sábado, junho 30, 2012

O NOVO ÍDOLO DOS "PROGRESSISTAS"

Responda rápido, você que lê estas linhas: que movimento/ideologia/corrente política da atualidade justifica práticas como o extermínio de homossexuais, despreza a democracia e os direitos humanos, defende ditaduras que perseguem qualquer um que pense diferente (inclusive comunistas), justifica o terrorismo e a opressão das mulheres, acredita numa conspiração judaica para dominar o mundo e aplaude negadores do Holocausto?

Se você pensou em algum grupelho de extrema-direita, formado por jovens carecas que brandem suásticas e outros símbolos neonazistas, acertou em parte. Porque as mesmas idéias expostas acima são defendidas, hoje, por quem está no extremo ideológico oposto. Estou falando, claro, da esquerda.

E não me refiro unicamente a algum obscuro grupúsculo radical anarquista ou trotskista, que habita as margens da vida política. Nada disso. Estou falando do mainstream, da corrente principal do pensamento esquerdista hoje em dia.

Acham que exagero? Então vejam o seguinte cartaz:

Trata-se de um folheto distribuído pela Confederação Israelita do Brasil (CONIB), por ocasião da vinda do presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, à conferência da Rio+20, que acabou de acontecer. O texto diz tudo. Ahmadinejad comanda um regime que é, entre outras coisas, teocrático (a lei islâmica é a oficial), intolerante (as outras crenças são perseguidas), autoritário (encarcera opositores - inclusive comunistas), homofóbico (enforca homossexuais em praça pública), machista (mulheres são apedrejadas em caso de adultério), genocida (defende a destruição de Israel), terrorista (patrocina atentados de grupos como o Hezbollah), antissemita (nega o Holocausto) e inimigo da paz (quer a bomba atômica). A última de Ahmadinejad foi culpar os judeus pela existência do tráfico internacional de drogas. Enfim, o horror. 

Ou seja: Ahmadinejad representa exatamente tudo aquilo que a esquerda mais condena e abomina, certo? 
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Errado. Aliás, muito pelo contrário.
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O que fizeram os esquerdistas? Aproveitaram a presença de Ahmadinejad num evento mundial para execrá-lo e condená-lo com veemência, no mínimo como um ditador e um patife? Mobilizaram as redes sociais para uma grande manifestação contra esse verdadeiro acinte que foi a participação de um inimigo da humanidade numa conferência das Nações Unidas, concebida para debater a construção de um mundo melhor? Militantes dos direitos humanos, sindicatos, pacifistas, UNE, LGBT, ecologeiros, maconhistas, vadias, enfim, a beautiful people toda, decidiu dar-se as mãos e sair às ruas para mostrar que Ahmadinejad não é bem-vindo no Brasil?

Sabe o que esses defensores do belo e do justo fizeram quando da visita de Ahmadinejad ao Rio? Nada. Silenciaram sobre tudo o que está aí em cima. Silenciaram, apenas? Não, foram visitar Ahmadinejad. Visitá-lo, somente? Não, foram ouvi-lo. Só ouvir? Não. Foram aplaudir.

Isso mesmo. Políticos do PT, PSB e PCdoB, além de representantes da UNE e  alguns supostos intelectuais, como Emir Sader, resolveram tomar cafezinho com o iraniano. Os campeões das causas humanitárias e progressistas, sempre alertas para denunciar o menor sinal de "intolerância" e até de "racismo" no Brasil, foram puxar o saco e bater palmas para o ditador fanático e antissemita. E saíram todos deliciados com o que disse o "amigo e irmão" de Luiz Inácio Apedeuta da Silva. Democracia? Direitos Humanos? Respeito às minorias? Liberdade de expressão? Paz? Isso é coisa de burgueses imperialistas, sentenciaram os "humanistas".

A propósito: um valente progressista do PCdoB, indignado com o folheto da CONIB, escreveu um texto no site do partido em que defende Ahmadinejad com unhas e dentes, e ainda aproveita para equiparar os israelenses aos... nazistas! Num texto em que defende um antissemita negador do Holocausto! Pois é...

A comparação não é boa, mas vamos fazer um exercício de imaginação: pensem no ex-presidente norte-americano George W. Bush negando que os nazistas mataram 6 milhões de judeus. Preciso dizer mais?  

Agora sabe você, caro leitor, de onde partiu uma manifestação contra a presença na Rio+20 do chefe de uma ditadura homofóbica e intolerante, que representa o oposto dos valores democráticos e civilizatórios? De um grupo de evangélicos, liderados pelo bispo Silas Malafaia. Em frente ao hotel em que Ahmadinejad estava hospedado, os manifestantes exibiram um cartaz no qual pediam respeito à liberdade religiosa no Irã. Um bando de "reacionários" e "obscurantistas", como se vê...
Cartaz da "reacionária" e "obscurantista" Assembléia de Deus em defesa da liberdade religiosa no Irã: enquanto isso, os progressistas e humanistas da esquerda brasileira ouviam, embevecidos, uma lição de Mahmoud Ahmadinejad sobre como construir um mundo melhor... sem judeus e sem homossexuais.

Se serve de consolo, não pense, gentil leitor, que a cumplicidade com ditadores e terroristas é algo exclusivo do Brasil. Nos EUA e na Europa, essa forma de cegueira voluntária (e suicida) também é corrente. Figuras idolatradas pela esquerda mundial, como Noam Chomsky, Edward Said, Tariq Ali e Michael Moore, são useiros e vezeiros em concentrar suas baterias contra os EUA e Israel, enquanto voluntariamente fecham os olhos ou justificam o terrorismo islamita. Opõem-se assim, direta ou indiretamente, a tudo aquilo que a esquerda disse um dia defender, como a liberdade de expressão e os valores democráticos. Leiam o excelente livro de Nick Cohen, What's Left? How The Left Lost Its Way, publicado em 2007 no Reino Unido, que reduz a pó o edifício que a esquerda do Primeiro Mundo criou para si mesma, e que nós, cucarachas, copiamos. Duvido que quem o ler não irá reconhecer o que acontece também por estas plagas.

O beija-mão dos esquerdistas brasileiros em Ahmadinejad é uma pequena mostra, embora bastante ilustrativa, de um fenômeno apontado por Cohen: o colapso moral da esquerda daqui e de alhures, que se prolonga pelo menos desde a queda do Muro de Berlim em 1989, e cujo capítulo mais recente começou após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001. Sobretudo depois da onda de manifestações contra a guerra do Iraque em 2003, os velhos dogmas de luta de classes e socialismo deram lugar ao relativismo cultural e a políticas de identidade, em tudo contrárias à proposta teoricamente universalista do marxismo.  Saiu de cena o "proletários de todo o mundo, uni-vos!" e entrou em seu lugar o "respeito às diferenças". O resultado disso foi uma aliança profana entre comunistas ou ex-comunistas e o fanatismo islamita. Criticar Ahmadinejad por suas posições antissemitas? Isso é preconceito imperialista. Condenar os atentados da Al Qaeda? É incapacidade de "compreender o outro". E assim por diante.

Esse argumento não é apenas falacioso: é idiota. Francamente, de todas as desculpas para não fazer nada diante de ditadores e de fanáticos, a de que "é preciso entender o outro" é a mais estúpida, a mais cretina. Dizer, com base no relativismo cultural, que a tirania de Saddam Hussein no Iraque ou a do Talibã no Afeganistão eram parte da cultura local, como se fossem um quibe, além de ofender as milhares de vítimas iraquianas e afegãs desses regimes, é uma afronta à inteligência. Equivale a dizer que a cultura do Brasil é a da escravidão, ou a da Nova Inglaterra nos EUA é a da caça às bruxas.
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Ora, desde quando apedrejar mulheres e enforcar homossexuais em praça pública - como se faz hoje no Irã - é uma manifestação cultural? Nesse caso, seríamos forçados a dizer que a cultura dos alemães é o nazismo, ou que a dos japoneses é o harakiri. Seriamos obrigados a afirmar que a vitória dos aliados na Segunda Guerra Mundial deve ser deplorada, e não comemorada como uma vitória da humanidade.

Toda essa lengalenga relativista sobre "respeito às diferenças", que virou moda de uns tempos para cá, sobretudo entre os bem-pensantes da esquerda festiva e de miolo mole, não passa de um pretexto para defender a permanência de regimes criminosos e destilar desprezo pela democracia e pelos direitos humanos. Ou estes são valores universais ou não são nada. No caso do Irã, então, nem se fala. Até porque a teocracia de Teerã não é exatamente um modelo de "respeito ao outro". A imagem a seguir mostra por quê:
Homossexuais enforcados no Irã: é assim que o regime de Ahmadinejad demonstra seu "respeito às diferenças"...

Dizem que as ideologias estão superadas, e que não existem mais direita e esquerda. Divirgo ligeiramente. Para mim, estes continuam sendo conceitos válidos. Sobretudo extrema-direita e extrema-esquerda. Apenas com uma diferença: hoje, elas estão do mesmo lado. Seja um troglodita de cabeça raspada e suástica tatuada no braço, seja um sociólogo uspiano filiado ao PT ou ao PSOL, ambos, comunistas e fascistas, defendem as mesmas coisas. Aí estão Emir Sader e Mahmoud Ahmadinejad que não me deixam mentir.

E ainda há quem se escandalize com a aliança entre Lula e Maluf em São Paulo. Francamente...   

Um comentário:

Anônimo disse...

Texto magnifíco!

Jurava que iria ter esquerdistas de butthurt nos comentários, haha. Ninguém se manifestou, só confirma o que o texto diz.