Chavista em ação nas ruas de Caracas:
democrático até demais, segundo Lula...
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O governo brasileiro, de Luiz Inácio Lula da Silva, está muito preocupado com os rumos políticos da América Latina. Está receoso, sobretudo, diante de uma grave ameaça que paira sobre a paz e a segurança na região. Uma ameaça realmente letal, que o fez inclusive solicitar a convocação de uma reunião especial da UNASUL - a União dos Países Sul-Americanos - realizada há alguns dias em Bariloche, Argentina. Diante de ameaça assim tão séria, acredita Lula, é preciso mobilizar todos os esforços, unir todos os governos.
Que grave ameaça é essa, capaz de provocar arrepios em Lula? Seriam as freqüentes ingerências de Hugo Chávez nos assuntos internos dos países vizinhos, inclusive com a descoberta de que está fornecendo armas pesadas aos comunonarcoterroristas das FARC? Seriam os constantes atentados à liberdade de imprensa na Venezuela, com a declaração de Chávez de que irá fechar dezenas de canais de rádio no país que dizem o que ele não gosta de ouvir? Seria a aliança militar de Chávez com o Irã de Mahmoud Ahmadinejad, cujo ministro da Defesa está na lista de procurados pela Interpol por explodir um centro judaico e algumas dezenas de pessoas em Buenos Aires nos anos 90? Seria o fato de que a Bolívia, sob a liderança entusiasmada de Evo Morales, está se tornando uma imensa plantação de coca para exportação para os promissores mercados das favelas brasileiras? Não. O que tira o sono de Lula e seus áulicos não é nada disso. É o acordo militar assinado entre... a Colômbia e os EUA.
O acordo Colômbia-EUA, como quem lê notícias sabe, prevê a permissão de uso, a militares norte-americanos, de sete bases colombianas nos próximos dez anos. Lula acha isso um absurdo. Acha que um país soberano, como é a Colômbia, não tem nada que se aliar aos gringos, e que isso pode vir a ser uma ameaça à Amazônia etc. etc. Está tão preocupado com o assunto que, na reunião da UNASUL em Bariloche, o presidente da Colômbia, Álvaro Uribe, teve de corrigi-lo, afirmando que, ao contrário do que disse nosso Guia Genial, não há "bases americanas" na Colômbia (as bases são colombianas, o acordo prevê apenas o direito ao acesso a elas por parte de militares americanos - e, ainda que as bases fossem de Tio Sam, a Colômbia tem o direito de cessão, assim como qualquer outro país). Mas nada disso adiantou: com o apoio de grande parte da imprensa, já se escolheu o "perigo" do momento: as "bases americanas" às portas da Amazônia.
Lula está preocupado, principalmente, porque o acordo foi assinado entre o governo da Colômbia, que não reza pela cartilha esquerdista-bolivariana do Foro de São Paulo, que ele criou em 1990 junto com Fidel Castro para "restabelecer na América Latina o que se perdeu no Leste Europeu", e o governo dos EUA que, mesmo com o companheiro Babaca Obama à frente, ainda é, bem, os EUA... O que o move não é, obviamente, qualquer preocupação genuína com a segurança do hemisfério, nem com a Amazônia. Se alguém tem alguma dúvida, que dê uma olhada na maneira realmente enérgica com que o governo brasileiro condenou igualmente a aliança militar de Chávez com os aiatolás iranianos, e inclusive o anúncio de que a Venezuela irá ajudar o programa nuclear do Irã (Ahmadinejad só prometeu varrer Israel do mapa, mas deixa pra lá...). Ou a reação realmente veemente do governo brasileiro diante da revelação de que armas, inclusive foguetes, venezuelanas foram encontradas num acampamento das FARC, e que estas deram dinheiro a Chávez e a Rafael Correa do Equador. É... Ameaça mesmo é o acordo entre a Colômbia e os EUA para combater o narcotráfico. Aliança militar, segundo Lula, só com amantes da paz e da liberdade, como Ahmadinejad e Vladimir Putin.
Todos os dias lemos e ouvimos elogios rasgados ao "pragmatismo" de Lula, à sua "moderação", em comparação com os arreganhos autoritários de Chávez, Morales, Correa etc. etc. Há mesmo quem diga que Lula é uma alternativa ao chavismo, um anteparo, podendo servir de mediador etc. Pena que faltou combinar com os fatos. Lula já declarou que, na Venezuela, há "democracia até demais" e, graças aos bons ofícios de Marco Aurélio Top Top Garcia, o Brasil adotou a corajosa posição de se declarar "neutro" entre o governo colombiano e as FARC, entre outras demonstrações de "pragmatismo" e "moderação" do mesmo naipe. Ou seja: Lula, Chávez, Morales, Correa e Ortega, para não falar no padre comedor Fernando Lugo do Paraguai, estão no mesmo barco, no mesmo lado: o da "revolução bolivariana". Até a The Economist, ao que parece, começou a acordar para essa realidade. Tenho apenas uma dúvida: quem é o líder, Lula ou Chávez. Se o critério a ser levado em conta for o histrionismo e a exibição na mídia, a resposta é, certamente, Chávez. Mas se for a antigüidade e o nível de bajulação por parte da intelligentsia, bem como a capacidade de dissimulação, não tenho dúvida: o estrategista, o chefe, é Lula. Até porque, numa guerra, a tropa de choque vai na frente, e o general fica na retaguarda.
Fatos como a grita geral contra o acordo Colômbia-EUA, em contraste com o silêncio acabrunhado acerca do apoio escancarado de Chávez ao narcotráfico e ao terrorismo, assim como a condenação praticamente unânime ao governo constitucional de Honduras em favor do retorno do golpista Manuel Zelaya ao poder, não deixam qualquer margem à dúvida: seja na versão hardcore chavista, seja em sua forma light lulista, a verdade é que agora somos todos bolivarianos. Pobre América Latina: tão longe de Deus, tão perto de Chávez e Lula.
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