Se fosse somente isso, já seria demais. Mas o legado de Woodstock vai além. Ao culto da irresponsabilidade e ao individualismo sem deveres ou coletivismo sem direitos ("maconha pode; cigarro, não"...), some-se o rebaixamento moral da sociedade. O relativismo cultural, vindo com a filosofia New Age e a onda "pós-moderna", levou a uma situação de embotamento mental, que se expressa hoje em fenômenos como o politicamento correto e o multiculturalismo. Em especial, a moda "espiritualista" oriental, com seus gurus indianos e lamas tibetanos sorridentes, levou a um misticismo estéril e idiota, a uma negação total da racionalidade, fazendo a alegria de todo tipo de charlatão, de Osho a Paulo Coelho. Agregue-se a isso um rebaixamento intelectual, com a gíria rapidamente tomando o lugar da Gramática e às vezes criando até uma nova língua: entre o "pô" e o "aí, bicho", as maiores expressões intelectuais dos hippies, e o "tá ligado" da molecada autista de hoje em dia, existe uma inegável relação, provavelmente resultante da queima de neurônios pela ação da maconha e de outras substâncias. O resultado é uma geração inteira incapaz de emitir uma opinião, e até mesmo de formar uma frase com sujeito e predicado.
Este é um blog assumidamente do contra. Contra a burrice, a acomodação, o conformismo, o infantilismo, a ingenuidade, a abobalhação e a estupidez que ameaçam tomar conta do País e do Mundo. Seja livre. Seja do contra. - "A ingenuidade é uma forma de insanidade" (Graham Greene)
quinta-feira, setembro 03, 2009
WOODSTOCK: UM RETRATO NA PAREDE
Nunca fui muito ligado em música. Principalmente, na música dita "jovem", rock, pop, hip-hop, essas merdas todas. Houve uma época em que até tentei me interessar pelo assunto, e cheguei a comprar alguns discos - era o tempo dos discos de vinil, antes da chegada do CD às lojas. Gostava especialmente de Led Zepellin e The Doors - estes últimos, principalmente, por causa do filme de Oliver Stone de 1991, de que na época eu gostei mas que depois aprendi a abominar, como toda a obra desse diretor, aliás. Mas foi menos por interesse genuíno do que pela onda da adolescência, período em que costumamos pensar e agir com os hormônios e não com o cérebro. Fui a pouquíssimos shows de rock e, ao contrário da maioria dos caras de minha idade, nunca quis ter uma banda. Sempre preferi os filmes e os livros aos discos. Pelo menos, aqueles - principalmente os livros - me dizem muito mais. Até hoje é assim.
Sei que o que vou dizer a seguir poderá parecer algo meio fora de moda, e vai certamente decepcionar algumas pessoas. Se for assim, paciência. Entre frustrar as expectativas dos outros e violentar a própria consciência, fico com a primeira opção. Mas o fato é que a "comemoração" dos 40 anos do Festival de Woodstock, lembrado à exaustão no mês que passou, é uma dessas coisas que me enchem de um tédio irreprimível, de uma vontade danada de dormir e só acordar quando tudo estiver terminado. Não gosto de hippies, nunca gostei. E não é só pela falta de asseio pessoal ou pela vagabundagem - na verdade, confesso até sentir uma pontinha de simpatia pelo estilo de vida bicho-grilo: afinal, quem não quer sair por aí, cabelos ao vento, sem lenço nem documento, em harmonia com a natureza etc.?... Mas não, não é por isso que não simpatizo com os ripongas desta e de eras passadas. Detesto sobretudo a romantização, a visão mitificada que se tem até hoje sobre essa época, como repudio qualquer mitificação, sobre quem ou o que quer que seja.
Para começo de conversa, o que há para se comemorar? Uma frase bastante repetida sobre Woodstock é que "se você lembra do que rolou no festival, então é porque você não esteve lá". Isso diz muito sobre o que realmente aconteceu naqueles três dias de "música, sexo, drogas, paz e amor". Sobre música, já falei antes, tenho pouco a dizer. Quanto ao sexo, as orgias romanas e casas de swing de hoje em dia não deixam muito a desejar, e francamente não vejo muito sentido em glamourizar um bundalelê ao ar livre. O mesmo para o consumo de drogas. Para mim, Woodstock nada mais foi do que uma imensa rave, com gente suja, pelada e bolada de tanta maconha e LSD. Um festival de piolhos e de lama, regado a canabis.
Na verdade, o que se celebrou em Woodstock não foi qualquer "rebeldia", mas o escapismo, a pura e simples irresponsabilidade juvenil, com uma embalagem "psicodélica". Quem assistir aos filmes sobre o evento poderá constatar: ninguém ali fala coisa com coisa, estão todos muito doidões para pensar e articular uma frase coerente, e até mesmo para curtir a música. Uma das performances mais famosas, a de Joe Cocker cantando "With A Little Help From My Friends", dos Beatles, não deixa dúvidas: o cantor estava pra lá de Bagdá. Uma opinião estúpida diz que sua apresentação foi tão boa por causa das drogas que ele tomou antes de subir ao palco. De fato, sua performance foi tão genial que durou uns vinte anos, mais ou menos - período em que ele lutou para se livrar do vício em cocaína que quase o fez cantar no além.
Os que ainda hoje lucram horrores com a nostalgia hippie ou se mortificam por não terem nascido ou serem jovens demais quando houve o festival dizem que Woodstock foi um momento importante dos anos 60, o auge da contracultura e da "geração paz e amor", "da era de Aquário" etc. etc. Acho tudo isso uma bobagem sem tamanho, uma babaquice. Quando assisto a algum vídeo sobre Woodstock, ou sobre qualquer festival de rock do período, o que vejo é muita sujeira, muito lixo, vagabundagem e culto às drogas. Basta ver o que aconteceu com os principais´nomes da música no período, como Janis Joplin, Jimi Hendrix e Jim Morrison: todos mortos por overdose aos 27 anos de idade. É essa a rebeldia, o grande grito revolucionário daquela geração: se entupir de drogas pesadas até morrer sufocado com o próprio vômito...
O culto às drogas é, de fato, o maior legado de Woodstock. E não há nada de romântico ou pitoresco nisso. Da maconha e do LSD, consumidos em quantidades astronômicas naqueles dias, até a cocaína, o ecstasy e o crack que hoje infestam as ruas das grandes e até das pequenas cidades, há uma linha inegável. Já escrevi aqui antes, quando analisei a herança de 1968 - outro momento mitificado até não se poder mais da História recente -, que a "expansão da consciência", um dos maiores mantras do período, defendido pelo guru da contracultura Timothy Leary, é um dos pilares sobre o qual foi erguido mais tarde o tráfico de drogas nas favelas cariocas. De início algo típico de jovens entediados das classes média e alta dos países desenvolvidos, o vício na maconha e na cocaína foi logo imitado, como tudo o mais, pelas classes mais pobres, que aprenderam a lucrar com o vício dos playboys e filhinhos-de-papai. O resultado são cerca de 50 mil mortes por ano no Brasil.
É, sou um "careta", não vejo beleza alguma em torrar os neurônios com fumaça de erva ou em "viajar" ao som de The Who ou Jimi Hendrix com os olhos vidrados. Aliás, acho uma afetação e uma boiolice essa tietagem, esse endeusamento das figuras do período, transformadas em totens do que se convencionou chamar de "contracultura" ou "udigrúdi". Sem falar no papo besta sobre "libertação individual" e "contra o sistema", que não passa de um socialismo de botequim, um marxismo de galinheiro. Curiosamente, na mesma época em que Janis Joplin se esgoelava em Bethel, Fidel Castro proíbia o rock e mandava a polícia bater nos hippies em Cuba. Depois, o ditador cubano percebeu o "sex-appeal" da cultura dos sixties e mandou erguer, cinicamente, uma estátua de John Lennon em Havana. Isso mostra como a cultura hippie é facilmente apropriada até por quem a despreza.
Mas o que particularmente mais abomino nos hippies é o pacifismo bocó, que na época estava no auge por causa da Guerra do Vietnã. Se há algo que eu sempre refutei e que procuro desmascarar, é o pacifismo. Foi o pacifismo que preparou o terreno para algumas das piores tragédias da humanidade (quem quiser saber do que estou falando, estude a História da Conferência de Munique antes da Segunda Guerra Mundial). Com suas flores e visual colorido, os hippies, muito fumados e cheirados, não se deram conta de que estavam agindo como inocentes úteis de quem jamais teve qualquer compromisso com a paz, muito pelo contrário. O pacifismo seria muito interessante se não houvesse quem dele se aproveitasse do outro lado da Guerra Fria.
Essa mistura de culto às drogas-pacifismo-socialismo-de-miolo-mole deixou raízes profundas. Uma das estrelas do festival, o guitarrista mexicano Carlos Santana, apareceu há alguns anos na cerimônia da entrega do Oscar em Los Angeles com uma camiseta estampada com um enorme rosto de Che Guevara - outro ídolo daquela geração. Indagado por que escolhera aquela camiseta, ele soltou a seguinte pérola: "Che Guevara é paz, Che Guevara é amor, bicho!" Santana foi um dos que viveram intensamente aqueles dias em Woodstock. Na verdade, ele ainda está lá.
Hoje, há vários woodstocks pelo mundo. Todos os anos, é realizado, em um lugar diferente, o Forum Social Mundial, a Woodstock esquerdista-bolivariana. Há algumas semanas, houve uma Woodstock em Brasília, na forma de um Congresso estudantil, da UNE. Em todas essas ocasiões, rolou muito sexo, drogas e rock'n roll. Rolou muita imundície e desrespeito também, como puderam constatar os alunos das escolas públicas do Distrito Federal que serviram de dormitório-motel-boca de fumo-lixeira-latrina dos "estudantes" bancados com dinheiro público. Há dez anos, em 1999, empresários espertalhões quiseram reeditar, no mesmo lugar, o festival de Woodstock, ocorrido 30 anos antes: o resultado foi caos, vandalismo e violência.
Tudo isso pode parecer só ranhetice de minha parte, pura implicância minha com os bichos-grilos. Podem pensar assim, se quiserem. Mas faço questão de dizer: entre a "contracultura" e a Cultura - com "C" maiúsculo -, eu prefiro mil vezes esta última. Todos os discos dos Beatles e trinados de Mick Jagger, juntos, não valem um soneto de Camões. Prefiro Shakespeare a Janis Joplin; Homero a Jimi Hendrix; Voltaire a Jim Morrison. E prefiro analisar a realidade, e não fugir dela. Woodstock não passa de um retrato na parede. Um retrato embolorado. Que fique por lá mesmo.
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Um comentário:
Muito legal esse blog, gostei bastante. Eu quando era mais jovem gostava muito de Sepultura, Iron Maiden, Pantera, Pearl Jam, The Doors e por aí vai.... Ainda gosto, mas qdo vc vai notando que as letras TEM uma conotação política (não são todos os casos, evidentemente), vc passa a gostar menos da banda e fica mais conciente de qto na juventude vc era, na verdade, um idiota.
Abração,
Gustavo Silva
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