
Refiro-me, claro, à Operação Salvem o Sarney, ditada desde o gabinete do presidente da República - mas podem chamar Operação Dilma 2010, que dá na mesma. Se havia ainda alguma dúvida - e, acreditem, ainda há quem as tenha - de que o PT nada mais é do que uma correia de transmissão da vontade de Lula, e que esta é atualmente a mesma de figuras como Sarney, Collor e Renan Calheiros, a farsa encenada no tal "conselho de ética" no Senado tratou de enterrá-la para sempre. Irrevogavelmente, como diria o senador Aloízio Mercadante, o Irrevogável, que deu um novo sentido à palavra no episódio, depois de uma conversa com o chefe.
Como acontece quando a vergonha é grande demais para esconder, a salvação do neocompanheiro Sarney gerou algumas defecções na grei petista. A mais notável foi a da senadora Marina Silva, que se bandeou lá para o lado dos verdes, onde aliás sempre esteve. Saiu dizendo que o governo Lula não dá bola para as "causas sociais" etc. Como se fosse somente agora, com a pantomima do Senado, que estivesse claro que coisas como Bolsa Família e Fome Zero nunca passaram de um engodo para iludir os trouxas e perpetuar o que dizem combater. Mais honesto foi, a meu ver, o senador Flávio Arns, que, talvez por estar no primeiro mandato, pôde se dar ao luxo de certa sinceridade. Só errou, e errou feio, ao dizer que o PT jogou no lixo seu ideário etc. e tal. O "ideário" do PT, como está demonstrado com clareza quase pornográfica, nunca foi outro senão o poder, única e simplesmente. Assim como o único compromisso de Lula é com Lula. Se era para pular fora do barco e se mostrar decepcionado com um partido que teria rasgado suas bandeiras, a defecção de Arns está pelo menos quatro anos e um mensalão atrasada.
Do mesmo modo, como a glória tem mil pais, mas a vergonha é órfã, não faltará também quem tente, numa hora dessas, descolar o PT da figura de Lula, como se o opróbrio devesse recair somente sobre o PT, e não sobre Sua Excelência, o presidente da República. Falso. Se há algo que a atitide da tropa de choque pró-Sarney deixou claríssimo é que Lula é o PT, e o PT é Lula. Mercadante que o diga. O petismo e o lulismo são inseparáveis. Não haveria PT sem a figura de Lula que o unisse e lhe desse sustentação, assim como não haveria Lula sem o esquerdismo acadêmico que grassa no País há uns cinqüenta anos no mínimo, e que tratou de elevar o ex-operário à condição de santo. Lula é uma invenção da intelligentsia tanto quanto o PT foi uma mentira de sociólogos.
Hoje, aliás, a definição do que é Lula e do que é o PT está até mais abrangente. Pelo que se viu nesses últimos meses, Lula (e o PT) é Sarney, é Collior, é Renan Calheiros.
O que fica do papelão que o PT promoveu no caso Sarney é que o petismo, como ideologia, foi mesmo pro saco. Na verdade, o petismo, a versão tupiniquim mais elaborada do esquerdismo, foi uma ilusão popular, do tipo que é analisado por Charles Mackay em seu livro clássico. Mas engana-se quem pensa que os esquerdistas bocós e utopistas de galinheiro irão aposentar de vez seus sonhos revolucionários. O petismo pode ser um cadáver, mas o lulismo está aí, firme e forte. Será preciso muito mais do que um José Sarney para que ele vá para o lugar que lhe é de direito - a lata de lixo da História.
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Acendamos uma vela, portanto. Não para o lulismo, pois infelizmente este ainda nos atormentará por algum tempo. Mas para a vergonha na cara.
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