quarta-feira, março 17, 2010

LULA EM ISRAEL: UM FESTIVAL GROTESCO DE CINISMO


Lula, como vocês sabem, esteve em visita a Israel, como parte de um périplo maior pelo Oriente Médio, que incluiu também a Jordânia e os Territórios Palestinos. O criador de Dilma Rousseff quer aparecer como o "pacificador" da região. É isso mesmo: o Brasil ficou pequeno para os delírios de grandeza do maior dos megalonanicos. E, como não há ninguém por perto que tenha o mau gosto de lhe trazer de volta à realidade, ele segue em frente com mais essa patacoada.

Mesmo assim, a visita do "Estadista Global" a Israel veio a propósito. Mesmo tendo esperado o último ano de seu mandato para fazer uma visita ao país, única democracia do Oriente Médio, e (coincidência?) o único da região que ele não tinha ainda visitado. Lula deixou para o final de seu governo a visita a Israel, pois antes quis conhecer países mais importantes e certamente mais democráticos, como a Síria e a Líbia... Visitas como a que acabou de ocorrer servem, portanto, para baixar um pouco o véu da diplomacia lulista, revelando que, por trás de toda uma retórica adiposa sobre neutralidade, esconde-se o compromisso com um dos lados, precisamente o lado mau da humanidade. E foi exatamente isso o que aconteceu, como esperado.

Logo no primeiro dia da visita a Israel, o "profeta do diálogo" - como o chamou o diário esquerdista israelense Haaretz, certamente embalado pelo mesmo espírito que elegeu Lula o "homem do ano" do Le Monde em 2009, e o campeão da ética e da decência no Brasil por três décadas - mostrou a que veio, deixando de visitar o túmulo de ninguém mais, ninguém menos do que o fundador do Sionismo, o movimento que deu origem a Israel, Theodor Herzl. Algo assim como um chefe de Estado estrangeiro que visita o Brasil e deixa, por exemplo, de comparecer a uma cerimônia em homenagem a Tiradentes. O Chanceler de Israel, Avigdor Lieberman, que deveria, pelo protocolo, ciceronear o visitante, não perdeu a chance de dar um recado, e não compareceu ao discurso de Lula no Knesset, o Parlamento israelense, sendo seguido por cerca de metade dos parlamentares do país. Um gesto "descortês", segundo o professor de boas maneiras e movimentos manuais heterodoxos Marco Aurélio Top, Top Garcia - como se equiparar Israel a seus inimigos, como veremos, fosse o supra-sumo da cortesia diplomática.

Perante um Parlamento esvaziado, ao lado do presidente Shimon Peres (que deveria estar sem nada melhor para fazer na hora) e da líder da oposição, Lula se dedicou durante uma hora a atacar o país anfitrião, enquanto não deu um pio sobre o terrorismo palestino e as intenções nucleares de países como o Irã. Falou sobre sua fórmula mágica para alcançar a "paz" na região: basta Israel deixar de fazer novos assentamentos e derrubar o muro que o separa dos Territórios Palestinos, afirmou o Demiurgo, que todos se darão as mãos e viverão fraternalmente. Sobre o terrorismo de grupos como o Hamas e o Hezbollah, que independe de assentamentos israelenses para existir - na Faixa de Gaza, por exemplo, o Hamas intensificou seus ataques a Israel depois da saída de TODOS os colonos israelenses da região, em 2005 -, nenhuma palavra. O mesmo em relação aos motivos que levaram Israel à construção do muro, bem como sobre o fato de que, desde que ele começou a ser erguido, nenhum atentado terrorista de vulto tenha ocorrido em Israel. Silêncio total.

Em seguida, o auto-proclamado reformador da geografia comercial e política do mundo fez uma visita ao Museu do Holocausto em Jerusalém, lugar dedicado à memória dos 6 milhões de judeus assassinados pelos nazistas na Segunda Guerra. Dessa vez não deu pra evitar, deve ter pensado o sábio para quem os iranianos são árabes, não persas. Lula plantou uma árvore e fez um discurso de praxe contra a barbárie do Holocausto, afirmando que crimes como aquele "nunca mais, nunca mais" deveriam se repetir etc. Até parecia que o presidente que estava ali proferindo essas palavras não era o mesmo que fez festa para receber em Brasília o negador do Holocausto Mahmoud Ahmadinejad, em novembro passado, e que irá reencontrá-lo, dessa vez em Teerã, dentro de algumas semanas. Como se o chefe de Estado ali presente fosse mesmo um humanista e um democrata, alguém sinceramente interessado na defesa dos direitos humanos, e não o aliado incondicional de ditaduras como a de Cuba, que comparou os dissidentes da tirania mais antiga do Ocidente a bandidos, enquanto posava sorridente para fotos ao lado de Fidel e Raúl Castro.

Terminada a programação em Israel, foi a vez de Lula visitar os Territórios Palestinos. Lá chegando, o Guia Genial demonstrou mais uma vez toda sua eqüidistância na questão israelo-palestina, que o credencia a se colocar como mediador no conflito, ao colocar uma coroa de flores no túmulo de Yasser Arafat. O fato de ele não ter feito o mesmo no túmulo de Theodor Herzl, claro, foi só um detalhe, nada que deponha contra a "neutralidade" do governo Lula na questão, ou um simples problema de cerimonial, apressaram-se a explicar os puxa-sacos de plantão. O fato de Arafat, uma figura de proa do terrorismo internacional nas décadas de 60 e 70, que só renunciou à luta armada e aceitou a existência de Israel em 1988, ter as mãos sujas de sangue, muito do qual de gente inocente, ao contrário de Herzl, que jamais matou alguém, é também, claro, só um detalhe insignificante.

E assim prosseguiu mais essa visita "exitosa" (segundo o Itamaraty, para o qual toda visita é "exitosa") de Lula ao estrangeiro. Tão exitosa que, acredito, Lula provavelmente não irá mais se contentar com o modesto papel de "negociador" e "peace-builder" entre Israel e seus inimigos: após equiparar moralmente Israel (uma democracia) e o Irã (uma teocracia), o Gandhi de Garanhuns e futuro secretário-geral da Organização das Galáxias Unidas vai tentar impor a paz na região com o apoio de seu notável charme e carisma e de seu aliado incondicional Ahmadinejad. Como numa reunião entre a CUT e a Força Sindical, ele vai convencer israelenses, a Fatah, o Hamas e os iranianos a se darem as mãos. E, como são todos iguais do ponto de vista moral, vai convencer os israelenses e o restante do mundo que o Irã - e, por extensão, o Hamas e o Hezbollah - tem o direito a ter armas nucleares ("afinal, Israel também não tem?", afirmam os defensores do "desarmamentismo global"). Novamente, o fato de Israel não ameaçar varrer ninguém do mapa, ao contrário do Irã, não faz a menor diferença para essa estratégia tão sábia do maior estadista e maior pacifista da história do sistema solar.

Lula não é capaz de dizer uma palavra sobre direitos humanos em Cuba ou sobre democracia na Venezuela, nem de distinguir entre um golpista destituído e um governo constitucional em Honduras, mas acha que tem alguma coisa a dizer na questão do Oriente Médio. Acredita, ou finge acreditar, que pode acabar com décadas de conflito entre israelenses e iranianos, entre israelenses e palestinos, e entre os próprios palestinos, com base unicamente na vontade, no gogó. Será apenas cinismo? Ou é loucura mesmo?

Honduras, Cuba, Israel, Irã... é o Brasil caminhando, célere, para se tornar um "global player". Nesse caso, um "global loser".

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