esquerdista "moderado, defensor da democracia e da economia de mercado". Isso mostra como foi eficiente a lavagem cerebral petista. É a teoria das duas esquerdas, a "carnívora", representada por tipinhos ridículos como Hugo Chávez e Evo Morales, e a "vegetariana", responsável e moderada, a qual Lula pertenceria. Nada mais falso. A política externa do Itamaraty sob Lula não tem feito outra coisa senão comprovar que a esquerda latino-americana, longe de estar dividida entre "carnívoros" e "vegetarianos", está bem unida, desenvolvendo uma ação coordenada em lugares como Honduras, sempre no sentido de destruir a democracia e substituí-la por governos populistas e autoritários. A economia - insisto nesse ponto - é um instrumento dessa política maior, e não um fim em si mesmo para os petistas.
O erro dos economistas está em não enxergar além dos números da economia, alguém já disse. Para eles, basta que o governo adote uma política econômica responsável e atraia investimentos, que tudo o mais lhe será perdoado. É assim que pensa a maioria das pessoas, aliás, para quem democracia e ética, por exemplo, são simples conceitos abstratos, muito bonitos mas sem peso efetivo na vida cotidiana. O problema é que a economia não é tudo. A China é atualmente uma das economias mais dinâmicas do planeta, graças a reformas liberais que abriram o país para o capitalismo, mas segue sendo uma tirania comunista no plano político. Para os economistas, e sobretudo os economistas liberais, isso não tem qualquer importância. Desde que o governo mantenha a economia funcionando, pode censurar, prender, fuzilar e corromper à vontade. É aí que mora o perigo.
No final de seu texto, Maílson da Nóbrega afirma que Lula curvou-se às imposições da nova realidade do país, herdada de FHC, e termina dizendo: "O Brasil mudou o PT, que agora é, em todos os sentidos, um partido como os outros." Não poderia estar mais errado. O governo Lula se sustenta unicamente numa combinação de sorte (pela situação econômica mundial favorável em 2003-2008), oportunismo e hipocrisia. Assim como o PT não mudou o Brasil para melhor, o Brasil não mudou o PT. Este continua a ser o que sempre foi, um partido esquerdista a serviço de uma visão totalitária e personalista, sem nenhum compromisso filosófico com a democracia e a sociedade livre. Apenas soube trocar o discurso camaleonicamente quando lhe foi conveniente, para melhor agarrar-se ao poder e enganar os incautos. De nenhuma maneira é um partido como os outros.
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