terça-feira, maio 25, 2010

A COMÉDIA IRANIANA DE LULA. OU: UM TEXTO ME DÁ MAIS UM MOTIVO PARA NÃO SER "NENHUMLADISTA"

Como sempre faço quando um assunto me interessa, procuro ler tudo que posso sobre o tema. Isso inclui textos idiotas, panfletários ou de propaganda ideológica, ao lado de análises sérias, escritas com lógica e bom senso. Inclui também aquele tipo de texto em que o autor procura o tempo todo se omitir de dizer a que veio, em nome de uma “isenção” erroneamente identificada com equilíbrio e sabedoria, como se o “meio-termo” fosse sempre a justa medida da verdade para todas as coisas, e não, como geralmente acontece, uma capa para encobrir o medo elementar de fazer escolhas morais.

Um exemplo dessa mentalidade “isentista” ou “nenhumladista” é um texto de um velho conhecido deste blog, o Pablo Capistrano (http://www.diariodenatal.com.br/2010/05/25/opiniao.php). Pablo, aliás, há algumas semanas me expulsou de seu website por causa de uma comparação que eu fiz e que ele não achou legal, envolvendo galináceos. Na ocasião, até escrevi de volta, tentando mostrar que não há qualquer sentido agressivo ou atentatório à honra pessoal mostrar a diferença entre carne, frango e chester (ver meu texto "A arte da tergiversação", neste blog), mas não adiantou: meu texto foi vetado e me vi banido do site. Agora Pablo vem comprovar que aquela minha analogia estava certa, com um artigo que, a começar pelo título (“Nem tanto, nem tão pouco”), apenas reforça minha atitude de fugir da neutralidade quando se trata do governo Lula, especialmente em questões como o recente “acordo” com o Irã.

Pablo começa dizendo que teve o cuidado de deixar passar uma semana e ler e ouvir tudo que pôde sobre o tal “acordo” envolvendo Brasil,Turquia e Irã anunciado com fanfarra no começo da semana, o qual se revelou (mais) um monumental fiasco da diplomacia lulista. Ele diz que não gosta de formar uma opinião apressada e que é fácil exagerar, reduzir, distorcer etc., buscando evitar interpretações simplistas e rudimentares sobre certos fenômenos etc., etc. Atitude louvável, sem dúvida, que também procuro seguir à risca. Principalmente quando quem está na berlinda é algum governo de “direita”, contra o qual se forma um suspeitíssimo consenso, como o de George W. Bush no caso do Iraque, por exemplo. O que leva a pensar: será que um dia teremos uma análise que não seja exagerada, reducionista e distorcida por parte de algum luminar da esquerda a respeito da decisão de Bush de derrubar Saddam Hussein? E quando veremos esse mesmo benefício da dúvida negado a Bush deixar de ser aplicado por analistas “isentos” a regimes tão do gosto das esquerdas, como o dos irmãos Castro em Cuba, por exemplo? Mas estou divagando. Adiante.

Discorrendo sobre interpretações que atenderiam mais a interesses político-partidários do que à busca pela verdade, Pablo tenta pesar na mesma balança os argumentos centrais dos “governistas” e “oposicionistas” na questão do “acordo” com o Irã. Aparentemente, quero crer que por distração, ele parece se esquecer que reduzir questão tão complexa ao que disseram “governistas” e “oposicionistas” no plano doméstico e no contexto de uma (pré)campanha presidencial é uma forma de reducionismo. Trata-se de uma interpretação simplista e rudimentar – exatamente o que Pablo alega ser contra no começo do texto. A mais recente mancada gigantesca do megalonaniquismo lulista vai muito além desse esquema pré-fabricado (e totalmente artificial, diga-se de passagem, haja vista a disputa eleitoral deste ano se resumir a um campeonato entre duas vertentes esquerdistas). A questão não é entre “tucanos” e petistas, entre Serra e Dilma, mas entre o mundo e um louco nuclear que ameaça destruir outro país. Ponto.
.
Afirma Pablo: “Nem tanto, nem tão pouco. Há que se reconhecer um mérito do governo Lula nesse caso: o de definitivamente trazer para a agenda da política eleitoral brasileira temas circunscritos apenas aos aficionados em política externa.”

Pois é, ainda há quem veja mérito na egotrip do Aiatolula... Independentemente do fato de que, como já escrevi antes, política externa (infelizmente) nunca deu ou tirou voto no Brasil, o “mérito” do governo Lula apontado por Pablo pode ser resumido assim: Lula e seus cumpinchas do Itamaraty estão expondo o Brasil ao ridículo mundial, mas isso pelo menos faz com que os brasileiros passem a discutir o assunto. Ou seja: a política externa da Era Lula é uma porcaria, mas pelo menos o povo está falando nela... Sobre isso, tenho apenas uma coisa a dizer: Que mérito, cara-pálida? Lula está arrastando o nome do Brasil na lama!

Além do mais, é improvável que o tema da política externa será trazido para a agenda eleitoral. Por um motivo muito simples: os brasileiros estão cantando e andando para o que acontece no mundo! Se se importassem, se dessem à atual política externa a devida atenção, pelo menos a metade da atenção que dão ao futebol ou às fofocas de celebridades, se encheriam de indignação e sairiam às ruas pedindo a cabeça de Lula numa bandeja. Por pura vergonha.

Prossegue Pablo:
“Além do mais, é preciso reconhecer que o governo Lula não inventou a retórica da independência e da crítica da diplomacia brasileira às grandes potências do norte. Desde o tempo de Rui Barbosa o Brasil aqui e acolá cutuca, com seu discurso emergente, os senhores da política mundial.”

E daí que não foi Lula o inventor da retórica antiamericana e terceiro-mundista? Isso só mostra que o antiamericanismo doentio é uma constante em certos setores da diplomacia brasileira. Agora, francamente, ver algum parentesco entre a política externa aloprada de Lula e Rui Barbosa é um pouco demais, não? Gostaria de saber o que a “Águia de Haia” e liberal ferrenho teria a dizer hoje em dia se confrontado com a aliança incondicional de Lula com tipos como Ahmadinejad. Arrisco um palpite: ele estaria se remexendo no túmulo, com certeza! Sem falar que o patrono da diplomacia brasileira, o Barão do Rio Branco, principal articulador da “aliança não-escrita” com Washington, seria descrito hoje pelos que comandam a diplomacia petista como um americanófilo. O que mostra que a política externa lulista é, além de tudo, contrária à tradição diplomática brasileira.

Mais Pablo: “O que o governo Lula fez, e isso é também preciso reconhecer, é tomar uma atitude geopolítica que condiz com o discurso de sublevação dos servos, bem cara à esquerda pós-iluminista. Se os governos anteriores permaneciam no campo da retórica servindo ao jogo de interesses políticos do momento, a dupla Lula-amorim saiu da conversa e fez um movimento geopolítico internacional realmente ousado e independente, projetando o país, para o bem ou para o mal, como um elemento autônomo no jogo das macropotencias mundiais. È preciso reconhecer isso.”
.
“Discurso de sublevação dos servos”? Ahmadinejad, os Castro e Chávez certamente assinariam embaixo dessa expressão. O que Lula e companhia fizeram foi atrelar o Brasil ao que de pior existe na humanidade, e isso inclui um regime teocrático, o iraniano, que é em tudo anti-iluminista. Enxergar mérito nessa patacoada é apenas referendar um antiamericanismo rançoso e bolorento, caro às esquerdas e também a uma direita estúpida e reacionária (sim, há reacionários em ambos os lados). O “movimento ousado e independente” da dupla Lula-Amorim custará ao Brasil a respeitabilidade internacional, colocando o País no rol dos países amigos de tiranos e terroristas. E isso conduz não ao protagonismo, mas a seu exato oposto: o isolamento internacional, a diminuição do tamanho do País no concerto das nações. O que já é realidade, como o caso do Irã demonstra cabalmente.
.
Diz Pablo: “A jogada da dupla Lula-amorim se deu em quatro movimentos. O Brasil já havia tentado marcar essa posição no caso de Honduras, mas a interferência dos EUA frustrou as intenções tupiniquins. Então Lula acenou para o Armadinejahd quando ocorreram as eleições no Irã ano passado. Em um segundo movimento Lula convidou o presidente do Irã para vir ao Brasil. Depois se meteu em Israel com o discurso da paz (agora ficou bem claro que a intenção de Lula em Israel não tinha nada a ver com causa da paz entre palestinos e israelenses). Por fim visitou o Irã e posou para a foto com o acordo nas mãos.”

1) não foi a “interferência dos EUA” que frustrou as intenções tupiniquins em Honduras: foi a ignorância do que diz a Constituição daquele país, além do alinhamento com o golpismo bolivariano;

2) Lula não somente “acenou para Ahmadinejad” nas eleições do ano passado: ele referendou a fraude, justificando a repressão à oposição iraniana, que comparou a uma torcida frustrada porque o time perdeu um jogo de futebol; o mesmo padrão se repetiu quando do convite à visita indesejada de Ahmadinejad ao Brasil.
Concordo apenas com a parte final do parágrafo.
.
Para Pablo, o “lado escroto” do movimento lulista em direção ao Irã está em ter-se aproximado (eu usaria outro verbo) de um regime teocrático, que tende para o totalitarismo. Ele também tem a clareza de pensamento de não aceitar as comparações do Irã com Israel, que tem armas nucleares e não assinou o TNP, pois é inteligente o suficiente para compreender que não se pode colocar no mesmo saco um país que luta para se defender e um regime comandado por um lunático que jurou varrê-lo do mapa, além de negar o Holocausto e oprimir seu próprio povo. Mas ele derrapa ao não perceber que o “lado escroto” da política externa lulista para o Irã se manifesta no próprio “acordo” Brasil-Turquia-Irã, uma simples manobra para que o irá ganhasse tempo e continue a enganar o mundo e enriquecer urânio para seu programa nuclear secreto. Uma escrotice de marca maior, que só perde para a burrice dos lulistas. Qual o mérito do governo Lula em proteger um regime como o de Ahmadinejad?
.
No final, Pablo escreve: “O governo brasileiro conseguiu o que queria. Mostrou ao mundo que pode atuar fora do quintal sulamericano e que não é um simples pau mandando dos EUA, pena que tinha que ser ao lado do Armadinejad, pena que tinha que ser ao lado da teocracia dos Aiatolás que fala em nome de Deus para justificar os erros e as misérias políticas dos homens.”

Nem vou entrar na discussão sobre se o governo brasileiro “conseguiu o que queria” (a chinelada que recebeu no dia seguinte ao tal “acordo” do Conselho de Segurança da ONU e a humilhação que se seguiu estão aí para falar por si mesmos.) Vou me concentrar apenas no seguinte: Pablo dá a impressão que o erro de Lula está apenas em ficar ao lado de Ahmadinejad, como se o antiamericanismo recalcado e irracional que pauta atualmente a política externa brasileira fosse uma coisa boa. Não é. É justamente esse antiamericanismo, juntamente com um complexo de inferioridade travestido de complexo de “comigo-ninguém-pode”, que está por trás de todas as inumeráveis derrotas da política externa brasileira nos últimos oito anos, e que levou à enrascada em que o governo Lula se meteu no Oriente Médio.
.
Há quem se negue a ter uma posição definida sobre tudo, e prefira se refugiar numa confortável eqüidistância. Há quem ache que a verdade está sempre no meio. Eu não. Entre Lula e a honestidade, ou entre Ahmadinejad e o mundo, eu não escondo de que lado estou.

Um comentário:

Anônimo disse...

Para você que sempre ataca dizendo que não ha " racismo" ou discriminação no Brasil , recomendo uma recente materia da BBC de londres, segue o link abaixo.

http://news.bbc.co.uk/2/hi/world/latin_america/10159297.stm?ls