sábado, outubro 23, 2010

LULA, DILMA E A TEORIA DA "BOLINHA DE PAPEL". OU: COMO IGNORAR FATOS E ENXERGAR SOMENTE O QUE INTERESSA


Eu não sei o que atingiu José Serra na cabeça na passeata de sua campanha no Rio de Janeiro. Os lulo-petistas sabem. Aliás, já sabiam antes mesmo de qualquer perícia: "foi uma bolinha de papel".

O ex-presidente Lula - ele abandonou o cargo há meses, trocando-o pelo de chefe de facção política em tempo integral -, acusou Serra de fazer teatrinho e querer criar um "factóide" (sempre que seus adversários denunciam seus malfeitos, os lulo-petistas dizem ser um factóide). Isso foi um dia antes de o Jornal Nacional desmentir a versão divulgada pelo SBT e pela Record, que mostram apenas a imagem do que parece uma inofensiva bola de papel arremessada contra Serra. O JN preferiu mostrar também as imagens do celular de um jornalista da Folha de S. Paulo, feitas 15 minutos depois em meio ao tumulto, que mostram o que parece ser um objeto pesado atingindo a cabeça do candidato tucano - imagens atestadas como autênticas por um perito.

Resumo da ópera(bufa): O candidato rival dos lulo-petistas foi vítima de agressão por uma horda de militantes possuídos pelo ódio que agiram como um bando de gorilas ou como tropa de choque fascista, e isso está provado cientificamente pela análise pericial das imagens. O (ex)presidente da República, que, em vez de repudiar a agressão - como faria se fosse um estadista, e não um chefe de torcida -, açula seus seguidores à intolerância, é o chefe dessa milícia de camisas-pardas (ou vermelhas). E nada disso, assim como a análise das imagens, vai mudar a versão lulo-petista: "foi uma bolinha de papel"...

O episódio todo, que parece pequeno, é extremamente grave. Além de demonstrar o desprezo boçal de um presidente da República transformado em animador de comício pelas regras da democracia e da civilização - pela primeira vez na história do Pais, um candidato à Presidência da República foi vítima de agressão física, instigada pelo ocupante do Palácio do Planalto, que ainda por cima acusa a vítima -, o fato comprova, na verdade, um padrão, monotonamente seguido pelos lulo-petistas sempre que divulgados fatos que não lhes convêm ou agradam (como as declarações de Dilma sobre o aborto, por exemplo):

- O fato não ocorreu; trata-se de "calúnia", "boato" ou "factóide" (antes mesmo de qualquer avaliação técnica, notem bem);

- O "outro lado" também faz igual, logo os dois lados se equivalem moralmente (Lula lembrou que teriam jogado uma bola de água em sua pupila em Curitiba - como se uma bola de água e um objeto contundente tivessem o mesmo efeito, e como se tal fato, se realmente ocorreu, tivesse partido de uma turba de vândalos, como os que agrediram Serra no Rio, e não de um gesto isolado.);

- De qualquer maneira, a denúncia é falsa porque foi a "mídia golpista" que a levou ao ar (se a notícia fosse a seu favor, não diriam o mesmo);

- Enfim, o culpado é a vítima (total inversão da realidade).

Desde 2003, esse padrão tem-se repetido com freqüência quase religiosa. Com poucas variações, até as palavras são as mesmas. Além das que estão aí em cima, "conspiração das elites golpistas" é um termo-chave (ou chavão) empregado constantemente, bem como atribuir tudo a um "excesso" de alguns poucos "aloprados". Dizer-se traído (mas com o cuidado de omitir o nome do suposto traidor) também pode ser útil para livrar a cara do chefe.

Dizem que, em um dos processos de Moscou, quando o ditador soviético Josef Stálin resolveu exterminar seus potenciais inimigos na década de 30, um dos réus, convencido da inutilidade de qualquer defesa no tribunal - os veredictos estavam decididos antes do próprio julgamento -, virou-se para um dos membros do Partido e perguntou: "o que devo pensar?" Com os lulo-petistas, ocorre o mesmo. Se vêem um fato que não lhes convém, não analisam se é ou não verdade: viram-se e perguntam para o chefe: "o que devo pensar?" É que já abdicaram de pensar há muito tempo.

George Orwell, em sua obra-prima 1984, resume de forma genial esse processo de construção mental: se alguém lhe mostra quatro dedos, e o Grande Irmão diz que, em vez de quatro, são cinco, você nega o que está diante de seus olhos e diz que são cinco. Mais: depois de algum tempo, passa a acreditar que, de fato, são cinco.

Hoje, quando imagens de vídeo mostram o contrário do que os lulo-petistas dizem, os militantes pró-Dilma, feito zumbis, tentam convencer uns aos outros de que a realidade não é o que todos vêem, mas apenas o que eles, lulo-petistas, querem que seja verdade. Diante de imagens que mostram claramente Dilma defendendo a legalidade do aborto, ou um rival sendo agredido, não lhes resta outra coisa senão negar os fatos e apegar-se à teoria da bolinha de papel.

Se mostrarem um video em que Lula aparece roubando uma velhinha à mão armada, seus devotos lulo-petistas dirão primeiro que o vídeo é falso, depois que isso não passa de uma conspiração da mídia golpista. Comprovada a veracidade das imagens, dirão que seus adversários fazem o mesmo. Finalmente, vão afirmar que o dinheiro era para ajudar os pobres. O nome disso, em bom português, é lavagem cerebral. Parece piada, mas é a realidade.

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