O egípcio Farouk Hosny é o candidato apoiado pelo Brasil para a direção-geral da UNESCO. A UNESCO é o órgão da ONU encarregado da educação, ciência e cultura. Como tal, espera-se de seu diretor-geral que seja alguém afinado com os ideais do humanismo, da liberdade de expressão e de pensamento. Tal é o entusiasmo do governo brasileiro com a candidatura de Hosny que o Itamaraty deixou de apoiar o nome de um brasileiro, Márcio Barbosa, que cogita lançar-se candidato por um outro país.
Mas quem é o preferido do Brasil para assumir a direção da UNESCO? Farouk Hosny, o candidato apoiado pelo governo Lula e pelo Itamaraty, é o ministro da Cultura do presidente egípcio Hosni Mubarak, no poder há 28 anos. Mubarak, um general da Força Aérea, não dá trégua à oposição, que invariavelmente acaba na cadeia. Hosny é seu ministro desde 1987. Um candidato afinado com os ideais de humanismo e de liberdade de pensamento que deveriam nortear a UNESCO, como se vê.
Mas isso não é o mais grave.
Farouk Hosny, o candidato preferido de Lula e Celso Amorim, é conhecido principalmente por uma declaração, digamos, controversa sobre a literatura judaica. Ele não é muito fã de obras como o Talmude ou o Pentateuco. Tanto que, certa vez, disse o seguinte: "Se eu encontrasse livros em hebraico numa biblioteca egípcia, eu os queimaria".
A frase acima deveria, pelo menos em teoria, desqualificar seu autor como um antissemita hidrófobo e um inimigo da cultura e do humanismo, certo? Não para Lula. Não para o Itamaraty. Em ocasiões como essa, o discurso oficial brasileiro já vem pronto: "Não podemos ter relações apenas com quem concordamos", foi a frase-clichê repetida por Celso Amorim para justificar o voto brasileiro em Hosny. Também se costuma alegar altas razões geopolíticas, como a "aproximação com os países árabes" etc. É verdade. Nenhum país pode dar-se ao luxo de relacionar-se somente com quem está de acordo. As eleições em organismos internacionais obedecem a complexos cálculos geopolíticos e estratégicos. Tudo isso é verdade. Como verdade também é o fato elementar de que não se pode apoiar para a direção da UNESCO um conhecido antissemita e queimador de livros.
Nossos sábios do Itamaraty acreditam que é sempre melhor dialogar com figuras como Hosny do que firmar posição em defesa de coisas como democracia e direitos humanos. Com isso, acreditam que o Brasil, do alto de seu poder, poderia influenciar, de algum modo, governos como o do Irã e da Coreia do Norte. Como se fosse possível influenciar e trazer à razão quem nega o Holocausto e queima livros. A essa atitude auto-proclamada pragmática chamam de smart power. Recentemente, tivemos uma amostra bastante didática desse smart power, com o convite feito por Lula e Celso Amorim para que o antissemita e negador do Holocausto Mahmoud Ahmadinejad visitasse o Brasil. Na última hora, e sem avisar o Itamaraty, Ahmadinejad cancelou a visita. Esnobado, o Itamaraty teve como único resultado concreto uma chuva de críticas de todos os lados pelo convite ao sucessor de Hitler. Isso é smart power...
Pensando bem, não deveria causar surpresa o apoio do Brasil a tipos como Farouk Hosny. Defender a candidatura à direção da UNESCO de um queimador de livros é mesmo a atitude mais coerente de um governo que se nega a condenar o genocídio de 300 mil pessoas pelo governo do Sudão e que recusa a Israel o direito de se defender, além de ver "democracia até de mais" em países como Cuba e a Venezuela. Pensando bem, é mesmo algo coerente. Assim como coerente foi a declaração do Apedeuta a respeito da farra das passagens áreas no Congresso, de que não se tratava, afinal, de crime tão grave assim... Sabem como é: para quem tem um mensalão nas costas e já disse que caixa dois é algo "normal, porque todo mundo faz", alguns milhões de reais dos cofres públicos para levar a namorada para passear não é grande coisa mesmo.
Nas últimas semanas, um deputado causou furor ao dizer que se lixa para a opinião pública. Foi, com justiça, linchado pela imprensa. O governo Lula, o Itamaraty, estão se lixando para os direitos humanos. Estão cantando e andando para a democracia. E parece que ninguém está dando a mínima.
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