sexta-feira, janeiro 30, 2009

EXTRADITEM TARSO GENRO!


Um leitor me mandou um link para que eu juntasse meu nome a um abaixo-assinado de repúdio à decisão do Ministro da Justiça, Tarso Genro, de conceder status de refugiado político ao terrorista italiano Cesare Battisti e negar sua extradição para a Itália (http://www.abaixoassinado.org/abaixoassinados/3794). O abaixo-assinado é uma resposta a outro, firmado por 505 figuras conhecidas e nem tão conhecidas da nossa esquerda tunipiniquim, como Oscar Niemeyer e Emir Sader, a favor da decisão. A ideia é produzir um documento com mais assinaturas do que o outro, para ser enviado a Tarso Genro.

Ainda não coloquei minha assinatura no abaixo-assinado. Considero a iniciativa válida, mas, devo confessar, manifestos desse tipo não fazem meu gênero. Sei que o objetivo é justo e bem-intencionado, e que a pessoa que me mandou o link está coberta de razão. Mas não sei se adiantaria alguma coisa. Manifestos e abaixo-assinados, para mim, são um subgênero literário, e têm mais a ver com nossos artistas e "intelequituais" de esquerda, muitos dos quais transformaram a confecção de tais documentos coletivos em sua maior - senão, a única - produção artística e acadêmica. Além do mais, o texto será endereçado a Tarso Genro, que certamente nem se dará ao trabalho de lê-lo, devendo terminar repousando, esquecido, em alguma gaveta empoeirada do Ministério da Justiça. Tudo bem que o objetivo não é convencer Tarso a mudar de ideia, mas firmar posição de uma parte da sociedade contra a concessão do refúgio a Battisti, mas não consigo evitar uma certa sensação de frustração em apôr meu nome em algo que não será lido pelo destinatário.

Muito melhor seria, a meu ver, solicitar a extradição de Tarso Genro. Não sei a quem isso poderia ser solicitado, nem se a proposta é factível (desconfio que, infelizmente, não é), mas a ideia me parece muito mais interessante do que qualquer manifesto ou abaixo-assinado contra a decisão do governo brasileiro de não devolver a Itália um terrorista homicida. Tarso Genro já demonstrou que é um perigo para os brasileiros. É uma ameaça à nossa segurança, a perfeita antítese do que se espera que seja um Ministro da Justiça. O mínimo que se poderia esperar seria querer que nos livrássemos dele de uma vez.

O que dizer de alguém que ocupa a pasta da Justiça e concede refúgio político, à revelia da lei italiana e da do próprio País, a um criminoso condenado à prisão perpétua por quatro homicídios na itália? E que, ao tentar justificar essa sua decisão, que provoca uma desnecessária crise diplomática, mentir deslavadamente, ao ter dito que o citado terrorista "não teve o direito de defesa" e "corre o risco de perseguição política" em seu país de origem, como se a Itália fosse uma ditadura bananeira qualquer? E que mentiu novamente, quando disse que a condenação de Battisti havia-se baseado tão-só no depoimento de uma única pessoa, militante do mesmo grupo terrorista de ultra-esquerda, em troca do benefício da delação premiada, quando os documentos do caso revelam claramente que a condenação se baseou no depoimento não de uma, mas de DEZ testemunhas, que viram Battisti na cena dos crimes e participando das mortes?

O que dizer de um Ministro de Estado da Justiça que, agindo como verdadeiro capitão-do-mato, mobiliza a Polícia Federal para prender dois boxeadores cubanos que tentavam fugir da ilha-prisão do Caribe e que os coloca, em tempo recorde e no meio da noite, em um avião fretado pelo governo de Hugo Chávez da Venezuela, de volta para Cuba? E que, ao tentar justificar esse seu ato, afirmou categoricamente que os dois atletas haviam se apresentado "voluntariamente" e "praticamente imploraram" para retornar a seu país, tendo sido pego mais uma vez na mentira, quando, algum tempo depois, um dos atletas, aproveitando a primeira oportunidade, evadiu-se da ilha para a liberdade? (Detalhe: os cubanos NÃO RESPONDIAM A NENHUM PROCESSO PENAL em seu país.)

O que dizer de um Ministro da Justiça que propõe a revisão da Lei de Anistia, promulgada em 1979 e que perdoou tanto terroristas de esquerda quanto agentes da repressão política, sob o pretexto de que o crime de tortura é imprescritível, mas que não diz uma palavra sobre a imprescritibilidade do terrorismo? E que, no afã de justificar o revanchismo, chega ao ponto de desmentir as próprias organizações armadas de esquerda, ao dizer que não considera terrorismo a luta armada dos anos 60 e 70?
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Ainda há quem pense que a decisão de Tarso Genro em conceder refúgio político a Cesare Battisti foi o resultado de uma leitura equivocada do processo, e não de puro e simples favorecimento ideológico. Bobagem. Basta perguntar: se Cesare Battisti fosse um ex-membro de uma organização fascista, de extrema direita, ao invés de ter militado no Proletários Armados para o Comunismo (PAC), a decisão de Tarso Genro seria a mesma?

Quando Márcio Thomaz Bastos foi nomeado Ministro da Justiça para livrar a cara de Lula e sua quadrilha das acusações do mensalão, eu achei que os petistas haviam atingido o fundo do poço. É que eu não sabia que o sucessor de Bastos seria Tarso Genro.

Que tal um abaixo-assinado pedindo a extradição de Tarso Genro para Cuba? Eu assino!

quarta-feira, janeiro 28, 2009

Um diálogo sobre discursos (ou: da necessidade de recolocar frases no contexto)

Criança palestina vestida de terrorista em manifestação do Hamas:
Isso, Israel não faz

(É necessário ler primeiro meu texto "Escudos humanos, um problema da humanidade")
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Escreveu-me Pablo Capistrano, um conterrâneo filósofo com quem troco umas ideias de vez em quando. Ele em vermelho. Comento em preto.

Oi Gustavo, mais uma vez eu agradeço a repercusso do meu artigo no seu Blog e queia escarecer apenas alguns pontos:

1. A infrmação sobre o Olmet foi retirada da TV, acho que a fonte não estava bem informada, mas não importa posto que veio de uma autoridade israelense.
Tudo bem, Pablo, erros acontecem. Ainda mais quando a fonte em que nos baseamos é a TV. Normal.

2. A questão dos atentados me referia aos homens bomba e não as miseis do Hammas ou Hezbolah, voce tem razão em relação aos miseis mas deve concordar comigo que após a construção do muro na cijordânia e as medidas de segurnça do estado de israel os atentados com homen bomba diminuiram significativamente.
Que bom que você concorda que o muro cumpriu e cumpre uma importante função de segurança. É bom lembrar que, quando ele começou a ser construído, se não me engano durante o governo de Ariel Sharon, não faltou quem criticasse a decisão de Israel de erguê-lo, comparando-o, inclusive, com o Muro de Berlim, o que é um absurdo em todos os sentidos. Finalmente, parece que reconheceram que o muro é uma necessidade!... Isso vai direto à essência da questão - Israel é um Estado sitiado e diariamente ameaçado de destruição, e tem o direito de defender-se. Algo com o que você concorda, como está escrito mais adiante.

3. o que eu crítico no meu artigo não é a política militar israelense nem a existência do estado de israel. O que eu fiz no meu artigo foi algo que não se reduz a análise política das ações militares, eu analisei o discurso, algo que para mim, como filósofo me parece mais problmático no momento.
Perdão, Pablo, mas não vejo como separar a crítica do discurso da crítica da ação israelense em Gaza. A frase que você criticou - "nós cuidamos de nossas crianças" - não pode ser retirada do contexto em que foi pronunciada. E o contexto foi a guerra de Israel contra o Hamas em Gaza. Peres estava se referindo a uma prática do Hamas que foi sistematicamente omitida pela imprensa: a de usar os civis palestinos (principalmente, crianças) como escudos humanos, a fim de provocar mortes entre a própria população e assim indispor a opinião pública mundial contra Israel. Nesse contexto, convenhamos, não é preciso ser antissemita para concluir que Israel não tem o direito de se defender - ou de existir.
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Infelizmente, a sua interpretação da frase como tendo algo de "racista" e "etnocêntrico" vai nesse sentido. Vou lembrar aqui o que você escreveu: "Quando a autoridade israelense fala "nós cuidamos de nossas crianças" ele acaba se aproximando de um discurso de tipo (1). Um discurso de exclusão, cisão, separação. O problema não é meu, porque aquelas não são "minhas crianças". As crianças dos outros são um problema dos outros, das minhas cuido eu. Curiosamente esse é o discurso do Hamas, que obviamente não vai se preocupar com as crianças israelenses, porque eles pensam que estão defendendo as crianças palestinas (apesar de enchê-las de bombas, usa-las como escudo ou lançá-las em um martírio suicida e inútil). O sinistro é justamente que, com essa declaração o discurso da autoridade israelense e dos grupos que eles tentam combater se torna o mesmo".
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Em outras palavras: segundo sua interpretação do discurso, Peres estava dizendo algo assim: "Estou me lixando para as crianças palestinas; não é problema meu etc." Não é preciso ser especialista no conflito israelo-palestino para perceber que esta é uma interpretação truncada e retirada do contexto. Isso porque a questão subjacente ao discurso de Peres, e que não foi levada em conta, foi a dos ESCUDOS HUMANOS, que Peres estava denunciando. Mas o que ficou foi a suposta "arrogância racista e etnocêntrica" da autoridade israelense.
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O curioso é que, mesmo que sua interpretação da frase de Peres fosse verdadeira, Pablo, este não seria ainda o discurso do Hamas, porque o Hamas, ao contrário de Israel, não dá a mínima para as crianças dos dois lados - israelense ou palestino.
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4. Acho que mesmo no contexto que você situou a resposta do Peres (ou Olmet) foi equivocada. Ela não condiz com os princípios étcos do judaismo nem com os preceitos morais da religião de Moisés, principalmente quando dito por um lider de governo. acho que ele poderia ter sido mais feliz na resposta.
Já escrevi sobre o verdadeiro significado da frase de Peres, e deixo claro que não se tratou de nenhuma afirmação "racista" ou "etnocêntrica". Francamente, não sei se isso condiz ou não com os princípios éticos e morais da religião de Moisés, até porque, ao contrário do que pensam os terroristas do Hamas, a questão não é religiosa: é, isso sim, uma questão de civilização versus barbárie. A superioridade moral de Israel em relação ao Hamas é um fato irrefutável. É por isso que eu, mesmo não sendo judeu, me perfilo ao lado de Israel contra os que querem destruí-lo. Creio que não preciso dizer aqui que lado representa a civilização, e qual lado, a barbárie. Ver "racismo" e "etnocentrismo" na frase de Peres, mesmo truncada como foi pela imprensa, como se fosse um sinal verde para as tropas israelenses "massacrarem" as criancinhas palestinas, francamente, é algo que não pode ser levado a sério.

5. acho que você não conseguiu entender o que Kant disse, e o fato de você apoiar a causa de Israel contra o Hamas (o que para mim é plenamente legitimo e que de certa forma eu também apoio) acabou fazendo com que você perdesse a dimensão de que há, nos dois lados do conflito, uma perigosa semelhança. A ideia de uma "terra sem povo para um povo sem terra" é mais semelhante a retórica do Hammas do que você percebeu.
Sobre Kant, não vou falar, pois você certamente sabe mais do assunto do que eu. Apenas me ative ao que você escreveu, citando o grande filósofo, que era contra qualquer tentativa de compartimentalizar a humanidade, para expressar que considero a defesa de Israel uma causa não de uma nação ou de uma tribo, mas da humanidade. Você diz que minha postura, de apoio a Israel contra o Hamas, é plenamente legítima e que "de certa forma" também a apóia, pelo que eu o felicito (a maioria dos comentaristas, infelizmente, acha normal manter-se "neutro" entre Israel e o Hamas, como se fosse possível a neutralidade entre a corda e o pescoço). Mais uma vez: parabéns por essa sua posição! Só não concordo quando você diz que colocar-se ao lado de Israel contra o Hamas me faz perder de vista a existência de uma "perigosa semelhança" entre os dois lados do conflito. Primeiro, porque, ao menos que Israel queira abertamente riscar o Estado palestino do mapa e exterminar sua população, não há semelhança alguma entre os dois lados. Segundo, porque o lema "uma terra sem povo para um povo sem terra" não corresponde, em hipótese alguma, à política de Israel em relação aos palestinos na atualidade, tendo sido empregado nos primeiros anos do movimento sionista para justificar a emigração de judeus para a região, a partir do final do século XIX. Terceiro, mesmo esse lema equivocado e historicamente datado não condiz com os objetivos e métodos de grupos como o Hamas: ao contrário dos sionistas de cem anos atrás, seus membros sabem muito bem que o Estado que eles querem destruir é habitado, e não fazem segredo de sua intenção de varrê-lo do mapa. Enfim, afirmar qualquer semelhança ou equivalência moral entre Israel e o Hamas é - insisto - uma rematada falsidade, que só beneficia o lado dos que querem destruir Israel.
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6. Isarel tem o direito de existir e ele não pode ser destruido, o estado de Isarael é uma realidade asim como a existência do povo palestino. Mas Israel precisa do discurso correto para legilitimar-se moralmente e se manter do lado da justiça.
Novamente, Pablo, meus parabéns por você reconhecer o direito de Israel existir. Com isso, você está se diferenciando de nove em cada dez analistas "sérios" que, nos últimos dias, não cansaram de repetir na TV, até a exaustão, o mantra da "reação desproporcional" de Israel contra o Hamas (como se Israel devesse, em nome da proporcionalidade, provocar um genocídio em Gaza). Alguns chegaram mesmo, no auge da demência, a fazer comparações completamente descabidas entre a luta de Israel contra o Hamas e o... nazismo! Isso demonstra até que ponto o antissemitismo, velado ou não, já tomou conta da cobertura do conflito no Oriente Médio. Felizmente, ao que parece, você não compactua com esse discurso imoral e calhorda. Faço apenas um adendo: mesmo que o discurso do Shimon Peres fosse incorreto (o que não foi o caso), isso não iria mudar muita coisa: independentemente do discurso que tenham as autoridades israelenses, e até de quais sejam suas ações (basta ver a história da região nos últimos nove anos), os atentados terroristas do Hamas e do Hezbollah, assim como a mentalidade antissemita de parte da opinião mundial, continuariam do mesmo jeito. Infelizmente, para os inimigos de Israel, não importa o que seus líderes digam ou façam, a legitimação moral do Estado de Israel jamais será por eles reconhecida. Diante disso, resta a Israel apenas defender-se. É uma pena que tanta gente considere isso uma atitude "racista" e "etnocêntrica".
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Enfim, aí vai um resumo da questão:

- Israel é um Estado democrático e tem o direito de existir e de se proteger;

- Os inimigos de Israel, como o Hamas, juraram destruí-lo e exterminar sua população;

- A ação militar israelense em Gaza foi defensiva e visou a eliminar ou debilitar essa ameaça;

- No decorrer da ação de Israel em Gaza, o Hamas não hesitou em usar a população palestina, inclusive crianças, como escudos humanos;

- A maior parte da opinião pública mundial mordeu a isca e se colocou contra Israel, acusando-o inclusive de promover um "massacre" em Gaza;

- Diante das acusações, Shimon Peres tratou de colocar os pingos nos is, ao dizer que, ao contrário do Hamas, Israel cuida de suas crianças;

- A frase foi interpretada por muitos como uma demonstração de arrogância de Israel, e não como a constatação de uma realidade óbvia: Israel, ao contrário do Hamas, não usa crianças como escudos humanos para ganhar pontos na guerra de propaganda.

Tudo isso apenas comprova uma coisa: há uma campanha sistemática anti-Israel, e quase ninguém se dispõe a defendê-lo dos verdadeiros racistas e genocidas.

Cada vez mais concordo com a frase de Golda Meir: "Prefiro receber protestos a receber condolências".

O resto é conversa pra boi dormir.

sexta-feira, janeiro 23, 2009

AS IMPRESSIONANTES CREDENCIAIS DO BRASIL

Como todos sabem, desde que Luiz Inácio Lula da Silva tomou posse no Palácio do Planalto, uma Nova Era se iniciou na História deztepaís. O Brasil, que antes era um quintal dos EUA e uma colônia desimportante dos banqueiros internacionais, tornou-se, enfim, uma nação de respeito. Nosso prestígio e protagonismo nos assuntos mundiais, como o recente périplo do Chanceler Celso Amorim pelos países do Oriente Médio demonstrou cristalinamente, não cessam de crescer, arrancando aplausos e suspiros de admiração em todas as latitudes. Sob a mão digna e altiva do companheiro Lula, o Brasil caminha a passos largos para sair de sua posição periférica e subserviente e assumir um lugar de destaque na arena das relações internacionais, perfilando-se ao lado das grandes potências, com vez e voz nos grandes temas mundiais. Não por acaso, um dos objetivos mais persistentes de nossa diplomacia é, com toda razão, uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU, onde poderemos ensinar o mundo como se comportar.
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Para que não fique nenhuma dúvida de que a política externa brasileira realmente entrou em uma fase gloriosa em sua História, e de que o Brasil reúne todas as credenciais para colocar-se entre os grandes do mundo, vou me restringir a elencar algumas importantes conquistas alcançadas nos últimos anos, em apenas uma área: a dos Direitos Humanos. Vejam como, nesse campo, já nos colocamos na vanguarda mundial, podendo dar lição de moral a qualquer país:

- Em 2006, o Brasil votou contra a condenação do governo do Sudão no Conselho de Direitos Humanos da ONU. A invejável democracia sudanesa estava sendo acusada de promover uma campanha de extermínio da população da região de Darfur. O Brasil, coerente com sua tradição de pacifismo e de respeito à lei internacional, negou-se a reconhecer, como fez a ONU, que o que estava acontecendo em Darfur, e continua a acontecer, é um genocídio. O voto brasileiro foi correto, como se verifica pelos 300 mil mortos na região desde 2003.

- No mesmo órgão da ONU, e também de forma coerente com sua tradição legalista e democrática, o Brasil se absteve de condenar o regime de Cuba pelo fuzilamento e prisão de dissidentes que cometeram o terrível crime de querer ausentar-se do país ou de criticar o governo. Novamente, uma decisão sábia, baseada no princípio da não-politização da questão dos Direitos Humanos. A não-politização dessa questão, realmente, é uma cláusula pétrea da atual diplomacia brasileira, como veremos a seguir.
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- Ainda sobre Cuba, em 2007 o governo brasileiro, fazendo jus à sua reputação de farol da democracia, e não querendo politizar a questão dos Direitos Humanos, devolveu ao governo cubano dois boxeadores que queriam aproveitar os Jogos Pan-Americanos, então disputados no Rio de Janeiro, para cometer a terrível aleivosia e crime de lesa-humanidade de escapulir de seu país para a Europa. Seguindo todos os trâmites e procedimentos da lei internacional, e em plena conformidade com as normas do Estado de Direito democrático, bem como da não-politização da questão dos Direitos Humanos, o Ministério da Justiça apreendeu os dois atletas e meteu-os, no meio da noite, num avião fretado pela Venezuela de volta a Cuba, onde lhes foram dadas, como sabemos, todas os garantias (menos a de competir outra vez fora da ilha, mas isso é um detalhe). O ministro da Justiça do Brasil, o grande humanista Tarso Genro, acalmou a todos, dizendo que os pugilistas haviam praticamente implorado para voltar a Cuba. Há alguns meses, um dos atletas, ingratamente, comprovou que realmente implorara para ser devolvido a Cuba, ao reincidir no delito e aproveitar a primeira oportunidade para fugir para a Europa... O governo brasileiro também se negou a condeder refúgio a opositores do governo boliviano de Evo Morales, que, como sabemos, já se mostrou um amigo do Brasil, tendo uma predileção especial pelas refinarias da Petrobrás.

- Com outro país latino-americano, a Venezuela, a diplomacia independente e altiva do Itamaraty também não tem deixado de dar mostras de grande apreço pela democracia. Um exemplo eloquente do compromisso de nossa atual política externa com os valores democráticos está na atitude do governo Lula no tocante ao fechamento de um canal de televisão pelo governo de Hugo Chávez, um conhecido democrata. Diante de algumas críticas de alguns pessimistas e sombrios de plantão, nosso Guia Genial deixou clara a posição do governo brasileiro sobre o que está acontecendo no país vizinho: a Venezuela, segundo Lula, tem "democracia até demais".

- No começo de 2008, mais uma vez o Brasil deu uma demonstração de todo o equilíbrio e sabedoria de sua política externa, durante a crise entre Colômbia e Equador por causa da morte do dirigente número dois das FARC pelo Exército colombiano em território do Equador. Sabiamente, como sempre, o governo Lula colocou-se ao lado do Equador, cuja soberania foi violada, contra a Colômbia, que, como sabemos, agiu por pura maldade, pois não tem problemas com terroristas que usam as fronteiras de outros países. O Brasil foi mais além, e aproveitou o episódio para reiterar que não reconhece as FARC como terroristas, como declarou Marco Aurélio Garcia. A posição acertada do Brasil foi ainda mais fortalecida quando foi revelado que o governo do Equador dá abrigo e apoio às FARC.

- Mais recentemente, o governo brasileiro reforçou ainda mais suas credenciais humanistas, ao condenar a ação militar de Israel na Faixa de Gaza, mas não o Hamas. É que Israel, como é notório, agiu por pura perversidade, para atingir de propósito prédios da ONU e matar o maior número possível de criancinhas palestinas, enquanto o Hamas, como também é notório, é como as FARC para o Brasil. Evidentemente, isso qualifica plenamente o Brasil como um mediador para alcançar a tão sonhada paz na região. Quem sabe vem aí um Prêmio Nobel.

- Ainda há poucos dias, o governo brasileiro demonstrou todo seu tirocínio na defesa intransigente dos princípios democráticos, ao conceder o status de refugiado político a um italiano, Cesare Battisti, foragido da Justiça de seu país por algumas ideias políticas, como matar quatro pessoas à queima-roupa nos anos 70. Na ocasião, Tarso Genro justificou a decisão, pois afinal trata-se de um país, a Itália, que, ao contrário de Cuba, é uma ditadura, na qual o acusado não teve nem teria nenhum direito de se defender. O governo da Itália, claro, não gostou. Mas, felizmente, temos Lula para defender a nossa soberania. Esta, aliás, consiste em peitar os mais ricos e pôr em dúvida os procedimentos jurídicos de outro país, como até uma criança sabe.
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Mas o caso Battisti não é o único a ilustrar nosso compromisso com a Lei e o Direito. Há alguns anos, o governo brasileiro concedeu refúgio a um ex-padre, Olivério Medina, que se apresenta como representante das FARC no Brasil. Sua esposa, aliás, trabalha como funcionária do Ministério da Pesca, para cuja sede em Brasília foi transferida a pedido de Dilma Rousseff, dedicando-se, desde então, a alfabetizar os pobres favelados do Lago Sul de Brasília. Em tempo: Tarso Genro deseja revogar a Lei de Anistia, para punir os que cometeram crimes políticos durante a ditadura militar no Brasil - menos, claro, os que o fizeram em nome de um ideal elevado e humanista, como o comunismo.

Como se vê, sob a batuta de Lula, Celso Amorim, Marco Aurélio Garcia e Tarso Genro, o Brasil está mesmo preparado para assumir um lugar de liderança entre os países defensores da Democracia e dos Direitos Humanos. Quem duvida que, com essas impressionantes credenciais, teremos nossa voz ouvida e acatada em qualquer foro internacional? Dá-lhe Brasil!

quarta-feira, janeiro 21, 2009

OBA-OBAmania

Devo confessar que não me emociono facilmente. Diante de uma cena ou de um discurso feito sob medida para arrancar lágrimas da plateia, geralmente eu me encrespo e procuro reprimir o máximo meu lado passional e sentimental, buscando guiar-me sempre pela razão. Não que eu seja um monstro de frieza e de insensibilidade. É que, diante de ondas de emotividade e de consensos fabricados, acho impossível não ficar com um pé atrás. Prefiro fazer o que pouca gente faz numa hora dessas: pensar.
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Se o motivo de emoção e histeria à minha volta é a posse de um presidente ou o discurso de um político, sou ainda mais radical. Simplesmente não consigo abrir mão do 0,0002% de meus genes que não compartilho com os chimpanzés e juntar-me à multidão ululante. Discursos - ainda por cima, de políticos - não me comovem nem um pouco. Antes, causam-me um tédio irreprimível. Não me entusiasmam, apenas me provocam bocejos de hipopótamo. Prefiro o zumbido de uma abelha ou de uma mosca a permanecer de pé, ou mesmo sentado, tendo os ouvidos e a inteligência massacrados por uma catarata de promessas e frases de efeito, tão vazias quanto as cabeças para as quais se dirigem.
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Foi exatamente assim, profundamente entediado, que me senti ontem, ao ver pela televisão a cerimônia de posse de Barack Obama na presidência dos EUA. Tem gente que está chorando até agora. Afinal, era um "momento histórico". Teve uma repórter, se não me engano da Globo, que achou isso pouco, e tascou um "esse é um momento histórico na história da humanidade". Só faltou dizer que estava presenciando o advento do novo Messias, o redentor da espécie humana. Aliás, para muita gente, era isso mesmo que estava acontecendo.

Em seu discurso de posse, Obama falou em "reconstruir" a nação (ela foi destruída?). Esse tipo de discurso, em vez de me entusiasmar, me dá calafrios. A ideia de "reconstrução" do país - ou do mundo - é algo presente nos discursos de todos os líderes ditatoriais do século XX, de Hitler e Stálin a Fidel Castro e Hugo Chávez. Traz em si um claro componente de messianismo salvacionista, algo tão conhecido de nós, brasileiros. Não duvido que já estejam acendendo velas para Obama em alguns lugares dos EUA, assim como já estão acendendo velas para São Luiz Inácio em algumas cidades do interior do Nordeste. Uma das frases do discurso de Obama foi "a esperança venceu o medo". Impossível evitar a impressão de déjà vu.

Obama é o presidente "histórico". Sua eleição está sendo considerada, por dez em cada dez veículos da grande imprensa, uma vitória contra o racismo e um raio de esperança para a humanidade. Quanto a ser uma vitória contra o racismo, já escrevi sobre isso, e acho que foi exatamente o contrário - Obama dificilmente teria sido eleito não fosse justamente a questão racial, ou seja, o fato de ser (americanamente, diga-se) negro. Com relação à segunda questão, de se Obama é ou não uma esperança, é aqui que tenho minhas maiores dúvidas. A vitória de Obama pode ser creditada a uma série de fatores, inclusive à crise financeira mundial, mas é inegável que foi também uma vitória dos inimigos dos EUA. Muitos que torceram por ele compartilham da visão segundo a qual os EUA só agem, e o mundo reage. O terrorismo islamita, por exemplo, é visto, segundo essa visão, sempre como uma forma de reação, de resposta, à política externa norte-americana. O discurso de Obama, ao proclamar que guerras se vencem com mais do que armas e ao prometer diálogo com regimes como o do Irã, vai nessa direção. Soube que ele pretende fechar a prisão de Guantánamo e conversar também com Raúl Castro, que governa um regime que mantém umas 600 Guantánamos na ilha-prisão de Cuba, mas ninguém - principalmente, os que votaram em Obama - dá a menor bola para esse último detalhe.

Outro fato interessante é que, com a aposentadoria de George W. Bush, os devotos de Obama terão um problema pela frente. Com Belzebu fora da Casa Branca, quem irão demonizar e culpar por todos os males do mundo? O novo Satã para se atirar o sapato já foi escolhido: Israel, contra o qual os idiotas úteis e arautos do "outro mundo possível" já voltaram suas baterias de ódio, inclusive de antissemitismo disfarçado. De fato, pouco importa quem esteja na Casa Branca: por trás do ódio a Bush, estava o ódio aos EUA, que é anterior a Bush e continuará a existir durante o governo Obama, pois suas raízes são muito mais profundas. A diferença é que, com Obama na presidência, há a possibilidade de o discurso do Blame America First tornar-se oficial, para gáudio dos que se alegraram com os atentados de 11 de setembro.
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Aliás, para sermos justos, até isso é duvidoso no que concerne a Obama. Vamos lembrar. Ele montou uma equipe de governo composta de algumas figuras previsíveis e outras, como o responsável pela segurança, oriundas da Era Bush. Isso demonstra como os slogans de "mudança" que embalaram a campanha podem ser - pelo visto, são - vazios e eleitoreiros. É mais um detalhe a aproximar Obama de seu colega Lula da Silva. O Apedeuta, como sabemos, copiou a política econômica de FHC, que passou anos atacando com fervor jesuíta. Hoje, com aquele seu jeito misto de Rolando Lero e Dercy Gonçalves, reivindica até a paternidade da estabilidade econômica... O que leva à seguinte conclusão sobre os dois presidentes: tanto num caso como em outro, eles se opunham a seus antecessores, não a suas políticas.
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No começo deste texto afirmei que, diante de ondas de irracionalidade coletiva, não consigo abandonar meu lado racional e deixar de pensar. E pensar é duvidar. E é exatamente isso o que a posse - e a pose - de Obama me induzem a fazer. No momento em que se celebra sua ascensão, uma série de perguntas e dúvidas pululam em minha cabeça. A primeira de todas é: ele realmente nasceu nos EUA? Se sim, porque vem há meses se esquivando de mostrar sua certidão de nascimento, como lhe é exigido em um processo legal movido por um advogado de seu próprio partido? Qual é exatamente sua relação com figuras como Tony Rezko, Bill Ayers, Jeremiah Wright e Raila Odinga? Que papel teve no escândalo da ACORN, a maior derrama de títulos de eleitores falsos da História dos EUA? Finalmente, por que a imprensa não divulga nada disso? Sobre qualquer um desses pontos, nenhuma investigação, nenhuma matéria ou reportagem mais cética e investigativa. Se há algo de histórico na eleição e posse de Obama, não é a cor de sua pele nem seu nome pouco usual, mas o nível realmente inédito de adulação com que o brindou a imprensa norte-americana e mundial, um culto da personalidade verdadeiramente soviético em suas proporções e em sua disposição de esconder fatos pouco abonadores da vida do novo Messias. E ai de quem chame a atenção para essas questões não-respondidas! Será tachado de maluco ou nazista, e ponto final.
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Pouco mais de dois anos atrás, ninguém sabia quem era Barack Hussein Obama. Hoje, continuam não sabendo. Há apenas uma certeza: com ele na Casa Branca, os EUA se tornaram um país mais caudilhesco, mais terceiromundista, mais bananeiro.

terça-feira, janeiro 20, 2009

"Ai que preguiça"...


Recebi um post anônimo muito engraçado. Relutei um pouco antes de publicá-lo aqui, por motivos que, imagino, não são difíceis de perceber, mas não resisti. Os meandros da mente humana, sobretudo quando se mostra propensa a bizarrices, é algo que sempre me fascinou. Aí vai. Comento em seguida.

Gustavo,

Eu realmente me divirto muito com o teu blog. Simplesmente porque ele é falso e ridículo como qualquer outro blog existente. Tem meses que sou os mais variados tipos de pessoas, sejam esquerdistas, direitistas, anti-imperalistas, americanista, nordestina homossessual, pró e contra Fidel... São infinitos os meus pseudônimos. A verdade como você coloca, e principalmente no meio que você coloca, não existe. Tudo aqui é falso... eu, as pessoas que aqui escrevem, você e, principalmente, o blog em si.

No momento eu desapareço, mas futuramente volto a aparecer, de maneira diferente, de qualquer forma possível, para te apoiar ou te refutar, não importa. O que interessa é brincar neste blog imaginário que você criou... hehehe

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Fico feliz em saber que há gente que se diverte com meu blog, embora este não seja meu objetivo. Eu, da minha parte, sofro um bocado. Primeiro, pela falta de tempo para escrever sobre tudo que eu gostaria, o que sempre gera um sentimento de frustração. Segundo, porque o sentimento que me anima a escrever e a manter o blog não é bem a jocosidade, mas a tristeza - a pena da galhofa e a tinta da melancolia, como diria Machado de Assis, tão massacrado pelas "homenagens" que recebeu no ano passado. Tristeza diante daquilo que considero errado, falso, injusto ou simplesmente idiota - como o artigo impagável de Oscar Niemeyer que transformou um livro demolidor sobre Stálin em apologia do tirano -, e que demandaria mais de uma vida para ser comentado. Tristeza diante de comentários que usam e abusam de adjetivos como "falso e ridículo" sem apresentar um mísero argumento que seja, sobre qualquer assunto, a respaldar esse tipo de afirmação. Enfim, diante de tudo que me faz dizer "epa", em vez de "oba". Diante disso tudo, da miséria da condição humana, confesso que às vezes bate uma profunda e irresistível fossa, uma vontade de sentar no meio-fio e chorar, chorar...

Compreendo perfeitamente as razões que levam a comentários como o que eu transcrevi acima. Afinal, por que não consigo ser alguém "normal", politicamente correto, mainstream, do tipo de que todos gostam? Alguém assim, sem opinião, seguidor da multidão, sempre pronto a dizer algo edificante, adaptável camaleonicamente a qualquer ambiente e a qualquer platéia, mais ou menos como o personagem do filme de Woody Allen, Zelig? Por que não guardo minhas opiniões para mim mesmo e não deixo de azucrinar os bem-pensantes com essa minha mania de querer debater? Por que não perco a chance de criticar o Lula por sua apologia da ignorância ou por coisas desimportantes como o mensalão e sua devoção à ditadura cubana? Por que, destoando de nove de cada dez exemplares da espécie humana nesses dias, eu me recuso a fechar os olhos para o terrorismo do Hamas e condenar a ofensiva de Israel em Gaza? Por que me escandalizo e vejo um claro viés ideológico na decisão de um ministo da Justiça em conceder refúgio político a um terrorista de esquerda condenado por vários homicídios na Itália, um país democrático, quando esse mesmo ministro desse mesmo governo negou refúgio a dois atletas que tentavam fugir de Cuba? Por que não me emociono com a posse de Santo Obama e prefiro, em vez disso, encasquetar com tolices como o fato de que ele até agora não provou ter nascido nos EUA, como determina a Constituição que ele jurou hoje respeitar e defender? Por que insisto nessa besteira de blog? Por que, enfim, não sou um cara legal?

Mas o.k., o autor (ou autora) do comentário acha que o blog é falso, assim como este que escreve. Quer dizer com isso que tudo que aqui escrevo, assim como eu mesmo, é falso, não existe, assim como o próprio blog em si, um mero produto de minha imaginação certamente delirante etc. etc. E ainda diz, amparada no anonimato, que gosta de brincar, dizendo-se ora isso, ora aquilo, ora do contra, ora do a favor. Se a pessoa em questão entra aqui se fingindo passar por outra, e com opiniões diferentes só para ver no que vai dar, é algo, para mim, irrelevante. O que importa é sua afirmação de que, com isso, o meio escolhido, o próprio blog, é uma ilusão. Sei não. Talvez tenha razão. Talvez o blog não exista mesmo. Talvez a internet seja só uma lata de lixo, e nada mais. Talvez os fatos e argumentos que aqui apresento sejam ilusórios. Talvez eu não exista. Talvez nada exista. Talvez o Sol gire em torno da Terra, e não o contrário. Talvez, quem sabe, tudo seja um grande video-game ou uma espécie de matriz virtual. Talvez sim, talvez não, algo assim pós-moderno, um papo meio assim... sei lá, entende? Mil coisas...

Pois é, para que refutar o que este blogueiro diz, com fatos e argumentos? Para que pensar, né? Dá um trabalho danado e, além de tudo, é algo tão chato... Melhor é seguir o rebanho. Ai que preguiça...

quinta-feira, janeiro 15, 2009

ESCUDOS HUMANOS, UM PROBLEMA DA HUMANIDADE

Vou pedir licença a meu conterrâneo, o filósofo Pablo Capistrano, para comentar um artigo dele aqui em meu blog. Já fiz isso antes, e acho que ele vai entender. O artigo em questão se chama "Todas as crianças da humanidade" e foi publicado no Jornal de Hoje, de Natal/RN, no último dia 10 de janeiro. O assunto é o conflito em Gaza. Pablo se detém sobre um aspecto específico - o aspecto mais visível do conflito, como o de quase todas as guerras, infelizmente -: a morte de crianças. Ele lembra o drama dos "pais de Goradze, enclave bósnio-mulçumano, em pleno território Sérvio durante a guerra dos balcãs. Milhares de crianças foram degoladas por Chetniks (guerrilheiros Sérvios) ou queimadas por bombas enquanto a comunidade internacional e a opinião pública cuidava da vida. Mas também penso nas crianças alemães de Dresden, incineradas pelas bombas dos aliados durante os bombardeios de 1944 (que mataram 200 mil), as crianças de Nagasaki e Hiroshima, as crianças judias nos campos de extermínio, as vietnamitas correndo nuas com napalm arrancando a pele." etc.
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Até aí, estou inteiramente de acordo com Pablo Capistrano. O problema começa aqui: "Mas o grave esses dias, foi mesmo a declaração de Ehud Olmert, primeiro ministro de Israel. Quando perguntado porque havia tantas crianças palestinas mortas no conflito de Gaza e tão poucas crianças israelenses, ele teria respondido: "nós cuidamos de nossas crianças".
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Qual o problema com essa afirmação de Pablo? Bom, eu poderia dizer que o problema é que a frase não foi dita por Ehud Olmert, mas por Shimon Peres, presidente de Israel e Prêmio Nobel da Paz. Alguém que, já tendo lutado em várias guerras desde 1948 e tendo sido um dos principais articuladores do frustrado acordo de paz com a OLP de Yasser Arafat em 1993, deduzo que saiba um pouco do que está falando. Mas o problema não é esse. O problema é que a frase de Peres, que precisa ser reposta em seu devido contexto ("texto sem contexto é pretexto", não me lembro quem disse isso, mas é verdade), significa algo totalmente diverso do que diz Pablo em seu artigo.
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Vejamos o que diz Pablo, quando se refere à frase de Peres: "Isso [o fato de Israel cuidar de suas crianças] é verdade. Após anos sofrendo atentados quase que diários, em 2009 Israel sofreu apenas um". Vamos aos números: somente nos últimos anos, mais de 3 mil foguetes do Hamas atingiram a região sul de Israel. Desde que a ofensiva israelense começou, já foram dezenas, que fizeram mais de dez vítimas fatais. Não vou entrar aqui no debate de se isso é "proporcional" ou não (já discuti isso exaustivamente em outros textos). Vou me limitar a citar apenas o que está dito aí em cima: em 2009, Israel sofreu bem mais do que um atentado. O problema é que ninguém parece estar dando a mínima para isso. Como parece não estar dando a mínima também para o fato de que, não fosse a pronta e enérgica ação militar israelense, já teríamos tido bem mais do que um ou dezenas de ataques terroristas.
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Pablo parece reconhecer isso, pois afirma "que do ponto de vista da segurança de Israel, a política dos últimos governos é, ao menos temporariamente, eficaz". Mas, logo em seguida, comete um deslize: "e que a retórica apocalíptica de grupos como Hamas e Hezbolah é de um primarismo político digno da mais profunda piedade".
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Aqui há mais alguns pontos a serem esclarecidos. Primeiro, não é somente a retórica do Hamas e do Hezbollah que é apocalíptica: suas ações assassinas e indiscriminadas contra a população civil isralense (e também contra os palestinos, como se verá mais adiante) também são. Tais grupos, é bom lembrar, juraram varrer Israel do mapa, com toda sua população - crianças inclusive. Segundo, isso não é digno de piedade: é digno de ação enérgica para deter esses criminosos. Piedade eu reservo para as crianças, tanto israelenses quanto palestinas, as maiores vítimas do... Hamas! Aliás, onde está a ONU que ainda não começou uma investigação sobre a prática do Hamas de utilizar suas instalações em Gaza para disparar mísseis contra Israel?
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Prossegue Pablo: "Agora, há uma dimensão sinistra no discurso da autoridade israelense. Existem ao menos três formas retóricas de você se escandalizar com o massacre de crianças em Gaza. (1) você se escandaliza porque israelenses estão matando crianças palestinas; (2) você se escandaliza porque judeus (apoiados por cristãos ocidentais) estão matando crianças muçulmanas; (3) você se escandaliza porque estão matando crianças."
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Da minha parte, fico com a opção 3: a morte de uma criança, seja palestina, israelense ou em Darfur, é a morte de uma criança. Não há nada mais terrível e repugnante. Ponto. Acrescento apenas que faltou Pablo falar de outra dimensão, a mais perversa de todas: você se escandaliza (deve se escandalizar) porque um grupo terrorista e genocida está usando crianças como escudos humanos para serem propositalmente mortas e assim servir de carne barata para fazer propaganda contra o inimigo, que está lutando para se defender. Deve se escandalizar ainda mais, a meu ver, se, diante de tamanha barbaridade, a mídia e a opinião pública mundial estiverem sendo manipuladas de maneira tão grotesca pelos terroristas, a ponto de ignorarem isso por completo e comprarem, mesmo sem o saber, suas teses genocidas.
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Pablo: "Quando a autoridade israelense fala "nós cuidamos de nossas crianças" ele acaba se aproximando de um discurso de tipo (1). Um discurso de exclusão, cisão, separação. O problema não é meu, porque aquelas não são "minhas crianças". As crianças dos outros são um problema dos outros, das minhas cuido eu. Curiosamente esse é o discurso do Hamas, que obviamente não vai se preocupar com as crianças israelenses, porque eles pensam que estão defendendo as crianças palestinas (apesar de enchê-las de bombas, usa-las como escudo ou lançá-las em um martírio suicida e inútil). O sinistro é justamente que, com essa declaração o discurso da autoridade israelense e dos grupos que eles tentam combater se torna o mesmo".
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Aqui está o cerne de minha discordância com o texto de Pablo. Quando mencionou as crianças palestinas, Shimon Peres estava se referindo à maneira diferente como cada lado cuida dos seus. Evidentemente, ele estava se referindo ao hábito do Hamas de utilizá-las como escudos humanos, coisa que Israel, mesmo o mais ferrenho antissionista teria de admitir, não faz. Em outras palavras, eles estava dizendo: "NÓS CUIDAMOS DE NOSSAS CRIANÇAS; AO CONTRÁRIO DO HAMAS, QUE AS USA COMO ESCUDOS HUMANOS, COM A INTENÇÃO DELIBERADA DE GERAR MORTES ENTRE AS CRIANÇAS PALESTINAS E COM ISSO LEVAR TODOS A SE INDIGNAREM CONTRA ISRAEL". Dizer que "esse é o discurso do Hamas" é algo que não pode ser levado a sério: Israel não só cuida de suas crianças, como cuida para que os bombardeios em Gaza causem o menor número possível de vítimas entre as crianças palestinas - é uma pena que o Hamas não tenha os mesmos escrúpulos de humanidade, nem em relação às crianças israelenses, nem em relação às crianças palestinas. O texto inteiro dá a impressão de que Israel está matando indiscriminadamente e por pura maldade ("ah, esses judeus malvados"...), como se não existisse Hamas nem escudos humanos. Eu me recuso a colocar Israel no mesmo saco dos que querem destruí-lo, assim como me recuso a colocar no mesmo saco os Aliados e os nazistas.
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"O fato é que, a partir dessa lógica, ao se escandalizar porque israelenses matam crianças palestinas você pode, ao mesmo tempo, não se escandalizar se palestinos matassem crianças israelenses".
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Não, Pablo. Mil vezes não! A partir desse raciocínio, que tenta equiparar Israel ao terrorismo do Hamas, você pode, facilmente, justificar este último, encarando-o como uma "legítima retaliação" (há quem defenda isso, e não são poucos). Não é preciso ser pró-Israel para perceber que há algo de intrinsecamente pró-terrorista, logo perverso, nesse raciocínio. Já demonstrei que as mortes de crianças palestinas se devem mais ao Hamas, que as usa como escudos - uma prática covarde e criminosa - do que às bombas de Israel, que visam, primordalmente, alvos do Hamas. O que distingue Israel do Hamas é que este último atira suas próprias crianças na fogueira da guerra, explorando a dor e o sofrimento de inocentes para daí auferir ganhos na guerra de propaganda (que está ganhando, como o texto de Pablo parece demonstrar).
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"Há algo de racista ou de etnocêntrico nesse discurso. Um leve odor aristocrático que acostumou a decompor a humanidade em setores. Se você opta pelo discurso 2: "eu me escandalizo porque judeus (apoiados por cristãos ocidentais) estão matando mulçumanos"; parabéns, você subiu de nível no videogame ideológico do ódio. Abandonou o estágio de um mundo baseado em laços sanguíneos, familiares, raciais, nacionais ou étnicos e entrou no mundo da religião. O problema é que esse discurso, apesar de ter bases diversas, tem, miseravelmente, as mesmas conseqüências: ódio, rancor, vingança, retaliação. Elementos centrais na construção dos massacres. Ele é um mesmo discurso de exclusão que hoje, serve para alimentar a ideologia fundamentalista de grupos que exploram o fanatismo e ignorância das massas, para reter um naco qualquer de poder."
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Insisto: não se pode igualar o direito de Israel defender-se de seus inimigos e as intenções e práticas genocidas do Hamas (inclusive contra seu próprio povo e suas próprias crianças). Não há nada de "racista" ou "etnocêntrico" nisso, ao contrário do discurso do Hamas, este sim, racista e etnocêntrico, além de genocida. No final desse parágrafo, Pablo reproduz um dos clichês mais repetidos de todos os tempos: o discurso israelense serviria como combustível para o terrorismo genocida do Hamas e assemelhados. Isso, além de ser falso - basta estudar um pouco a História do conflito nos últimos anos para perceber que não importa o que Israel faça ou deixe de fazer, o terrorismo se alimenta de uma fonte de ódio muito mais profunda e irracional -, se esquece de um fato fundamental: grupos como o Hamas não querem "reter um naco qualquer de poder": querem, isso sim, destruir Israel e islamizar o mundo à força.
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"Kant escreveu certa vez que não se pode tratar a humanidade em si mesmo e no outro como um meio. A grande utopia do esclarecimento é a da não decomposição da humanidade. A da possibilidade que esses discursos de exclusão e de separação sejam um dia substituídos por um discurso que aponte, sobre a superfície das distinções, aquilo que nos une. Porque eu diminuo em mim toda humanidade, quando não perco a capacidade de sofrer pelas crianças do inimigo".
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Concordo plenamente com as palavras de Pablo. Daí porque apóio a causa de Israel contra o Hamas. Esta é uma causa pertencente não a um grupo específico, a um país ou a uma tribo, mas a toda a humanidade.
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É uma pena que o discurso anti-Israel tenha tantos matizes, enquanto o direito de um Estado democrático defender-se de um bando de facínoras genocidas é visto como uma atitude belicista e mesmo nazista (ou "racista" e "etnocêntrica"). Mas, como dizia Golda Meir: "prefiro receber protestos a receber condolências". Inclusive pelas crianças palestinas, exploradas pelo Hamas como carne de canhão para atacar Israel, sob o olhar complacente da comunidade internacional.

MENTIRAS SOBRE ISRAEL

Cartaz do filme antissemita alemão da década de 30 "Der Ewige Jude" (O Judeu Eterno): estariam os atuais inimigos de Israel muito longe das opiniões nazistas?


Desde que as Forças de Defesa de Israel iniciaram sua ofensiva contra os fanáticos terroristas do Hamas, há algumas semanas, temos visto se intensificar a campanha de desinformação e propaganda antissionista e antissemita (esta, em geral, não se atreve a mostrar a cara, escondendo-se sob vários subterfúgios). Eis um resumo das mentiras, engodos e falsidades que foram repetidos ad nauseam nos últimos dias, e uma refutação a cada um deles:

- "A reação militar de Israel na Faixa de Gaza é desproporcional e o iguala aos terroristas".
Já escrevi bastante sobre essa balela, a mais repetida de todas. Vou tentar resumir aqui o que penso a respeito: Israel é um Estado democrático (o único, aliás, do Oriente Médio) cercado por inimigos que querem riscá-lo do mapa e exterminar sua população. Um desses inimigos é o Hamas, organização terrorista que, em sua carta de fundação, jurou matar todos os israelenses e estabelecer um Estado islâmico. Israel está respondendo militarmente aos atentados do Hamas, que já lançou milhares de foguetes sobre alvos israelenses, tendo descumprido a trégua acordada meses atrás entre os dois lados. Se a reação de Israel fosse mesmo desproporcional, como se está apregoando, os caças e tanques israelenses deveriam estar promovendo o massacre de TODA a população palestina, e não visando a alvos do Hamas.
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Ainda assim, alguém poderia argumentar que a desproporção, aqui, é de meios, e não de fins. Isso seria evidenciado pela diferença das baixas de ambos os lados - cerca de mil, até agora, do lado palestino (a maioria, membros do Hamas), e 15, do lado israelense. O.k., mas isso não muda o essencial da questão. Exigir proporcionalidade entre um Estado democrático que luta para se defender e quem deseja eliminá-lo é uma cretinice, que só pode resultar de ingenuidade ou má fé. Imaginem o que o Hamas ou o Hezbollah fariam se, em vez de foguetes caseiros, tivessem tanques e helicópteros: certamente, o número de baixas, principalmente israelenses, seria bem maior, e a tragédia teria proporções - aí sim! - verdadeiramente genocidas. É justo e ético exigir proporcionalidade de meios entre a polícia e os criminosos?
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- "A reação desproporcional de Israel alimenta o terrorismo islâmico".
Esta é uma das mais cínicas - ou mais mal-informadas - mentiras repetidas diariamente na mídia sobre a questão israelo-palestina. Consiste em simplesmente inverter a realidade, culpando as vítimas pela violência e justificando a ação dos agressores como resposta legítima a uma agressão anterior - no caso, de Israel. É como se alguém dissesse: "pô, é só não fazer nada contra os terroristas, é só deixar esses coitadinhos quietinhos no canto deles, e eles páram de lançar mísseis e explodir bombas; eles deixam, enfim, de ser terroristas"... Não é difícil ver quão estúpida é essa teoria. Ora, não é qualquer ação israelense, assim como não é qualquer ação norte-americana, o que alimenta os terroristas. Basta lembrar que, em várias ocasiões, Israel já acenou com propostas de paz generosas, e o que se seguiu foi a intensificação, não a diminuição de atentados, inclusive com homens-bomba palestinos. Vamos lembrar alguns fatos:
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- Em 2000, por ocasião das conversações de paz em Camp David, o então primeiro-ministro israelense (e atual ministro da Defesa), Ehud Barak, ofereceu mais de 90% de todo o território palestino ocupado por Israel desde 1967 ao então líder da Autoridade Palestina, Yasser Arafat. Isso significaria que praticamente toda a Cisjordânia e a Faixa de Gaza passariam às mãos palestinas. Arafat desdenhou a proposta, e ao invés de aceitá-la, desencadeou uma onda de radicalismo que culminou na segunda intifada, a revolta palestina, contra Israel.
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- No mesmo ano de 2000, as tropas israelenses se retiraram do sul do Líbano, que ocupavam desde 1978. Desde então, a região se transformou numa base avançada do Hezbollah, que de lá lança seus atentados e dispara seus foguetes contra Israel, o que levou a uma rápida guerra entre Israel e o Hezbollah em 2006.
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- Em 2005, o então primeiro-ministro de Israel, Ariel Sharon, tido como um brutamontes reacionário e belicista, ordenou a retirada, de forma unilateral e sem pedir nada em troca, de todos os assentamentos judeus na Faixa de Gaza, território que desde então foi tomado pelo Hamas, primeiro numa eleição e, depois, num golpe de estado em que seus rivais do Fatah foram fuzilados à queima-roupa. De lá para cá, o número de ataques do Hamas contra civis israelenses a partir de Gaza só fez aumentar.

Notem bem: a cada movimento de Israel em direção à paz, seguiu-se não um aceno correspondente e semelhante do lado palestino, mas uma nova onda de terror antiisraelense. Seguiram-se não abraços e flores, mas tiros e explosões. O que prova que o terrorismo já deixou há muito de ter qualquer relação com qualquer coisa que Israel faça ou deixe de fazer. Ninguém é terrorista por vontade ou decisão alheias. Os únicos culpados pelo terrorismo são os... terroristas!
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- "A ação israelense vai contra a criação do Estado palestino".
Balela pura. A solução de dois Estados - um palestino, um israelense - já foi aceita e é defendida por Israel há anos. Ninguém discute mais isso. Quem não a aceita e luta contra a solução de dois Estados - a única solução possível para o conflito israelo-palestino - são os terroristas islamitas, como os fanáticos do Hamas e do Hezbollah. Estes não querem um Estado palestino, mas destruir Israel e implantar, em seu lugar, uma teocracia islâmica.
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Suponha que as fronteiras da região retornem a como eram antes da criação de Israel, em 1948. Mais: imagine que Israel deixasse de existir, e toda a região se tornasse o Estado palestino. O Hamas e o Hezbollah cessariam sua luta? Cessariam os atentados? Claro que não! O que eles querem é a islamização do mundo, a jihad global.
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- "Os judeus, que sofreram sob o nazismo, agora repetem seus métodos"
Certamente a mais desonesta e repugnante das mentiras, moralmente equivalente ao próprio nazismo. Consiste na seguinte ideia: como os judeus comeram o pão que o diabo amassou e foram quase exterminados pelos nazistas, não têm o direito de "fazer o mesmo" com os palestinos... Há duas falsidades evidentes aí: 1) não há como equiparar o extermínio de 6 milhões de judeus com as ações israelenses em Gaza, pelos motivos já expostos - a menos que se considere o Holocausto uma justa reação de Hitler e seus sequazes contra um inexistente terrorismo judaico contra a Alemanha; e 2) a ação de Israel não visa à população palestina como um todo, mas ao Hamas. Os civis palestinos morrem principalmente porque são usados pelo Hamas como escudos humanos.
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Por trás dessa tentativa infame e indecente de igualar a ação de um Estado que luta para garantir seu direito à existência com um dos crimes mais monstruosos da História está a seguinte ideia, não menos infame e indecente: os habitantes de Israel não têm o direito de se defender. Nem de existirem. Como pensava, aliás, Adolf Hitler.
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- "O sionismo é um movimento totalitário, semelhante ao nazismo".
Essa eu li um dia desses, num artigo da Folha. Esgotados todos os demais argumentos, apela-se para o argumento derradeiro, "histórico". Trata-se aqui de questionar retroativamente a própria criação em 1948 do Estado de Israel, mostrada como um processo de expulsão e de "limpeza étnica" da população supostamente original, árabe ou palestina. Não falta aqui uma pitada de antiimperialismo antiocidental, com ataques aos interesses neocoloniais de potências como os EUA e a Grã-Bretanha, que patrocinaram a fundação do Estado sionista. Tenta-se, aqui, transferir para Israel o ódio dos "antiimperialistas" pelos EUA, a besta-fera maior.
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O argumento, que seduz a muitos, é falso por várias razões. Primeiro, porque a criação de Israel não implicou em "limpeza étnica" coisa nenhuma, mas no estabelecimento de dois Estados, um árabe (não se falava, ainda, em palestinos) e outro judeu, tal como foi estabelecido pela ONU. Foram os árabes que não aceitaram a partilha, e atacaram em massa Israel no dia seguinte à sua fundação. Segundo, porque a criação de Israel foi vista com simpatia pela esquerda mundial, inclusive pela URSS (que votou a favor da criação do Estado judaico), sendo o atual antissionismo um produto dos anos 60, quando a URSS passou a apoiar os países árabes contra Israel, visto como um baluarte dos EUA no Oriente Médio durante a Guerra Fria. Finalmente, comparar o sionismo e o Estado de Israel, um país democrático, que tem inclusive cerca de 1,5 milhão de árabes muçulmanos, com ideologias e ditaduras totalitárias como a nazista só pode ser fruto de muita ignorância ou de desonestidade intelectual pura e simples.
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Aí está. Leiam e tirem suas próprias conclusões. Diante de tudo isso que está aí em cima, quem pode negar que estamos vivendo uma nova onda de antissemitismo?

quarta-feira, janeiro 14, 2009

ENFIM, UM DEBATE

Noite de terça-feira. Enquanto a falta de opção na TV aberta me deixava exasperado e o tédio já tomava conta de mim, fujo da estreia de mais uma edição de um programa idiota de candidatos-a-celebridades-que-fazem-tudo-para-aparecer e começo a zapear, buscando algo a que valesse a pena assistir. Detenho-me num programa que não tenho o costume de ver, atraído não pelo programa em si, uma das piores coisas na já em geral deplorável televisão brasileira, mas no GC (gerador de caracteres) que anunciava, em tom fortemente sensacionalista como é do feitio do programa: "professor transsexual quer ensinar crianças".
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Deixei de lado, por um momento, o caráter fútil do programa, os comentários asininos da apresentadora e o nível abissal dos convidados, a maioria celebridades vazias de cabeça oca, para prestar atenção ao debate em si. De um lado, um transsexual masculino, Genivaldo (ou Geane), rosto, corpo e gestos femininos, reivindicando o seu "direito" de lecionar para crianças de 4 a 6 anos de idade. De outro, dois psicólogos, especialistas na área de sexualidade. No meio, dois ou três convidados para fazer cena, sem muito de aproveitável que dizer.
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Já estava imaginando, pelos antecendentes do programa, o que viria a seguir: uma desbragada apologia da homossexualidade e um ataque vitimista e afetado, pela enésima vez na televisão, à mentalidade "homofóbica" que impede um sujeito de batom, maquiagem e salto alto de ensinar nas escolas para quem acabou de sair das fraldas e não sabe ainda a diferença entre um camelo e um cavalo. De fato, não me enganei de todo a esse respeito. Um dos primeiros a tomar a palavra, gay assumido, começou a cantar as virtudes da opção do(a) professor(a), enfatizando seu "direito como cidadão" de expor abertamente sua condição sexual em sala de aula, e criticando duramente "essa gente careta e preconceituosa, que não deixa a gente ser o que é". Ainda assim, resolvi assistir ao debate, devido à presença dos dois cientistas, cujas opiniões eu estava curioso para ouvir.
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Foi aí que eu tive uma surpresa - e uma grata surpresa! Após a plateia - composta, em sua maioria, de adolescentes - ter-se derramado em aplausos entusiasmados à arenga do convidado gay ("obrigado gente, eu adoro aplausos!"), um dos psicólogos pediu a palavra. Foi direto ao ponto: o motivo que levara o transsexual ao programa - seu proclamado desejo de dar aula a criancinhas - é um absurdo. Não por sua orientação sexual, não por moralismo ou "preconceito" contra quem ou o que quer que seja, mas por um motivo puramente médico ou, se preferirem, científico: na primeira infância, até os seis ou sete anos de idade, a criança é incapaz de discernir claramente a diferença entre masculino e feminino. Sendo os professores, como os pais, uma referência nessa fase da vida, a presença de um transsexual em sala de aula pode acarretar danos irreparáveis à formação da criança, inclusive o que está catalogado como DIG - Distúrbio de Indefinição de Gênero -, uma doença segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). Crianças, ao contrário do que se imagina, têm, sim, sexualidade. É por esse motivo, acrescentou o especialista, que aos oito meses de idade não é recomendável que elas continuem dormindo no mesmo quarto dos pais, para evitar traumas psicológicos. Nada impede a pessoa de dar aulas para jovens ou adultos, já de personalidade formada, mas a ideia de um transsexual como professor(a) (na minha época se dizia "tio" ou "tia") de uma turma formada por quase-bebês de 4 ou 5 anos de idade é, com o perdão da palavra, abominável. E isso não é uma opinião: é um dado científico.
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A informação pegou claramente os presentes de surpresa, revelando todo seu despreparo para analisar casos como aquele. Isso não impediu, claro, que os gays presentes se mostrassem indignados, vociferando contra os "homofóbicos" que não os deixam ser felizes como são e insistindo na defesa do "sonho" de um travesti ensinar para que idade for, sem se importar com o fato de que isso iria ou não confundir a cabecinha das crianças ("eu ensino e confundo", chegou a dizer o candidato a professor de pré-primário). Aliás, em todas as suas intervenções, não lembraram em momento algum o direito das crianças à educação de qualidade. Sem argumentos, partiram para o sentimentalismo. No final, foi apresentado um vídeo em que o citado transsexual derramava-se em lágrimas, falando de sua mãe que é tudo para ele e que está enfrentando um tratamento contra o câncer. Só não sei o que isso tem a ver com o tema debatido.
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Esse episódio, mesmo vindo de uma fonte improvável, é bastante educativo. Bastou dois especialistas, aparentemente medianos, citarem alguns dados científicos básicos para revelar mais uma tentativa de manipulação por parte da militância gay, hoje uma força política considerável, com presença garantida na mídia (o programa era o mesmo em que os dois sargentos gays do Exército fizeram toda aquela pantomima no ano passado, antes de serem corretamente expulsos da corporação). Na verdade, o que ficou claro é que os gays (e aqui estou falando dos militantes gays) não estão interessados em "democracia" ou "cidadania" - palavras que foram bastante repetidas no debate - coisa nenhuma, mas, única e exclusivamente, em transformar seus próprios desejos e caprichos em normas obrigatórias, sem levar em consideração o restante da sociedade. Não estão interessados em coisas como ética pedagógica - algo que o sujeito do debate, sendo professor, deveria conhecer -, mas tão-somente em impor sua agenda política, "ocupando espaços", promovendo uma "mudança comportamental". Nesse caso, o transsexual Geane/Genivaldo quer porque quer lecionar para crianças em fase pré-escolar, algo que - é a OMS que diz - só pode gerar confusão em mentes ainda em início de formação, e que não despertaram ainda para as nuances da sexualidade humana. Ele não sabe disso? Sabe, sim. Mas, e daí? A "causa" é mais importante.
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Já escrevi aqui sobre esse tal movimento gay e como ele está conseguindo, com o apoio ou o olhar complacente de muitos, idiotizados ou paralisados pelo "politicamente correto", subverter - no sentido real do termo - as regras da democracia para impor uma mentalidade claramente autoritária à sociedade, sepultando, em nome do respeito à diversidade, a própria diversidade. Um projeto de lei atualmente em tramitação no Congresso ameaça tornar crime até mesmo uma opinião ou piada de bar considerada "homófóbica". Agora, querem investir sobre as criancinhas, a parcela mais influenciável da sociedade. Não duvidem: em breve, veremos gente defendendo abertamente na televisão as virtudes da pedofilia. E quem se opuser a isso, citando inclusive dados científicos, será acusado de ser um brutamontes preconceituoso e homofóbico.

terça-feira, janeiro 13, 2009

UM VERMELHO-E-AZUL COM UM TEXTO MUITO CONFUSO (OU MAL-INTENCIONADO)

Às vezes me deparo com um texto aparentemente correto, com afirmações inicialmente certas, um título apropriado etc. A partir da terceira ou quarta linha, porém, algo se transmuda: o que pouco antes pareceria lucidez e agudeza de análise se transforma num amontoado desordenado de afirmações incongruentes e estapafúrdias, que logo degeneram em negação e/ou distorção dos fatos pura e simples. É esse precisamente o caso do texto que li hoje na Folha de S. Paulo, de autoria de um certo Ricardo Melo, sobre o conflito em Gaza e o tour diplomático do governo Lula na região nos últimos dias. Reparem que ele até começa bem, e faz algumas observações interessantes. O problema está na linha de raciocínio que ele adota, francamente anti-Israel. Meus comentários vão em azul.
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DIPLOMACIA DE FACHADA
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É patético. No mesmo momento em que Israel avança para a guerra urbana em Gaza, o presidente Lula usa seu programa de rádio para pedir respeito à decisão do Conselho de Segurança da ONU sobre um cessar-fogo.
Nada a comentar. Assino embaixo. Adiante.
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Mera saudação à bandeira. A ONU, desde a sua fundação, só tem feito referendar a vontade dos países ricos. Ninguém sério, ou que se leve a sério, acredita que as Nações Unidas exerçam algum poder de fato para arbitrar conflitos, interromper guerras e promover a paz.
Aqui começa o problema. Sob o pretexto de criticar a inação da ONU, o autor comete um disparate histórico, ao dizer que "A ONU, desde a sua fundação, só tem feito referendar a vontade dos países ricos". Se isso fosse mesmo verdade, teríamos que considerar países como Sudão, Cuba e Síria potências econômicas. A ONU, hoje, não passa de uma mega-ONG e de um clube de ditadores, muitos deles patrocinadores ativos do terrorismo, todos com alguma encrenca com os tais "países ricos". Não é por acaso que os EUA e Israel são sempre voto vencido na Assembléia-Geral da dita organização.
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Ao contrário. O que a ONU tem feito ao longo de sua história é chancelar as guerras ao dar poder de veto a um único país para impedir ações mandatórias.
Mais confusão (ou desinformação). Não é "um único país" que tem poder de veto (suponho que seja dos EUA que o autor esteja falando...), mas cinco países - EUA, Rússia, China, França e Reino Unido - que detêm o direito de veto no Conselho de Segurança da ONU. Foi graças ao veto de três desses países - Rússia, China e França - que a ONU se opôs à guerra para derrubar Saddam Hussein do poder no Iraque, em 2003. E é graças ao veto de pelo menos um deles - a China - que a ONU dá de ombros para o genocídio em Darfur, a maior tragédia humanitária da atualidade, na qual já morreram cerca de 300 mil pessoas. Quem tem voz na ONU, meu amigo, não é Israel: são seus inimigos, como Ahmadinejad e Hugo Chávez. Nada a ver com o que diz o autor das linhas acima.
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A ONU que votou pelo cessar-fogo em Gaza é a mesma que assistiu, aprovando documentos parecidos, à invasão do Iraque, do Afeganistão (pela URSS e pelos EUA), à Guerra do Vietnã, da Coreia e a outras tantas tragédias.
Vou deixar de lado os casos do Afeganistão e do Iraque (basta ler o que escrevi acima). Vou me referir apenas aos outros dois, o Vietnã e a Coréia. No primeiro caso, pode-se culpar a ONU sim, mas de não ter feito nada para tentar impedir a agressão do Vietnã do Norte (comunista) ao Vietnã do Sul (capitalista), o que, hoje esquecemos completamente, foi a grande causa da guerra, levando os EUA a intervirem militarmente na região. A resposta é fácil: a então URSS, que na época integrava o Conselho de Segurança, não deixaria (a China comunista só entraria no Conselho em 1971, substituindo Taiwan). Quanto à Coréia, o autor parece não ter estudado direito a História: em 1950, diante da invasão da Coréia do Sul pelas forças comunistas da Coréia do Norte, a ONU não se omitiu. Pelo contrário: com o único voto contra da URSS, a ONU aprovou o envio de uma força militar liderada pelos EUA para deter o avanço norte-coreano. Aliás, essa foi uma das raras vezes em que a ONU honrou o que está na sua Carta de fundação e serviu para alguma coisa.
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A retórica é o refúgio preferido da hipocrisia diplomática.
Nada a comentar sobre essa frase. Apenas sobre o que vem em seguida.
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O Brasil tem sido criticado por alguns por “condenar” o ataque à faixa de Gaza. Fachada pura. Pergunte qual iniciativa concreta o Itamaraty ou o Planalto tomaram para incomodar o governo israelense. Prepare-se para o silêncio absoluto. Mas, no mundo das representações, soa importante mandar nosso chanceler excursionar pelo Oriente Médio, aparecer em fotos com o presidente do Egito e apertar as mãos da ministra israelense que “não vê crise humanitária” na faixa de Gaza.
Aqui está o cerne de toda a confusão/desinformação. A condenação diplomática do governo Lula à operação israelense na Faixa de Gaza não é de fachada, infelizmente. Aliás, é aqui que mora o problema. O governo brasileiro não vê problema nenhum nos ataques terroristas do Hamas contra alvos israelenses, tanto que se abstém de condená-los abertamente, como se recusa a condenar essa organização terrorista e genocida. Isso se traduz numa iniciativa concreta contra o governo israelense, que luta há 60 anos para se proteger de quem quer destruí-lo. O Brasil já condenou Israel na Comissão de Direitos Humanos da ONU, mas se recusa até hoje a condenar a ditadura de Cuba e o governo genocida do Sudão, sem falar nos narcobandoleiros das FARC, que insiste em não classificar como o que são: terroristas. Agora, vem falar em paz no Oriente Médio, e se oferece inclusive como mediador. Isso sim é fachada pura e representação hipócrita. Patético.
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O autor parece achar tudo isso pouco, e cobra uma atitude mais "concreta" do Itamaraty contra Israel. Quem sabe, ele ficaria satisfeito se o Brasil reconhecesse logo o Hamas como o legítimo representante do povo palestino e chamasse o Embaixador brasileiro em Israel (aliás, ele defende isso sim, vejam o próximo parágrafo).
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Em relação ao que interessa, a posição brasileira é, na verdade, oposta. Compare: por muito menos, se é que vidas importam alguma coisa, o Brasil chamou de volta o embaixador em Quito, até se certificar que o governo Correa honraria compromissos financeiros com uma empreiteira. Já em Gaza, trata-se de civis lançados à própria sorte, manipulados por extremistas islâmicos e vítimas da brutalidade da máquina de guerra de Israel. Que tal, presidente, também chamar nosso embaixador para conversar?
Viram só? Eu bem que disse: comece criticando a organização certa, a ONU, mas pelo motivo errado - esta seria um instumento dos "países ricos" (como os EUA e Israel) -, e você terminará defendendo a posição dos terroristas contra Israel. A comparação com o Equador só faria algum sentido se a "máquina de guerra" de Israel estivesse, de fato, promovendo um massacre indiscriminado da população civil palestina na região (algo em que muita gente, ignorando o Hamas, parece acreditar piamente, deixando-se levar pela massiva propaganda antiisraelense na mídia). Mesmo assim, o autor parece esquecer algo essencial: o governo Lula só chamou o embaixador em Quito MESES após o fanfarrão Rafael Correa ter encampado as propriedades da Odebrecht e impedido seus funcionários (brasileiros) de saírem do país. Sem falar que, no caso da crise diplomática com a Colômbia no começo do ano passado por causa da morte do número dois das FARC, o Brasil se colocou inteiramente do lado de Correa contra a Colômbia, mesmo tendo sido provado e comprovado que o governo equatoriano abriga e dá apoio aos terroristas em seu território. Isso, sim, é que mereceria, a meu ver, chamar nosso embaixador em Quito para conversar.
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Enfim, das duas uma: ou esse tal Ricardo Melo não sabe do que está falando, ou a ONU e o Itamaraty a que ele se refere não são a ONU e o Itamaraty que existem na realidade. Em qualquer caso, trata-se de mais um exemplo de desonestidade intelectual na imprensa brasileira.

segunda-feira, janeiro 12, 2009

ERRATA

(ler primeiro o post anterior):
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Meu último post contém algumas incorreções pontuais. Culpa da pressa e da memória, que às vezes falha (alguns podem achar que não, mas também sou humano). Diferente do que escrevi, o caso por mim narrado não ocorreu na década de 70, mas numa data incerta, não especificada (deduz-se que tenha sido nos anos 40 ou 50; portanto, não nos "anos de chumbo" da ditadura militar). Nem foi em São Paulo, mas em Belo Horizonte.
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Nada disso, claro, invalida o essencial do que está escrito. Pensei em corrigir esses detalhes no próprio texto, mas isso seria facilmente notado por quem já o tivesse lido, que poderia pensar, assim, que eu estaria sendo desonesto.
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Resolvi, então, fazer algo melhor. Aí vai o trecho do livro citado do dirigente comunista Hércules Corrêa (Memórias de um Stalinista, p. 73), em que me baseei:
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"Algo também marcante aconteceu com um sujeito encarregado de zelar pela gráfica do Partido, em Belo Horizonte. O fulano, comprovadamente, não apenas entregou à polícia nossas instalações, como delatou companheiros, que acabaram presos em conseqüência disso. Aparentemente, o homem queria estabelecer-se como uma espécie de espião, dentro do PCB. Nem desconfiava que já sabíamos de sua traição. Convocado para uma reunião, foi levado a um aparelho. Lá chegando, foi sumariamente executado. Seu corpo foi derretido com ácido muriático numa banheira e os restos, despejados na latrina." (Grifo meu)
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O autor afirma ainda: "Como esses, deram-se muitos outros episódios, naqueles anos, que foram reeditados, esporadicamente, na década de 70". E ainda: "Não estou aqui, propriamente, confessando arrependimentos. Apenas expondo até onde se pode, ou se precisa chegar, não sei, quando perdemos a medida da política de convivência com a sociedade".
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É uma pena que Hércules Corrêa não tenha revelado os nomes dos autores e da vítima desse crime nefando, nem o local e a data exatos em que ele foi cometido (daí minha pequena confusão com datas e locais no post). Ele ainda tenta justificar tais barbaridades, como no caso de ditaduras, quando "isso" (ou seja: assassinar e derreter pessoas com ácido) se torna - é ele que diz - "uma necessidade". Se tivesse sido um pouco mais honesto consigo mesmo, teria percebido, também, que, longe de serem uma "necessidade", o crime e a mentira são parte essencial e inseparável do ideário comunista. Digo mais: eles são o próprio ideal comunista.
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No mais, não há o que reparar. Faço a correção, transcrevendo aqui o texto original, pelo seguinte motivo: ao contrário de Oscar Niemeyer, procuro ler antes de emitir uma opinião. E, diferentemente de nosso gênio oficial, não tenho a desculpa da idade para justificar qualquer erro que eu venha a cometer. Ele pode dar-se ao luxo de citar um livro sem tê-lo lido, a ponto de confundir denúncia com elogio a Stálin. Afinal, ele é stalinista e vive em outra realidade. Eu não.

"A CANTAR E A DANÇAR"... UMA HISTÓRIA DESCONHECIDA DOS "ANOS DE CHUMBO"


Querem conhecer uma história de arrepiar? Um verdadeiro conto de horror, de deixar o sangue gelado?

Vou logo avisando: é coisa forte. Se você não tem estômago para cenas horripilantes, é melhor parar por aqui. Aí vai.

Em um dia da década de 1970, um militante do então ilegal Partido Comunista Brasileiro (PCB) desapareceu na cidade de São Paulo. Em uma casa de periferia, um grupo de facínoras agarrou-o e, sem dar-lhe o direito de defesa, matou-o sumariamente. Em seguida, os algozes atiraram seu cadáver, ou a vítima ainda viva (não se sabe ao certo), em uma banheira cheia de ácido. O corpo - pele, músculos, nervos, ossos - foi dissolvido, até virar uma pasta repugnante e irreconhecível. Após essa operação macabra, os assassinos despejaram o que pouco antes fora um homem na privada e deram descarga. Serviço feito, juraram silêncio sobre o ocorrido e foram para casa. O homem, que pouco antes caminhava pelas ruas, agora não existia mais. Fora evaporado, literalmente liquidado. O esgoto seria seu túmulo.

Já estão enojados? Esperem, não contei tudo ainda. Há motivos a mais para sentir engulhos. Sabem quem matou e deu sumiço no corpo da infeliz vítima? Se você respondeu que os assassinos foram torturadores do DOPS ou do DOI-CODI, a serviço da ditadura militar brasileira que, no mesmo período, estava caçando, matando e esquartejando comunistas, a resposta é: errado! Os autores desse assassinato brutal e até agora praticamente desconhecido foram nada mais, nada menos, do que... os próprios companheiros de militância política da vítima, membros do PCB!

A revelação de mais esse "justiçamento" cometido pela esquerda brasileira está no livro Memórias de um Stalinista (Rio de Janeiro: Ed. Ópera Nostra, 1994), do dirigente comunista Hércules Corrêa (falecido no ano passado). Quem quiser verificar por si mesmo, e não confiar nas palavras deste blogueiro, pode ir lá, na página 73 do livro. Os militantes do Partido estavam desconfiados que o sujeito era um traidor e que estaria espionando para a repressão, por isso resolveram eliminá-lo. Infelizmente, o autor não identifica a vítima, nem dá nome aos assassinos. Limita-se a notificar o assassinato, sem dizer sequer onde e quando exatamente ele ocorreu. É mais um crime dos "anos de chumbo" no Brasil que permanece e permanecerá, pelo visto, sem solução.
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Esse não foi o único caso de militante de esquerda morto pelos próprios companheiros de organização, inclusive pelo PCB (outros casos, como o de Elza Fernandes, na década de 30, são bastante conhecidos, tendo sido seu assassinato ordenado diretamente pelo chefe do "Partidão", Luiz Carlos Prestes, o "Cavaleiro da Esperança"). Há vários outros praticados por membros de organizações da luta armada. E, assim como ocorreu naqueles casos, o nome da vítima não consta em nenhum livro ou lista de mortos e desaparecidos políticos desde 1964 no Brasil, inclusive do publicado pelo governo Lula algum tempo atrás, e seus familiares não serão agraciados com gordas indenizações saídas do Erário público. Aliás, não se sabe sequer o nome da vítima. Outra diferença é que o crime foi cometido pelo moderado PCB, um partido que, nessa época, vejam só, era contra a luta armada e acusado de "pacifismo" e "legalismo" pelos grupos mais radicais.

Por que estou recordando história tão escabrosa? Porque ainda estou lembrando do artigo inacreditável de Oscar Niemeyer - militante do PCB desde a juventude -, em que o centenário arquiteto e fundador de Brasília derrama-se em louvores ao genocida Josef Stálin, chegando ao cúmulo de citar, como hagiográfico, um livro (que não leu) extremamente crítico e revelador sobre os anos de juventude do tirano soviético. Niemeyer diz que o livro "está reabilitando" Stálin, responsável direto por cerca de 30 milhões de mortes, e enaltece a juventude do monstro, quando este passava o tempo, entre um assalto a banco aqui e uma conspiração acolá, "a cantar e a dançar com seus amigos". Como a cantar e a dançar deveriam estar os companheiros comunistas de Niemeyer, ao derreterem o corpo do militante na banheira de ácido.

Niemeyer tem 101 anos. Está caduco? Certamente. Mas não pela idade. Suas ideias comunistas, como o próprio stalinismo, é que estão faz tempo, pertencendo ao museu de horrores da História, como o nazismo. Deveríamos jogá-las no ralo e dar descarga, como foi feito com aquele pobre homem, mais uma vítima anônima do fanatismo e da loucura, de quem não sabemos sequer o nome, mais de trinta anos depois.

sábado, janeiro 10, 2009

GAZA: O QUE PRECISA SER DITO

No mesmo dia, no mesmo jornal, na mesma página em que o gênio oficial Oscar Niemeyer, do alto de seus 101 anos, publicou um texto hilário em que enaltece Stálin, caindo no ridículo ao tomar um livro que critica o ditador soviético como um panegírico, um jovem de 31 anos, Gustavo Ioschpe, disse o que precisava ser dito sobre o atual conflito entre Israel e o Hamas em Gaza. Uma verdadeira lição de lucidez e análise crítica, uma aula de sabedoria, infelizmente ignorada por gente velha de idade e de espírito. Eu não poderia ir dormir hoje sem publicar o que segue.
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Gaza: hora de golpear o terrorismo
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A cobertura do conflito entre Israel e Hamas surpreende pela omissão de dois fatos simples e indispensáveis. Primeiro: Israel não ocupa Gaza desde 2005. Segundo: o Hamas é uma organização terrorista. Não são “milicianos”, “radicais”, “fundamentalistas”. O que diferencia o Hamas é o uso de métodos terroristas para alcançar seus objetivos. Objetivos, aliás, públicos e antigos: constam de sua carta de fundação, de 1988, solenemente ignorada pela imprensa.
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Em seu documento, o Hamas declara “trabalhar para impor a palavra de Alá sobre cada centímetro da Palestina” (art. 6º). Aqui, “Palestina” é a histórica: território que hoje inclui Israel, Gaza e Cisjordânia. Essa formulação prega a destruição de Israel e a criação de um Estado islâmico, governado pela sharia (a lei muçulmana). No artigo 7º, o Hamas cita “o profeta [Maomé]: “o julgamento final não virá até que os muçulmanos lutem contra os judeus e os matem’”. No artigo 11, declara que a Palestina é um “Waqf”: terra sagrada e inalienável para os muçulmanos até o Dia da Ressurreição e que, pela origem religiosa, não pode, no todo ou em parte, ser negociada ou devolvida a ninguém.
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Há outros trechos interessantes -o Hamas deixa claro o papel dos intelectuais e das escolas, que é de doutrinamento para a jihad; das mulheres (”fazedora de homens” e administração do lar) e até determina o que é arte islâmica ou pagã -que permitem ao leitor antever o paraíso de liberdade em que se tornaria a Palestina caso a sua visão fosse concretizada. Também há artigos em que o antissemitismo do grupo acusa a comunidade judaica internacional de dominar a mídia e as finanças internacionais e de ter causado a Segunda Guerra Mundial, em que 6 milhões de judeus foram assassinados.
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O documento flerta tanto com o ridículo que ele mesmo esclarece, no artigo 19, que “tudo isso é totalmente sério e não é piada, pois a nação comprometida com a jihad não conhece a jocosidade”. Quanto à seriedade do Hamas, não resta a menor dúvida, e seria bom que a comunidade internacional deixasse de tratá-los como pobres coitados e os visse como o que são: genocidas que só não implementam sua visão por inabilidade. A realidade no Oriente Médio mudou, mas a imprensa brasileira não se deu conta. Passou tanto tempo atacando Israel por sua ocupação contra os pobres palestinos que continuam a dirigir sua sanha acusatória três anos depois do fim da ocupação.
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Qual é a justificativa do Hamas para disparar foguetes contra a população civil israelense? Nenhuma. Para alguns, seria uma reclamação contra o bloqueio da fronteira. Essa é uma maneira totalmente ilegítima e inaceitável de protestar. Para notar o absurdo, basta imaginar se o Uruguai resolvesse lançar foguetes sobre a Argentina quando esta bloqueou suas fronteiras por causa da “guerra das papeleiras”. Pode-se realmente exigir de Israel que abra suas fronteiras a uma organização que deseja destruí-lo? Por que o Egito também bloqueia sua fronteira com o Hamas (apesar de ninguém protestar por isso)? Será por que o grupo usa a fronteira para contrabandear armas?
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Quaisquer que sejam as razões do Hamas para a campanha de pirotecnia -campanha assustadora, que já lançou mais de 3.500 foguetes contra Israel-, nenhum Estado pode tolerar essa agressão contra seus cidadãos. Comentaristas sugerem a resolução do problema por vias pacíficas, mas ninguém menciona exatamente como se daria a negociação, já que o Hamas não reconhece a existência de Israel. Aqueles que reconhecem o direito de resposta de Israel o fazem com duas condicionantes: que a resposta seja proporcional ao ataque e que civis não sejam vitimados.
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A exigência de proporcionalidade é uma sandice. Levada ao pé da letra, significa pedir que um Estado democrático constitucional lance foguetes a esmo contra uma população civil indefesa. Outra “saída” seria a morte de mais soldados israelenses. Ou, melhor ainda, civis. Ninguém menciona que, na Segunda Guerra, morreram 22 vezes mais civis alemães do que ingleses. O dado é ignorado com razão. A contabilidade é irrelevante. Hitler precisava ser derrotado.
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É certo que a morte de qualquer civil é uma tragédia. Uma vida é uma vida. Mas, quando os acusadores se espantam que 20% ou 25% dos mortos sejam civis, eu me espanto pelo contrário: é preciso enorme controle e apreço pela vida de inocentes para que, em uma região densamente povoada e contra um inimigo que se esconde em regiões urbanas, o índice de acerto seja de 75% a 80%. Os membros do Hamas se escondem em áreas residenciais, em prédios cheios de crianças. Agem de tal maneira que, em seu confronto com as democracias ocidentais, nós sempre saímos perdendo: ou pagamos com as vidas de nossos civis ou com um pouco da nossa civilidade.
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Não há maneira militar de derrota-los em definitivo. A melhor saída é drenar o pântano: chegar a um Estado palestino com os moderados do Fatah e investir para que o atraso econômico e a sensação de derrota e humilhação de muitos países árabes sejam amenizados. Fazer com que o caminho da paz e da prosperidade seja mais atraente que o terrorismo. Enquanto isso não acontece, é preciso mão forte para combater o terrorismo que já nos atinge. Ontem em Nova York, hoje em Gaza, amanhã provavelmente em outras capitais do mundo civilizado.
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GUSTAVO IOSCHPE, 31, mestre em desenvolvimento econômico pela Universidade Yale, é articulista da revista “Veja” e foi colaborador da Folha . É autor de “A Ignorância Custa um Mundo” (Prêmio Jabuti 2005).