segunda-feira, setembro 22, 2008

O CAPITALISMO MORREU! (Pela milionésima vigésima vez...)


Confesso que não ligo muito para economia. As notícias sobre o assunto, mesmo quando se trata de uma crise séria e de possível alcance mundial como a que atualmente aflige os EUA, não costumam me despertar maior interesse. Meu conhecimento sobre o tema, já escrevi aqui, não vai muito além de algumas noções básicas sobre macroeconomia e teoria econômica, além de história da economia, aprendidas meio que à força, por obrigação. Acho qualquer assunto que tenha a ver com dinheiro, números, cálculos etc., extremamente entediante. Sempre que o jornal anuncia os números da inflação ou do crescimento do semestre, sou tentado a mudar de canal, como tenho vontade de fazer sempre que William Bonner e Fátima Bernardes anunciam o último treino da seleção brasileira de futebol e a próxima entrevista de Ronaldinho Gaúcho. Nesses momentos, busco em outra emissora alguma informação atualizada sobre a guerra na Geórgia ou sobre a crise na Bolívia. É um defeito imperdoável de minha parte, admito. Mesmo assim, não resisto a escrever alguma coisa sobre algo de que julgo entender um pouco - a manipulação das notícias pela esquerda jurássica e oportunista, que se revela na cobertura de muitos jornais sobre a quebradeira no país de Jorjibúxi.

A falência do banco Lehman Brothers e a intervenção salvadora do governo Bush nos mercados deram o mote perfeito para que os dinossauros colocassem a cabeça para fora da toca e praticassem seu esporte preferido - desancar o capitalismo. Sentindo-se cheios de razão, muitos colunistas, subitamente convertidos em analistas econômicos, como Emir Sader e Luiz Fernando Veríssimo, não perderam essa oportunidade de apontar aquilo que consideram uma contradição gritante do sistema neoliberal norte-americano, que teria, segundo essas mentes privilegiadas de defensores do cleptopetismo estatal e do socialismo cocaleiro-bolivariano, deixado as coisas saírem do controle em nome do "deus-mercado", apenas para apelar para o guarda-chuva do intervencionismo estatal. "É o fim do neoliberalismo", logo se começou a ouvir, com a esquerda, exultante, repetindo Francis Fukuyama - o "último homem", nesse caso, seria o "homem novo" socialista, como um dia quis criar em Cuba o fedorento Che Guevara.

É sempre assim. Ocorre uma crise em Wall Street, as bolsas despencam, os corretores arrancam os cabelos, o governo se vê obrigado a injetar dinheiro para salvar o sistema, e os inimigos do mercado e da sociedade aberta têm verdadeiros orgasmos, anunciando o tão esperado - e, para eles, sonhado - apocalipse. "O capitalismo morreu, o capitalismo morreu!", é o que repetem para si mesmos, nesses momentos, como um mantra. É. Eles têm razão. O capitalismo morreu. Mais uma vez. Sua primeira morte foi em 1929, com o crash da Bolsa de Valores de Nova York e o início da Grande Depressão dos anos 30. Depois, morreu novamente, no começo dos anos 60, quando o então chefão da falecida União Soviética, Nikita Krushev, anunciou em tom solene que eles, os comunistas, iam enterrar os capitalistas. Finalmente, sua missa de sétimo dia ocorreu em meados dos anos 70, quando os mercados entraram em parafuso por causa da crise do petróleo. E foi morrendo e ressuscitando, morrendo e ressuscitando... O capitalismo, em sua encarnação atual de "neoliberalismo", morreu. E vai ressuscitar de novo. E de novo, e de novo. Para consternação dos Veríssimos e Sáderes, que continuarão proclamando, com ares professorais, sua morte iminente e inexorável, como previra o inefável Marx.

Não é preciso ser nenhum gênio para perceber que os esquerdistas, nesse caso como em todos os outros, confundem a realidade com a própria vontade, o que é típico de mentes psicopatas. Acreditam que os 700 bilhões injetados por Bush na economia são o prenúncio do fim do capitalismo (ou do "neoliberalismo", como gostam de dizer) e o início de uma era de ouro de intervencionismo e dirigismo estatal porque assim o desejam. Está sendo assim agora, como o foi antes, e o será depois. Não contentes com essa manifestação de voluntarismo triunfalista travestido de análise econômica, os companheiros também adoram posar de moralistas, acusando o governo Bush - além de tudo, é o governo Bush! - de usar o dinheiro do contribuinte para salvar banqueiros e empresas da falência, como FHC teria feito com o PROER no caso dos bancos. Aqui, seja por auto-ilusão, seja por desonestidade intelectual, seja pelas duas coisas, confundem salvação do sistema com maracutaias - única forma pela qual eles conseguem engatar um raciocínio.

Uma coisa é socorrer empresa falida, como se tornou comum no nosso "capitalismo" de compadres, baseado no uso e abuso do dinheiro público para compensar a incompetência e os desmandos de empresários que vivem de mamar nas tetas da vaca sagrada estatal - algo de que os petralhas entendem bastante. Outra coisa, muito diferente, é manter os fundamentos e a estabilidade do sistema econômico, impedindo uma reação em cadeia que pode degenerar em colapso para todos. É para isso, a propósito, que existe o Estado. Ou, como diz Reinaldo Azevedo em seu blog: "É evidente que o estado não deve socorrer empresa quebrada. Que quebre! É do jogo. Mas é preciso distinguir esse tipo de intervenção, muito comum em Banânia, da chamada crise sistêmica, da quebradeira geral — que não puniria apenas as empresas incompetentes e os especuladores. Também o dinheirinho no banco do homem comum, que é o verdadeiro dono da grande massa do meio circulante do sistema, iria para a cucuia."

Já relatei aqui a época em que eu militava numa seita de extrema-esquerda, que defendia a derrubada do capitalismo e a revolução proletária mundial, no começo dos anos 90. Naqueles tempos de porralouquice, lembro bem, começávamos qualquer análise de conjuntura com o seguinte mantra: "o capitalismo, em sua fase final de crise (ou desintegração)..." Era a plena época, vejam bem, de euforia econômica do início da globalização. Mesmo assim, tínhamos como certa e verdadeira a noção de que o capitalismo entraria em crise, mais cedo ou mais tarde, e que seu colapso era inevitável. Isso, para nós, era um dogma, um fato da natureza, assim como o nascer e o pôr do sol. Pois é. Certas coisas não mudam mesmo. O capitalismo vive de crises cíclicas e periódicas, renovando-se e fortalecendo-se após cada uma delas. O socialismo, ao contrário, é perfeito, como demonstrou o século XX.

Até a próxima crise. E até a próxima morte e ressurreição do capitalismo.

Um comentário:

Gilvan Ximenes disse...

Gustavo,

Seu pensamento a respeito do capitalismo não deixa de ser um clichê,no entanto, em parte, concordo com o conteúdo e discordo integralmente da forma. Para quem se declara experiente nesse tipo de análise, falta a serenidade e humildade próprias daquele que, vendo-se no topo, deve compadecer-se dos incauto ou ignóbeis da base. Até os não intelectuais honestos já sabem do mal que aflige toda a sociedade que respira o capitalismo e nem há necessidade de ser psicopata para engatar um raciocínio assim. O motivo dos refluxos (quebradeira) e fluxos (injeção de dinheiro público) vitais do capitalismo está insculpido naquilo que não queremos ver porque é simples demais: a corrupção dos sentimentos. O livre mercado regulado pelo Estado é vital, sobretudo quando o Estado intervem para evitar um mal maior - você disse muito bem -, contudo, que a facilidade do socorro não incentive a irresponsabilidade e a incompetência na gestão dos interesses e do dinheiro públicos. Isso, sim, é o que deveria ser enfatizado no seu artigo, não ater-se a proclamar o óbvio. A propósito, sugiro que faça uma leitura (sem querer ofender seu currículum)do pensamento de Tony Judt, em sua mais recente obra "O Mal Ronda a Terra", quando trata do Culto do Privado.