sexta-feira, fevereiro 29, 2008

A FALÊNCIA DA O.N.U.


Tenho dois assuntos sobre os quais gostaria de escrever nos próximos dias, se tiver tempo: um é o novo filme de Michael Moore, Sicko; o outro me foi suscitado pela notícia abaixo. Vou começar por este último (em vermelho a notícia):
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Por Marcelo Ninio, na Folha:

Um relatório preparado por um investigador das Nações Unidas afirma que o terrorismo palestino é "conseqüência inevitável" da ocupação israelense e pode ser comparado à resistência ao nazismo e à luta contra o apartheid, o antigo regime de segregação racial da África do Sul. A comparação enfureceu a diplomacia israelense, que considerou o documento uma espécie de luz verde da organização ao terror.

O documento preparado por John Dugard, investigador independente da ONU para o conflito entre Israel e os palestinos, será apresentado no dia 17 de março no Conselho de Direitos Humanos da organização. Em um de seus trechos mais polêmicos, Dugard diz que é preciso lembrar o "contexto histórico" ao analisar a violência palestina."A história está repleta de exemplos de ocupações militares às quais se resistiu com violência, atos de terror. A ocupação alemã foi resistida por muitos países europeus durante a Segunda Guerra", exemplifica, sem distinguir ações contra militares das que atingem civis. Assinante lê mais aqui

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Um jornalista cujo blog eu visito às vezes, Reinaldo Azevedo, escreveu o seguinte sobre a notícia acima (em azul):

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Trato a ONU a pontapés há muito tempo. Na Primeira Leitura, essa mega-ONG de inúteis e depravados ideológicos merecia combate permanente. Aquilo não é uma Organização de Nações Unidas, mas uma espécie de covil de interesses de ditadores terceiro-mundistas, coadjuvado por funcionários idiotas vindos do Primeiro Mundo, que vêem virtudes verdadeiramente revolucionárias em tiranos e terroristas.

O delinqüente poderia ter comparado, sei lá, a situação à resistência dos argelinos anticolonialistas, notáveis também pelo uso da violência. Não perderia nada em delinqüência teórica, mas, ao menos, não exibiria o ânimo da provocação torpe. A comparação com o nazismo — que tinha como prática o extermínio de judeus e como uma das metas a sua erradicação — é simplesmente inaceitável.

Dia desses, a ONU divulgou um relatório sobre direitos humanos e racismo no Brasil. Nem dei bola. Sabem por quê? Não confio naquela gente. Aquilo é uma repartição pública de incompetentes. Há coisa de uns, sei lá, quatro ou cinco meses, um relatório da entidade, feito com base numa única matéria de um jornalista argentino, afirmava que a cidade São Paulo tinha 1% dos homicídios mundiais. Era mentira. Os dados, velhos. Tiveram de pedir desculpas.

Por isso, quando a ONU disse a Bush: “Não invada o Iraque”, pensei: mais um bom motivo para invadir o Iraque. A ONU está sempre errada.

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Mais uma vez, concordo inteiramente com Reinaldo Azevedo. Como quase sempre, ele está coberto de razão. Daí porque reproduzi na íntegra seu comentário à notícia. Não me vem à mente maneira melhor de demonstrar até que ponto pode chegar a depravação ideológica da ONU, organização que já se tornou, há muito tempo, um clube de ditadores e genocidas. No Brasil, ainda temos ilusões de que a ONU realmente representa as aspirações e esperanças da humanidade, e que todos os males do mundo se devem ao unilateralismo de Bush e dos EUA. Ainda acreditamos, ingenuamente ou não, que a ONU, especialmente a Assembléia-Geral e as agências especializadas, é uma espécie de reunião de anjos cheios de boas intenções, e que a solução de todos os problemas do mundo está no chamado multilateralismo. Simplesmente não nos damos conta ou não nos importamos se essa tal "multipolaridade" for apenas um pretexto para o aumento de influência de países como Zimbábue ou Coréia do Norte.

Há muito a ONU já perdeu sua razão de ser, tornando-se uma burocracia obsoleta e paquidérmica a serviço das piores causas da humanidade. Quando foi criada, em 1945, sobre os escombros da Segunda Guerra Mundial, como uma substituta da ineficente Liga das Nações, a idéia era reunir os países vencedores do conflito ("Nações Unidas" era o nome genérico como se definiam os países aliados contra o Eixo nazi-fascista), em torno das três potências democráticas - EUA, Reino Unido e França, mais a China Nacionalista (substituída, em 1971, pela China Comunista) e URSS (sucedida pela Rússia) -, países que compõem, desde então, sua instância máxima, o Conselho de Segurança. Era, então, uma organização essencialmente européia e, principalmente, ocidental, afinada - com a óbvia exceção da URSS - com os princípios de democracia e liberdade que levaram à derrota do nazi-fascismo e ao surgimento da ordem mundial do pós-guerra. A partir dos anos 60, porém, sua composição passou a se modificar, assim como seus objetivos, à medida que nela ingressavam os países recém-independentes da África e da Ásia, antigas colônias européias, muitos dos quais governados por demagogos e carniceiros da estirpe de um Nasser ou de um Idi Amin. Sobretudo durante a década de 70, com a crise do petróleo e o aumento da influência dos países árabes, a ONU transformou-se, de protetora da paz e da democracia no mundo, em palanque e correia de transmissão de tiranos e terroristas (Yasser Arafat foi aceito como observador e discursou na organização, em 1974), que tinham em comum o fato de serem antiamericanos. Desde então, na Assembléia-Geral, onde cada país tem um voto, Israel e EUA estão sempre na berlinda. No Conselho de Segurança, onde a unanimidade é obrigatória, os votos de EUA, Reino Unido e França quase sempre conflitam com os de Rússia e China - donos, como se sabe, de um vasto prontuário de apoio a ditaduras e violações aos direitos humanos (mas quem se importa, não é mesmo?).

O relatório sobre o terrorismo palestino, citado acima, apenas ilustra esse desvirtuamento. Não é o único exemplo. Na questão dos direitos humanos, as distorsões são ainda mais gritantes. A ONU possui uma Comissão de Direitos Humanos, da qual o Brasil faz parte, que já foi presidida por um representante da Líbia (!) e na qual ditaduras como Cuba e Irã quase sempre se safam de qualquer condenação, pois contam com o apoio e a simpatia de seus integrantes, que preferem dirigir sua munição contra os EUA e Israel, os párias da ONU, alegando não querer "politizar" a questão (ao mesmo tempo que a politizam, acusando os EUA e Israel dos piores crimes e atrocidades).

Nascida para evitar genocídios como o que os nazistas fizeram na Europa, a ONU virou, na prática, cúmplice de seus perpetradores (os exemplos da Bósnia e de Ruanda em 1994, quando a ONU se omitiu diante do massacre de 800 mil pessoas, são gritantes demais para ser ignorados). Atualmente, um verdadeiro genocídio está em marcha na região de Darfur, no Sudão, onde milícias armadas pelo governo muçulmano de Cartum se dedicam a exterminar a população cristã e animista, mas a ONU demorou anos para perceber o que acontecia - e, quando finalmente percebeu, recusou-se a chamar a chacina de genocídio. Como não poderia deixar de ser, a sombra da corrupção também se abateu sobre a organização: após a primeira Guerra do Golfo, quando as forças da coalizão liderada pelos EUA expulsaram as tropas iraquianas do Kuwait (uma das raras vezes em que a ONU serviu para alguma coisa), a ONU manteve um amplo programa de troca de petróleo por comida com o Iraque, quando o país ainda era uma satrapia de Saddam Hussein ("Oil for Food program"), que resultou no maior escândalo de desvio de recursos da história da organização. Daí porque, assim como Reinaldo Azevedo, não me surpreendi nem um pouco quando a ONU se opôs, em frente, à intervenção no Iraque para derrubar Saddam Hussein. E daí porque, assim como ele, apoiei a invasão com entusiasmo.

Há anos, o Brasil elegeu como principal meta de sua diplomacia conquistar um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas, perfilando-se ao lado das grandes potências. É mais um delírio megalomaníaco do governo Lula, que já chegou dizendo que iria "mudar a geografia comercial do mundo". Mas, para um governo que é parceiro de Fidel Castro e de Hugo Chávez, a ONU é mesmo o lugar mais indicado.

quinta-feira, fevereiro 28, 2008

É PRECISO ENTERRAR O MITO CASTRISTA - II



Paredón em Cuba: é possível ficar neutro diante do terror?

Escreve Pablo Capistrano, em resposta a meu texto anterior, em que comento artigo seu sobre Fidel Castro. Meus comentários vêm em seguida.

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Pô Gustavo fico lisongeado em perceber que você escreveu tanto sobre um texto tão despretensioso e que eu particularmente ~escrevi meio que burocraticamente para preencher meu compromisso com o jornal e emitir uma opinião sobre o assunto.

não precisa se desculpar por discordar de mim nem por me citar, é até bom.

mas vamos aos pontos:

1. Confesso a você que eu não consigo ser parcial, nem radical sobre nada. Não amo, nem odéio meus objstos de análise. anos de leitura da maldita filosofia alemã fizeram seu estrago sobre mim pór isso não consigo perder a frieza quando eu vejo as discussões das dua storcidas organizadas (os pro e os contra fidel).

2. trivialidade ideologica é, para mim, satanizar fidel ou diviniza-lo. isso sim é perpetrar o mito que você quer derrubar, lembra do paraiso perdido de John Milton? Lúcifer é um anti-heroi tão fascinante quando Jesus.

3. satanizar fidel é burrice, assim com idealiza-lo. faces de uma mesma moeda e de um radicalismo que em essencia é igual.

4. a revolução americana está ligada a cubana, na jistória latino americana porque são faces de um mesmo iluminismo que gerou o liberalismo de adam smith anglo-americano e os socialismo franco-germanicos. elas aparecem com alternativas excludentes, por isso estão linkadas uma a outra de modo simbiotico.

Continuando..

4. quanto a questão do embargo só há uma resposta para a manutenção desse embargo depois da queda da URSS, o interesse mútuo dos EUA e de Cuba, o embargo era vital para o regime de Cuba e atendia aos intereses da administração Bush pai e filho e Clinton, que tomaram medidas endureçendo o embargo.

5. quanto a questão dos DHs, veja Guantanamo e o que a adminstração Bush está fazendo ao rasgar a convcenção de genebra e criar uma zona solta de qualquer tipo de direito (nem o direito norte americano, nem o direito dos prisioneiros do oriente médio, nem o direito internacional está sendo aplicado aquelas pessoas) como é possivel sustentar que essa administração defende os direitos humanos?o patrioct act aprovado pelo congresso norte americano e suportada pela SCF jogou a revolução norte americana e tudo aquilo de mais importante que aquele pais já produziu em termos de materializar a utopia iluminista no lodo. isso é trágito, Tomas Paine, Jefesrson e John Rawls, devem estar sofrendo muito no caixão.

bem, não sei se tem mais, mas é isso, acho que vou comentar seu comentário no JH da próxima sexta e escrever outro artigo deicando as coisas mais claras.

valeu cara, e não se esquente pode sentar o pau nos meus artigos, quem tá na chuva é para se molhar.

keep on the beat!
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Ok, Pablo, vamos lá.

Antes de qualquer coisa, é bom saber que você não se chateou por eu ter citado seu texto, e você nominalmente, em meu blog. Tem gente que se sente ofendida com isso. Bom saber que você não pertence à maioria da humanidade que pensa que debate de idéias é sinônimo de ofensa e agressão pessoal.

Confesso que tenho um péssimo defeito: não consigo enxergar nenhum texto como despretensioso ou burocrático. Principalmente quando trata de temas polêmicos, como a ditadura de Fidel Castro em Cuba. Se alguém emite uma opinião, e se o assunto me interessa, não tem jeito, eu comento. Se o assunto é polêmico e eu tenho uma idéia formada ou em formação sobre o mesmo, aí não tem jeito mesmo. É algo que está em meus genes, não dá para evitar.

Mas vamos lá, vou tentar analisar seu comentário, ponto a ponto. Desculpe se eu me alongar um pouco demais:

1. Você diz que não consegue ser parcial, nem radical, sobre nada, e que não ama, nem odeia seus objetos de análise. Creio que esta é uma atitude muito interessante quando o objeto de análise é, digamos, a posição das estrelas no céu ou a física quântica. Quando se trata de um fato como a ditadura castrista, porém, há de se convir que a coisa fica um pouquinho mais complicada. Do mesmo modo que é em relação a qualquer outra ditadura. Aqui não há como não se colocar do lado dessa ou daquela torcida. Basta perguntar: alguém teria essa mesma posição "equilibrada", hoje em dia, sobre a ditadura nazista ou stalinista, por exemplo? Admito minha ignorância em filosofia alemã, assim como na poesia de Milton. Sei apenas um pouco de História. E sei que um pato é um pato e um cachorro é um cachorro.

2. Você afirma que considera trivialidade ideológica satanizar ou divinizar Fidel. Eu também considero. Pois não se trata de satanizar ou não Fidel, assim como não se trata de satanizar Hitler ou Stálin - trata-se de denunciá-lo. E motivos para isso, convenhamos, há de sobra. Se tem alguma dúvida, dê uma olhada no que acontece com qualquer um que falar mal de Fidel em Cuba ou, se gosta de estatísticas, nos dados da ilha antes e depois de 1959. Já escrevi bastante sobre isso, aliás.

3. Para você, satanizar Fidel é burrice, assim como divinizá-lo. Mais uma vez, estou de total acordo com você. É burrice tentar satanizar Fidel, até porque, em minha opinião, isso é impossível. É impossível, diante da montanha de fatos que mostram o que ele sempre foi: um tirano homicida e um tremendo farsante, que prometeu uma revolução em Cuba, que seria democrática, e fez outra, totalitária e personalista. Não há como "satanizar" Fidel, pois a própria realidade se encarrega disso.

4. Você se refere às revoluções americana e cubana como herdeiras do Iluminismo. Concordo em parte, pois a revolução americana do século XVIII foi de fato um marco histórico importante na consolidação dos valores iluministas de propriedade privada, democracia política e liberdade individual. Tanto que é uma referência para todos os países, ainda hoje. Já a revolução cubana foi uma das maiores farsas já ocorridas em toda a História, um movimento que nasceu democrático e descambou numa tirania comunista, que só se arrasta hoje em dia porque conta com a simpatia e cumplicidade de governos como o de Lula da Silva. Também já escrevi extensivamente sobre isso, como você pode verificar em meu texto "O Trambique do Século", do ano passado (clique aqui: http://gustavo-livrexpressao.blogspot.com/2007/06/o-trambique-do-sculo.html).

5. Sobre o embargo - felizmente, você não chama de "bloqueio", o que mostra que não se deixou contaminar totalmente pela propaganda castrista -, não acho que temos grandes diferenças de opinião. De fato, o Coma Andante utiliza o embargo como arma propagandística, culpando os EUA pela falência do regime. Mas é preciso ter em mente que, se o embargo continua, não é somente por causa do Bush ou da Casa Branca, ou de alguma terrível cabala ou conspiração imperialista, mas porque há 2 milhões de exilados cubanos nos EUA - quase 15% da população da ilha, um recorde mundial -, que não têm razão alguma para desejar um afrouxamento da posição norte-americana em relação à ditadura na ilha. Só para fazer um paralelo histórico: o regime racista da África do Sul foi durante anos submetido a um implacável embargo por vários países do mundo, e isso teve um efeito importante para apressar o fim do apartheid. Se eu fosse cubano, certamente estaria pensando nisso.
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6. Com relação à questão dos Direitos Humanos em Cuba, sinto dizer, Pablo, mas acho que aqui você confirmou o que eu já havia dito antes, sobre o quanto a propaganda castrista está arraigada em nossas mentes. Sim, Guantánamo é uma mancha na história dos EUA - mesmo sabendo-se que não se tem notícia, não que eu saiba, de nenhum prisioneiro árabe ou afegão que tenha sido morto sob tortura na base americana, e que todos os que estão presos lá são pelo menos acusados de terrorismo, o que não é o caso nas prisões políticas cubanas. Mas a questão não é essa. Aqui não vejo como responder melhor seu comentário senão citando a mim mesmo. No caso, um trecho de meu texto "Fidel, o americanófilo", publicado aqui alguns dias atrás. Não é meu costume fazer isso, mas vamos lá (segue em azul):
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A dependência castrista dos EUA revela-se em praticamente toda ação, toda iniciativa do regime cubano. A lógica do confronto, do enfrentamento, foi o caminho escolhido por ele, Fidel, e agora repetido por seu pupilo Hugo Chávez, para se estabelecer e se eternizar no poder. Afinal, a invenção do inimigo externo, para um ditador, é algo essencial. Com base nesse discurso, ele pode aparecer como "defensor da pátria" e, ao mesmo tempo, meter na cadeia todos aqueles que possam constituir um obstáculo à ditadura, juntando a paranóia à ânsia pelo poder. É provável que, se os EUA não tivessem patrocinado a tentativa de invasão da Baía dos Porcos, em 1961, e a CIA não tivesse tentado matá-lo 636 vezes nos anos 60, ele teria forjado a invasão e os atentados apenas para ter a quem culpar por seus desmandos.

Assim, sempre que é defrontado com o imperativo moral de acabar com a censura e permitir eleições livres e plurais, o tirano trata imediatamente de condicionar qualquer abertura na ilha-prisão à medida semelhante nos EUA. Alguém pediu liberdade na ilha para os presos políticos? Os EUA devem libertar os "cinco heróis" detidos há alguns anos nos EUA por espionagem. Falou-se em liberdade de imprensa em Cuba? A imprensa norte-americana é dominada por uma "ditadura do dinheiro". Defendem a realização de eleições livres e plurais? Os EUA são uma democracia "de fachada". Fim das violações aos direitos humanos e das perseguições aos dissidentes políticos? Fechem a base militar de Guantánamo, gritam os castristas (enquanto isso, há umas duzentas Guantánamos em Cuba, mas ninguém liga). E assim por diante.

Entendeu a manipulação? Percebeu o tamanho da fraude? Fidel se aproveita que os EUA estão em guerra e mantêm prisioneiros ao arrepio da lei internacional em Guantánamo para desviar a atenção dos horrores de sua ilha-prisão. Não conheço canalhice maior do que essa. Pela mesma lógica, a ditadura hitlerista poderia arvorar-se em defensora dos direitos humanos, porque os EUA meteram milhares de nipo-descendentes em campos de concentração durante a Segunda Guerra Mundial. Assim como outros ditadores, Fidel se utiliza dos podres dos EUA, reais ou não, para justificar sua tirania. O trágico é que tanta "gente boa" se deixe levar por essa enganação, ocupando-se em criticar os EUA e caindo no "blame America first". É curioso como ninguém se lembrou de fazer esse tipo de coisa quando se tratava de condenar as ditaduras militares latino-americanas, inclusive no Brasil. Deve ser porque aquelas eram ditaduras de direita, logo "do mal", não eram de esquerda como a de Fidel, portanto não eram ditaduras "do bem"... Por que defender a democracia, no caso do Chile de Pinochet ou no dos milicos brasileiros, era um imperativo moral, e fazer o mesmo no caso de Cuba é "extremismo de direita"? Gostaria que você, ou alguém, me explicasse a lógica disso.

É um erro acreditar que se declarar "isento" ou "imparcial" significa, necessariamente, não tomar posição sobre um assunto. Quanto a isso, também já escrevi bastante aqui (creio que meu texto sobre a Eliane Cantanhêde demonstra isso claramente). Muitas vezes, "não ter lado" significa apenas compactuar com um lado, o lado do poder. Um filme que eu vi há algum tempo, No Man's Land (Terra de Ninguém), tem uma frase que eu considero perfeita: "Não se pode ser neutro diante da morte. Não fazer nada já é tomar uma posição". A meu ver, é exatamente este o caso de Cuba e da ditadura de Fidel Castro. O importante, aqui, é não se prestar ao papel de inocente útil de um tirano.

Creio que, nessa questão de Cuba, a esquerda, ao recusar-se a tomar partido pelos direitos humanos e pela democracia na ilha, está perdendo uma oportunidade de ouro para redimir-se por seus pecados. Poderia, finalmente, sacudir a poeira de um dos mitos mais longevos que se conhece, assim como se fez, no passado, com o mito stalinista. Poderia, enfim, provar de uma vez por todas que, quando fala em democracia, está falando a sério, e não apenas porque ela é útil para a realização de seu projeto político de poder. Isso seria uma demonstração de sinceridade intelectual, e um benefício inestimável à humanidade. Ou será que vamos ter que esperar mais quarenta anos para que se descubra, finalmente, que Cuba é uma ditadura totalitária e Fidel Castro, um ditador?

É isso, Pablo. Desculpe se me alonguei demais. Dizem que blog é para textos curtos. Mas tem coisas que exigem uma reflexão mais profunda. Às vezes o óbvio é o mais difícil de se admitir. Quando você publicar seu texto no JH comentando meu comentário, pode me citar à vontade. Adianto até um perfil meu que você pode aproveitar: Gustavo, ex-comunista, ex-marxista, ex-revolucionário. Atualmente, um reacionário, um conservador e direitista. Inimigo ferrenho de qualquer ditadura - de esquerda ou de direita - e defensor da liberdade. Acredita na diferença entre bem e mal. E não aceita compactuar com tiranias.
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Um abraço!

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P.S.: Aí vai um trecho do livro do escritor cubano Reinaldo Arenas, "Antes que anoiteça" (Record, páginas 14-15). Arenas, que faleceu em 1990, fugiu de Cuba junto com milhares de pessoas, no episódio conhecido como "êxodo de Mariel", e era um freqüentador habitual dos calabouços da ditadura cubana, além de ter toda sua obra censurada em Cuba, pois cometeu o terrível crime contra-revolucionário de ser... homossexual (!). Ele conheceu de perto o que é o paraíso socialista do Caribe e, por isso mesmo, não se dava ao luxo de uma atitude "fria" e "neutra" diante do regime de Fidel Castro:

"Algum dia, finalmente, o povo derrubará Castro e a primeira coisa que deverá ser cumprida será acusar todos aqueles que colaboraram impunemente com o tirano. As pessoas que promovem um diálogo com Castro, sabendo (como todos sabem) que Castro não largará o poder de livre e espontânea vontade, pois necessita apenas de uma trégua e de ajuda econômica para se fortalecer, são tão culpadas quanto os carrascos que torturam e assassinam o povo, talvez até mais; de fato, em Cuba vive-se num clima de absoluto terror, mas no exterior pode-se optar por uma certa dignidade política. Todos esses figurões que sonham em aparecer nas telas de televisão de mãos dadas com Fidel Castro, tornando-se assim figuras políticas relevantes, devem ter sonhos mais realistas: devem sonhar com uma corda na qual ficarão pendurados no parque Central de Havana, pois o povo de Cuba, com toda a sua generosidade, ao chegar o momento da verdade, irá enforcá-los. É assim que vão morrer e, pelo menos em relação a eles, não terá havido nenhum derramamento de sangue. Talvez esse ato de justiça sirva de exemplo para o futuro, pois Cuba é um país que produz canalhas, marginais, demagogos e covardes, numa relação desproporcional à sua população."

quarta-feira, fevereiro 27, 2008

É PRECISO ENTERRAR O MITO CASTRISTA

Estou sendo particularmente prolixo em relação à "renúncia" do tirano Fidel Castro. Peço que me perdoem por essa minha fixação em um único assunto. Sei que parece obsessão de minha parte, e que isso cansa. Mas a cada dia aparece um motivo a mais para falar - mal - desse mitômano, assim como da distopia que ele impôs à sua ilha da fantasia, e que hipnotizou gerações inteiras de perfeitos idiotas latino-americanos. E não estou me referindo somente a mentes esclerosadas como Frei Betto e Oscar Niemeyer. Muita "gente boa" também se deixou e continua a se deixar enganar pelo farsante do Caribe. Além disso, acho que tenho direito a algumas obsessões.

Acabo de ler, por exemplo, um texto de um conhecido meu, dos tempos da faculdade, o Pablo Capistrano, publicado no Jornal de Hoje, de minha cidade, Natal-RN, de 23/02. O texto, bem escrito como tudo o mais que ele produz, não pode ser considerado exatamente uma apologia da ditadura castrista, nem uma crítica. A meu ver, ele exemplifica uma visão que se tornou corrente em muitas análises e reportagens, que parecem estar pisando em ovos quando tratam da ditadura cubana e de seus crimes. O autor - espero que ele não se chateie comigo por citar seu nome neste blog, mas isso é internet - busca a todo momento uma atitude "equilibrada" diante do fenômeno Fidel, longe do que chama de "trivialidades ideológicas que embotam uma visão mais transparente do papel da revolução cubana no cenário da política latino americana". Já escrevi neste blog que não acredito na possibilidade de ter uma atitude "equilibrada" e "isenta" diante de tiranos homicidas como Fidel Castro. Assim como não sei a que trivialidades ideológicas o autor se refere. Sei apenas que, se está se referindo aos 17 mil fuzilamentos e 78 mil afogados tentando fugir da ilha desde 1959, é forçoso admitir que isso constitui bem mais do que uma mera trivialidade.

O autor critica, com muita propriedade aliás, o embargo econômico dos EUA à ilha como "o maior aliado da Cuba socialista", responsável pela criação do "espectro do inimigo gigantesco, do império poderoso e continental, um Golias feito de dólares, tecnologia e petróleo, que pairava sobre a atrevida ilha de Fidel, que fortalecia o discurso do regime e ajudava a manter acesa a chama da revolução." Quanto a isso, estou de total acordo com Pablo Capistrano. O mito do Davi cubano enfrentando o Golias imperialista norte-americano, ao mesmo tempo em que atrelava a economia do país ao Golias de pés de barro soviético, é devido, em boa medida, a alguns erros da Casa Branca em relação a Cuba, e à forma extremamente malandra como Fidel Castro se aproveitou desses erros para mandar milhares para o paredón e consolidar sua ditadura. O problema é o que é afirmado em seguida: "De certo modo, era conveniente para o regime norte americano que Fidel permanecesse no poder (talvez na época da guerra fria, não, mas depois que a URSS caiu, qual o motivo para manter Cuba sob cerco? )". Concordando-se ou não com a manutenção do embargo à ilha (já cheguei a achar que era um erro, mas agora tenho minhas dúvidas a respeito), deve-se dizer que há, sim, motivo de sobra para manter Cuba sob cerco depois do fim da URSS. Pelo menos 2 milhões de motivos - o número aproximado de cubanos que fugiram da ilha-prisão desde que Fidel e seus barbudos tomaram o poder, em 1959. São esses, os chamados gusanos ("vermes", em espanhol), que pressionam o governo norte-americano para manter o embargo comercial à ilha. É gente que perdeu tudo com o regime de Fidel, muitos tiveram parentes e amigos presos e fuzilados, e sonham com o dia em que vão poder retornar à ilha em que nasceram e desfrutar de seu país em liberdade. Gente como, por exemplo, os três músicos que fugiram no final do ano passado quando em turnê em Olinda, ou os dois pugilistas que aproveitaram a vinda para os Jogos Pan-Americanos para tentar escapar para a liberdade, mas foram capturados como escravos fujões e devolvidos a seu feitor Fidel Castro pelo governo do capitão-do-mato Lula da Silva. Se eu fosse um desses cubanos desesperados, não sei se seria a favor do fim do embargo econômico a essa ditadura, ainda mais porque a dita-cuja mantém relações comerciais normais com a maioria dos países do mundo, e inclusive, de forma indireta, com os EUA, mediante os milhões enviados todo ano à ilha pelos exilados de Miami, e isso não fez a ilha avançar um milímetro em direção à democracia. Muito pelo contrário.
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"Se é espantoso que Cuba tenha permanecido sem contato oficial com a maior economia do mundo, e ainda assim tenha conseguido grandes avanços sociais, mesmo durante o colapso que arrasou a infra-estrutura da Ilha entre 1989 e 1993, mais espantoso ainda é entender como muitos jornalistas e comentaristas políticos não conseguiram entender ainda a ligação estreita que unia o regime norte americano e a revolução castrista."

A relação estreita entre os EUA e a revolução castrista, seja lá o que isso seja, é algo claro e inegável. Como claro e inegável é o fato de que a tese, amplamente difundida, de que Cuba se voltou para o lado da ex-URSS e do comunismo porque foi a isso empurrada pela política hostil e desastrada dos EUA é uma das maiores mentiras que já surgiram em todos os tempos (não sei se é isso que o autor quer dizer; espero que não). Como mentirosa é a idéia, também repetida ad nauseam, de que Cuba se tornou uma espécie de éden da saúde e da educação após a subida de Fidel ao poder (novamente, espero que não seja a isso que o autor se refere, quando fala em "grandes avanços sociais" supostamente alcançados pela ditadura cubana). Pelo contrário: Cuba era, e isso já escrevi antes, um dos países mais prósperos e desenvolvidos das Américas até os anos 50, inclusive na área social. Tinha, então, a 3a renda per capita da América Latina. Hoje, está em 29. lugar, na frente apenas do Haiti.

"Ao sustentar um embargo contra Cuba com o velho e manjado argumento dos Direitos Humanos (usado quando é politicamente conveniente) os governos norte americanos davam a Fidel força para continuar mobilizando as massas na sua ilha."

É impressionante como a propaganda castrista é eficiente. Mesmo quando acreditamos que não estamos fazendo o jogo de Fidel, acabamos reproduzindo, sem saber, suas mentiras e manipulações. Vejam a questão dos direitos humanos. A tirania castrista tem sempre pronta a resposta quando é cobrada pelos fuzilamentos e prisões de dissidentes: "Olhem os EUA" etc., etc. Desse modo, alegam - e muitos entre nós assinam embaixo - que o argumento dos direitos humanos, quando usado pelos EUA, não passa de uma conveniênia política. Não nos damos conta de que o mesmo poderia ser dito pelos defensores de ditaduras de direita em relação a seus acusadores, isto é, que estariam agindo de acordo com as conveniências da URSS etc., etc. É estranho, para dizer o mínimo, que não se veja ninguém dizendo que os defensores da anistia e das Diretas Já no Brasil nos anos 70 e 80 eram um bando de agentes de Moscou (e olha que muitos eram mesmo). Mas quando se trata dos exilados e dissidentes cubanos pedindo democracia e eleições livres na ilha-cárcere, ah!, são todos lacaios do imperialiamo ianque e mercenários a soldo da CIA... E ainda há quem queira criticar os "double standards" dos EUA nessa questão.

"Erra quem pensa que o líder cubano é uma figura simples, perpassada de uma rudimentar unidade ontológica que o liga apenas a imagem do ditador sanguinolento que os analistas do cordão da CNN costumam a passar. O ditador Fidel é uma de suas imagens. Há a do líder carismático, messiânico; a do revolucionário romântico, a do político pragmático e frio, do nacionalista arraigado a uma idéia de "cubanidade" que se uniu de forma intrínseca a idéia de revolução, com a sua figura pessoal. Há Fidel para todos os gostos e antes que o tempo construa seu julgado sobre o legado do velho líder, muitas imagens ainda vão aparecer, para banhar os sonhos, ódios e utopias dos homens."

Que Fidel Castro é uma figura-chave da História latino-americana no século XX, e que não se pode analisar a trajetória do continente sem levá-lo em conta, é um fato, não há o que se discutir. Ele é, sem dúvida, uma personagem histórica da mais alta importância, goste-se ou não dele. Exatamente como foram grandes figuras históricas Hitler, Stálin, Mao Tsé-Tung e o Aiatolá Khomeini. No entanto, não vejo ninguém - pelo menos ninguém em seu juízo perfeito - tentando de algum modo relativizar os crimes monstruosos que esses senhores cometeram, enaltecendo o "bom legado" que eles deixaram para a posteridade. Não vejo ninguém, por exemplo, dizer que há Hitlers e Stálins, assim como Francos e Pinochets, "para todos os gostos". Fidel Castro é um tirano e assassino. Isso não é uma questão de "imagem". É um fato. Eu me recuso a cultivar essa posição ambígua em relação ao ditador cubano e a seu regime criminoso.

Não é preciso ser nenhum americanófilo fanático ou pertencer ao cordão da Fox News e da CNN para perceber que Fidel Castro é um dos tiranos mais sanguinários que já pisaram sobre a terra, cujo nome merece figurar na lista dos maiores farsantes e enganadores da História. Basta um pouco de bom senso e honestidade intelectual. Se não acreditam em mim, é suficiente dar uma olhada nos números da repressão em Cuba desde 1959, fartamente documentados, e tentem refutá-los, se puderem. Se o mal provocado por Fidel Castro se restringisse ao que ele fez com a ilha de Cuba nesses últimos 49 anos, já seria algo terrível o suficiente. Mas a dimensão da tragédia castrista vai muito além do espaço territorial da ilha do Caribe e de seus 11 milhões de habitantes. Durante quase meio século, o tirano cubano e seus apoiadores trataram de construir uma lenda revolucionária que embotou os cérebros de milhares, senão milhões de pessoas em todo o mundo, especialmente na América Latina. Esse mito foi responsável pelas maiores calamidades políticas na história do continente nas últimas cinco décadas. Inclusive no Brasil, onde o golpe de 1964 foi desfechado sob a justificativa de impedir a "cubanização" do País - justificativa que, com as informações de que dispomos hoje em dia, está bem longe de ter sido um mero pretexto ou pura paranóia dos milicos.

A lenda castrista, infelizmente, não chegará ao fim com a morte de Fidel Castro. Morto este, é preciso matar o mito criado em torno de sua figura. A exemplo de outras ideologias totalitárias, como o nazismo e o stalinismo, o castrismo sobreviverá, ainda por algum tempo, ao desaparecimento de seu criador. Assim como aconteceu com outro mito que está diretamente ligado a Fidel, o de Che Guevara, a lenda criada em torno de sua personalidade persistirá por muito tempo ainda após sua morte física, pelo menos enquanto houver gente disposta a se deixar enganar. Quando soube da "renúncia" fictícia do "Coma Andante", seu amigo Lula da Silva declarou aos jornalistas que Fidel era o "único mito vivo" da atualidade. Pela primeira vez vou concordar com algo que o Apedeuta disse. De fato, Fidel é um mito vivo, mas não pelas razões que acha Lula. Fidel Castro não foi somente um tirano assassino, responsável pela destruição física e moral de seu país: é um farsante, um grande trapaceiro e mentiroso. Enfim, um mito político, que precisa ser extirpado, assim como o foram os mitos Stálin e Mao Tsé-Tung e um dia será Lula.

Não tenho o costume de citar a mim mesmo, mas não me vem à mente agora maneira melhor de terminar esse texto senão repetindo o que escrevi aqui em outro artigo. Creio que a frase seguinte resume o que penso sobre o discurso do "legado ambíguo" da ditadura cubana e de Fidel Castro:

"Tem gente que acha possível ficar neutro diante do crime e da mentira. Tem gente que prefere esconder-se detrás de um véu de ambigüidade. Tem gente que acha impossível distinguir entre o certo e o errado, a verdade e a mentira, o bem e o mal. Eu, não."

terça-feira, fevereiro 26, 2008

FIDEL, O AMERICANÓFILO


Na foto, o carniceiro-mor e terrorista heróico Che Guevara apreciando um pouco o gosto do imperialismo ianque: antiamericanismo para brasileiro ver
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Em sua última "Reflexão" publicada em seu jornal oficial Granma, o Coma Andante e mentiroso profissional Fidel Castro, que mais uma vez conseguiu enganar a todos com sua renúncia de mentirinha (continua no controle do Partido Comunista, que detém o verdadeiro poder em Cuba), escreveu o seguinte:
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"Eles [os EUA] falam em mudança. Mudança, mudança, mudança. Concordo que é preciso haver mudança. Mas nos Estados Unidos."

A frase é importante. Leiam-na de novo. Mais uma vez. Memorizem-na. Seu significado pode ser traduzido da seguinte maneira: "Nós, cubanos, somos um povo soberano. Tão soberano que, se quisermos ter democracia um dia, dependemos dos EUA. Podem tirar o cavalo da chuva: enquanto a camarilha castrista estiver no poder em Cuba, quem manda nos destinos da ilha não são os cubanos; é o Departamento de Estado, é Rice, é Bush."

Perceberam o paradoxo? Fidel Castro, o líder do antiimperialismo na América Latina (como disse Oscar Niemeyer), o herói da luta contra a opressão e a arrogância imperial norte-americana, é um ardente seguidor do imperialismo ianque. Isso mesmo. Você leu certo. Fidel é um agente da Casa Branca, um americanófilo, um lacaio de Wall Street.

Onde isso mais se verifica é na forma como o tirano caribenho manipula a questão do "bloqueio" norte-americano à ilha (na verdade, um embargo). Há mais de 40 anos Fidel repete sem cessar que o tal "bloqueio" é a causa de todos os males de Cuba, da falta de sabão em pó até o caráter ditatorial do regime. Tal "bloqueio", como já disse antes, é uma farsa, uma ilusão, pois Cuba mantém relações comerciais normais com a maior parte dos países do mundo, e inclusive com os EUA, que enviam US$ 1 bilhão à ilha todo ano por meio dos exilados anticastristas. Mas isso não importa para os apoiadores do ditador. O "bloqueio" é um bode expiatório, o álibi perfeito. Se o ambargo não existisse, Fidel o faria existir.

Mas e os slogans do regime? E os quase cinqüenta anos de propaganda oficial cubana? E os discursos longuíssimos do "líder máximo" esbravejando contra o "bloqueio" dos EUA à ilha? Encenação, pura encenação. Farsa para inglês - ou brasileiro - ver. Fidel Castro é tão antiamericano quanto foi, um dia, anti-soviético ou anti-torcida do Fluminense. Trocando em miúdos: o antiamericanismo, em seu regime farsesco, não passa de um instrumento ideológico da ditadura, uma forma de garantir seu controle absoluto sobre a população.

A dependência castrista dos EUA revela-se em praticamente toda ação, toda iniciativa do regime cubano. A lógica do confronto, do enfrentamento, foi o caminho escolhido por ele, Fidel, e agora repetido por seu pupilo Hugo Chávez, para se estabelecer e se eternizar no poder. Afinal, a invenção do inimigo externo, para um ditador, é algo essencial. Com base nesse discurso, ele pode aparecer como "defensor da pátria" e, ao mesmo tempo, meter na cadeia todos aqueles que possam constituir um obstáculo à ditadura, juntando a paranóia à ânsia pelo poder. É provável que, se os EUA não tivessem patrocinado a tentativa de invasão da Baía dos Porcos, em 1961, e a CIA não tivesse tentado matá-lo 636 vezes nos anos 60, ele teria forjado a invasão e os atentados apenas para ter a quem culpar por seus desmandos.

Assim, sempre que é defrontado com o imperativo moral de acabar com a censura e permitir eleições livres e plurais, o tirano trata imediatamente de condicionar qualquer abertura na ilha-prisão à medida semelhante nos EUA. Alguém pediu liberdade na ilha para os presos políticos? Os EUA devem libertar os "cinco heróis" detidos há alguns anos nos EUA por espionagem. Falou-se em liberdade de imprensa em Cuba? A imprensa norte-americana é dominada por uma "ditadura do dinheiro". Defendem a realização de eleições livres e plurais? Os EUA são uma democracia "de fachada". Fim das violações aos direitos humanos e das perseguições aos dissidentes políticos? Fechem a base militar de Guantánamo, gritam os castristas (enquanto isso, há umas duzentas Guantánamos em Cuba, mas ninguém liga). E assim por diante.

Mas Cuba não é um país soberano? Aí é que está. Em todas as suas declarações, o ditador faz questão de reafirmar a soberania de sua ilha-cárcere. Diz que o país tem orgulho de sua Revolução, que não se renderá jamais etc., etc. Um verdadeiro cabra-macho, esse Fidel. Mas, na verdade, é tudo jogo de cena, é tudo falso. A principal característica da soberania é a possibilidade de um país decidir livremente sobre seu destino. Se Cuba fosse realmente um país soberano, não dependeria do que ocorre em Washington para decidir seu futuro. Se fosse realmente independente, não condicionaria qualquer mudança na ilha a nenhuma mudança nos EUA. Não faria esse tipo de chantagem, procurando politizar a questão. Mais importante que isso, se Cuba fosse realmente um país soberano, seu povo não estaria manietado por um tirano que se eterniza no poder há 49 anos. Ao mesmo tempo em que, em seu discurso, brada sua soberania diante do "império", Fidel a nega, subordinando qualquer passo que venha a dar na ilha à decisão da Casa Branca.

Muitos ainda acreditam que foram os EUA que, com sua política hostil e desastrada, empurraram Cuba para o lado do comunismo e da ex-URSS. Já falei aqui que isso é um mito, entre os muitos mitos e falsidades alimentados pela ditadura castrista. Agora, no ocaso de seu poder e de sua vida, o tirano se aproveita de mais essa mentira para tentar vender a idéia de que Cuba hoje só não é uma democracia porque os EUA não querem, porque os EUA não deixam. Não caiam nessa. Cuba só é uma ditadura, e continuará a ser uma ditadura, por única e exclusiva vontade de Fidel Castro - com uma mãozinha, claro, de seus inúmeros amigos, como Chávez e Lula.

Fidel deve tudo aos EUA. Inclusive o poder. Quando estava em Sierra Maestra, contou com o apoio mais ou menos velado da CIA e do Departamento de Estado, que desconfiavam do ditador Fulgencio Batista e viam o jovem líder guerrilheiro barbudo como uma alternativa democrática para a ilha. Um correspondente do The New York Times, Herbert L. Matthews, subiu a serra para encontrar-se com Fidel, então dado como morto após o desembarque do Granma, e voltou alardeando que o guerrilheiro era um líder democrata e não-comunista. Quando as forças rebeldes entraram em Havana, em janeiro de 1959, contavam com o apoio e a simpatia não só da população cubana, mas da opinião pública norte-americana, que, trabalhada pelas reportagens de Matthews, via Fidel como um herói romântico e dirigente democrático. Logo veriam quão democrático ele era, com os milhares de fuzilamentos e a anulação de todas as liberdades na ilha, que então se transformaria num Estado marxista sustentado pela URSS.

Os auto-proclamados antiamericanismo e antiimperialismo de Fidel são tão falsos e oportunistas quanto suas arengas por "mudança" nos EUA. Muita gente acredita que, após a "renúncia" fajuta do tirano, o caminho estaria aberto para que Hillary ou Obama, se eleitos, finalmente iniciem algum tipo de diálogo com Cuba, e que isso levaria à restauração da democracia na ilha. Tola ilusão. Se houvesse uma revolução nos EUA e o país se tornasse, hipoteticamente, uma república comunista, o Coma Andante daria um jeito de continuar a espinafrá-lo, apenas para desviar a atenção do que ocorre em sua ilha particular, transformada em verdadeira prisão para seus habitantes, há quase meio século. O curioso é que Fidel sempre foi um ardente admirador dos EUA. Seu primeiro contato com a política foi aos 13 anos de idade, quando enviou uma carta, em inglês cheio de erros, ao presidente Franklin Roosevelt, dos EUA, na qual pedia que este lhe enviasse uma nota de 10 dólares (já se antevia aí o futuro espertalhão). Na juventude, era um astro do beisebol, seu esporte favorito. Lia Hemingway. Adorava Coca-Cola e filmes de faroeste. Que tanta gente ainda se deixe levar por sua lábia é algo que desafia a compreensão humana.

Não é só Fidel que é dependente, política e psicologicamente, dos EUA. Os bocós esquerdóides que o idolatram, os Chicos Buarques e Luís Fernandos Veríssimos, também são. Assim como o ditador cubano, eles são fascinados pelo país do Mickey Mouse. E, assim como ele, falta-lhes um mínimo de honestidade intelectual para que o confessem.

CUBA NÃO ERA CASSINO, LULA

Notícia desta terça-feira, 26 de fevereiro, retirada do portal Terra. Meus comentários estão em preto.
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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse em Buenos Aires que a América do Sul precisa ajudar Cuba a se desenvolver nesta nova etapa pós-Fidel Castro, para que a ilha não volte aos tempos em que era "um cassino".
Vocês viram? De acordo com o Apedeuta, que é tão versado em história de Cuba quanto em língua portuguesa, a ilha era, antes de Fidel, "um cassino". Deve ter-se baseado em "O Poderoso Chefão 2" para dizer tamanha asneira. Primeiro, Cuba não era cassino coisíssima nenhuma. A capital, Havana, tinha sim muitos cassinos e cabarés, assim como o Rio de Janeiro nos anos 40, antes da proibição do jogo pelo Dutra. Mas isso não se estendia de maneira alguma à toda a ilha. Sem falar que o significado que se quis imprimir à palavra "cassino" - um lugar de jogatina e perdição, um paraíso da máfia e do turismo sexual, como se Cuba fosse "um bordel dos ianques" - esconde o fato de que a ilha, antes de Fidel ("nos tempos em que era um cassino", segundo Lula), tinha um dos melhores níveis de vida da América Latina. Ao contrário de hoje em dia: sob a gerontocracia cubana, a ilha transformou-se numa mistura de bordel para os turistas endinheirados e prisão para seu povo.

Em entrevista transmitida na segunda pela TV argentina, o presidente afirmou que na ocasião teve a impressão de que Fidel, que já estava afastado desde julho de 2006, continuava "lúcido politicamente".
Fidel, "lúcido politicamente"? Esse Lula é mesmo do balacobaco. A não ser que se considere um tirano assassino que se recusa a devolver o poder ao povo como "lúcido politicamente". A não ser que se considere lucidez política o apego desmesurado ao poder, a intolerância com dissidentes, a mitomania exagerada e o culto da personalidade. Nesses quesitos, o Apedeuta pode dizer que o Coma Andante é tão lúcido quanto a múmia esclerosada Oscar Niemeyer.

"Todos nós na América do Sul precisamos contribuir para que Cuba não volte a ser um cassino. Precisamos contribuir para que se aproveite todo o seu potencial intelectual, o potencial educativo do seu povo, e se transforme em um país mais próspero, mais desenvolvido", afirmou Lula ao canal de notícias TN.
Mais uma vez, Lula diz o seguinte: todos nós precisamos contribuir para evitar que Cuba volte a ter a 3. renda per capita da América Latina (hoje tem a 29a, inferior apenas a do Haiti), eleições livres, imprensa independente e sem censura. Precisamos contribuir para que a ilha não volte a ser o país que era antes de Fidel Castro ter-se apossado do poder, prometendo democracia e instaurando, em lugar desta, uma ditadura comunista que lançou um país antes próspero na mais completa indigência e desespero. Enfim, diz Lula, é preciso impedir que Cuba volte a ser uma democracia próspera, e continue a ser uma ditadura falida.
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"Estou convencido de que Cuba não voltará a ser o que era nos tempos de Fulgencio Batista. Cuba é um povo muito orgulhoso, extraordinariamente politizado, um povo com a formação adequada, e acho que vai se sair bem desta", acrescentou Lula.
E eu "estou convencido de que" Lula sabe tanto sobre o que era Cuba nos tempos pré-Fidel Castro quanto minha avó sabe sobre física quântica. Do contrário, ele saberia que o país era, antes de 1959, um dos mais prósperos e produtivos do continente americano, com níveis de desenvolvimento superiores, à época, aos da Espanha, sua antiga metrópole, e equivalentes à da Itália. Hoje, Cuba é uma sombra do que já foi um dia, uma ditadura totalitária que mantém um povo acorrentado à base de libreta de racionamento. Mesmo povo que Lula acredita ser "extraordinariamente politizado" e que teve "uma formação adequada", como se doutrinação ideológica obrigatória (ou seja: lavagem cerebral) e falta de liberdade de pensamento fossem sinônimos de politização e de formação adequada... Lula, Lula, você me mata.

"Acho que é assim que vamos ajudar Cuba: sem nenhuma ingerência política, e sim com muita vontade de ajudar os cubanos a fazer o que precisam que seja feito", concluiu. Esse Lula é demais. Primeiro, corrobora a versão oficial castrista da História de Cuba pré-Fidel, e manifesta todo seu apoio e admiração ao tirano do Caribe. Depois, diz ser contra qualquer ingerência política... É, ele realmente sabe "fazer o que precisa que seja feito". Impressionante.

Se antes eu tinha certeza de que o Apedeuta era um completo ignorante em Gramática e em História do Brasil, agora me convenço de que é também um parvo em História de Cuba. Deve ser porque seu conhecimento sobre o assunto é retirado de alguma cartilha de Frei Betto ou Emir Sader. Nunca na história deste país tivemos um presidente tão ignorante, tão farsante e tão amigo de um ditador.

segunda-feira, fevereiro 25, 2008

Resposta ao leitor

Escreve um leitor, que assina como João, a respeito de meu último texto, "Fidel, o discurso isentista e a filosofia dos eunucos morais":

"Polêmico, com toda a certeza. Mas não me parece um "Inimigo da afetação de qualquer espécie, da arrogância, do esnobismo e de outras frescuras do tipo". A questão não é ser isento perante a questão do Fidel, mas a Veja nada mais é do que uma revista "afetada"; nada mais faz do que expor uma opinião com defesas fracas e sem base argumentativa. Liberdade de imprensa não é sinônimo de mediocridade de matéria."
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Comento:
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Caro João, você não leu errado. Sou, sim, um inimigo da afetação de qualquer espécie, da arrogância, do esnobismo e de outras frescuras do tipo. Continuarei a sê-lo. Esta é uma atitude minha em relação à vida, assim como o compromisso, que cedo me impus, com a verdade dos fatos. Quanto a isso, reafirmo o que está no meu perfil.

Pelo que eu entendi, você insinua que eu estaria em contradição com esse meu compromisso, quando diz que a Veja, que eu elogio em meu texto, é uma revista "afetada" (as aspas são suas), que nada mais faz senão "expor uma opinião com defesas fracas e sem base argumentativa". Concordo somente com a primeira parte de sua frase. Sim, a Veja é uma revista que tem opinião, e, ao contrário de nossa mídia "isentista" e "nenhumladista", não tem medo de expô-las. Discordo quando você diz que essas opiniões são "fracas" e "sem base argumentativa". Ao contrário do que você diz, no caso da "renúncia" do tiranossauro do Caribe a revista expôs suas opiniões de forma muito clara e com forte base de argumentação. Aliás, até agora não vi ninguém refutar nenhuma das afirmações da Veja sobre o ditador cubano e a tirania que ele impôs à sua ilha da fantasia. Não quer tentar fazer isso?
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Você diz que "liberdade de imprensa não é sinônimo de mediocridade de matéria". Novamente, sou obrigado a concordar apenas em parte, o que significa discordar em parte. Primeiro, porque, se você está se referindo à Veja, então tenho que discordar de sua opinião: de todas as revistas semanais de informação, a que mais se aproximou da verdade no caso de Cuba foi, sim, a revista dos Civita, como espero ter feito entender em meu texto. E segundo, porque, liberdade de imprensa, infelizmente, pode sim conviver com a mediocridade mais tacanha e o panfletarismo mais obtuso. Basta dar uma olhada no que faz a Carta Capital, por exemplo.

O que me irrita, João, é a desonestidade intelectual. Esta é, a meu ver, a pior forma de arrogância, o pior tipo de esnobismo. A Veja pode ser acusada de muita coisa, menos de esconder suas próprias opiniões por trás de um véu de "isentismo" e ambigüidade.
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Enfim, João, a questão É SE É POSSÍVEL SER "ISENTO" QUANTO À TIRANIA CASTRISTA. Afirmo que não. Afirmo que qualquer tentativa de relativizar o que acontece em Cuba, alegando neutralidade ou imparcialidade, é uma forma de compactuar com a ditadura. No caso da cobertura sobre a tirania castrista em Cuba, a Veja não fez isso. Optou pela honestidade intelectual, chamando pato de pato e cachorro de cachorro. Por isso merece meu aplauso.

FIDEL, O DISCURSO ISENTISTA E A FILOSOFIA DOS EUNUCOS MORAIS


Três das quatro principais revistas semanais brasileiras estampam em suas capas, nesta semana, o mesmo assunto: a "renúncia" do ditador Fidel Castro, após 49 anos no comando da ditadura comunista de Cuba. A Veja resume tudo na chamada: "Já Vai Tarde". A Época mantém o tom anódino e imparcial: "Depois de Fidel". Coerente com seu papel de porta-voz oficioso das esquerdas, a Carta Capital parece lamentar a saída do tirano: "Cuba sem Fidel". A Istoé preferiu falar de lipoaspiração.

As três capas sintetizam três posições da imprensa brasileira. Três atitudes diante de um ícone das esquerdas do século XX. Com exceção da Veja e outras publicações "de direita", a postura da mídia nacional ante o regime de Havana tem sido ou o alinhamento total (Carta Capital) ou a defesa da "neutralidade" (Época). Das três posições, o apoio incondicional e a "imparcialidade" denotam, apenas, canalhice ideológica ou desonestidade intelectual. Ponto para a Veja. Ponto para a verdade.

Não vou analisar aqui o ponto de vista de revistas como a Carta Capital ou a Caros Amigos - verdadeiros panfletos esquerdóides travestidos de jornalismo, comprometidos até a medula com a roubalheira dos petralhas. Não vou me sujar comentando esse lixo. Creio que as opiniões por elas emitidas sobre Fidel, terrorismo islâmico, o mensalão, o escândalo dos cartões corporativos, Chávez e Morales são por demais conhecidas e por demais pedestres para merecerem ser rebatidas. A própria realidade se encarrega disso, revelando o nível de degradação moral a que chegaram seus editores. Em vez disso, vou me concentrar na cobertura da chamada imprensa "neutra", ou "imparcial", sobre a saída de cena do tirano do Caribe.

A atitude "isentista" cultuada por parte da imprensa brasileira em relação à ditadura cubana não tem nada a ver com compromisso com a verdade. Muito pelo contrário. Trata-se de uma posição também ideológica, uma concessão inexplicável às esquerdas. No caso, uma posição ideológica meio envergonhada, de quem se acanha diante de fatos irrefutáveis e se empenha em defender o indefensável. Basta lembrar. Quase todas as reportagens ou artigos sobre Fidel Castro começavam com o mesmo bordão: "Para uns, um ditador; para outros, um benfeitor". Ou seja: lembrava-se da falta de liberdade em Cuba, dos fuzilamentos, das prisões de dissidentes, apenas para em seguida fazer a observação compensadora: sim, o regime é ditatorial, mas deixou um legado de conquistas sociais. Sim, o regime é assassino, mas deu saúde e educação ao povo. Como eu já comentei aqui, uma articulista da Folha de S. Paulo, jornal que se orgulha de sua posição "isenta" e "equilibrada", Eliane Cantanhêde, chegou a escrever que é preciso "preservar os ideais" do regime cubano. Em outras palavras: é preciso reconhecer, em nome da "isenção" e do "equilíbrio" jornalísticos, que o regime castrista tem lá suas qualidades. É uma ditadura, mas uma ditadura camarada, "boa", "do bem"...

Estranho discurso esse, o da "isenção" política. Digo estranho porque ele só costuma ser aplicado às ditaduras de esquerda. Esse tipo de filosofia de eunucos morais não costuma valer para ditaduras de direita, como a de Pinochet no Chile, que aliás já acabou faz tempo, ao contrário da de Cuba, que apenas mudou de mãos. Que jornalista "neutro" teria coragem de escrever que regimes como o dos generais chilenos ou os de Hitler e Mussolini deixaram um legado importante de avanços sociais e econômicos, dizendo que é necessário "preservar esses ideais"? Claro está que esse discurso ambíguo, quando aplicado à ditadura cubana, não se sustenta. Primeiramente, porque em nenhum lugar está escrito que renunciar à democracia é o preço a pagar por justiça social (fosse assim, a Costa Rica e o Chile de hoje, para não falar de países como a Suécia e a Dinamarca, seriam terríveis ditaduras). E, principalmente, porque os tão decantados "avanços sociais" da ditadura cubana não passam de uma farsa. Como sabe qualquer pessoa que estudou um pouco de história de Cuba, a situação econômica do país antes da chegada de Fidel Castro ao poder era das melhores na América Latina, inclusive na área social. Havia uma boa relação médico-pessoa na ilha antes de 1958, e o analfabetismo, que Fidel Castro diz ter sido de 50%, era na verdade de 22%, um dos menores índices nas Américas (o Brasil, para se ter uma idéia, tinha quase a metade da população analfabeta, no mesmo período). Nenhum desses alardeados avanços foi conquista da ditadura cubana. Pelo contrário: na saúde, por exemplo, que é o carro-chefe da propaganda cubana no exterior, o que se tem visto é o declínio das condições sanitárias da população e o aparecimento, nos anos 90, de doenças antes erradicadas, devido à deficiência no consumo de proteínas (os cubanos, com seu bom humor apesar de tudo, costumam dizer que, em Cuba, há três problemas: o café-da-manhã, o almoço e o jantar). Por sua vez, o sistema educacional cubano pode ser qualquer coisa, menos ideal: além de não se poder ler o que se quer por causa da censura governamental, os estudantes cubanos são obrigados a passar por verdadeiras sessões de doutrinação ideológica e lavagem cerebral (não admira, portanto, que os companheiros petistas queiram reproduzir por estas plagas o sistema cubano, com cartilhas marxistas ensinadas às crianças nas escolas). Pergunto: que "educação de qualidade" pode conviver com a censura e a impossibilidade de pensamento independente?

Mas onde a retórica "isentista" mostra toda sua parcialidade disfarçada a favor da ditadura castrista é quando se debruça sobre as causas da situação calamitosa da ilha-prisão. Em nove de cada dez análises ou artigos, culpa-se o embargo norte-americano (às vezes chamado, com boa ou má fé, de "bloqueio") pela situação de penúria e indigência do país. Desse modo, nossa imprensa "isenta" apenas reproduz o discurso oficial castrista, servindo de caixa de ressonância de suas mentiras, ao responsabilizar um fator externo, os EUA (sempre ele, claro), pelas mazelas produzidas pela própria incompetência do regime socialista. Em primeiro lugar, o embargo norte-americano não impede que a ilha comercie livremente com 179 países (dados do Ministério das Relações Exteriores de Cuba), nem que os EUA sejam hoje, embora por vias tortas, um de seus principais parceiros comerciais, com US$ 1 bilhão enviado anualmente pelos gusanos de Miami a seus parentes na ilha-cárcere - uma das principais fontes de renda do regime, ao lado do turismo e da exploração de níquel e petróleo. O racionamento de alimentos, uma das principais contribuições cubanas ao atraso secular da América Latina, data de 1962, em plena época das vacas gordas soviéticas. Durante mais de três décadas, de 1960 a 1991, Cuba foi sustentada por uma polpuda mesada da ex-URSS. Estima-se que a ilha tenha recebido em ajuda econômica de seus antigos patrocinadores soviéticos algo em torno de US$ 100 bilhões - dinheiro suficiente para alavancar a economia de qualquer país. E, no entanto, o que a ditadura de Fidel Castro deixou como legado? Um país arruinado, empobrecido e sem perspectivas.

Tudo que ditadores como Fidel Castro e seu irmão Raúl desejam não é a adesão incondicional dos formadores de opinião dos países democráticos a suas teses totalitárias: é a imparcialidade, ou "isenção" dos mesmos diante de seus crimes. Ao contar com esse tratamento diferenciado, os donos do poder em Havana poderão ficar sossegados, pois saberão que sempre haverá quem procure compactuar com a tirania. Ainda que Cuba fosse um paraíso da saúde e da educação (o que está bem longe de ser verdade), ainda que a ilha-presídio estivesse submetida a "um cruel bloqueio genocida do imperialismo" (o que também é falso), não haveria motivo algum para tamanha condescendência. É uma pena que revistas como Época e o governo do Brasil não enxerguem essa realidade.

Chamar o ditador e assassino em massa Fidel Castro de ditador e assassino em massa não é uma opinião. É um fato. Assim como chamar Hitler ou Stálin de tiranos e genocidas não é uma questão de ponto de vista, mas de respeito à verdade da História. Não pode haver neutralidade diante do crime e da mentira. Pedir "isenção" diante do estupro de um país inteiro, como o que ocorre em Cuba há 49 anos, não é deixar de tomar posição: é colocar-se ao lado do estuprador. Fidel já vai tarde. Ponto para a Veja.

sexta-feira, fevereiro 22, 2008

O BRASIL NÃO DEVE MAIS. APESAR DOS PETISTAS.

Deu nos jornais de hoje. O Banco Central anunciou que, pela primeira vez na História, o Brasil dispõe, em caixa, de mais dinheiro do que o necessário para pagar sua dívida externa. Daria para pagar a danada e ainda sobrariam uns 4 bilhões de dólares. De devedor, o Brasil é agora credor dos gringos.

A notícia é excelente. Finalmente nos livramos de um fantasma que assombrou gerações. A minha, por exemplo, que está na faixa dos trinta e poucos anos, cresceu ouvindo que a tal dívida era o maior entrave ao desenvolvimento do País. Acostumamo-nos a achar que ela era impagável. Lembro que, quando eu comecei a despertar para as coisas do mundo, lá pelos meados dos anos 80, havia poucas certezas na vida. Uma delas era que jamais veríamos o dia em que a dita dívida seria, enfim, coisa do passado. Era algo, se tanto, para os nossos netos ou bisnetos. Até que enfim nos livramos de um fardo. No entanto...

No entanto, "notícia boa demais a gente desconfia", como se diz em minha terra. No caso, não é a notícia em si, uma das melhores coisas que já aconteceram nos últimos tempos no Brasil, mas o que os atuais ocupantes do poder vão fazer com ela. Os lulo-petistas, claro, vão tentar capitalizar em cima da notícia. Vão dizer que o mérito é todo deles, que fizeram o dever de casa em economia. Lula vai aparecer na TV enchendo o peito, dizendo que "nunca na história defte paif" etc., etc. Não caiam nessa. É mais uma empulhação da quadrilha no poder.

O fim do problema da dívida externa não é uma vitória do governo Lula, nem dos lulo-petistas. É uma vitória da ortodoxia econômica. Quem tem memória lembra bem: os lulo-petistas sempre foram contra as políticas ortodoxas ("neoliberais") que permitiram o equilíbrio das contas públicas. Clamaram contra elas, quando estas começaram a ser aplicadas, durante o governo de seu rival FHC, treze anos atrás. Alegavam, demagogicamente, que tais políticas seriam "uma submissão aos ditames do FMI e do capital internacional". Uma vez no poder, porém, mudaram de discurso, mantendo a mesma política econômica que condenavam com tanto fervor na véspera. Sem confissão, nem arrependimento. Não por convicção, mas por puro oportunismo. Por pura demagogia.

O sucesso da política econômica de Mantega, Meirelles e cia. não se dá por causa dos petistas, mas apesar deles. Incapazes de apresentar coisa melhor do que a política de seus rivais tucanos, trataram de copiá-los. Não foram os lulo-petistas que criaram as condições para o sucesso dessa política ortodoxa. Apenas beneficiaram-se dela. Depois de terem tentado de todas as maneiras destruí-la, dela se apropriaram. Não podendo ter destruído a árvore em sua raiz, estão colhendo os seus frutos. O que chamam de sucesso é apenas a prova de sua desonestidade.

Assim como fizeram com a ética e com a democracia, os lulo-petistas aderiram à ortodoxia econômica por conveniência política, por oportunismo. Trata-se de uma adesão instrumental, e não filosófica. Se adotam uma linha econômica baseada em pré-requisitos como responsabilidade fiscal, metas de inflação e superávit primário, não é porque acreditam de fato nesses princípios, mas apenas porque os consideram um instrumento útil à conservação de seu poder. Este, sim, é o único compromisso dos lulo-petistas, sua única e real causa.

Nesse trabalho de enganar a todos, os lulo-petistas contaram também com uma boa dose de sorte. De fato, a sorte de Lula é impressionante. Durante seu governo, ele se beneficiou de uma maré extremamente favorável da economia mundial. Assim como Hugo Chávez, que se beneficia da alta dos preços do petróleo no mercado internacional para impor seu "socialismo do século XXI". Assim como seu colega venezuelano, Lula usa o capitalismo e a democracia para miná-los. E, assim como Chávez, ele não pode dizer que foi o criador dessa situação favorável.

Não há como negar também que as boas notícias na área econômica têm um lado negativo para os lulo-petistas. Até agora, por exemplo, não os vi comemorarem tanto assim a notícia de que o País é, enfim, dono de seu destino. Deve ser porque, com o problema da dívida enfim solucionado, não poderão mais botar a culpa pelos males do Brasil no FMI ou em outro agente externo. Não poderão mais defender a realização de um plebiscito em defesa do calote da dívida externa, como já fizeram antes. Terão que procurar outro bode expiatório. As elites ou a mídia golpista, quem sabe.

O que permite tamanha distorção da realidade pelos petralhas, além dos fatores citados, é uma boa dose de ingenuidade política por parte de seus críticos liberais. Estes tendem a absolutizar o papel da economia, acreditando que, basta o governo adotar uma linha ortodoxa, com resultados positivos, e provará ser um governo de gente madura e responsável. Não pode haver engano maior do que esse. O que esses senhores não entendem é que a economia não é um fim em si mesmo; é um meio para a conquista e manutenção do poder político. Se os petistas rezam, hoje, pela cartilha da ortodoxia liberal, isso não ocorre porque tenham se convertido ao credo da liberdade e da democracia, mas apenas porque esperam que tal política lhes garanta as bases materiais necessárias à implantação de um projeto totalitário de poder. Esse projeto pode muito bem conviver com uma política econômica capitalista, como demonstram os exemplos da China e do Vietnã. Na América Latina, seu principal instrumento de articulação estratégica é o Foro de São Paulo. Nele, o mesmo governo que é hoje louvado por seu "pragmatismo" e "responsabilidade" por muitos economistas cerra fileiras ao lado de ditadores como Fidel Castro e do narcotráfico internacional. Enquanto os banqueiros e financistas se mantiverem satisfeitos com os números da economia, não prestarão atenção a esse processo.

A História demonstra que encher os bolsos da burguesia é a melhor maneira de seus inimigos prepararem o golpe que a varrerá do mapa e lhes permitirá a conquista do poder. Foi assim na Rússia czarista, com a ajuda do Kaiser alemão a Lênin para derrubar o governo provisório de Kerensky. Foi assim na Alemanha, com parte da burguesia alemã apoiando os nazistas de Hitler. E é assim hoje, no Brasil, com o governo de Lula e dos petralhas. Enquanto esses burgueses estúpidos continuarem pensando com seus bolsos e suas barrigas, e não com suas cabeças, o triunfo definitivo dos inimigos da liberdade será só uma questão de tempo.

quarta-feira, fevereiro 20, 2008

MUNDO BIZARRO


Quando eu era criança, passava na TV um desenho animado do Super-Homem, no qual ele lutava com um seu alter-ego, chamado Bizarro. Bizarro era parecido com o Super-Homem, com a diferença de que fazia tudo ao contrário. Tinha, se não me engano, o "S" invertido no peito, inclusive. Se o Homem de Aço era o arquétipo do bom-moço, Bizarro era sua antítese. Era, digamos assim, um anti-Super-Homem, que usava seus superpoderes a serviço do mal. Bizarro habitava o planeta Bizarro, onde tudo acontecia às avessas do que se passava na Terra: os lixeiros se dedicavam a emporcalhar as ruas, em vez de limpá-las, e os policiais a soltar os criminosos, em vez de prendê-los. As leis existiam para punir as vítimas, e beneficiar os criminosos. Era uma espécie de Terra ao contrário, um espelho invertido. Um caos.
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Esta semana lembrei muito de Bizarro e de seu planeta. Quem me reacendeu essa lembrança proustiana de minha infância foi Lula. O Apedeuta deu mais uma contribuição à sua quase inesgotável lista de frases absurdas, ao dizer numa entrevista que espera que, após a renúncia de El Coma Andante Fidel Castro, os exilados cubanos em Miami não voltem ao pais para "criar uma situação de conflito" (não era bem isso que ele quis dizer, ele pensou um pouco antes de completar a frase). Em outras palavras, nosso Guia Genial formulou votos de que os 2 milhões de exilados desde que Fidel Castro tomou o poder, 49 anos atrás, não retornem a seu país, e que a sucessão em Cuba não resulte no fim da ditadura.

Lembrei-me quase imediatamente do desenho animado. Tal como o personagem Bizarro, Lula tem-se dedicado a defender, no caso de Cuba, tudo aquilo a que sempre disse se opor, e vice-versa. Lula, o líder democrata, o inimigo da ditadura militar, é hoje um dos defensores mais ardorosos de uma das ditaduras mais antigas do planeta. Lula, o ex-preso político no DOPS, o símbolo da luta pela anistia e pelas diretas-já, é um inimigo ferrenho da anistia e das eleições diretas em Cuba. Lula, o maior mito já criado pela imprensa livre brasileira, é um inimigo da liberdade de imprensa na ilha-presídio. Lula, o maior fenômeno das esquerdas brasileiras, surgido no mesmo ano da volta dos exilados brasileiros, é contra a volta dos exilados em Cuba. Lula é o Bizarro da política brasileira. Lula e os esquerdistas. Um bando de Bizarros, revirando latas de lixo e abrindo as portas das cadeias.

Mundo realmente bizarro esse das esquerdas, realmente estranho. Afinal, que esquerdista não uivaria de raiva e indignação ao ver alguém tripudiar dos exilados brasileiros, nos anos 70, dizendo que esperava que estes não voltassem ao país, pois poderiam "criar uma situação de conflito"? Quem, nas hostes de esquerda, não levantaria a voz para berrar contra atitude tão autoritária, de quem não deseja a volta da democracia e procura a todo custo evitar o retorno dos punidos pelo regime, para "evitar revanchismos"? Chico Buarque certamente escreveria uma música denunciando o autor de proposta tão indecente, tão nauseabunda e imoral, defendendo a volta do irmão do Henfil. O Pasquim publicaria páginas e páginas de sátira sobre o assunto, com certeza. E assim por diante.

O Planeta Bizarro dos nossos esquerdistas é Cuba. Tudo que eles sempre condenaram aqui com veemência - a repressão política, a prisão de dissidentes, as violações de direitos humanos, a pobreza generalizada -, lá eles defendem com igual fervor. Pense numa coisa, qualquer coisa, que os lulo-petistas sejam contra no Brasil, e eles serão a favor da mesma coisa em Cuba. Se aqui eles se dizem a favor da liberdade de expressão, e inclusive torram milhões numa TV estatal completamente inútil para, segundo dizem, "defender o direito do povo à informação", lá eles ignoram a falta de imprensa livre. Se aqui eles falam em democracia, lá falam em não deixar os exilados retornarem a seu país. Se aqui eles defendem os direitos dos cidadãos, lá fecham os olhos para a ausência de eleições livres e democráticas. E assim por diante.

O desenho animado me fascinava por causa da idéia de um mundo pelo avesso, de ponta-cabeça (ou de cabeça para baixo, como queiram), em que o claro se torna escuro, o certo se torna errado, o bem vira mal, e assim por diante. Na minha mente infantil, aquilo atraía pelo caráter absurdo, pela impossibilidade lógica. Hoje, percebo que tal realidade invertida não é tão impossível assim. Mundo bizarro, o das esquerdas.

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P.S.: Por falar em Chico Buarque, um dos mais conhecidos amigos e admiradores brasileiros do ditador renunciante, lembrei de uma música muita inspirada que ele compôs nos anos 70. O país era outro, o ditador era outro, mas quem pode dizer que a letra da canção não se ajusta perfeitamente a um certo país e a um certo tirano, para quem tanto ele quanto Lula batem palmas? Será que o Chico topa fazer um show nesse país, bancado pelo Ministério da Cultura de seu amigo Gilberto Gil? Vejam a letra e pensem a respeito:

Apesar De Você

Chico Buarque

Composição: Chico Buarque

(Crescendo) Amanhã vai ser outro día x 3

Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão, não.
A minha gente hoje anda
Falando de lado e olhando pro chão.Viu?
Você que inventou esse Estado
Inventou de inventar
Toda escuridão
Você que inventou o pecado
Esqueceu-se de inventar o perdão.

(Coro) Apesar de você
amanhã há de ser outro dia.
Eu pergunto a você onde vai se esconder
Da enorme euforia?
Como vai proibir
Quando o galo insistir em cantar?
Água nova brotando
E a gente se amando sem parar.

Quando chegar o momento
Esse meu sofrimento
Vou cobrar com juros. Juro!
Todo esse amor reprimido,
Esse grito contido,
Esse samba no escuro.
Você que inventou a tristeza
Ora tenha a finezade “desinventar”.
Você vai pagar, e é dobrado,
Cada lágrima rolada
Nesse meu penar.

(Coro2) Apesar de você
Amanhã há de ser outro dia.
Ainda pago pra ver
O jardim florescer
Qual você não queria.
Você vai se amargar
Vendo o dia raiar
Sem lhe pedir licença.
E eu vou morrer de rir
E esse dia há de vir
antes do que você pensa.
Apesar de você

(Coro3) Apesar de você
Amanhã há de ser outro dia.
Você vai ter que ver
A manhã renascer
E esbanjar poesia.
Como vai se explicar
Vendo o céu clarear, de repente,
Impunemente?
Como vai abafar
Nosso coro a cantar,
Na sua frente.
Apesar de você

(Coro4) Apesar de você
Amanhã há de ser outro dia.
Você vai se dar mal, etc e tal,
La, laiá, la laiá, la laiá…….

REAÇÕES ABJETAS - II


Vocês têm acompanhado a cobertura da imprensa brasileira sobre a renúncia do tiranossauro Fidel Castro? Tirando uma ou outra coisa, grande parte poderia facilmente ser publicada no Granma, o jornal oficial do Partido Comunista Cubano. É sempre a mesma lengalenga sobre a "ambigüidade" de Fidel, uma figura-chave da História da América Latina no século XX e, ao mesmo tempo, um ditador que se perpetuou no poder e baniu as liberdades etc. e tal. É assim que tem se comportado a nossa imprensa chamada "isenta", que acredita ser possível manter-se "neutra" diante de um facínora e assassino em massa. A Folha de S. Paulo de hoje, 20 de fevereiro, por exemplo, publicou um artigo de Eliane Cantanhêde sobre o assunto (http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/elianecantanhede/ult681u374019.shtml). Como sempre faço quando leio algo do tipo, não resisti e fiz uns comentários, que seguem às frases da autora que mais me chamaram a atenção:

"Se Hugo Chávez é o maior e mais eficaz amigo de Cuba com seus petrodólares, Lula tem uma enorme vantagem sobre ele: além de aliado de Fidel e agora de Raul Castro, Lula mantém um diálogo maduro e próximo com os Estados Unidos. É assim com George W. Bush, certamente será assim com o sucessor --ou sucessora-- seja democrata, seja republicano".

De que "diálogo maduro e próximo" a autora está falando? Será que está se referindo ao mesmo presidente que já expulsou até um jornalista americano porque este teve a ousadia de comentar seus hábitos etílicos (mostrando também, com isso, todo seu amor à liberdade de imprensa, no que também se aproxima de seu ídolo Fidel Castro)? Ou, então, deve estar falando da política externa implementada pelo Itamaraty, uma mistura mal-ajambrada de megalomania terceiromundista e antiamericanismo de botequim que fez de tudo para ajudar a enterrar a ALCA, entre outras importantes conquistas da nacionalidade...

Eliane Cantanhêde pertence ao time dos analistas "sérios" que acreditam, sinceramente ou não, que o governo Lula é uma alternativa real à ditadura comunista de Fidel Castro ou ao caudilhismo populista de Hugo Chávez e Evo Morales. Certamente, não ouviu falar ainda do Foro de São Paulo ou, se já ouviu, faz-se de desentendida. Se olhasse a realidade mais de perto, perceberia que a aliança Lula-Fidel vai muito além de qualquer possibilidade - aliás, bastante remota - de "mediação" entre Cuba e os EUA. O objetivo de Lula não é mediar qualquer transição para a democracia na ilha: é garantir a sobrevivência da ditadura cubana.

"Como vão se comportar os "cubanos de Miami", que têm muito dinheiro e querem triturar todos os Castro com os próprios dentes? Os EUA, que empurraram Fidel para a órbita soviética e comunista, terão flexibilidade para abrir o diálogo e cancelar o embargo à ilha?"

A autora repete um dos estereótipos mais comuns sobre os opositores da ditadura castrista, que seriam todos gente endinheirada e que querem triturar Fidel e seu hermanito porque eles, afinal, tiveram a audácia de nacionalizar suas propriedades milionárias em nome da justiça social, vejam vocês... Basta olhar para o perfil médio dos exilados que se arriscam todos os dias em barcos improvisados tentando fugir da ilha-prisão para perceber que essa idéia é falsa. Outra coisa: não foram os EUA que "empurraram Fidel para a órbita soviética e comunista". Essa mentira, de tão repetida, já virou uma espécie de mantra, que até os inimigos de Fidel reproduzem. Já escrevi sobre isso antes neste blog, mas vou repetir: a comunização de Cuba não foi o resultado de nenhuma pressão externa dos EUA sobre Cuba. Foi Fidel, ansioso por poder, que manipulou a rivalidade entre as duas superpotências, os EUA e a URSS, para alijar os setores não-comunistas da Revolução Cubana e concentrar todos os poderes em suas mãos, instituindo sua ditadura pessoal. Vá estudar um pouco de História, Eliane Cantanhêde!

"Apesar disso [a fuga em massa de cubanos para o exílio], as análises confidenciais brasileiras, desde a época de FHC, são de que Fidel conseguiu manter expressivo apoio popular, sobrevivendo ao fim da União Soviética, à queda do Muro de Berlim e à crise econômica, que se tornou especialmente grave depois de 1995."

Sabe por que, apesar das dificuldades, Fidel "conseguiu manter expressivo apoio popular", Eliane? Porque conta com coisas como a G2, a polícia secreta, e os CDR, os Comitês de Defesa da Revolução, que mantêm controle total da sociedade cubana, por meio do terror absoluto. Porque não há nenhuma liberdade de expressão, a imprensa é completamente censurada, e qualquer um que ouse falar mal do tirano é jogado imediatamente no xadrez. Só por isso. Mas se você está mesmo interessada em saber se os cubanos amam mesmo o seu regime, então olhe para os milhares que fogem do paraíso socialista, votando com os remos.

"Fidel é o mito de gerações. Difundiu ideais de igualdade emocionantes que fizeram a cabeça de milhões mundo afora, enquanto determinou e conduziu uma prática política repressora das liberdades individuais que gerou oposição também em milhões mundo afora. Além de ter convivido com um embargo econômico cruel e inabalável durante décadas. Um embargo que derrubaria qualquer um, menos ele".

Poucas vezes vi tietagem tão explícita disfarçada de análise "séria". Vejamos quais foram os "ideais emocionantes" que o caudilho cubano difundiu: fuzilamentos, milhares de presos políticos, partido único no poder, ausência de todas as liberdades, paranóia e megalomania. Sem falar na destruição econômica da ilha, que ele transformou num porta-aviões da ex-URSS nas Américas. Emocionante, não? E os EUA ainda por cima impôem um "embargo econômico cruel" (pelo menos ela não falou em "bloqueio", já é alguma coisa) só pra prejudicar o Fidel, esse herói. Ah, esses gringos malvados e imperialistas... Mas ainda bem que Fidel é o "cara" e enfrenta os ianques. Como todos sabem, é só porque é "ele" que o embargo não o derrubou. Isso não tem nada a ver com o fato de que o tal embargo não impede o governo da ilha de ser paparicado por dezenas de governos ocidentais, como o do amigão Lula da Silva, não é mesmo? Claro que não, ora...

"O que se espera é que os ideais sobrevivam, amparados por bons índices de saúde e de educação, e que novos ventos acrescentem ao regime cubano modernidade, democracia e integração ao mundo. Manter o bom legado, passar por cima do mau legado".

Acho que aqui não precisa dizer muita coisa. Os votos de Eliane Cantanhêde de que os "ideais sobrevivam", e que os "bons índices de saúde e de educação" prossiguam demonstram a que vem a nossa imprensa quando trata de Fidel e de Cuba. Eis o "bom legado" deixado por Fidel, para ficarmos apenas nas duas áreas citadas: uma saúde sucateada, que já era boa antes do tirano chegar ao poder, e uma "educação" que não passa de doutrinação ideológica, nem sequer disfarçada, uma lavagem cerebral movida a slogans e panegíricos ao "máximo líder". É a teoria dos "dois Fidéis", o bonzinho, que dá saúde e educação ao povo, e o mauzinho, que lhe tira a liberdade. Fico aqui pensando... Será que alguém na nossa grande mídia teria coragem de dizer algo semelhante de um Pinochet, ou de um general Médici? Ah, essa nossa imprensa "séria e isenta"...

Não sei o que é pior: uma imprensa abertamente calhorda e alinhada com os donos do poder, ou uma que esconde suas preferências ideológicas alegando uma suposta "imparcialidade". Tem gente que acha possível ficar neutro diante do crime e da mentira. Tem gente que prefere esconder-se detrás de um véu de ambigüidade. Tem gente que acha impossível distinguir entre o certo e o errado, a verdade e a mentira, o bem e o mal. Eu, não.

REAÇÕES ABJETAS


Asquerosa. Nojenta. Abjeta. Repugnante. Horrível. Nauseante. Canalha.

Que palavra da língua portuguesa poderia melhor descrever a declaração do Apedeuta, quando perguntado por jornalistas qual sua opinião sobre a renúncia do tirano Fidel Castro? Depois de derramar-se nos elogios de praxe ao "mito vivo", Lula disse esperar que o fato abra caminho para uma transição pacífica etc. e tal, e, num arroubo de quase-sinceridade, deixou escapar que espera que a saída de cena do Coma Andante não permita que os exilados cubanos em Miami (dá uma risadinha meio irônica) não retornem à ilha para... (parou para pensar um pouco) para... "criar uma situação de conflito". Ufa!

A pequena pausa feita por Lula antes de terminar sua frase lamentável - mais uma para constar do bestialógio lulista - é quase tão reveladora quanto a frase em si, uma das coisas mais cínicas e nojentas que eu me lembro ter visto alguém dizer nos últimos tempos. Naquele instante, não mais do que uns cinco segundos, o Guia Genial se deu conta da enormidade do absurdo que estava dizendo e, tentando remendar o irremendável, saiu-se com o "criar uma situação de conflito". Aposto uma viagem para Havana no Aerolula que o que ele queria dizer, na verdade, era que esperava que a renúncia de seu ídolo Fidel Castro não levasse a que os exilados voltassem a Cuba para restaurar a democracia e o capitalismo na ilha-prisão, ajustando as contas com os carrascos castristas. Deve ter sido porque ele percebeu que não estava numa reunião do Foro de São Paulo, foi isso.

O que explica tamanha cretinice? A meu ver, apenas o fascínio de Lula e dos companheiros petralhas pela figura do ditador cubano, um dos maiores assassinos em série da história da humanidade, responsável pela ruína física e moral de um país inteiro para alimentar sua megalomania e gosto pelo poder. Para Lula, assim como para o serial killer do Caribe, todos os exilados cubanos - cerca de 2 milhões - são vermes, gusanos, mercenários a soldo do imperialismo e da CIA. Gente como o escritor Guillermo Cabrera Infante, falecido há alguns anos no exílio na Inglaterra. Ou Huber Matos, companheiro de luta de Fidel e Che Guevara em Sierra Maestra, hoje exilado na Flórida, que passou vinte anos preso em condições subumanas por não ter aceito a comunização da revolução que ajudou a fazer. Ou o escritor Reinaldo Arenas, já falecido, que passou anos preso nas masmorras fétidas da ilha pelo crime de ser homossexual (o que diriam os nossos militantes gays diante disso?). Ou o poeta Heberto Padilla, também já morto, forçado a abjurar toda sua obra e a denunciar em público vários colegas artistas e intelectuais, num espetáculo de degradação humana só comparável aos expurgos da era stalinista na ex-URSS. E Carlos Franqui, Norberto Fuentes, Raúl Rivero, Oswaldo Payá, Vladimiro Roca... Nomes que Lula certamente desconhece, ou, se conhece, despreza solenemente. Não importa que muitos deles tenham fugido em desespero de seu país, quando o viram transformado numa ditadura comunista. Não importa que tenham sido perseguidos e enjaulados como animais por pregarem a liberdade. O lado bom, o lado da humanidade, para Lula e a quadrilha que ele comanda, não são eles, é Fidel, é Raúl Castro. Estes sim, os verdadeiros heróis, para os esquerdistas.

Não vou lembrar aqui o que afirmei antes neste blog, inclusive com números, sobre a monstruosa farsa que é o regime cubano. Nem vou mencionar fatos que a esquerda há muito esconde, como a quantidade de mortos pela ditadura castrista. Quem tiver interesse em conhecer os números pode folhear O Livro Negro do Comunismo e refutar as informações lá contidas, se puder. Vou lembrar apenas que Lula e Fidel Castro são mais do que bons companheiros. São cúmplices. Não por acaso, Lula entregou de bandeja dois atletas cubanos que tentaram fugir da ilha-cárcere, no ano passado. Não por acaso, também, quando esteve em Cuba, em janeiro, não falou em nenhum momento sobre os mais de 250 presos políticos do regime. É que ele, Lula, é um dos carcereiros.

Outra declaração que me deu vontade de vomitar, embora não me tenha causado nenhuma surpresa pela personagem que a emitiu, foi de Oscar Niemeyer. Nosso gênio oficial consegue ser mais caquético do que o tirano cubano. Niemeyer, do alto de seus recém-completados cem anos de stalinismo e hipocrisia - deve tudo, para começo de conversa, a um conhecido anticomunista e apoiador do golpe de 64, Juscelino Kubitschek -, afirmou, gagá, que Fidel Castro é não somente o líder de Cuba, mas da América Latina inteira. Isso mesmo. Fidel, o novo Bolívar, o comandante de 300 milhões de latino-americanos contra o imperialismo ianque... O que devo concluir de tal afirmação? Que o tirano cubano é o maior benfeitor que apareceu no continente nos últimos cinqüenta anos, diz Niemeyer. Tão benfeitor que transformou um país que há cinco décadas tinha a terceira renda per capita da América Latina num escombro que hoje só perde para o Haiti. Em sua carta-renúncia, Fidel citou o arquiteto brasileiro, dizendo que é preciso ser conseqüente até o fim. Em outras palavras, que levará junto para o túmulo 11 milhões de indivíduos, se assim achar necessário para conservar seu poder, assim como estava disposto a levar a humanidade inteira na crise dos mísseis, em 1962, quando quase provocou uma guerra nuclear entre os EUA e a ex-URSS. Niemeyer, pelo menos, tem a desculpa da idade para dizer tais aberrações. Ao contrário de outros capachos do ditador, como Lula e Frei Betto. Estes se encaminham, céleres, para a senilidade niemeyeriana, prematuramente caducos.

Não sei o que será de Cuba quando Fidel Castro finalmente se for deste mundo, fazendo assim a alegria de milhões de cubanos exilados e de tantos outros milhões que querem juntar-se a seus parentes fora da ilha, ou que simplesmente sonham secretamente com o dia em que poderão dizer o que pensam. Pior do que com ele é que não poderá ficar. Sei apenas que quando esse dia chegar, não haverá lenços suficientes para enxugar as lágrimas que nossos esquerdistas verterão pela morte do adorado Líder Máximo. Com idiotas da estirpe de Lula e Niemeyer, o Brasil caminha a passos largos para descer cada vez mais na escada da inteligência humana.