sexta-feira, julho 01, 2011

A CULPA DA VÍTIMA. OU: O TERRORISMO "CAVALHEIRESCO" DA ESQUERDA

O norte-americano Curtis Carly Cutler era cônsul dos EUA em Porto Alegre (RS) quando, em 4 de abril de 1970, sua caminhonete Plymouth foi fechada por um Fusca. Dele, sairam vários homens fortemente armados com revólveres e metralhadoras. Era uma tentativa de seqüestro. Não somente de seqüestro, mas de assassinato: depois de manobrar o automóvel para fugir dos seqüestradores, Cutler sentiu um forte impacto - um dos bandidos, frustrado pelo fracasso da operação, disparou contra ele um balaço de pistola .45, ferindo-o nas costas. Por pouco ele não morreu.

Em entrevista à revista Época (número 679, 23/05/2011), Cutler não mostrou qualquer ressentimento contra os agressores. Pelo contrário: defendeu - isso mesmo, defendeu - o que fizeram, e afirmou que, se estivesse no lugar deles, nas mesmas circunstâncias, talvez faria o mesmo. Disse ainda que, quando viu os criminosos presos, ficou "triste". Cutler declarou à revista que achou "muito cavalheiresco" da parte de seus frustrados captores não terem metralhado o carro em que estava (havia uma mulher e uma criança com ele no automóvel), e que considera "apropriado" terem lhe metido uma bala que transfixou seu ombro direito e passou raspando pelo pulmão... Em toda a entrevista, Cutler deixa transparecer certa culpa pelo ocorrido. Ele pede mesmo desculpas por ter jogado o carro contra os atacantes e fugido. Só faltou agradecer por ter levado um tiro.

Cutler é doido? É masoquista? Por que tamanha condescendência com quem tentou raptá-lo e, ainda por cima, abatê-lo a tiros? O que leva alguém que quase morreu numa tentativa de seqüestro a praticamente se desculpar por não se ter deixado capturar, e ainda por cima tecer tão calorosos elogios a seus atacantes?

A resposta Cutler dá na frase que é o próprio título da entrevista: "Nunca fui anticomunista".

O bando que tentou seqüestrar Cutler mais de quarenta anos atrás era de militantes da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), um dos vários grupos terroristas de extrema-esquerda que atuavam na época no Brasil. Um dos seqüestradores foi o ex-prefeito de Belo Horizonte e hoje ministro do Desenvolvimento do governo Dilma Rousseff (ela também, ex-participante de grupos armados esquerdistas), Fernando Pimentel.

Segundo a lenda cor-de-rosa polida pela esquerda hoje no poder, a VPR era uma organização de jovens idealistas que lutavam heroicamente contra a ditadura militar então vigente no Brasil, e em favor da democracia e da liberdade. Segundo os próprios documentos das organizações terroristas de esquerda, a VPR, assim como todos os demais grupos armados qua atuaram nos anos 60 e 70 no Brasil, opunha-se com armas à ditadura militar não porque desejasse a democracia, mas porque queria substituí-la por uma ditadura comunista - a qual, visto o retrospecto do comunismo no século XX, faria os militares brasileiros parecerem, em comparação, um grupo de escoteiros em férias.

Entre a realidade dos fatos e a mitologia esquerdista, Cutler preferiu esta última, a ponto de não se ver sequer como vítima de seqüestro e tentativa de homicídio. Pelo que se lê na entrevista, ele parece muito mais preocupado em se livrar da "pecha" (é assim que chama a revista) de anticomunista que teria recebido depois do seqüestro, explicando: "Ser anticomunista era ser como o senador Joseph McCarthy" (referindo-se ao presidente do Comitê para Assuntos Não-Americanos durante a "caça às bruxas" nos EUA nos anos 50). Ele diz mesmo que os terroristas "foram heróis" e chega a compará-los aos militares alemães que tentaram matar Hitler. Para ele, a VPR era uma organização que lutava pela democracia e os terroristas que a compunham, como Fernando Pimentel, eram freedom fighters, lutadores da liberdade.

Que os brasileiros, entorpecidos por décadas de propaganda ideológica esquerdista nas escolas, reforçada pela ignorância histórica, tenham-se deixado enganar pela falácia da luta armada como uma forma de "resistência democrática" contra a ditadura militar, vá lá, ainda dá para entender. Mas que uma vítima de um ato terrorista, perpetrado por um grupo que desejava implantar o comunismo no Brasil, ainda mais funcionário diplomático do governo dos EUA, venha a público aplaudir os que o atacaram - e que planejavam assassiná-lo como "espião da CIA", como comprova um comunicado apreendido na época pelas forças de repressão -, é algo que desafia qualquer compreensão. É algo que só pode ser explicado como manifestação da Síndrome de Estocolmo, ou da mais pura idiotia política.

Não é preciso ser defensor da censura e do pau-do-arara para constatar que Curtis Carly Cutler foi vítima de uma ação terrorista, um crime considerado hediondo e inafiançável. Também não é preciso ser a favor do regime militar para perceber que os que praticaram tal ato estavam se lixando para a democracia. Mas o mais importante: não é necessário ser antidemocrático - ou partidário do macarthismo - para ser anticomunista. De fato, é o inverso que é verdade: comunistas não defendem a democracia. Jamais defenderam. Pelo contrário: desprezam-na e combatem-na, aberta ou dissimuladamente.

Assim como não percebe essa verdade óbvia, Cutler demonstra total falta de senso de proporções. Por mais que se abominem as torturas praticadas pelos agentes do regime militar, comparar os generais brasileiros aos nazistas é o mesmo que comparar uma pulga a um elefante. Do mesmo modo, igualar os terroristas que assaltavam bancos e seqüestravam diplomatas estrangeiros como Cutler aos militares que se sacrificaram tentando livrar a humanidade de Hitler é uma afronta a esses últimos. Nem o general Médici era Hitler, nem Fernando Pimentel é um conde von Stauffenberg.

Fico me perguntando: se, em vez de comunistas, os terroristas que tentaram raptar Cutler fossem membros de um grupo neofascista, as palavras de Cutler seriam as mesmas? Alguém já viu um sobrevivente da tortura chamar de "cavalheiresco" o torturador que, podendo tê-lo matado, poupou-lhe a vida? (E o autor do disparo que atingiu Cutler provavelmente nem essa intenção teve.) Imaginem o escândalo se alguém na esquerda viesse dizer que a tortura foi "apropriada"... No mínimo, internariam o autor da declaração em alguma instituição psiquiátrica - e com toda razão.

A ânsia de Cutler em agradar os terroristas de esquerda, garantindo para si um atestado de simpatia ideológica, revela a persistência do tabu que os norte-americanos chamam de anti-anticomunismo. Trata-se da proibição tácita de se condenar os crimes dessa ideologia intrinsecamente criminosa e genocida, pois isso seria fazer o "jogo da direita". O comunismo matou mais de 100 milhões de pessoas, mas ainda assim possui uma aura moral que o fascismo, por exemplo, não tem. É o totalitarismo "do bem". Em nome dele, do comunismo, tudo, absolutamente tudo, é permitido; os crimes que se cometem em seu altar são inimputáveis. Em nome dessa causa sagrada, vale até mesmo ser baleado numa tentativa de seqüestro. Isso mostra a que ponto chegou a lavagem cerebral comunista: provavelmente, se soubesse que o grupo que tentou seqüestrá-lo era de "guerrilheiros", Cutler não teria oferecido qualquer resistência. Teria sido sua contribuição à "causa"...

Na ex-URSS, durante o grande terror dos expurgos stalinistas, era comum as vítimas dos fuzilamentos morrerem gritando vivas a Stálin e ao comunismo. Muitos até se reconheciam culpados de crimes imaginários, e passavam mesmo a acreditar que os tinham cometido, pois o Partido assim o dizia (e o Partido estava sempre certo). A se julgar pela entrevista do ex-cônsul Curtis C. Cutler à Época, a culpabilização da vítima e a glorificação dos carrascos, fenômeno típico do stalinismo, continuam mais fortes do que nunca. Pelo menos enquanto persistir o monopólio esquerdista da História dos "anos de chumbo" no Brasil.

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