segunda-feira, agosto 06, 2007

UMA CATÁSTROFE INEVITÁVEL

"Qualquer pessoa é criminosa quando promove uma guerra evitável; e também o é, quando não promove uma guerra inevitável". (José Martí)


Em 3 de julho passado, o Ministro da Defesa do Japão, Fumio Kyuma, renunciou após ter provocado uma avalanche de críticas, por sua declaração de que o lançamento das bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki, ao término da Segunda Guerra Mundial, foi inevitável. Kyuma foi obrigado a deixar o cargo, sob uma chuva de protestos dos sobreviventes e de entidades pacifistas, os quais, de forma muito compreensível, acusaram-no de insensibilidade diante da dor de tantos milhares de pessoas, sacrificadas no altar do maior conflito de todos os tempos. Além do mais, um Ministro da Defesa justificar publicamente o lançamento de duas bombas atômicas sobre seu próprio país, convenhamos, é algo inadmissível.

A renúncia de Kyuma demonstra que, ainda hoje, os fantasmas do passado insistem em assombrar países como o Japão e, também, todos nós. É impossível mencionar os nomes Hiroshima e Nagasaki sem sentir um frio na espinha. Os números dos mortos - mais de 200 mil -, a devastação causada pelas explosões, os relatos de pessoas vaporizadas pelo calor ou devoradas lentamente pela radiação, o fato de as vítimas terem sido quase todas civis, o assustador cogumelo atômico erguendo-se sobre as duas cidades, assombram e assombrarão a consciência da humanidade por muitos anos ainda. Afinal, matar civis, e ainda por cima aos milhares de uma vez, utilizando uma tecnologia até então desconhecida, parece e é um crime indefensável. O fato de terem sido os EUA os autores da façanha, então, torna-a ainda mais revoltante, fazendo levantar em todo o mundo vozes de repúdio e condenação.

Indignações à parte, e analisando-se a História com frieza - ou mesmo sem frieza, à quente -, sou obrigado, entretanto, a concordar com o Ministro demissionário japonês. As bombas e a tragédia humana sem precedentes que provocaram foram mesmo inevitáveis. Por mais doloroso que seja admitir isso, trata-se de um dever de honestidade, de sinceridade perante a História. Sem as duas explosões sobre Hiroshima e Nagasaki, o Japão dificilmente se renderia, a guerra, que até aquele momento já ceifara a vida de mais de 50 milhões de pessoas, se arrastaria por vários meses ainda, talvez anos. A quantidade de mortos, o sofrimento de ambos os lados, seria sem dúvida muito maior.

Você deve estar se perguntando: não havia outro jeito de pôr fim à guerra? Certamente havia, mas as conseqüências seriam muito piores. Vejamos o contexto. Em agosto de 1945, EUA e Japão já estavam em guerra havia quatro anos, e as forças nipônicas, embora batidas no campo de batalha, não davam mostras de que iriam render-se. Aliás, a rendição ao inimigo, no código de guerra japonês (bushido), era considerada uma indignidade, algo pior do que a morte. Não por acaso, os militares japoneses ficaram célebres pela brutalidade com que tratavam os prisioneiros, chegando ao ponto de treinar tiro-ao-alvo e praticar ataques de baioneta em alvos humanos. Cidades inteiras, como Nanking, tiveram sua população exterminada pelas forças nipônicas. Milhares de civis chineses foram usados como cobaias em experiências biológicas, semelhantes às que os nazistas praticaram contra os judeus na Europa. Os soldados japoneses lutaram literalmente até o fim em Iwo Jima e Okinawa, e muitos civis se suicidaram para não cair nas mãos do inimigo em Saipan e Tiniam. A simples idéia de rendição era um anátema para o povo nipônico, que, fanatizado pela tradição e por uma ideologia racista e militarista, idolatrava o imperador como um deus vivo - não o representante de Deus na terra, não um intermediário entre os homens e a divindade, mas a encarnação mesma do Todo-Poderoso. Nessas condições, a idéia dos marines desembarcando na baía de Tóquio sem um banho de sangue infernal era simplesmente impensável. O governo norte-americano calculara em cerca de 1 milhão o número de mortos, civis e militares, caso os EUA tentassem uma invasão do arquipélago japonês.

Tendo saído de um isolamento de séculos, o Japão jamais havia perdido uma guerra, tendo derrotado, sucessivamente, chineses, coreanos e russos, antes de lançar-se à conquista militar do Leste da Ásia e das ilhas do Pacífico. Nesse processo, os japoneses foram responsáveis por algumas das maiores atrocidades e crimes de guerra da história da humanidade, só comparáveis aos dos nazistas, os quais incluíram o uso de armas químicas e biológicas, bombardeios indiscriminados e a escravização sexual de milhares de mulheres nos países ocupados - tema freqüente de atritos diplomáticos, ainda hoje, com países como a China e a Coréia do Sul. Não havia perspectiva de paz à vista, a curto ou médio prazo. O mundo já estava cansado da carnificina e da insanidade da guerra. A Alemanha já fora devastada pelos bombardeios aliados - somente em Dresden, morreram mais civis do que em Hiroshima e Nagasaki - e Tóquio já fora alvo de devastadores ataques dos B-29. Foi então que os EUA tiveram a idéia da bomba. Aquela foi uma decisão essencialmente militar. Foi a mais difícil decisão que um presidente - Harry S. Truman - teve que tomar até hoje. Uma duríssima necessidade, tornada inevitável pela obstinação do inimigo.

Não faltou quem dissesse, terminado o pesadelo da guerra, que as bombas atômicas sobre o Japão não influíram de forma decisiva para a decisão japonesa de render-se. Que tudo não teria passado de uma demonstração de força dos norte-americanos para impressionar o verdadeiro inimigo, que então começava a despontar sobre as ruínas do Eixo nazi-fascista: a URSS. Há vários motivos para discordar dessa tese. Em primeiro lugar, pelas razões já apontadas, que demonstram que, apesar da derrota em ferozes batalhas, o Japão estava longe de aceitar a rendição. Em segundo lugar, e o mais importante, tal interpretação constitui um anacronismo, sendo um produto da Guerra Fria. É preciso lembrar: a URSS não condenou o lançamento das bombas, logo após o ocorrido. Só começou a fazê-lo alguns anos depois, já iniciada a disputa ideológico-militar com os EUA e o mundo ocidental. Logo, a verdadeira motivação dessas críticas não era a indignação moral diante de um assassinato em massa - até porque de assassinatos em massa os líderes da URSS entendiam bastante -, mas um objetivo político-propagandístico.

Há um outro aspecto pouco lembrado na tragédia de Hiroshima. Quando o Enola Gay despejou sua carga mortal sobre a cidade, quase ninguém, nem mesmo os cientistas do Projeto Manhattan, sabiam ao certo seus efeitos. O gesto de lançar a bomba foi, assim, uma ação calculada para terminar a guerra, mas também um ato de desespero. Nada que possa ser comparado aos argumentos cínicos de países como o Irã e a Coréia do Norte, os quais, sob a alegação de que é necessário "quebrar o monopólio nuclear das superpotências", insistem em seus programas atômicos clandestinos. Ao contrário dos EUA quando bombardearam o Japão, os líderes desses países conhecem perfeitamente do que uma explosão nuclear é capaz. Não desejam adquirir essa tecnologia para acabar com alguma guerra, para forçar um inimigo obstinado à rendição, mas para chantagear o mundo. Isso retira qualquer legitimidade a seus propósitos.

Hoje, 6 de agosto, faz 62 anos que o primeiro artefato nuclear caiu sobre Hiroshima. Desde então, a data passou para a História como o marco inicial da era atômica. Crescemos, todos aqueles que nasceram após 1945, sob a sombra da ameaça da aniquilação total, primeiro nos anos da Guerra Fria entre EUA e URSS e, hoje, na forma da proliferação nuclear, representada por organizações terroristas como a Al Qaeda e governos imprevisíveis como os de Teerã e de Pyongyang. Hiroshima continuará a ser um símbolo da loucura humana. Mas, é forçoso admitir, se não quisermos ter uma visão unidimensional da História, que a loucura, nesse caso, não se restringe àqueles que tomaram a decisão de lançar a bomba. Nem está ausente dos cálculos de muitos que se acostumaram a condená-la.

3 comentários:

Anônimo disse...

tú és um bosta!

Anônimo disse...

CRIMINOSOS SÃO OS ALIADOS QUE INVENTARAM O MASSACRE DE NANQUIM PARA JUSTIFICAR AS BOMBAS LANÇADOS NO JAPÃO!

INVENÇÃO?

VER O SITE http://www.ne.jp/asahi/unko/tamezou/nankin/index-e.html

Anônimo disse...

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