Antes de qualquer coisa, é bom que fique bem claro: não tenho, nunca tive nem terei um dia nenhum sentimento negativo contra quem quer que seja por sua cor, raça, etnia, gênero ou orientação sexual. Do mesmo modo, desafio qualquer um a mostrar onde, quando e como eu já teria expressado, neste blog ou fora dele, qualquer opinião que possa ser remotamente associada a qualquer traço de racismo ou homofobia. Nunca tive nem terei nada a ver com nenhum grupo skinhead espancador de negros e nordestinos (até porque sou nordestino), ou com pastores evangélicos que em seus sermões condenam ao fogo do inferno os "sodomitas"(até porque não sou religioso). O simples fato de ter de fazer esse esclarecimento antes de entrar no tema deste texto demonstra a gravidade do ponto a que chegamos. Se, depois de ler o que escreverei aqui, você ainda tiver alguma dúvida quanto a isso, e insistir em considerar minhas opiniões eivadas de algum preconceito, alerto: o problema é todo seu.
Minha cisma com a política de cotas raciais nas universidades e no serviço público e com o projeto de lei "anti-homofóbico" ora em exame no Congresso (PLC 122/06) não tem nada a ver, ao contrário do que gostariam os militantes dos "movimentos" negro e gay, com nenhum viés discriminatório contra negros ou homossexuais. Tem a ver, isto sim, com o que considero uma clara violação de um dispositivo constitucional básico, segundo o qual todos - todos, sem, exceção - são considerados e tratados como iguais (frise-se: iguais!) perante a lei. Trata-se de um pilar do Estado de Direito Democrático, uma conquista da democracia e dos direitos humanos. É esse princípio fundamental da vida civilizada que está sendo ameaçado hoje, graças à ação de minorias antidemocráticas que, em nome da "correção de injustiças históricas" e da "ampliação dos direitos humanos" querem, na verdade, impingir à sociedade uma gravíssima injustiça e minar as próprias bases da democracia e dos direitos humanos.
Comecemos pelas cotas. Em 2003, após anos de pressão do chamado "movimento negro", foi aprovada uma lei que reserva 20% das vagas nas universidades públicas a pessoas que comprovarem ser afro-descendentes, ou seja, negros e pardos. Sob o rótulo politicamente correto de "ação afirmativa", a idéia seria permitir a negros e pardos - a parcela mais pobre da população, segundo estatísticas brandidas por esse "movimento" - o acesso à universidade, o que lhes estaria vedado por sua cor de pele, ou seja, por sua condição de negros e pardos. À parte o fato de que "afro-descendente", no sentido lato, constitui um conceito bastante elástico - tendo a humanidade, segundo as pesquisas arqueológicas mais recentes, surgido no continente africano, seríamos todos, portanto, por definição, afro-descendentes -, além de, culturalmente, como escreveu Gilberto Freyre, sermos mais africanos que europeus, aparentemente esqueceu-se que tal sistema, importado dos EUA, adapta-se muito bem a sociedades onde reinou, durante anos, a segregação racial, não sendo, pois, adaptável a países como o Brasil, onde a intensa miscigenação praticamente apagou as linhas que separam as raças. Isso, por si só, já seria motivo suficiente para demonstrar o caráter inócuo e demagógico dessa lei. O problema, no entanto, é muito mais grave, pois tal sistema, a pretexto de corrigir uma suposta divisão racial da sociedade - aliás, no caso do Brasil, inexistente -, acaba legitimando e institucionalizando o racismo, ao estabelecer, como critério para o acesso à universidade e a outros serviços públicos, não o mérito individual, mas única e simplesmente a cor da pele. Pior: através de um sistema risível de classificação racial, baseado, no caso da Universidade de Brasília, pelo exame - pasmem - das fotografias dos candidatos, no pior estilo do apartheid sul-africano ou do nazismo. Daí que dois irmãos gêmeos idênticos tenham sido considerados, por esse sistema absurdo, como um branco e o outro, negro, é algo que não deveria causar-nos nenhuma surpresa. Além da impossibilidade prática de definir-se quem, no Brasil, seria negro ou branco, criou-se, com essa lei, uma situação em que a imensa maioria da população, composta de mestiços, é alvo de antemão de uma política discriminatória e, sim, racista, para beneficiar uma minoria.
A PLC 122/06 consegue ser ainda mais absurda. De acordo com o texto atualmente em discussão na Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal, pretende-se igualar a homofobia a crimes já considerados inafiançáveis, como o racismo. Argumentam os defensores de tal medida que esta se faz necessária em virtude do elevado número de crimes, sobretudo assassinatos, supostamente cometidos contra homossexuais no Brasil. Sem falar que os assassinatos praticados por homossexuais não se encontram contemplados em nenhuma legislação específica (e alguém nega que estes também ocorrem?), o problema é que, assim como no caso da política de cotas raciais, a definição do que seria homofobia, por sua própria natureza vaga e imprecisa, serve às mais amplas interpretações. Estaria enquadrada nessa categoria aquela piada que os amigos costumam trocar no bar, sobre o jeito afeminado do amigo gay? Nesse caso, dever-si-a prender quase todos os humoristas brasileiros, que têm na imitação de trejeitos e desmunhecadas seu ganha-pão. Deveria ser jogada no xadrez, aliás, quase toda a população brasileira, que não cansa de usar, no dia-a-dia, expressões populares como "boiola", "baitola" etc. (a propósito: o que diria o povo brasileiro de uma lei que, a pretexto de não ferir as suscetibilidades de judeus e muçulmanos, banisse expressões como "judiar" e "mourejar"?). Quem for heterossexual - a maioria, creio eu - que tome muito cuidado e pense várias vezes antes de rejeitar polidamente uma cantada de alguém do mesmo sexo, pois poderá ser tachado como "homofóbico" e parar atrás das grades. No mesmo sentido, deveriam ser encarcerados sem direito a fiança (quase) todos os padres católicos e pastores protestantes do País, sempre e quando mencionassem a Bíblia para expor seu ponto de vista sobre homossexualidade. Aliás, mesmo antes da aprovação dessa lei idiota, já tivemos uma amostra do grau de arbitrariedade dessa iniciativa, com a decisão judicial que ordenou a retirada de outdoors espalhados em Campina Grande (PB), com os dizeres: "Homossexualismo" e a frase do Gênesis, "E Deus fez o homem e a mulher e viu que era bom", por considerá-los "homofóbicos". Se é homofobia citar a Bíblia para expor uma posição religiosa sobre esse tema - com a qual, aliás, ninguém é obrigado a concordar -, imaginem o que ocorrerá, caso essa lei seja aprovada, com quem ousar expor publicamente seu ponto de vista pessoal sobre o assunto. Onde fica a liberdade religiosa e de expressão?
Se havia alguma dúvida de que, sob a égide do lulismo, caminhamos para um tipo de totalitarismo politicamente correto, o sistema de cotas raciais e a PLC 122/06 demonstram isso de forma cabal e irrefutável. Em um país onde quase todos trazem a marca ou o sangue africano nas veias, e onde artistas, cantores e diretores de televisão são em grande parte gays assumidos e militantes, dizer que há racismo e perseguição generalizada a negros e homossexuais é de uma imbecilidade sem medida. Longe de significarem um avanço na luta pelos direitos de minorias oprimidas, tais iniciativas são obra de "movimentos" político-ideológicos que, amparados durante anos pelas esquerdas, visam a defender não direitos, mas privilégios. O que realmente querem é impor uma divisão racial e sexual na sociedade, instituindo uma casta de indivíduos intocáveis e acima das leis, que utilizarão a cor da pele ou a opção sexual como álibi para todo tipo de abuso - uma ditadura gay e racista.
No começo deste texto desafiei quem o lesse a demonstrar em que momento lanço mão de argumentos racistas e discriminatórios. É uma pena que não se possa dizer o mesmo das mentes brilhantes que estão por trás do sistema de cotas e da PLC 122/06.
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