Escreveu o leitor Ítalo Viana, sobre meu texto "Lula, o sábio":
Antes de tudo, parabéns! Acho louvável a crítica como exercício de cidadania e como forma de exercitar a mente. Também me considero um "do contra". Pois bem, li as diversas críticas ao Irã e contra seu programa nuclear, pois o mesmo estaria planejando destruir Israel. Pergunto: e daí? Os EUA combatem o "terror" e têm bomba atômica, por que o Irã não pode combater o terror de Israel, que corretamente indigna-se com o holocausto, mas promove algo semelhante contra os palestinos? Não seria Israel do mesmo bando terrorista dos que assolam o mundo? E os EUA com suas guerras desastrosas no Kwait, Afeganistão e Iraque, não são terroristas? São. Sou contra as guerras, por óbvio, mas entendo que os conflitos no Oriente são bem mais complexos do que definir qual o Regime, se democrático ou não, de cada país.
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Respondo
Sobre os elogios: Obrigado. Critico não porque eu seja "do contra", apesar do nome do blog, mas porque é necessário. Mais do que um exercício de "cidadania" (êta palavrinha desgastada, essa!), ou uma forma de exercício mental, é uma maneira, segundo penso, de não compactuar com a mentira e de manter a sanidade.
Agora, quanto a suas observações sobre Israel, o Irã e o terrorismo, desculpe se eu parecer muito duro. Já respondi a elas em outros posts, mas, como já disse outras vezes, não me importo de ser repetitivo. Aí vai.
1) Em primeiro lugar, o Irã não "estaria planejando" destruir Israel: está planejando! Não se trata de usar, aqui, o condicional. Mahmoud Ahmadinejad já deixou claro que sua intenção é VARRER ISRAEL DO MAPA (palavras dele, não minhas). É com esse fim em mente que ele dá armas e dinheiro aos terroristas do Hamas e do Hezbollah. A bomba atômica é o meio pelo qual ele pretende atingir esse objetivo.
2) Caro Ítalo, você diz "e daí?" para esse fato. Dá de ombros para a possibilidade, cada vez mais concreta, de o regime dos aiatolás mandar alguns milhões de pessoas para o túmulo em um holocausto nuclear. Deve dar de ombros também e perguntar "e daí?" para cada atentado terrorista do Hamas ou do Hezbollah (financiados pelo Irã) em que morrem civis inocentes. Presumo que você também deve dizer "e daí?" para o que Hitler fez com 6 milhões de judeus (e olhe que ele nem tinha bomba atômica...).
3) Você lembra que os EUA combatem o "terror" (por que as aspas? o 11 de setembro não foi suficiente?) e têm bomba atômica, então porque o Irã não pode ter para combater o "terror de Israel" (as aspas são minhas), que "promove algo semelhante ao Holocausto contra os palestinos" etc.?
A questão exige ser desmembrada para melhor ser respondida. Vamos lá:
- Pelo que entendi, você considera os EUA e o Irã com o mesmo direito a ter a arma nuclear. Assim como o governo brasileiro, você acredita que um país democrático, que se rege há duzentos anos por leis, e onde as liberdades (inclusive a liberdade de malhar o governo) são plenamente respeitadas, e um regime teocrático dominado por fanáticos - e fanáticos que juraram exterminar um povo inteiro - se equivalem moralmente. Acredita, portanto, que não há diferença entre os que combatem terroristas e os próprios terroristas. Combater assassinos genocidas e ser assassino genocida, para você, não tem a menor diferença, pois "é tudo a mesma coisa" etc.
Se você se deu ao trabalho de ler outros textos meus nos quais falo do mesmo assunto, deve ter percebido que discordo disso inteiramente. Deve ter visto que, entre quem professa o terror e quem luta contra o terror, fico do lado destes últimos, contra os primeiros. Para mim, não há equivalência moral entre terroristas e quem os combate, assim como não havia equivalência moral entre os nazistas e os Aliados na Segunda Guerra Mundial. Assim como não há equivalência moral entre Israel e o Irã, entre os EUA e Bin Laden.
Não sou o único a pensar assim. Albert Einstein, por exemplo, pensava de modo semelhante e mim nesse aspecto. Em 1939, ele mandou uma carta ao então presidente dos EUA, Franklin D. Roosevelt, alertando o governo dos EUA para o perigo que seria uma Alemanha hitlerista com acesso à então recém-descoberta tecnologia de armas nucleares. Inclusive ele sugeria que o governo norte-americano deveria começar urgentemente um programa nuclear, antes que os nazistas saíssem na frente e adquirissem o controle dessa tecnologia letal. Einstein preferia os EUA aos nazistas. Em sua visão, uma Alemanha nazista com armas nucleares, ao contrário dos EUA, era uma ameaça à humanidade. Ele, assim como eu, não acreditava na equivalência moral entre ditaduras e democracias.
Em outras palavras, você diz que não há diferença entre uma democracia que combate o terrorismo e uma tirania que promove o terrorismo. Eu digo que há diferença, sim. E acho que não é muito difícil entender por quê.
- Você diz que Israel promove algo "semelhante ao Holocausto com os palestinos". Esta é uma acusação muito grave, gravíssima. Como tal, exige provas contundentes e irrefutáveis. O Holocausto foi a tentativa de extermínio dos judeus europeus pelos nazistas. Estes mataram cerca de 6 milhões em campos de exterminínio como Auschwitz e Treblinka. Pois bem: diga o nome de um campo de concentração criado pelo Estado de Israel para exterminar os palestinos como "povo". Por favor, aponte uma ação de Israel - qualquer uma - que corresponda ao que se convencionou chamar de genocídio e que poderia, portanto, ser comparada ao que os nazistas fizeram. Qual seria o equivalente, na região, ao Gueto de Varsóvia? Ou aos fornos crematórios de Auschwitz? Gaza? Cisjordânia? Faça-me o favor.
Aproveite e explique - a mim e ao mundo - como um povo ameaçado de extinção por quem jurou aniquilá-lo num mar de sangue (os israelenses) deve agir para se defender de grupos como o Hamas e o Hezbollah e de regimes como os do Irã e da Síria. Se você descobrir um jeito de fazê-lo que exclua o uso da força, eu garanto que você será o próximo ganhador do Nobel da Paz.
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Não me surpreende que os inimigos de Israel façam tantas referências ao Holocausto. É que uma das táticas desse pessoal é a revisão da História. Não é por acaso, por exemplo, que Ahmadinejad é um negador do Holocausto. Assim fica mais fácil para ele preparar uma nova Shoah: enquanto ele nega que os judeus foram vítimas de uma política de genocídio, ele prepara um novo Holocausto. Ele espera terminar aquilo que Hitler começou. Se depender de seus amigos brasileiros como Lula e de muitas pombas lesas pacifistas, ele não está muito longe de alcançar esse objetivo.
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Aliás, vale lembrar para quem acha que "são todos iguais": Israel já tem a bomba atômica. E, no entanto, jamais fez menção de usá-la contra seus inimigos. Pode muito bem varrer outros países do mapa, inclusive o Irã, mas não o faz. Alguém duvida qual a intenção de Mahmoud Ahmadinejad em relação a Israel, assim que o Irã tiver armas nucleares?
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4) Você pergunta: "Não seria Israel do mesmo bando dos terroristas que assolam o mundo?". Respondo: NÃO. Os motivos estão acima. A menos que se queira colocar Davi Ben-Gurion, Golda Meir e Yitzhak Rabin no mesmo saco que Osama Bin Laden, Saddam Hussein e o Talibã. A menos que se queira botar no mesmo saco uma democracia (a única do Oriente Médio, aliás) e tiranos e açougueiros fanáticos que juraram destruí-la e instalar em seu lugar algum tipo de regime totalitário ou islamita. Creio que não preciso explicar mais do que isso. Ou será que preciso?
5) Pelo mesmo motivo, dizer que os EUA "também são terroristas" é de uma cretinice sem limites. É algo que flerta com a pura delinqüência intelectual, servindo para justificar o terrorismo. Sem falar que os exemplos que você deu de "guerras desastrosas" são ridículos. Vamos a cada um deles:
- Kuwait: Para começo de conversa, não foram os "EUA", e sim a ONU, que levou adiante a guerra de 1991. Foi a ONU, num dos raros momentos em que serviu para alguma coisa, que ordenou a campanha militar para expulsar os iraquianos de Saddam Hussein do Kuwait. Tratou-se de uma guerra que até mesmo muitos inimigos ferrenhos de George W. Bush consideraram justa. Se tem alguma dúvida, pergunte aos kuwaitianos.
- Afeganistão: A "guerra desastrosa" de que você fala levou à derrubada de uma das tiranias mais absurdas de todos os tempos, a dos talibãs, que abrigavam Bin Laden. Não me parece um desastre derrubar uma ditadura e substituí-la por uma forma incipiente de democracia. Tampouco me parece desastrosa a decisão de ir atrás dos responsáveis pelo 11 de setembro onde quer que se escondam. A derrubada do Talibã livrou o povo afegão de uma tirania medieval de fanáticos religiosos que explodiam, por "idólatras", estátuas milenares e puniam com chibatadas mulheres que mostrassem o rosto na rua. Hoje, o país está sendo resgatado do século XIII. Convenhamos, não é pouca coisa.
- Iraque: Posso dizer o mesmo do caso anterior. A "guerra desastrosa" resultou no fim de uma das tiranias mais odiosas do século XX e abriu o caminho, pela primeira vez em 5.000 anos de História, para que a região conheça algo parecido com a democracia. Evidentemente, o caminho para isso tem percalços. Mas aí eu pergunto: aqueles que consideram a derrubada de Saddam um erro e a guerra um desastre, que outra solução teriam para o país? Manter Saddam no poder indefinidamente? Hoje, o Iraque tem problemas. Mas o maior deles, pelo menos, acabou. A menos que você veja alguma chance para o povo iraquiano sob o regime de Saddam.
Não sou contra todas as guerras, pois não sou pacifista. Já escrevi bastante sobre isso, aliás. Acho o pacifismo algo muito bonito na teoria, mas que na prática pode levar - aliás, geralmente leva - a resultados exatamente opostos àqulo que almeja: a paz. Você, caro leitor, acabou de dar um exemplo disso, ao colocar no mesmo patamar moral países democráticos e tiranias totalitárias. Ao fazer isso, você justificou o terrorismo. Avalizou o Mal, falando em nome do Bem. Não faço isso.
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