sexta-feira, setembro 16, 2011

A ESTUPIDEZ DOS "OUTROS SETEMBROS"

Já é uma tradição: todo 11 de setembro, enquanto a humanidade, compungida, lembra o horror indizível das Torres Gêmeas desabando e levando consigo milhares de seres humanos transformados em pó no maior ato terrorista da História, um bando de zé-manés, leitores de Noam Chomsky e Tariq Ali, aproveita a ocasião para lembrar "outros setembros". Certamente incomodados com as homenagens às vítimas de um ataque cruel e desumano, perpetrado por fanáticos, arranjam um jeito, mesmo assim, de destilar sua raiva contra a maior democracia do mundo, buscando contrapor, ao 11 de setembro "dos americanos", uma data "alternativa": o 11 de setembro de 1973 (queda do governo de Allende no Chile), ou o setembro de 1982 em Beirute (massacre dos refugiados palestinos em Sabra e Chatila). O objetivo é contrapor a memória de outros fatos ao 11 de setembro de 2001, a "data deles", a fim de minimizá-la e abafá-la, reduzindo-a à insignificância.

Trata-se de uma verdadeira obra-prima de desviacionismo e vigarice intelectual, digna dos manuais de desinformação e propaganda da época do antigo KGB, e que precisa ser denunciada com toda força. Em primeiro lugar, o 11 de setembro de 2001 não é "dos americanos" (alguns preferem dizer "estadunidenses"). É uma data da humanidade. Assim como Auschwitz e o Holocausto não dizem respeito somente aos judeus, e o genocidio em Ruanda não é um assunto apenas dos ruandeses. Morreram, no WTC e no Pentágono, além do vôo que se espatifou na Pensilvânia, cerca de 3 mil pessoas, de mais de 50 nacionalidades (inclusive brasileiros). Logo, o atentado terrorista não atingiu apenas um país, mas foi uma ofensa a todo o mundo civilizado. Mesmo que só tivessem morrido americanos, o ataque foi uma barbaridade sem precedentes, que só pode causar repulsa a pessoas decentes. Rotular o 11/09 como uma data "dos americanos", como se dissesse respeito tão-somente aos EUA ou ao governo de George W. Bush, além de ser uma obscenidade, não passa, portanto, do antiamericanismo mais bocó, sequer disfarçado.

Ao tentarem contrapor à lembrança dos ataques fatos como a queda de Allende e o massacre de Sabra e Chatila, como se fossem uma espécie de "anti-11/09", os antiamericanos de plantão incorrem na total delinquência e na completa cretinice. Isso porque tais memórias não são, em absoluto, excludentes. A menos que se considere as pessoas esmagadas e queimadas vivas nas Torres Gêmeas como diretamente responsáveis pelo golpe militar do general Pinochet, 28 anos antes, ou pela chacina de civis palestinos levada a cabo pelos milicianos falangistas libaneses da família Gemayel, não há qualquer razão lógica e, muito menos, moral, para qualquer tipo de associação entre um e outro fato. Todos foram tragédias - a de 2001, bem maior em dimensões e consequências. Eu poderia lembrar, por exemplo, o 5 de setembro de 1972 (data do massacre dos atletas israelenses nos Jogos Olímpicos de Munique, executado por um grupo terrorista palestino que se intitulava, não por acaso, Setembro Negro) e isso não mudaria absolutamente nada o que sinto em relação a outras tragédias do tipo, como a do Chile ou a do Líbano. Não sei se os que ficam mordidos com a lembrança do 11 de setembro "dos americanos" podem dizer o mesmo. Acho que não.

Além do fato de serem tragédias humanas, não há termo de comparação entre o que aconteceu nos EUA e o que houve nas ruas de Santiago ou de Beirute. O golpe de 11 de setembro de 1973 no Chile foi a culminação de um longo processo de radicalização política, iniciado três anos antes e instigado pelo próprio governo marxista de Salvador Allende. Por mais terrível que tenha sido o golpe (e foi terrível, com milhares de mortes, inclusive a do próprio Allende, morto dentro do palácio presidencial com seus guarda-costas), a verdade inegável é que ele esteve longe de ter sido não-provocado, ao contrário dos ataques da Al-Qaeda. Diferentemente destes, tratou-se do desfecho sangrento de uma quase guerra civil, em que ambos os lados – e não somente os militares – conspiravam contra a democracia e em favor de um golpe de Estado. No final, venceu a direita – e a esquerda, derrotada, desde então passou a se dizer democrata, como escreveu o cientista político Carlos Rangel. (E agora cobra equivalência entre os dois 11 de setembros, como se não tivesse sua parcela de culpa pelo ocorrido, eu diria.)

O golpe do Chile e o massacre de Sabra e Chatila foram episódios, respectivamente, da Guerra Fria e da Guerra Civil Libanesa. Evidentemente, nenhuma das vítimas merecia morrer. Terríveis como foram, com sua cota de vítimas inocentes, não se pode compará-los, contudo, ao 11 de setembro de 2001, quando milhares de pessoas foram trucidadas, sem saber por que, por um inimigo literalmente caído do céu. Pretender minimizar seu impacto, apelando para a lembrança de "outros setembros", é coisa de verdadeiros aleijões morais, de gente sem o menor escrúpulo e sem a menor consciência, que acredita que uma desgraça anula outra - ou pior: que uma justifica outra.

Na verdade, o que incomoda muita gente no 11 de setembro é que não podem dizer, como estão acostumados a fazer, que os EUA foram o lado agressor. É que têm que admitir, contra a vontade, que o grande satã imperialista foi vítima de uma agressão covarde e canalha. Essas pessoas se alimentam do ódio, pura e simplesmente, que sentem por aquilo que muitas delas invejam em segredo. Elas não dizem, e jamais vão admitir um dia, que se regozijaram com as cenas de morte e destruição em Manhattan dez anos atrás. São pessoas como o ex-frade Leonardo Boff, que lamentou – lamentou! – que tivessem sido "apenas" dois aviões os que atingiram o WTC: "quisera que tivessem sido 25"... Enfim, são uns verdadeiros humanistas, pessoas maravilhosas, gente do bem e preocupada com o bem-estar da humanidade.

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