quinta-feira, abril 23, 2009

A PROIBIÇÃO DE COMPARAR


Protesto da esquerda contra a Folha de S. Paulo, que chamou o regime de 64 de "ditabranda": será que os que seguram essa faixa consideram mais "branda" a ditaDURA de Cuba?

Pode-se comparar ditaduras? Essa pergunta tem sido feita há algumas semanas, desde que a Folha de S. Paulo ousou publicar um editorial em que chama o regime militar brasileiro (1964-1985) de "ditabranda".
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Imediatamente o jornal foi bombardeado por críticas raivosas de muitos intelectuais e intelequituais de esquerda, indignados com o que lhes pareceu uma diminuição ou justificação das barbaridades cometidas pelos militares, como a tortura e a censura. Dois professores da USP enviaram cartas furibundas à redação do diário, tendo recebido uma resposta à altura do jornal, que classificou a indignação dos mesmos de cínica e hipócrita, pois os mesmos professores, tão zelosos da democracia no Brasil, não têm pudor em bater palmas para ditaduras em nada brandas, como a dos irmãos Castro em Cuba. De nada adiantou. Acuada, a Folha teve de pedir desculpas por esse "pecado", e uma turba fez uma manifestação de protesto em frente ao prédio do jornal, enquanto panfletos partidários travestidos de publicações "sérias", em geral a soldo do governo, tomaram as rédeas do farisaísmo esquerdista.
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Fatos como esse demonstram aquilo que venho dizendo há tempos, aqui e alhures: que vivemos uma espécie de ditadura mental - ditadura mesmo, e não ditabranda -, caracterizada pela hegemonia do pensamento de esquerda e do politicamente correto. O que causou indignação nas hostes esquerdistas não foi a classificação do regime militar de 1964 como "ditabranda" - foi a ousadia do jornal paulista em mostrar as diferenças existentes entre esta e regimes venerados pela esquerda, como o de Cuba. Em outras palavras: é proibido comparar.
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Respondendo a pergunta que inicia esse texto, digo que sim, pode-se comparar regimes ditatoriais. Digo mais: é necessário compará-los. Sem isso, é impossível compreendê-los.
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Antes que o digam, já me adianto: não se trata de relativizar o que ocorreu no Brasil quarenta anos atrás, como se se estivesse dizendo "pô, a ditadura militar não era tão ruim, afinal", nem, muito menos, de justificar a repressão política do período, mas sim de colocar os pingos nos is da História, infelizmente monopolizada pela visão esquerdista. Para tanto, uma visão objetiva e, tanto quanto possível, desapaixonada dos fatos se faz necessária.
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A ideia de que não se pode comparar o que houve no Brasil com o que segue ocorrendo em países como Cuba, ou entre ditaduras de direita e ditaduras comunistas, é essencialmente falsa pois, sob os mais diversos pretextos - "não existe hierarquia da dor", "pouco importa quem matou mais" etc. -, o que se esconde é a tentativa, até aqui bem-sucedida, de eliminar qualquer senso de proporção.
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O senso de proporção é a bússola mesma que orienta o comportamento e o pensamento humano. Eu só sei se sou alto ou baixo, gordo ou magro, feio ou bonito, em comparação com alguém ou alguma coisa. Sem esse termo de comparação, sem esse senso de medida, perdemos completamente o rumo, não há como dizer se fulano ou determinado objeto é assim ou assado. Sem esse elemento, enfim, não há referências. Isso vale tanto para as relações entre as pessoas e as coisas, como para os regimes políticos.
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Além do mais, vale lembrar: a comparação é a base do Direito. Quem mata ou fere um será punido com a sanção que é devida a quem mata e fere um, e não dez ou vinte. Do mesmo modo, quem mata, mutila e tortura não vinte ou cem ou quinhentos ou mil, mas cem mil, ou cem milhões, merece receber uma punição muito mais severa, compatível com a gravidade desses crimes. Isso não sou eu que digo: é o Código Penal.
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Um exemplo da perda desse senso de proporção patrocinado pelas esquerdas é a recusa destas de discernir entre regimes autoritários e totalitários. Com frequência, ouvimos algum propagandista ideológico travestido de professor vociferar contra a ditadura "fascista" de 64 etc., reduzindo um fenômeno político-social extremamente complexo - o fascismo - aos métodos empregados pelos esbirros da repressão. É uma falsidade. Já escrevi antes que é um absurdo classificar o regime de 64 de fascista, pois, entre outras coisas, não havia um partido único no poder aos quais os militares estivessem submetidos (pelo contrário: por ter extinguido todos os partidos políticos, o regime militar foi de certa forma o oposto do fascismo). Pelo mesmo motivo, é um erro afirmar que se tratava de um regime totalitário, e não autoritário. Não se trata de uma distinção acadêmica: foi justamente por não diferenciar os nazistas dos social-democratas, a quem chamavam de "social-fascistas" (!), que os comunistas alemães perderam o foco e permitiram a ascensão de Hitler e os nazistas, no começo dos anos 30.
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Certo, para quem foi vítima da repressão e sofreu torturas, a distinção acima significa pouco, ou quase nada. Mas isso não muda em um milímetro a questão. Não é segredo para ninguém que tortura e assassinatos também acontecem, infelizmente, em democracias, e essas não deixam de sê-lo por causa disso. Pode parecer cruel, mas não é o sofrimento desse ou daquele indivíduo o que determina o caráter de um regime político. Fosse assim, qualquer pessoa que tivesse tomado uns safanões em uma delegacia de bairro poderia argumentar, com razão, que vivemos em uma ditadura fascista.
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Na verdade, por trás de todo o barulho e ranger de dentes contra editoriais como o da Folha, o que existe é, como disse o jornal em resposta aos dois professores da USP, muito cinismo e hipocrisia. Duvido muito que os que fizeram a manifestação em frente ao prédio do jornal estejam minimamente preocupados com democracia e direitos humanos (basta ver o símbolo do partido na faixa da foto acima). Estão, isso sim, interessados em jogar poeira nos olhos de todos, usando os casos brasileiro ou chileno como biombo, fazendo todos esquecerem o que sempre defenderam. Por trás das declarações enfurecidas contra a tortura e dos discursos a favor da dignidade da pessoa humana, o que defendem, na realidade, é a proibição de comparar. A tática é conhecida: maximizar os delitos do adversário e minizar os próprios. Até que só se enxergue os crimes do inimigo, e se esqueça por completo - ou se justifique - os cometidos em nome do socialismo. Desse modo, conseguirão o que desejam, fazendo todos acreditarem que os crimes da esquerda são infinitamente mais desculpáveis do que os da direita. Ou não são crimes. Pura desonestidade intelectual.
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Tudo isso tem um objetivo prático: as esquerdas sabem que os regimes e movimentos comunistas mataram mais, e de maneira muito mais sistemática e, se quiserem, científica, do que qualquer ditadura militar sul-americana, ou mesmo do que os regimes nazi-fascistas. No século XX, foram cerca de 100 milhões os mortos pelo comunismo em países como a ex-URSS, a China, o Camboja e a Coreia do Norte. Isso faz do comunismo uma ideologia muito mais assassina do que qualquer coisa engendrada, até aqui, pela mente humana. Não por acaso, Stálin dizia que a morte de um homem é uma tragédia; a de milhões, é uma estatística. É por isso que as esquerdas berram sempre que alguém tem a ousadia de comparar as ditaduras de direita e as de esquerda: tendo mais esqueletos no armário que esconder, sentem-se injuriadas quando alguém os expõe à luz, chamando de fascista e reacionário quem o fizer.
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Estou dizendo que as ditaduras de direita, como a brasileira ou a de Pinochet no Chile, porque mataram menos, devem ser justificadas? Não! Estou dizendo apenas que as ditaduras de esquerda mataram mais, infinitamente mais, e que são, por isso, mais criminosas do que as de direita. Além disso, as de esquerda não se contentam geralmente em exterminar ou calar seus opositores: fazem questão de implantar um sistema de coerção mental que não tem nenhum paralelo com nada que a direita tenha inventado até hoje. Ou, como disse certa vez Jorge Amado: "atrevo-me a dizer que as ditaduras de esquerda são piores, pois contra as de direita pode-se lutar de peito aberto; quem o fizer contra as de esquerda será tachado de reacionário, vendido, traidor".
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Ditaduras são ditaduras. Não importa de onde venham, que cor ideológica tenham, não existem ditadores bons: existem apenas ditadores, e ponto. Isso, porém, não deve nos deixar cegos, surdos e mudos para as diferenças entre eles. Pode-se, sinceramente, dizer que a ditadura militar brasileira foi tão sanguinária quanto, por exemplo, a argentina, com seus 30 mil desaparecidos políticos? Ou que as ditaduras de Salazar em Portugal, ou mesmo a de Franco na Espanha, foram tais e quais as de Hitler e Stálin, que deixaram atrás de si uma montanha de milhões de cadáveres? Mesmo assim, afirmo e reafirmo que eram todos regimes ditatoriais. Será que a esquerda, que idolatra Lênin e Fidel Castro, pode dizer a mesma coisa?
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O regime militar brasileiro matou 424 pessoas em 21 anos de existência. Foi, portanto, 424 vezes execrável. A ditadura cubana matou quase cem mil, entre fuzilados e afogados tentando escapar da ilha-prisão. Logo, merece ser repudiada cem mil vezes. Comparar não é relativizar, nem justificar o que quer que seja. É repor a verdade histórica.

Um comentário:

Anônimo disse...

Sugestão de site que achei recentemente sobre fatos e mitos da guerra entre Israel e terroristas, espero lhe seja de grande valia:

http://israelxxpalestina.blogspot.com/