terça-feira, dezembro 02, 2008

SARAMAGO, O COMUNISTA HORMONAL


José Saramago é, como todos sabem, o maior nome atual das Letras Portuguesas. Mesmo assim, vou pedir licença e falar mal desse monumento. Mais uma vez, vou cometer esse sacrilégio. Quem sou eu para desancar Saramago? Eu não sou ninguém, claro. Não sou nada. Saramago, por sua vez, é tudo. Afinal, ele é, como Oscar Niemeyer, uma figura venerável, acima do bem e do mal, e, como tal, se acha no direito de dizer qualquer coisa e será certamente ouvido - e levado a sério. Além de tudo, é um Prêmio Nobel. Um gênio. Já eu, bem... sou apenas um blogueiro, e o que digo deve fazer alguma diferença, talvez, para a meia dúzia de abnegados que me lêem. Mas vamos lá, na humildade.

Alguns dias atrás, Saramago esteve no Brasil, onde participou de um debate promovido pela Folha de S. Paulo. Bem, debate é maneira de dizer. Saramago, na verdade, fez um comício. Figuras como ele, totêmicas, não debatem: simplesmente falam. E ponto. Saramago falou pouco de Literatura, como é de seu feitio, e muito de política. Resumidamente, o sábio de Lanzarote repisou para uma platéia atenta e embevecida de mais de 300 pessoas suas teses favoritas: "a história da humanidade é um desastre", começou sua arenga, e "não merecemos a vida", ponderou, pessimista. Repetiu para si mesmo que "Marx nunca teve tanta razão quanto agora", ao se referir à atual crise econômica mundial. Em dado momento, ele deu uma definição de si mesmo e de sua opção ideológica - como direi? - bastante lírica: "Sou aquilo que se pode chamar de comunista hormonal. O que isso quer dizer? Assim como tenho no corpo um hormônio que me faz crescer a barba, há outro que me obriga a ser comunista." Ao final de sua palestra, uma integrante da platéia, demonstrando todo seu senso crítico e pretendendo falar em meu nome, gritou bem alto, enquanto Saramago terminava de falar: "Em nome de todos os brasileiros, obrigada por existir".

Tenho algo em comum com Saramago: também acho que a humanidade não merece viver. Mas, ao contrário do gênio, sou bem mais modesto em minhas intenções assassinas. Para mim, apenas uma parte da humanidade, uma parte ínfima aliás, deveria partir desta para melhor (ou pior). Refiro-me aos tiranos e genocidas - gente como Stálin, Mao Tsé-tung e Fidel Castro, que, assim como Saramago, acreditavam/acreditam que a humanidade também não presta e trataram de exterminar todos aqueles que não lhes agradavam. Uns 70 milhões, no caso de Mao, mais uns 35 milhões no de Stálin, e uns 95 mil no de Fidel. Assim como Saramago, esses líderes compartilhavam/compartilham do credo comunista. E, assim como Saramago, eles se excluíam/excluem da humanidade que querem despachar para o túmulo. Afinal, como diria Sartre, o inferno são os outros.

Saramago faz a apologia da morte. A apologia do genocídio, da destruição física de milhões de seres humanos. Mas e daí? Ele é um grande humanista. Truculento e insensível, claro, é quem o critica. Como este que escreve estas linhas.

Mas a parte de que eu mais gostei da palestra de Saramago foi sua confissão de que é um "comunista hormonal". Ele confirmou, assim, aquilo de que eu já suspeitava há tempos: o comunismo é mesmo uma doença. Um distúrbio dos hormônios, segundo o grande escritor. Deve ser mesmo. Somente uma alteração hormonal, ou genética, poderia produzir delírios como o "homem novo" ou a "ditadura do proletariado", que só geraram opressão e morte em escala industrial. Um hormônio que obriga pessoas aparentemente racionais a ser comunista, assim como faz crescer a barba, só pode ser um defeito congênito, uma aberração da natureza. Um amigo meu - aliás, simpatizante esquerdista - certa vez usou a expressão "socialista hormonal" para se referir à manada de revolucionários juvenis que pululam nas escolas e universidades e no que se convencionou chamar de "movimento estudantil". Gostei na hora da expressão, e a adotei. Já tendo sido eu mesmo um desses idiotas - felizmente, curado a tempo -, sei bem a influência dos hormônios na cabecinha de um adolescente entediado e com raiva do mundo. O esquerdismo, como já disse, é uma doença infantil, um sarampo ou uma catapora. O que causa estranheza são senhores de idade provecta vomitando essas sandices - e sendo aplaudidos por isso.

Vejam bem, não estou falando do Saramago literato, do Saramago escritor - sua literatura, aliás, com seus períodos longuíssimos sem vírgulas nem parágrafos, me diz muito pouco, quase tão pouco quanto os livros de Paulo Coelho, embora reconheça seu mérito literário em relação a este último. Estou falando do Saramago ideólogo, ou, mais precisamente, da persona política que Saramago criou para si próprio. Um misto de profeta apocalíptico e defensor empedernido do stalinismo, sempre pronto a espezinhar o "sistema" quando tem oportunidade, ao mesmo tempo em que fecha os olhos, voluntariamente, para os piores crimes já cometidos contra a humanidade. Não por acaso, atrevo-me a dizer, um de seus livros mais conhecidos se chama, exatamente, Ensaio sobre a cegueira... Já o título de outro livro seu, Ensaio sobre a lucidez, não parece muito adequado para definir o autor.

Além de comunista, Saramago é ateu. É outra coisa que temos em comum. No entanto, ao contrário do sábio português, não pretendo substituir o Todo-Poderoso por tiranos, ou por mim mesmo. Os marxistas, como Saramago, passaram décadas bombardeando os ouvidos alheios com a frase de que a religião é o ópio do povo. Melhor fez Raymond Aron, ao chamar o marxismo de o "ópio dos intelectuais". Saramago, com seu comunismo glandular, que o diga.
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Saramago é um gênio, um medalhão, um peito galardoado. Como tal, acostumamo-nos a enxergá-lo com o temor e a reverência próprios de devotos. Qualquer crítica que lhe for dirigida toma, assim, ares de blasfêmia, de crime de lesa-divindade. É mais um sintoma de nosso atraso intelectual, de nossa estupidez, de nossa babaquice sem limites.

Um comentário:

(c) P.A.S. Pedro Almeida Sande disse...

Todo ele emana humanidade, bondade!E é por isso que ele é tão amado em Portugal! Só lamento é eu e mais 9.999.000 Portugueses (alguns hão-de restar!)terem adormecido não antes de ter acabado de ler qualquer sua obra de arte, antes ter acabado de ler qualquer sua frase. Valha-nos a cegueira dos nobilados, valho-nos os cús de Judas do Lobo Antunes, pois homens como Saramago são homens, que por onde passam, arrasam!