quarta-feira, novembro 05, 2008

O MINISTRO TERRORISTA


Notícia da Folha de S. Paulo, volto depois.

05/11/2008 - 10h47

Esquerda armada não é terrorista, diz Tarso

da Folha Online

O ministro da Justiça, Tarso Genro, afirmou que os grupos de esquerda que adotaram a luta armada contra a ditadura militar "não podem ser classificados como terroristas". Tarso disse, porém, que a luta armada foi "um equívoco", apesar de essa decisão ser "compreensível historicamente", informa nesta quarta-feira reportagem de Kennedy Alencar, publicada pela Folha (a íntegra está disponível apenas para assinantes do jornal e do UOL).

"No caso brasileiro, um ou outro ato de terrorismo pode ter acontecido, mas não houve nenhuma organização que usasse os métodos do terror como prática permanente", disse.

A Folha indagou Tarso a respeito da declaração do ministro Gilmar Mendes, que afirmou que o "crime de terrorismo é imprescritível". O ministro da Justiça disse que não responderia especificamente ao presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), mas aceitou conversar em tese sobre o tema.

"Se o Ministério da Justiça não tiver opiniões a respeito dessas questões, emitidas com respeito a quem pensa diferente, não cumpre a sua função política institucional."

Comento
O que dizer de Tarso Genro? Vocês o conhecem. Ele já deportou, na calada da noite e em cumplicidade com Hugo Chávez, dois atletas cubanos que queriam fugir da ilha-prisão de Cuba, servindo de capitão-do-mato do tiranossauro Fidel Castro. Já recebeu em audiência agitadores armados que, um dia antes, haviam promovido uma arruaça a tiros em frente ao palácio do governo de São Paulo, ferindo com um balaço de pistola 9 milímetros um comandante da PM. Agora, de uns tempos para cá, encasquetou de querer mudar a Lei - no caso, a Lei de Anistia, de 1979. Quer porque quer, juntamente com Dilma Rousseff e Paulo Vanucchi, revogar a lei para que puna apenas um lado - o lado da repressão. Diante do chamado à razão - e à Lei - por parte do Ministro Gilmar Mendes (ainda há juízes em Brasília, felizmente), que apontou para o caráter imprescritível do crime de terrorismo (assim como o de tortura), Tarso não se fez de rogado: o que a esquerda armada praticou no Brasil nos anos 60 e 70 não foi terrorismo, diz ele.

Dita por uma pessoa comum, a afirmação acima seria apenas um equívoco histórico, ou mera demonstração de ignorância ou má-fé. Mas Tarso Genro não é um cidadão comum. É ninguém menos do que o Ministro da Justiça. Isso quer dizer que ele é, em teoria, a pessoa nomeada para tratar dos temas da Justiça no País e, como ele mesmo diz, emitir opiniões a respeito de assuntos concernentes, o que seria sua função constitucional. Acontece que, com ele, Tarso, o cargo passou a ter outra função: mistificar e distorcer a História para justificar o revanchismo.

Tarso Genro diz que a luta armada não pode ser classificada como terrorismo, mas como um "equívoco", além do mais, "compreensível historicamente". Duas conclusões lógicas decorrem inevitavelmente dessa afirmação. Primeiro, a repressão, a tortura e o AI-5 não foram, portanto, crimes, mas igualmente "equívocos", e "compreensíveis historicamente". Segundo, Tarso está em franco desacordo com os próprios militantes de esquerda que pegaram em armas no Brasil. Militantes como Carlos Mariguella, o principal ideólogo da luta armada, que em seus escritos - entre eles o Minimanual do Guerrilheiro Urbano, que se tornaria um clássico - disse coisas doces como as que seguem:

"Hoje, ser terrorista é uma condição que enobrece qualquer homem de honra porque isto significa exatamente a atitude digna do revolucionário que luta, com as armas na mão, contra a vergonhosa ditadura militar e suas monstruosidades". Citado em Elio Gaspari, A Ditadura Escancarada, 2002, p. 142.

"Sendo o nosso caminho o da violência, do radicalismo e do terrorismo (as únicas armas que podem ser antepostas com eficiência à violência inominável da ditadura), os que afluem à nossa organização não virão enganados, e sim, atraídos pela violência que nos caracteriza" ("O papel da ação revolucionária na Organização"). Citado em Daniel Aarão Reis Filho e Jair Fernandes de Sá, Imagens da Revolução, 1985, p. 212.

"Ao terrorismo que a ditadura emprega contra o povo, nós contrapomos o terrorismo revolucionário" - "La lutte armée au Brésil", novembro de 1969 - citado em Elio Gaspari, A Ditadura Envergonhada, 2002, p. 106.

Como se vê, das duas uma: ou Tarso Genro tem razão, e nesse caso Mariguella era um grande mentiroso, ou é ele, Tarso, que está mentindo. Fico com a segunda opção.

Mas Tarso Genro não se dá por satisfeito. Ele afirma ainda que "nenhuma organização armada [de esquerda] empregou os métodos de terror como prática permanente". Deve ter esquecido que a organização de Mariguella, a ALN, como os trechos acima não deixam dúvidas, abraçou o terrorismo de forma permanente como sua principal - a partir de certo momento, a única - forma de luta. E que foi seguida, nesse caminho, por outras siglas, como a VPR, o MR-8 e a VAR-Palmares, das quais participaram, como militantes, vários integrantes do atual governo. E que, nesse trabalho permanente, foram mortos e feridos não somente agentes da repressão, mas vítimas inocentes, atingidas em assaltos a bancos, seqüestros e atentados à bomba. Nenhum parente das pessoas mortas pela esquerda armada, cujo número total chega a 119, ao contrário das famílias dos 376 (ou 424, em outra contagem) mortos pela repressão política, recebeu, até o momento, nenhuma indenização do governo federal, nem mesmo um pedido de desculpas. Sabe-se que há casos, inclusive, de membros das próprias organizações armadas de esquerda fuzilados por seus próprios companheiros de luta. Mas isso não interessa a Tarso Genro.

A discussão sobre a revisão ou não da Lei de Anistia já se transformou num circo montado por Tarso Genro e outros que, como ele, querem reescrever a História para condenar os que combateram a esquerda e louvar os que cometeram atos terroristas. É uma iniciativa que se baseia em três falácias. A primeira já foi mencionada, é a que afirma que o terrorismo da esquerda não era terrorismo. A segunda sustenta o mito de que a luta armada de esquerda era uma forma de resistência democrática contra a ditadura militar. Contra a ditadura militar, não há dúvida que era, mas daí a dizer que os terroristas de esquerda queriam a democracia vai uma distância muito grande. As primeiras ações armadas de esquerda ocorrem ANTES do AI-5 - geralmente considerado o "momento inicial" da guerrilha no Brasil pela historiografia de esquerda -, com atentados como a explosão de uma bomba no aeroporto dos Guararapes, em Recife, que deixou dois mortos e 17 feridos em julho de 1966. Além disso - pesquisem se quiserem -, o projeto guerrilheiro era anterior ao próprio regime de 64, sendo levado adiante pelas Ligas Camponesas de Francisco Julião desde pelo menos 1961, em pleno regime democrático. Não há nenhum documento, um mísero pedaço de papel sequer - e olhem que a esquerda sempre foi pródiga em produzir manifestos, panfletos e resoluções - atestando que a democracia era o objetivo dos grupos armados de esquerda. Pelo contrário: como mostram Daniel Aarão Reis Filho e Jair Ferreira de Sá, TODOS os grupos da esquerda radical do período viam no socialismo, e não na democracia, o objetivo a ser alcançado; o que os guerrilheiros desejavam não era restaurar o status quo ante, mas implantar no Brasil um regime político semelhante ao de Cuba ou da China de Mao Tsé-tung. Em outras palavras: não lutavam pela democracia, mas para substituir uma ditadura por outra, muito mais terrível e assassina. Em nome desse objetivo, os militantes das organizações armadas de esquerda no Brasil mataram 119 pessoas, muitas delas sem nenhum envolvimento com os órgãos de repressão. Mas isso não é terrorismo, segundo Tarso Genro. Vale lembrar: esse é o mesmo governo que se recusa a considerar os narcobandoleiros marxistas das FARC terroristas.

A terceira falácia está diretamente ligada às demais, e vem agora sendo reforçada pela campanha revanchista de Tarso Genro et caterva. Trata-se de uma tentativa de politizar e de ideologizar o tema dos direitos humanos. Isso a esquerda vem fazendo de forma sistemática, diariamente, em relação à questão dos "anos de chumbo" do regime militar no Brasil. Para Tarso Genro, assim como para Dilma Rousseff, a esquerda é sempre vítima, jamais culpada. O terrorismo que ela pratica não é terrorismo; o combate a ele, sim. Logo, os mortos pelas mãos da esquerda, mesmo que simples transeuntes ou clientes de banco, não são vítimas - ou mereceram morrer, ou foram simples "danos colaterais" de uma luta necessária. A morte de um guerrilheiro, mesmo que em combate, porém, é algo terrível e escandaloso, que precisa ser denunciado. É uma maneira de dizer que os terroristas eram moralmente superiores aos torturadores, ou de afirmar, subrepticiamente, o seguinte: "Nós, da esquerda, podemos fazer o que aos demais mortais é vedado. Podemos matar, roubar, seqüestrar, explodir bombas, e estaremos fazendo algo glorioso e profundamente humanista. Todos aqueles que se colocarem em nosso caminho rumo ao comunismo são vermes e merecem ser esmagados".

A Lei de Anistia perdoou os dois lados, torturadores e terroristas. Foi justa? Pode-se discutir isso. Mas uma coisa é certa: tivessem os esquerdistas ganho a parada e tomado o poder, certamente o outro lado não teria sido perdoado. Aí está Tarso Genro para provar isso.

Ah, gostaram da foto? Adivinhem quem é o sujeito amarrando a venda nos olhos do prisioneiro prestes a ser executado pelo pelotão de fuzilamento: é Raúl Castro, irmão do Coma Andante e atual manda-chuva da ilha de Cuba. A foto é de 1959, quando Raúl e seu irmão Fidel tomaram o poder e passaram a pôr em prática, imediatamente, sua "justiça revolucionária". Raúl, que virá ao Brasil em dezembro, é um dos ídolos de Tarso Genro e Paulo Vanucchi, e é interpretado pelo galã Rodrigo Santoro num filme-exaltação sobre Che Guevara lançado no mês passado num festival de cinema em São Paulo. É mais uma prova do grande humanismo da esquerda, de seu compromisso inquebrantável com a democracia e os direitos humanos... Ou, quem sabe, um simples "equívoco", "compreensível historicamente", como diria Tarso Genro.
---
Quer ver mais fotos do humanismo da esquerda? Acesse www.therealcuba.com e vá em Photos - Firing Squad.

Nenhum comentário: