sábado, outubro 01, 2011

O BODE EXPIATÓRIO DO MUNDO

Um devoto anônimo da seita antiamericana - a religião que mais cresce no mundo, mais até do que o Islã ou os cultos evangélicos - me mandou um longo comentário em que se queixa, chorosamente, da "excessiva atenção" dada nos últimos dias aos dez anos da tragédia do 11 de setembro de 2001 nos EUA. Lembrando os bombardeios atômicos a Hiroshima e Nagasaki na II Guerra Mundial, ele (ou ela) diz lamentar o fato de nenhum militar norte-americano (ou de qualquer país aliado, enfim), ao contrário do que ocorreu com os alemães e japoneses, ter sido condenado pelas atrocidades cometidas contra a população civil (na Alemanha e no Japão, por exemplo). Afirma, ainda, ver "com indignação" as reportagens e documentários sobre os ataques terroristas, pois, segundo diz, "há muito não escuto falar nada sobre as atrocidades que os americanos cometeram contra o mundo" (sic). No final, solta a seguinte pérola:

Aliás, os eventos do 11 de setembro foram frutos dos presentes que a atrapalhada política internacional americana deu ao mundo: Bin Laden, Talibãs, Saddam Hussein, todos são frutos da burrice imperialista americana no Oriente Médio. E mesmo tendo armado todos esses e muitos outros terroristas e tiranos ao redor do mundo, ainda olhamos para os coitadinhos americanos com pena e dor. É lógico! Afinal, não foram os americanos mortos nos atentados que produziram os terroristas; foram os militares megalomaníacos e políticos gananciosos que o fizeram; os ataques não mataram nenhum deles; mataram apenas civis, inocentes e desprotegidos, da mesma forma que em Hiroshima e Nagasaki. Mas lá, como não foram americanos que morreram, ninguém lembra, ninguém fala.

Confesso que tenho pouca paciência para a discurseira antiamericana. Além de ser um trololó bucéfalo, muitos que o repetem nem se dão conta de que são antiamericanos, e que estão apenas justificando o que de pior existe na humanidade. Apenas repetem, mecanicamente, uma lengalenga ideológica condicionada pelo ódio, que muitos não admitem que sentem, contra os EUA - na verdade, contra a própria humanidade.

É exatamente esse o caso do autor do comentário acima. Aparentemente alguém indignado contra as injustiças da História (e o mundo é um lugar injusto, como todos sabem), acaba reproduzindo, na verdade, um dos discursos mais canalhas e criminosos de todos os tempos. Quase certamente sem o saber, acaba confessando-se cúmplice do terrorismo islamita, apelando para agravos passados.

O irritante desse discurso é que ele seria somente idiota, se não tivesse seguidores. Enquanto o Sol brilhar sobre a Terra, haverá gente, ingênua ou mal-intencionada, a lembrar as bombas sobre o Japão para destilar o ressentimento (muitas vezes, misturado a sentimentos inconfessáveis de inveja e admiração) contra os EUA e tudo que ele representa - a democracia, principalmente.

Sim, é verdade que os EUA cometeram ações que atingiram civis durante a II Guerra, como os bombardeios de Hiroshima e Nagasaki. Assim como TODAS as grandes potências que participaram do conflito, de ambos os lados, diga-se. Vistas à distância, quase 70 anos depois, tudo parece um gigantesco assassinato em massa (e, em muitos casos, foi isso mesmo). Mas pode-se abstrair daí o sentido da guerra? Os EUA mataram civis, assim como os alemães e os soviéticos também o fizeram (e em escala bem maior). Mas podem dizer que, ao contrário de seus inimigos, agiram em defesa de uma causa justa, e também (no caso das bombas sobre o Japão) para abreviar a guerra. Pergunte a um japonês o que ele acha do papel dos EUA na II Guerra e ele, quase certamente, agradecerá pelo fato de hoje o Japão ser um país pacífico e democrático, ao mesmo tempo em que se encolherá de vergonha pelo que seus avós fizeram nos países invadidos pelas forças nipônicas (nem por isso, porém, vou sair por aí insinuando que os japoneses "tiveram o que mereceram"). Do mesmo modo, os alemães terão que purgar, por gerações, o horror dos crimes nazistas (e não apenas contra os judeus). Sem falar nos cidadãos dos países libertados do jugo nazista pelas tropas de Patton e Eisenhower. Será que acreditam que os EUA deveriam se desculpar pelo que fizeram?

Aliás, acho mesmo que faltou alguém em Nuremberg: os soviéticos, que assinaram um pacto com os nazistas em 1939 e foram, assim, co-responsáveis pela eclosão da II Guerra. Sem falar nos milhões de mortos pela URSS de Stálin - antes, durante e depois do confronto. Para citar apenas um exemplo, ocorrido no começo da guerra: 25 mil soldados poloneses capturados foram exterminados pela polícia soviética na floresta de Katyn, em 1940. Somente alguns anos atrás, foi revelado que esse assassinato em massa foi cometido pelos russos (durante décadas, a propaganda comunista culpou os nazistas pelo massacre). E como esse há centenas, milhares de casos. Mas onde está a indignação contra esses crimes?

Falando nisso, também vejo com indignação a maioria das reportagens sobre o 11 de setembro veiculadas nestes dias, mas por um motivo bem diferente: a maioria delas, como já escrevi aqui, só faltam culpar os próprios EUA pelo ocorrido. Exatamente como faz o comentarista anônimo - aliás, ele (ou ela), vai além, e diz claramente que os EUA (e, portanto, todos os que morreram) tiveram o que mereceram.

O que tem a ver Hiroshima e Nagasaki com os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001? Nada, claro. A não ser que você seja um papagaio repetidor de slogans e platitudes antiamericanas, para quem qualquer ato de terror cometido contra os EUA, por pior que seja, é justificado. Outro dia, respondendo a uma amiga minha que, provavelmente sem o saber, endossou o discurso anti-EUA por trás da lembrança de "outros setembros", afirmei que tal discurso, ao contrapor fatos como o golpe no Chile em 1973 à tragédia de dez anos atrás em Nova York e Washington, visava tão-somente a miniminizar e, em última instância, a anular a lembrança dos ataques terroristas. O mesmo digo agora dessa tentativa tosca de contrapor - é esse o verbo - Hiroshima e Nagasaki ao 11 de setembro (aliás, o autor do comentário não tem do que se queixar: as bombas atômicas sobre o Japão, ao contrário do que ele afirma, são um dos fatos mais lembrados e repisados da História).

Do mesmo modo, somente sendo muito cretino e tendo o cérebro totalmente lavado pela vulgata esquerdóide à la Noam Chomsky para enxergar no 11 de setembro o resultado dos "presentes que a atrapalhada política americana deu ao mundo". Bin Laden, o Talibã e Saddam Hussein não são "frutos da burrice imperialista no Oriente Médio", mas do fanatismo islamita e do totalitarismo, que não precisam de ninguém para se justificarem. A menos que se considere as figuras citadas acima como robôs teleguiados, sem vontade própria, ninguém é terrorista ou ditador devido à vontade alheia. Não foram os EUA, até onde sei, que criaram Kadafi, Ahmadinejad ou Bashar al-Assad. Também não foi o Pentágono ou a CIA que engendraram o Hamas e o Hezbollah. O envolvimento direto dos EUA nos assuntos do Oriente Médio começa em 1958, quando Eisenhower enviou soldados ao Líbano. A Irmandade Muçulmana, organização-mãe do Hamas, surgiu em 1928 - trinta anos antes. Portanto, mesmo cronologicamente, tentar atribuir a culpa pelo fanatismo islamita aos EUA é coisa de quem vê chifre em cabeça de burro.

(Aliás, se há alguém a se culpar pela formação de Bin Laden, não são os EUA, mas a finada URSS, pois foi a hoje quase esquecida invasão do Afeganistão pelo exército soviético em 1979 que levou o milionário saudita a deixar sua terra natal e a aderir à jihad contra os "infiéis". Mas, como não houve americanos na parada, disso ninguém lembra, ninguém fala.)

Ainda que os ataques terroristas de 11/09 fossem uma "resposta" à política norte-americana no Oriente Médio - notem bem: ainda que -, seria necessário um grau de canalhice muito grande para afirmar que os EUA "colheram o que plantaram" (pois é isso que se está dizendo). Seria o mesmo que dizer que as cerca de 3 mil pessoas que morreram tostadas e esmagadas nas Torres Gêmeas e nos aviões MERECIAM morrer, pois teriam sido um alvo "legítimo". Ora, por que não dizer que os mortos em Hiroshima também "mereceram morrer"?

É claro que dizer isso seria uma estupidez enorme, até mesmo para um antiamericano. Por isso esse discurso vigarista precisa vir coberto de um verniz "humanista", lembrando tragédias passadas - como se estas justificassem o terror. Em qualquer caso, trata-se de algo típico de delinquentes morais, em busca de um bode expiatório - e que melhor bode expiatório pode existir do que os EUA, que muitos odeiam e todos invejam?

Já disse e repito: o que incomoda gente como o anônimo que me mandou o comentário (e que está "indignado" por causa disso...) é que ele não pode negar que, em 11 de setembro de 2001, os EUA foram VÍTIMAS, e não autores, de um ataque hediondo - simplesmente o maior ataque terrorista da História. Isso essa gente não pode conceber, ou entender, porque quebra radicalmente o esquema mental em que estão presos. Estão tão acostumados a ver o mundo de forma maniqueísta, em termos de "bem" e "mal" (sendo o "mal" o satã imperialista norte-americano, e o "bem", por conseguinte, todos os que se oponham a ele), que as noções de bem e de mal, de justo e injusto, já se misturaram em suas cabeças deformadas, invertendo-se completamente. Simplesmente não conseguem sair desse atoleiro mental porque não conseguem enxergar além do ódio que sentem pela pátria de Jefferson e Lincoln. Não percebem, ou não querem perceber, que os bin ladins não odeiam os EUA e o Ocidente pelo que estes fizeram, mas pelo que são. Talvez por partilharem desse mesmo ódio. Os devotos da seita antiamericana podem até tentar disfarçar, mas sempre deixam esse ódio vir à tona. Enquanto eu estiver aqui, faço questão de retirar-lhes a máscara.

2 comentários:

Anônimo disse...

"O que tem a ver Hiroshima e Nagasaki com os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001? Nada, claro."

O que ?? como assim nada?? , vejo que sua obstinação em defender a America chega a escurecer o seu entendimento, sua mente tão brilhante se torna obscura e cega até mesmo seu tão alardeado entendimento.

Osama Bin Laden é fruto direto da guerra fria.

Quando a Russia invadiu um até então pais pequeno e desconhecido, que rota de hippies. Para socorrer esse país os bondosos americanos injetaram tecnologia, armas e dinheiro na família que dominava a região ...a família " Bin Laden" e o resto é historia, inclusive da amizade historia com a família Bush, algo que curiosamente você nunca publicou em seu blog.

E agora, José? disse...

Excelente matéria da revista "Veja" (19 de dezembro de 2012) sobre a Tortura. Matéria: "A volta dos Suplícios" p. 130-132, falando justamente sobre a prática de simulação de afogamento utilizada pelos EUA para torturar seus presos políticos.

Como diz a matéria no final: " É claro que a tortura, às vezes, é eficaz. Em outras, é ineficaz. Mas em qualquer situação é crime"!