terça-feira, maio 31, 2011

OS ASSASSINOS "DELES" E OS "NOSSOS". OU: TERRORISTAS E TORTURADORES, QUAL A DIFERENÇA?

Existe um troço chamado "Amor e Revolução". Trata-se de uma telenovela exibida pelo SBT, a rede de televisão de Sílvio Santos. O enredo - se é que se pode chamar assim coisa tão tosca - tem como tema central os chamados "anos de chumbo" da luta armada durante o regime militar, nos anos 60 e 70. Uma coleção de clichês ideológicos e de meias-verdades sobre o período, que até parece saída de uma cartilha do MEC encomendada e aprovada por Fernando Haddad, "Amor e Revolução", a começar pelo título, é um lixo, uma porcaria típica dos programas da emissora de Sílvio Santos.

Desde que a Rede Globo - estupidamente rotulada de "direitista" pelos bocós da esquerda jurássica - inaugurou o filão, levando ao ar em 1992 a minissérie Anos Rebeldes para coincidir com o impeachment do neocompanheiro Fernando Collor de Mello, não se via tamanha falsificação histórica, tanta bobagem travestida de História na televisão brasileira. "Amor e Revolução" é o retrato perfeito da historiografia predominante sobre o regime militar no Brasil, na qual prevalece uma visão edulcorada da esquerda armada e a condenação maniqueísta dos militares.

Nem é preciso assistir a um capítulo da telenovela-trash (e mesmo se eu pudesse, não perderia meu tempo vendo essa bobajada); basta ler a sinopse para perceber o tamanho da propaganda ideológica travestida de teledramaturgia. Nesse caso, propaganda a favor dos "guerrilheiros", mostrados sempre - sempre, sem exceção - com uma aura de santidade, como jovens idealistas e heróicos, em luta contra a cruel e assassina ditadura militar, pela "democracia" e "por um mundo melhor". Os militares, por sua vez, são sempre - sempre, sem exceção - retratados como torturadores malvados e desumanos. Já seria constrangedor o bastante, se a novela, assinada por um autor importado da Record do "bispo" Macedo (outro amigão da turma do Planalto), não tivesse a qualidade artística de um dramalhão mexicano, com personagens que beiram o ridículo na forma amadoristica com que são interpretados, perto da qual Malhação parece uma jóia de dramaturgia shakesperiana.

Além do caráter trash da novelinha, há outro aspecto que vale a pena ressaltar. O dono do falido Banco Pan-Americano, ao que parece, pegou gosto pela "Semana do Presidente" - programinha que ia ao ar em sua emissora nos anos 80, em que o homem do baú bajulava os presidentes de plantão. Senor Abravanel sempre se deu bem com o governo, qualquer governo. Com o de Dilma Vana Rousseff, a Rainha Muda, não é diferente. Ele quis fazer um agrado à ex-companheira Stela da Vanguarda Popular Revolucionária, que tem no "passado de luta" uma peça importante do mito criado em torno de sua figura (o que ela realmente fez no período, estranhamente, permanece um mistério, e, se depender dela, permanecerá assim até o fim dos tempos). Só não precisava apelar na teledramaturgia de quinta e na pesquisa histórica de vigésima categoria. O público, pelo visto, não engoliu muito bem a patacoada, pois a coisa anda patinando no ibope. Tanto que o diretor resolveu incrementar a trama, incluindo um beijo lésbico na novela para ver se rendia alguns pontos a mais na audiência. (E assim fazer uma média com a turma GLBTT; sabe como é: amor, revolução, beijo lésbico, essas coisas...)

Pois bem. Se há algo que se salva nesse amontoado de slogans esquerdistas embalados numa roupagem que ficaria bem n'A Praça é Nossa são os depoimentos que alguns personagens reais aceitaram dar ao final de cada capítulo. Andei assistindo a alguns deles. Refletindo a hegemonia absoluta da esquerda nesse tema, a imensa maioria dos depoimentos - praticamente 90% - é de ex-militantes de organizações esquerdistas, como o guerrilheiro de festim José Dirceu, que repetiu pela enésima vez o personagem que criou para si mesmo, com aquele sotaque caipira forçado (fala-se que a própria Dilma Rousseff pode dar um depoimento até o fim da novela). Como era de se esperar, eles carregam na "luta pela democracia e pela liberdade" e na descrição das torturas que dizem ter sofrido nas mãos de seus captores militares etc. etc. Aqui e ali, uma vítima do terrorismo de esquerda, como o aposentado Orlando Lovecchio, que perdeu a perna na explosão de uma bomba em São Paulo em 1968, e o filho de um guarda assassinado por terroristas no assalto a um hospital (!), contam a sua história. Mas o predomínio é de gente de esquerda, que capricha no papel de vítima da repressão e merecedora da devoção das novas gerações.

Dentre os depoimentos da turma esquerdista, há um realmente assombroso. É o do hoje professor de música Carlos Eugênio Sarmento Coelho da Paz. Apesar do último nome ("da Paz") e do codinome utilizado nos anos de clandestinidade ("Clemente"), a história de Carlos Eugênio é barra-pesada. Ex-chefe do grupo tático armado da ALN (Ação Libertadora Nacional), organização terrorista criada pelo ex-deputado comunista Carlos Mariguella (morto em 1969), Carlos Eugênio narra com riqueza de detalhes uma das ações de que participou - o assassinato (os terroristas chamavam de "justiçamento") de um empresário, o dinamarquês Henning Albert Boilesen, numa rua de São Paulo, em 1971. Boilesen, que era acusado pela guerrilha de financiar a repressão, foi morto à queima-roupa, em plena luz do dia, com dezenas de tiros de fuzil e metralhadora disparados por Carlos Eugênio e outros terroristas. "Clemente" parece sentir prazer ao lembrar dos tiros de fuzil Mauser que ele disparou e que acertaram o empresário, abatido sem qualquer chance de defesa. E justifica o assassinato, lembrando que era uma guerra etc. e tal. Chega mesmo a sugerir que havia uma certa "beleza" na execução daquele "inimigo do povo"...

Não vou me estender aqui analisando o depoimento de Carlos Eugênio (que nunca foi preso e recebeu uma generosa indenização, como "perseguido político", da Comissão de Anistia da Presidência da República): Reinaldo Azevedo, em seu blog, já fez isso, num post devastador (http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/cuidado-leitor-abaixo-voce-lera-o-testemunho-de-um-assassino-frio-convicto-metodico-e-apaixonado-pela-morte-depois-voce-podera-ate-assistir-a-seu-testemunho-e-isso-e-so-o-comeco/). Vou me limitar a fazer uma pergunta.

Digam-me, com toda sinceridade, que diferença existe entre Carlos Eugênio e os assassinos de Rubem Paiva e de Vladimir Herzog? Além do fato de pessoas como Carlos Eugênio terem recebido gordas indenizações do Erário - não bastou terem sido anistiados, ainda recebem grana do Estado pelo que fizeram -, o que as difere dos torturadores a serviço do regime militar? Há assassinos "do bem" e "do mal"? Ou há somente assassinos?

Imaginem um ex-agente do DOPS ou do DOI-CODI vindo a público descrever de forma minuciosa como arrebentou todos os ossos do subversivo preso no pau-de-arara e na cadeira do dragão. Imaginem-no relatando nos mínimos pormenores como ele torturou sua vítima até a morte. Agora pensem nele dizendo isso com orgulho, buscando justificar esse crime bárbaro na base do "era uma guerra, eles também faziam" etc. Alguém conseguiria presenciar tal cena sem vomitar?

Carlos Eugênio escreveu dois livros - Viagem à Luta Armada e Nas Trilhas da ALN, publicados respectivamente pelas editoras Civilização Brasileira e Bertrand Brasil. Li os dois há algum tempo. Neles, ele descreve, usando pseudônimos, atos como o frio assassinato de Boilesen, decidido pelo "tribunal revolucionário" da ALN de Mariguella (autor de um manual em que se dizia orgulhoso de ser um terrorista). Uma das ações de que participou foi o "justiçamento" de outro militante da organização, Márcio Leite de Toledo, fuzilado com oito tiros por Carlos Eugênio e outro carrasco, no mesmo ano e na mesma cidade em que foi assassinado Boilesen.

Carlos Eugênio tenta justificar a morte de Boilesen como um ato da "revolução" - tal como está no título da telenovela do SBT -, pois afinal o empresário dava dinheiro para a repressão etc., como se isso justificasse o homicídio. O mesmo não pode dizer de Márcio Leite de Toledo, exterminado não porque fosse um "inimigo", mas porque desejava abandonar a luta armada... É assim que agem os revolucionários de esquerda: começam matando burgueses e terminam aniquilando a si próprios.

Carlos Eugênio candidatou-se a deputado nas últimas eleições. Teve uma votação ridícula. Felizmente. Imagino um debate entre ele e o deputado Jair Bolsonaro, também do Rio de Janeiro. Carlos Eugênio se apresentou aos eleitores como um ex-guerrilheiro e combatente contra o regime militar, orgulhoso de ter matado "pelo menos seis" pessoas. Bolsonaro, ao que se saiba, jamais torturou ou matou ninguém. Qual dos dois, Carlos Eugênio ou Bolsonaro, mais representa a barbárie?

Na história romanceada da luta armada de esquerda no Brasil, Carlos Eugênio, Mariguella e Lamarca foram heróis. Não é de estranhar. Afinal, o nome que ele usava na clandestinidade era "Clemente"...

Por favor, alguém me responda: qual a diferença entre um terrorista e um torturador?

2 comentários:

Ninja disse...

Entre um terrorista e um torturador não há a menor diferença. Por isso, ambos devem ser punidos por seus crimes contra a humanidade. A anistia irrestrita é uma grande babaquice!!! Tinha que estar todo mundo na cadeia, terroristas e torturadores!

João de Deus disse...

O Brasil recebeu um golpe dos militares, que tiraram um presidente legalmente constituído. Era preciso reagir. Chamar a reação de terrorismo é ridículo!