segunda-feira, julho 14, 2008

QUEM NOS PROTEGERÁ DO ESTADO POLICIALESCO?


- Vocês viram? Prenderam um figurão. Que beleza! Até que enfim um ricaço vai em cana! Aquele papo de que a justiça no Brasil é só para os 3 Ps - preto, pobre e prostituta - finalmente parece que está mudando. Ricos no xilindró! Bem-feito!

Certamente muita gente pensou assim na semana que passou, ao ver as cenas do banqueiro Daniel Dantas e de mais uns seis algemados após serem presos numa operação da Polícia Federal, batizada com o exótico nome de Satyagraha ("esse pessoal da PF escolhe uns nomes tão legais..."). O País está mudando para melhor, começou-se a ouvir. Daniel Dantas, uma sombra que percorre a política brasileira desde os tempos do governo FHC, um dos maiores corruptores do País, finalmente estaria encarando a Dona Justiça. Como nem tudo é perfeito, não poderia deixar de haver um juiz estraga-prazeres, que considerou a prisão abusiva e ordenou a soltura dos presos, resultando daí uma disputa com outro juiz e um prenda-e-solta que, para muitos, apenas comprovou aquilo que nos acostumamos a ouvir desde pequenininhos - que a Justiça, no Brasil, é só para os 3 Ps mesmo. Mas restou a satisfação de ver, pelo menos por alguns instantes, um bacana atrás das grades. Pobres e ressentidos, uni-vos! A Revolução pode não estar próxima, mas, enquanto isso, saboreemos essa doce vingança!

Não vou me debruçar aqui sobre o mérito da prisão de Daniel Dantas. Quem quiser saber os detalhes do caso, encontrará farto material à disposição na internet e nos jornais, e poderá fazer seu próprio juízo. Vou apenas me referir ao que me incomodou no assunto. E muita coisa me incomodou.

Incomodou-me, em primeiro lugar, que a operação da PF tenha sido montada como um verdadeiro circo midiático - no caso, um circo cuja principal atração era a prisão de um "tubarão do capitalismo financeiro". Desde o primeiro momento, desconfiei desse aparato todo, principalmente porque percebi, logo nas primeiras chamadas dos noticiários, um forte viés ideológico nessa história - "pegaram um rico, pegaram um rico". Quando li a respeito do inquérito policial montado pelo delegado da PF, de nome Protógenes (bom nome para um delegado da PF) - uma verdadeira peça de alucinação ideológica esquerdista, eivada de teorias conspiratórias e de uma visão delirantemente messiânica, cheia de impropérios contra os "ricos exploradores" e de um claro teor liberticida -, minhas desconfianças se confirmaram. Lembrei na hora daquele procurador do Ministério Público, o Luiz Francisco de Souza (lembram dele?), que fez muito barulho no governo FHC, posando de vingador dos fracos e oprimidos... Alguns anos atrás ele lançou um livro, um catatau de umas mil páginas, louvando o marxismo como uma "utopia cristã". Pois é... Sempre que se mistura Justiça e ideologia - no caso, um sentimento difuso de raiva e frustração, vingado pela captura de um "burguês" -, o que me vem à mente são os processos stalinistas dos anos 30.

Não que Daniel Dantas, Naji Nahas e Celso Pitta sejam vítimas inocentes de um pesadelo kafkiano, nada disso. Dantas, aliás, é uma caixa-preta, uma bomba que pode explodir a qualquer momento, e, como Pedro Collor e Roberto Jefferson, abalar profundamente os alicerces da nossa República - muita gente graúda no governo lulista, com certeza, deve estar roendo as unhas de apreensão com a prisão do banqueiro... Mas a questão não é essa. Sendo Dantas culpado ou não, a operação da PF é mais um capítulo rumo ao Estado policialesco em que está se transformando o Brasil. Há indícios de que a PF, ou pelo menos parte dela, anda extrapolando de suas funções, e que inclusive vem lançando mão de grampos ilegais e outras arapongagens do tipo, no melhor - ou pior - estilo SNI dos tempos da ditadura militar. A diferença - aqui está o ponto - é que dessa vez a comunidade de informações está a serviço dos "pobres" contra os "ricos", dos "trabalhadores" contra os "patrões", do "proletariado" contra a "burguesia". Ah, bom.

Outra coisa que me incomodou foi que essa tentativa tosca de ideologização da Justiça tenha vindo acompanhada de uma maré de intervencionismo policialesco na vida do indivíduo. Poucos dias antes da operação, entrou em vigor mais uma lei criada para proteger-nos de nós mesmos, a tal "lei seca" que criminaliza a cervejinha ao volante, e que está fazendo a alegria dos taxistas. Os legisladores, que certamente deveriam estar bêbados, esperam que a lei venha diminuir o número de acidentes nas estradas provocadas por motoristas embriagados. À primeira vista, uma lei muito racional e, a julgar pelas estatísticas, eficiente. No entanto, ninguém parece ter lembrado que, pela mesma legislação, o sujeito pode estar completamente alucinado de maconha ou cocaína e nada vai lhe acontecer se for apanhado numa blitz. Aliás, é curioso como o cerco aos fumantes e aos apreciadores de uma cervejinha no fim de semana está vindo acompanhado de um movimento cada vez mais forte no sentido de descriminalizar a erva maldita. Em outras palavras: fumar e cheirar pode; beber, não. Também pudera: ao contrário daquele baseado, o cigarro e o álcool são uma "indústria", algo capitalista... Ah, bom.

Quando se mistura esquerdismo de galinheiro e intervenção justiceira, o resultado não é uma sociedade mais civilizada e justa, e sim mais infantilizada e, por isso mesmo, menos livre. Está-se criando uma situação em que ao Estado está sendo dada carta branca para, em nome do que quer que seja - a "justiça social", a "segurança nas estradas", até mesmo a saúde dos nossos pulmões -, decidir o que é melhor para os cidadãos, que são tratados como crianças ou débeis mentais, incapazes de decidir por sua própria conta. Li que em alguns lugares já estão até mesmo proibindo o cidadão de fumar em recintos fechados, como bares e restaurantes, mesmo se for - vejam só - numa ala de... fumantes! Se não se pode mais fumar num ambiente reservado especialmente a quem fuma, separado de quem não é fumante, onde mais se pode fazê-lo? Onde está a liberdade de opção?
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Paradoxalmente, ao invés da responsabilidade, o que se estimula com essa imposição do politicamente correto na vida privada dos cidadãos é a irresponsabilidade, o paternalismo estatal. Isso, aliás, é uma nota constante do governo lulista. Em 2005, uma enorme campanha de propaganda tentou convencer os brasileiros de que a solução para a violência seria o desarmamento do cidadão comum. Este ficaria impedido de escolher ter ou não um revólver 38 para se defender da bandidagem, enquanto os bandidos manteriam seus AR-15 e AK-47. Do mesmo modo, o governo investe cada vez mais contra a liberdade de expressão e de informação, na forma de um projeto de lei que condena manifestações "homofóbicas" ou de tentativas de ressuscitar a censura - não por acaso, o inquérito do delegado Protógenes sugere a prisão de uma jornalista por haver, segundo ele, vazado informações da operação...

Essas tentativas de regular a vida do indivíduo, travestidas de boas intenções, assim como armações ideológicas rastaqüeras baseadas numa visão eivada de marxismo vagabundo, na linha "luta de classes" aplicada ao Direito, não me comovem. Aprendi a valorizar acima de tudo a liberdade do indivíduo, e a desconfiar de qualquer tentativa, por mais bem-intencionada que seja, de diminuir essa liberdade em nome de algo maior do que o indivíduo - a "coletividade", que muitos identificam com o próprio Estado. Tenho medo de sair à rua e ser atropelado por um motorista bêbado (ou fumado e cheirado), mas temo muito mais o "Estado sábio", que supostamente sabe o que é melhor para mim. Assim como desconfio de papagaiadas ideológicas travestidas de operações justiceiras. Estamos acostumados a querer que o Estado nos vigie a todos. Na verdade, devemos vigiar o Estado.

A propósito, você já viu um petista preso e algemado?

Um comentário:

Augusto Araújo disse...

Ei Gustavo, posso te fazer um pedido

notei em alguns debates, a insistencia de uns esquerdinhas quanto à comuna de Paris, eu pouco sei sobre o episódio, mesmo googleando

se uma hora vc puder fazer uma análise dela como fez com outros assuntos, eu agradeceria

desconfio q o q chega sobre a comuna é eivada de ideologismo

abs